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Revista
do
Instituto Histórico e Geográfico de
Montes Claros
Fundado em 27 de Dezembro de 2006
VOLUME XI
2º Semestre de 2013
MONTES
CLAROS
MINAS GERAIS – BRASIL
2013
O
Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros,
nos termos de seu Estatuto, tem como finalidade a promoção
de estudos e a difusão de conhecimentos de história,
geografia e ciências afins, do município de Montes
Claros e da região Norte Mineira, assim como o fomento
da cultura, a defesa e a conservação do patrimônio
histórico, artístico e cultural.
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS
Centro Cultural Hermes de Paula
Praça Dr. Chaves, 32 - Centro
CEP.: 39.400-005 - Montes Claros - MG
Site: www.ihgmc.art.br
REVISTA DO INSTITUTO HISTÓRICO
E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS
Publicação semestral
Diretor e editor:
Itamaury Teles de Oliveira
Reg. Prof. MG 07636JP
Conselho Editorial:
Haroldo Lívio de Oliveira, Itamaury Teles de Oliveira,
Luís Carlos Vieira Novaes e Wanderlino Arruda
Editoração/diagramação:
Cleber Caldeira
Impressão:
Gráfica e Editora O Lutador - Belo Horizonte - MG
CAPA:
Imóveis demolidos em Montes
Claros: chalé de Dona Laura
Gomes, na Praça Coronel Ribeiro,
19; chalé do Doutor Antônio
Augusto Veloso, na rua Camilo
Prates; Ginásio Diocesano de
Montes Claros.
ÍNDICE
DIRETORIA 2012/2013
COMISSÃO
FUNDADORA 2006-2007
Dr. DÁRIO TEIXEIRA COTRIM
Dr. HAROLDO LÍVIO DE OLIVEIRA
Jornalista LUIS RIBEIRO
Dr. WANDERLINO ARRUDA
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS
Centro Cultural Hermes de Paula
Praça Dr. Chaves, 32 - Centro
CEP.: 39.400-005 - Montes Claros - MG
Site: www.ihgmc.art.br
REVISTA DO INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS
Publicação semestral
Diretor e editor:
Itamaury Teles de Oliveira
Reg. Prof. MG 07636JP
Conselho Editorial:
Haroldo Lívio de Oliveira, Itamaury Teles de Oliveira,
Luís Carlos Vieira Novaes e Wanderlino Arruda
Editoração/diagramação:
Cleber Caldeira
Impressão:
Gráfica e Editora O Lutador - Belo Horizonte - MG
CAPA:
Imagens da antiga Estação
Ferroviária de Montes Claros,
inaugurada em 1º de setembro
de 1926
e demolida
no início dos anos 70
DIRETORIA
2012- 2014
PRESIDENTE
DE HONRA |
Dr.
Luiz de Paula Ferreira |
PRESIDENTE |
Dr.
Itamaury Telles de Oliveira |
1º
VICE - PRESIDENTE |
Dr.
Wanderlino Arruda |
2º
VICE - PRESIDENTE |
Dr.
Dário Teixeira Cotrim |
DIRETOR
EXECUTIVO |
Dr.
Petrônio Braz |
DIRETOR-SECRETÁRIO |
Dr.
Manoel Messias de Oliveira |
DIRETOR-SECRETÁRIO ADJUNTO |
Drª
Maria da Gloria Caxito Mameluque |
DIRETOR DE FINANÇAS |
Coronel
Lázaro Francisco Sena |
DIRETOR
DE FINANÇAS ADJUNTO |
Dr.
Adnauer Denarte Dávila |
DIRETORA
DE PROTOCOLO |
Profª
Felicidade Patrocínio |
DIRETORA
CULTURAL |
Profª
Maria Luiza Silveira Teles |
DIRETORA DE BIBLIOTECA |
Profª
Marta Verônica Vasconcelos Leite |
DIRETORA
DE MUSEU |
Economista
Roberto Carlos Morais Santiago |
DIRETOR DE RELAÇÕES PÚBLICAS |
Dr.
Haroldo Lívio de Oliveira |
DIRETORIA
DE JORNALISMO |
Jornalista
Luiz Carlos Vieira Novaes |
DIRETORA
DE CURSOS |
Profª
Ivana Ferrante Rebelo e Almeida |
PRESIDENTE
DE HONRA |
Dr.
Luiz de Paula Ferreira |
PRESIDENTE |
Dr.
Itamaury Telles de Oliveira |
1º
VICE - PRESIDENTE |
Dr.
Wanderlino Arruda |
2º
VICE - PRESIDENTE |
Dr.
Dário Teixeira Cotrim |
DIRETOR
EXECUTIVO |
Dr.
Petrônio Braz |
DIRETOR-SECRETÁRIO |
Dr.
Manoel Messias de Oliveira |
DIRETOR-SECRETÁRIO ADJUNTO |
Drª
Maria da Gloria Caxito Mameluque |
DIRETOR DE FINANÇAS |
Coronel
Lázaro Francisco Sena |
DIRETOR
DE FINANÇAS ADJUNTO |
Dr.
Adnauer Denarte Dávila |
DIRETORA
DE PROTOCOLO |
Profª
Felicidade Patrocínio |
DIRETORA
CULTURAL |
Profª
Maria Luiza Silveira Teles |
DIRETORA DE BIBLIOTECA |
Profª
Marta Verônica Vasconcelos Leite |
DIRETORA
DE MUSEU |
Economista
Roberto Carlos Morais Santiago |
DIRETOR DE RELAÇÕES PÚBLICAS |
Dr.
Haroldo Lívio de Oliveira |
DIRETORIA
DE JORNALISMO |
Jornalista
Luiz Carlos Vieira Novaes |
DIRETORA
DE CURSOS |
Profª
Ivana Ferrante Rebelo e Almeida |
Nota
da Coordenação
A ordem de publicação dos artigos dos sócios
efetivos obedeceu à sequência alfabética
dos nomes dos autores. Em seguida, foram ordenados os trabalhos
dos sócios correspondentes. A Revista não se responsabiliza
por conceitos e declarações expedidas em artigos
publicados. A revisão dos originais foi feita pelos próprios
autores dos artigos publicados.
CONSELHO
CONSULTIVO
Prof. José Geraldo de Freitas Drumond
Profº Juvenal Caldeira Durães
Escritora Milene A. Coutinho Maurício
Profª Ruth Tupinambá Graça
Dr. Waldyr Senna Batista
Profª Yvonne de Oliveira Silveira
COMISSÃO
DE GEOGRAFIA E ECOLOGIA
Prof. Ivo das Chagas
Profª Anete Marília Pereira
Profª Maria Aparecida Costa
COMISSÃO
DE HISTÓRIA E ARQUEOLOGIA
Profª
Marta Verônica Vasconcelos Leite
Prof.. César Henrique de Queiroz Porto
Profª Felicidade Patrocínio
Dr. Fabiano Lopes de Paula
COMISSÃO
DE ANTROPOLOGIA, ETNOGRAFIA
E SOCIOLOGIA
Profª
Maria Inês Silveira Carlos
Profª Cláudia Regina Almeida
COMISSÃO
DE CLASSIFICAÇÃO E DE
ADMISSÃO DE SÓCIOS
Dr.
Dário Teixeira Cotrim
Profª Míriam Carvalho
Dr. Wandelrino Arruda
Profª Zoraide Guerra David
COMISSÃO
DA REVISTA DO INSTITUTO HISTÓRICO
E GEOGRÁFICO
Dr. Petrônio Braz
Dr. Itamaury Teles de Oliveira
Jornalista Luís Carlos Vieira Novaes
Profª Marta Verônica Vasconcelos Leite
Dr. Wanderlino Arruda
Profº Juvenal Caldeira Durães
COMISSÃO
REVISORA DA REVISTA
Dr. Haroldo Lívio de Oliveira
Cel. Lázaro Francisco Sena
Dr. Wanderlino Arruda
LISTA
DE SÓCIOS EFETIVOS DO IHGMC
CD |
Sócios |
Patronos |
01 |
Dr José Santos Rameta |
Alpheu
Gonçalves de Quadros |
02 |
Escritora
Milene A. Coutinho Maurício |
Alfredo de Souza Coutinho |
03 |
Padre
Antônio Alvimar Souza |
Antônio
Augusto Teixeira |
04 |
Maria do Carmo Veloso Durães |
Antônio
Augusto Veloso (Desemb.) |
05 |
Profª
Yvonne de Oliveira Silveira |
Antônio
Ferreira de Oliveira |
06 |
Prof Marcos Fábio Martins Oliveira |
Antônio
Gonçalves Chaves |
07 |
Professora
Maria Aparecida Costa |
Antônio
Gonçalves Figueira |
08 |
Professora
Anete Marilia Pereira |
Antônio
Jorge |
09 |
Professora
Isabel Rebelo de Paula |
Antônio
Lafetá Rebelo |
10 |
Professora Maria Florinda Ramos Pina |
Antônio
Loureiro Ramos |
11 |
Vaga |
Ary
Oliveira |
12 |
Dr
Antônio Augusto Pereira Moura |
Antônio
Teixeira de Carvalho |
13 |
Dr
Cesar Henrique Queiroz Porto |
Ângelo
Soares Neto |
14 |
Professora
Karla Celene Campos |
Arthur
Jardim Castro Gomes |
15 |
Jornalista
Magnus Denner Medeiros |
Ataliba
Machado |
16 |
Dr
Waldir de Senna Batista |
Athos
Braga |
17 |
Profa.
Marta Verônica Vasconcelos Leite |
Auguste
de Saint Hillaire |
18 |
Dr Petrônio Braz |
Brasiliano
Braz |
19 |
Dr Luiz de Paula Ferreira |
Caio
Mário Lafetá |
20 |
Professora Felicidade Patrocínio |
Camilo
Prates |
21 |
Profa.Terezinha
Gomes Pires |
Cândido
Canela |
22 |
Dr. Luiz Giovani Santa Rosa |
Carlos
Gomes da Mota |
23 |
Historiador
Hélio de Morais |
Carlos
José Versiani |
24 |
José Ponciano Neto |
Celestino
Soares da Cruz |
25 |
Dr
Ronaldo José de Almentida |
Corbiniano
R Aquino |
26 |
Profa.
Maria Rejane Rodrigues Ruas Colares |
Cyro
dos Anjos |
27 |
Professora
Regina Maria Barroca Peres |
Dalva
Dias de Paula |
28 |
Jornalista
Jerusia Xavier Arruda |
Darcy
Ribeiro |
29 |
Professora Filomena Luciene Cordeiro |
Demóstenes
Rockert |
30 |
Escritora Maria Lúcia Becattini Miranda |
Dona
Tirbutina |
31 |
Professora
Clarice Sarmento |
Dulce
Sarmento |
32 |
Dr
Edgar Antunes Pereira |
Edgar
Martins Pereira |
33 |
Dr
Wanderlino Arruda |
Enéas
Mineiro de Souza |
34 |
Profa.
Geralda Magela de Sena e Souza |
Eva
Bárbara Teixeira de Carvalho |
35 |
Dr.
Antônio Ferreira Cabral |
Ezequiel
Pereira |
36 |
Dra. Felicidade Vasconcelos Tupinambá |
Felicidade
Perpétua Tupinambá |
37 |
Dra.
Jussara Veloso Ferreira Antunes |
Francisco
Barbosa Cursino |
38 |
Professora
Maria Inês Silveira Carlos |
Francisco Sá |
39 |
Professor
Ivo das Chagas |
Gentil
Gonzaga |
40 |
Drª
Maria da Glória Caxito Mameluque |
Georgino
Jorge de Souza |
41 |
Dr
Reinine Simões de Souza |
Geraldo
Athayde |
42 |
Professora
Maria Luiza Silveira Teles |
Geraldo
Tito da Silveira |
43 |
Professor
Benedito de Paula Said |
Godofredo
Guedes |
44 |
Economista
Roberto Carlos M. Santiago |
Heloisa
V. dos Anjos Sarmento |
45 |
Vaga |
Henrique
Oliva Brasil |
46 |
Professora
Eliane Maria F Ribeiro |
Herbert
de Souza – Betinho |
47 |
Jornalista
Paulo César Narciso Soares |
Hermenegildo
Chaves |
48 |
Profa.
Maria das Dores Antunes Câmara |
Hermes Augusto de Paula |
49 |
Prof. José Ferreira da Silva |
Irmã
Beata |
50 |
Jornalista
Délio Pinheiro Neto |
Jair
Oliveira |
51 |
Dr
José Carlos Vale de Lima |
João
Alencar Athayde |
52 |
Profa.
Maria Isabel M. F. Sobreira |
João
Chaves |
53 |
Dr
João Carlos M. Sobreira de Carvalho |
João
Batista de Paula |
54 |
Jornalista
Adnauer Denarte Dávila |
João
José Alves |
55 |
Cel. Lázaro Francisco Sena |
João
Luiz de Almeida |
56 |
Dra.
Ivana Ferrante Rebelo |
João Luiz Lafetá |
57 |
Jornalista
Luiz Carlos Novaes |
João
Novaes Avelins |
58 |
Profa. Maria Ângela Figueiredo Braga |
João
Souto |
59 |
Jornalista
Luiz Ribeiro dos Santos |
João
Vale Maurício |
60 |
Dr.
Manoel Messias Oliveira |
Jorge
Tadeu Guimarães |
61 |
Jornalista
Girleno Alencar Soares |
José
Alves de Macedo |
62 |
Profº
José Geraldo de Freitas Drumond |
José
Esteves Rodrigues |
63 |
Vaga |
José
Gomes Machado |
64 |
Professora
Palmyra Santos Oliveira |
José
Gomes de Oliveira |
65 |
Dra.
Maria de Lourdes Chaves |
José
Gonçalves de Ulhôa |
66 |
Arqueólogo
Fabiano Lopes de Paula |
José
Lopes de Carvalho |
67 |
Prof. Denilson Meireles |
José
Monteiro Fonseca |
68 |
Professora
Rejane Meireles Amaral |
José
Nunes Mourão |
69 |
Dr.
Aderbal Esteves |
José
(Juca) Rodrigues Prates Júnior |
70 |
Vaga |
José
Tomaz Oliveira |
71 |
Dra.
Edwirges Teixeira de Freitas |
Júlio
César de Melo Franco |
72 |
Jornalista
Theodomiro Paulino Correa |
Lazinho
Pimenta |
73 |
Dra.
Maria das Mercês Paixão Guedes |
Lilia
Câmara |
74 |
Professor
Laurindo Mekie Pereira |
Luiz Milton Prates |
75 |
Vaga |
Manoel
Ambrósio |
76 |
Vaga |
Manoel
Esteves |
77 |
Profª
Maria Jacy de Oliveira Ribeiro |
Mário
Ribeiro da Silveira |
78 |
Jornalista
Américo Martins Filho |
Mário
Versiani Veloso |
79 |
Professora
Maria José Colares Moreira |
Mauro
de Araújo Moreira |
80 |
Vaga |
Miguel
Braga |
81 |
Prof. Juvenal Caldeira Durães |
Nathércio
França |
82 |
Dr
Haroldo Lívio de Oliveira |
Nelson
Viana |
83 |
Vaga |
Newton
Caetano d’Angelis |
84 |
Dr
Itamaury Telles de Oliveira |
Newton
Prates |
85 |
Historiador
Expedito Veloso Barbosa |
Armênio
Veloso |
86 |
Professora
Zoraide Guerra David |
Patrício
Guerra |
87 |
Profº Arnaldo Bezerra |
Pedro
Martins de Sant’Anna |
88 |
Professora
Miriam Carvalho |
Plínio
Ribeiro dos Santos |
89 |
Jornalista Felipe A. G. Gabrich |
Robson
Costa |
90 |
Folclorista Teófilo Azevedo Filho (Téo) |
Romeu
Barcelos Costa |
91 |
Dr
Wesley Caldeira |
Sebastião
Sobreira Carvalho |
92 |
Professor
Roberto Pinto Fonseca |
Sebastião
Tupinambá |
93 |
Dr
Dário Teixeira Cotrim |
Simeão
Ribeiro Pires |
94 |
Dr
Luiz Pires Filho |
Teófilo
Ribeiro Filho |
95 |
Profa.
Marilene Veloso Tófolo |
Terezinha
Vasquez |
96 |
Professora
Ruth Tupinambá Graça |
Tobias
Leal Tupinambá |
97 |
Vaga |
Urbino
Vianna |
98 |
Dra. Mara Yanmar Narciso |
Virgilio
Abreu de Paula |
99 |
Vaga |
Waldemar
Versiani dos Anjos |
100 |
Professora
Maria Clara Lage Vieira |
Wan-dick
Dumont |
Sócios
Correspondentes
Jornalista
Adriano Souto |
Belo
Horizonte - MG |
Prof.
Alan José Alcântara Figueiredo |
Macaúbas
- BA |
Jornalista
Alberto Sena Batista |
Belo
Horizonte - MG |
Dr.André
Kohene |
Caetité
-BA |
Prof.
Regente Armênio Graça Filho |
Rio
de Janeiro- RJ |
Dr.
Ático Vilas-Boas da Mota |
Macaúbas
- BA |
Dr.
Augusto José Vieira Neto |
Belo
Horizonte - MG |
Dr.
Avay Miranda |
Brasilia
- DF |
Jornalista
Carlos Lindenberg Spínola Castro |
Belo
Horizonte - MG |
Escritora
Carmem Netto Victória |
Belo
Horizonte - MG |
Jornalista
Cláudia Correia Costa Carvalho |
Luz
- MG |
Jornalista
Cintia Bernes |
Belo
Horizonte - MG |
Historiadora
Célia do Nascimento Coutinho |
Belo
Horizonte - MG |
Historiador
Daniel Antunes Júnior |
Espinosas
- MG |
Historiador
Dario Cardoso Vale |
Belo
Horizonte - MG |
Dr.
Dêniston Fernandes Diamantino |
Januária
- MG |
Historiador
Domingos Diniz |
Pirapora
- MG |
Historiador
José Henrique Brandão |
Bocaiuca-MG |
Historiador
Paulo Costa |
Rio
Pardo de Minas - MG |
Historiador
Pedro de Oliveira |
Várzea
da Palma-MG |
Dr.
Enock Sacramento
|
São
Paulo - SP |
Dr.
Eustáquio Wagner Guimarães Gomes |
Belo
Horizonte - MG |
Dr.
Fernando Antônio Xavier Brandão |
Belo
Horizonte MG |
Escritor
Flávio Henrique Ferreira Pinto |
Belo
Horizonte - MG |
Jornalista
Genoveva Ruisdias |
Belo
Horizonte - MG |
Jornalista
Geraldo Henriques (Riky Tereze) |
New
York - USA |
Prof.
Herbet Sardinha Pinto |
Belo
Horizonte - MG |
Dr.
Hermano Baggio |
Pirapora
- MG |
Jornalista
Jeremias Macário |
Vitória
da Conquista - BA |
Jornalista
João Martins |
Guanambi
- BA |
Dr.
Jorge Lasmar |
Belo
Horizonte MG |
Dr.
Leonardo Alvares da Silva Campos |
Belo
Horizonte - MG |
Prof.
José Eustáquio Machado Coelho |
Belo
Horizonte MG |
Prof.
Dr. Jorge Ponciano Ribeiro |
Brasília
- DF |
Dr.
José Walter Pires |
Brumado
- BA |
Dr.
Marco Aurélio Baggio |
Belo
Horizonte MG |
Profa.
Dra. Maria da Consolação M. Figueiredo Cowen |
London
- England |
Prof.
Moisés Vieira Neto |
Várzea
da Palma - MG |
Jornalista
Paulo César Oliveira |
Belo
Horizonte - MG |
Jornalista
Manoel Hygino Santos |
Belo
Horizonte - MG |
Escritor
Reynaldo Veloso Souto |
Belo
Horizonte - MG |
Profa.
Terezinha Teixeira Santos |
Guanambi
- BA |
Prof.Thiago
Carvalho Makiyama |
Gunma-Ken
- Japão |
Prof.
Wellington Caldeira Gomes |
Belo
Horizonte - MG |
Historiador
Zanoni Eustáquio Roque Neves
|
Belo
Horizonte - MG |
APRESENTAÇÃO
Ao completar seus sete anos – número cabalístico
considerado por Pitágoras como sagrado, perfeito, mágico
e poderoso -, o Instituto Histórico e Geográfico de Montes
Claros atinge a sua maioridade, não só em decorrência
da prolífica produção literária de seus associados, mas
também como entidade reconhecida em todos os quadrantes
do território mineiro e, quiçá, brasileiro.
Sem cabotinismo, de forma discreta e determinada,
fomos construindo as sólidas bases sobre as quais se edificou
o bom conceito de que desfrutamos, haja vista o crescente
reconhecimento público pelo trabalho que desenvolvemos,
em prol da produção de conhecimentos sobre a
nossa vasta área de abrangência.
Com efeito, como pode ser comprovado nesta edição,
vários de seus membros foram contemplados com as mais
significativas honrarias, pelo Governo de Minas Gerais, em
cerimônias prestigiadas, com repercussão na mídia nacional.
Houve, até, um prêmio internacional conquistado por
um dos nossos associados. O folclorista Teófilo Azevedo
Filho, de nome artístico Téo Azevedo, foi agraciado com o
Grammy Latino 2013, em Los Angeles (EUA), pela produção
do CD sobre o centenário de Gonzagão.
Em nível municipal, abriram-se as portas de conselhos
para que as opiniões do Instituto Histórico e Geográfico
possam ser ouvidas e levadas em sua devida conta, com
a responsabilidade e o compromisso público que nos caracteriza,
na defesa e na promoção do nosso patrimônio cultural,
de forma genérica. Por isso mesmo, ocupamos cargo
de direção no Conselho Municipal do Patrimônio Cultural.
Com esta décima primeira edição, afora textos já
produzidos e ainda não publicados, somam-se mais de
2.000 páginas, exclusivamente sobre a história, a geografia,
a genealogia, as artes, as tradições e as pessoas da região
norte-mineira.
De uma entidade em busca de afirmação e itinerante,
nos primórdios da sua fundação, fomos conquistando, por
méritos, espaços públicos para sediar nossos trabalhos.
Nos últimos dois anos, no apagar das luzes da administração
do ex-prefeito Luiz Tadeu Leite, fomos contemplados
com uma sala no Centro Cultural Hermes de Paula, onde
instalamos a nossa sede administrativa, parte do nosso acervo
bibliográfico, e a galeria de retratos dos ex-presidentes.
Agora, no final de nosso mandato como presidente,
conseguimos um importante espaço para abrigar o acervo
bibliográfico doado ao Instituto pela família do nosso Patrono,
Simeão Ribeiro Pires. Os mais de oito mil volumes – que
se encontravam depositados, em sala inacessível ao público,
na Escola Estadual Prof. Plínio Ribeiro – já estão à disposição
de pesquisadores, na Casa da Cidadania, antiga rodoviária
da cidade, esta coincidentemente construída na gestão de
Simeão Ribeiro como prefeito de Montes Claros.
É por tudo isso que o Instituto Histórico e Geográfico
de Montes Claros, com apenas sete anos de fundação,
já se apresenta como entidade adulta e representativa.
Integrado por pessoas de notório saber em suas áreas, a
soma desses saberes é rico cabedal que flui naturalmente
para o seu engrandecimento e consolidação.
Agora, convidamos o leitor, sem maiores delongas,
para uma incursão nos excelentes textos produzidos por
nossos associados.
Itamaury Teles de Oliveira
HOMENAGENS
PÓSTUMAS A SÓCIOS
Historiador
João Botelho Neto
1932 - 2007
Cônego Adherbal Murta de Almeida
1921 - 2008
Poeta Reivaldo Canela
1933 - 2008
Escritor Olyntho da Silveira
1909 - 2009
Necésio de Morais
1922 - 2010
Ájax Tolentino
1940 - 2012
Reginauro Silva
1950 - 2012
Fernanda Ramos
1928 - 2012
Marta Sayago
1946 - 2013
Para um túmulo de amigo
“A morte vem de manso, em dia incerto
e fecha os olhos dos que têm mais sono...”.
(Alphonsus de Guimaraens - ossa mea, I.)
FATOS MARCANTES
DO ÚLTIMO SEMESTRE
ABRIL DE 2013 - Em pé: Manoel Messias Oliveira, José Ferreira,
Ivo das Chagas, Juvenal Caldeira, Lázaro Sena, Haroldo Lívio,
Dário Cotrim, Denilson Meireles, Wanderlino Arruda e Itamaury
Teles. Assentadas: Yvonne Silveira, Marilene Tófollo. Palmyra Santos
Oliveira, Mara Narciso, Maria Ângela Braga, Clarice Sarmento
e Felicidade Patrocínio.
MAIO DE 2013 - Em pé: Dário Cotrim, Manoel Messias, Geralda
Magela Sena, Marta Verônica, Felicidade Tupinambá, Mara Narciso,
Maria Lúcia Becattini, Felicidade Patrocínio, Haroldo Lívio,
Expedito Barbosa e Itamaury Teles. Assentados – Marilene Veloso
Tófolo, Yvonne de Oliveira Silveira, Palmyra Santos Oliveira, José
Ferreira da Silva, Lázaro Sena e Wanderlino Arruda.
JUNHO DE 2013 - (EM DIA E HORA DE JOGO DA SELEÇÃO
BRASILEIRA) – Itamaury Teles, Lázaro Sena, Lola Chaves, Mara
Narciso, Palmyra Santos Oliveira, Wanderlino Arruda, Dário Cotrim
e Manoel Messias de Oliveira.
REUNIÃO DO MÊS DE JULHO DE 2013: Em pé – Dário Cotrim,
Lázaro Sena, Manoel Messias, Mara Narciso, Maria Ângela Figueiredo,
Juvenal Caldeira, José Ferreira, Lola Chaves e Itamaury Teles. Assentados
– Edwirges Teixeira (Du), Palmyra Santos Oliveira, Iolanda
Teles, Marilene Tófolo, Amelina Chaves e Wanderlino Arruda.
REUNIÃO SOLENE DE POSSE
EM AGOSTO DE 2013
O Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros
reuniu-se dia 16 de agosto, às 19h30, na sede social do
Elos Clube, sob a presidência do escritor e jornalista Itamaury
Teles de Oliveira, para dar posse a novos associados
e lançar mais uma edição de sua revista semestral.
Na noite solene, foram empossados os seguintes novos associados em suas respectivas cadeiras: cadeira 04,
Maria do Carmo Veloso Durães - patrono Antônio Augusto
Veloso (Desembargador); cadeira 24, José Ponciano Neto
– patrono Celestino Soares da Cruz; cadeira 67, Denilson
Meireles - patrono José Monteiro Fonseca; cadeira 87, Arnaldo
Bezerra – patrono Pedro Martins Sant’Anna; cadeira
89, Felipe Antônio Guimarães Gabrich - patrono Robson
Costa; cadeira 90, Teófilo Azevedo Filho (Téo) – patrono
Romeu Barcelos Costa; e cadeira 99 - Virgínia de Abreu e
Paula - patrono Waldemar Versiani dos Anjos.
Além desses, foi entregue o diploma de sócio efetivo
aos familiares de Joaquim Soares de Jesus, “in memoriam”,
em virtude do seu falecimento antes da posse no Instituto
Histórico e Geográfico, para o qual havia sido eleito
por unanimidade dos votos dos associados, após os trâmites
regulamentares.
Roberto Carlos Santiago (Diretor de Museu), Itamaury Teles
(Presidente), Manoel Messias Oliveira (Diretor Secretário) e
Wanderlino Arruda (1º. Vice-Presidente)
Manoel Messias de Oliveira, Wanderlino Arruda, Itamaury Teles,
Haroldo Lívio e Rafael Gontijo
Membros do IHGMC presentes à Reunião Solene de Agosto: Em pé -
Luís Novaes, Roberto Carlos Santiago, Arnaldo Bezerra, Felipe
Gabrich, Expedito Barbosa, Pedro Oliveira, Manoel Messias Oliveira,
Itamaury Teles, Virgínia Abreu de Paula, José Ferreira, Haroldo
Lívio, Denilson Meireles, Geralda Magela Sena, Juvenal Caldeira e
Luiz Ribeiro. Assentados - Dário Cotrim, Wanderlino Arruda, Ivana
Ferrante Rebelo, Felicidade Patrocínio, Palmyra Santos Oliveira,
Maria do Carmo Veloso, Maria de Lourdes Chaves (Lola), Marilene
Veloso Tófolo e José Ponciano Neto.
SETEMBRO DE 2013 - Em pé: Juvenal Caldeira, Petrônio Braz,
Manoel Messias Oliveira, Denílson Meireles, Arnaldo Bezerra,
Lázaro Sena, Itamaury Teles, Marilene Tófolo, Felipe Gabrich, José
Ponciano Neto, Felicidade Patrocínio, Lola Chaves, José Ferreira e
Teófilo Azevedo (Téo). Assentados – Fabiano Lopes de Paula, Maria
do Carmo Veloso Durães, Edwirges Teixeira (Du), Palmyra Santos
Oliveira, Mara Narciso e Wanderlino Arruda.
OUTUBRO DE 2013 - Em pé: Lázaro Sena, Manoel Messias, José
Ferreira, Délio Pinheiro, Maria Ângela Figueiredo, Felicidade Patrocínio,
Marilene Tófolo, Itamaury Teles e Expedito Barbosa. Assentados– Regina Peres, Yvonne Silveira e Wanderlino Arruda.
NOVEMBRODE 2013 -Empé: José Ferreira, Lola Chaves, Marta
Verônica, Manoel Messias, Maria Ângela Figueiredo, Juvenal Caldeira,
Dário Cotrim, Petrônio Braz, José Ponciano Neto e Itamaury
Teles. Assentados: Maria do Carmo Durães, Irani Teles Antunes,
Palmyra Santos Oliveira, Edwirges Teixeira, Marilene Tófolo e
Wanderlino Arruda.
Itamaury Teles (novo 1º
Vice-Presidente),
Wanderlino Arruda (novo
Presidente do IHGMC) e
Dário Cotrim (novo 2o.
Vice-Presidente)
Alguns sócios presentes à reunião solene de posse da nova diretoria do
IHGMC, para o biênio 2013/2015: Em pé - Maria do Carmo Veloso,
Amelina Chaves, Marilene Veloso Tófolo, Geralda Magela Sena, Zoraide
Guerra David, Virgínia Abreu de Paula, Inês Silveira Carlos, Arnaldo
Bezerra e Cel. Lázaro Sena com a esposa; Assentados: José Ferreira da
Silva, Dário Cotrim e sua esposa Júlia, Olímpia e seu marido Wanderlino
Arruda, Itamaury Teles, Yvonne Silveira e Haroldo Lívio. Estiveram ainda
na reunião os associados: José Ponciano Neto, Luiz Ribeiro dos Santos,
Manoel Messias de Oliveira e Palmyra Santos Oliveira.
FATOSMARCANTES
DO ÚLTIMO SEMESTRE
DÁRIO COTRIM MINISTRA PALESTRAS
NA CIDADE DE GUANAMBI - BA
O nosso confrade Dário Teixeira Cotrim esteve na
cidade de Guanambi, em outubro próximo passado – onde
ministrou três palestras para as escolas daquela cidade,
sobre os temas: “O Idílio de Pórcia e Leolino” e “A Coluna
Prestes no Sertão Baiano e Norte de Minas”. O historiador
Dário Cotrim já tem 30 livros publicados. Ele é membro
efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros
e é sócio emérito do Instituto Histórico e Geográfico de
Minas Gerais. Presidiu o IHGMC no biênio de 2010 /2011.
TÉO AZEVEDO FATURA
O GRAMMY LATINO
O confrade Teófilo de Azevedo Filho, popularmente
conhecido por Téo Azevedo, é um baluarte da cultura
popular e foi indicado para o 14th Anual LATIN
GRAMMY Awards de 2013, como produtor dos CDs “Salve
Gonzagão – 100 anos” e “Sob o olhar januarense”.
Como se esperava, acabou conquistando o prêmio, na categoria “Melhor álbum
de raiz”, com o
CD em homenagem
ao centenário de
Gonzagão. A cerimônia
aconteceu no
dia 21 de novembro,
em Los Angeles, Estados
Unidos da
América.
MEDALHA DE HONRA PRESIDENTE
JUSCELINO KUBITSCHEK DE OLIVEIRA
O Presidente do IHGMC, escritor e jornalista Itamaury Teles, foi
agraciado pelo Governador Antônio Anastásia com a Medalha de
Honra Presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira, a mais
importante honraria concedida pelo Governo Mineiro, em cerimônia
realizada em Diamantina, dia 12 de setembro de 2013. Na mesma
oportunidade, a nossa confreira Yvonne de Oliveira Silveira,
presidente da Academia Montesclarense de Letras, recebeu a mesma
importante comenda.
O Presidente da Academia Mineira de Letras, escritor Olavo
Romano, a historiadora Regina Almeida, do IHGMG,
também receberam a Medalha JK, e posaram com nossos
confrades Itamaury Teles e Yvonne Silveira.
MEDALHA SANTOS DUMOND
O Governador Antônio Anastásia condecorou mais dois membros do
IHGMC: Felipe Gabrich e Edgar Antunes Pereira. Eles foram
agraciados com a Medalha Santos Dumont, na Fazenda Cabangu.
DONA PALMYRA PALESTRA SOBRE
A HISTÓRIA DE PORTEIRINHA - MG
Dona Palmyra Santos Oliveira– nossa confreira no IHGMC -
está sempre palestrando pelas escolas de Porteirinha, onde
reside faz mais de 70 anos. Ela, do alto dos seus quase 94
anos, é das mais assíduas em nossas reuniões.
POSSE NO IHGMG
Os confrades Petrônio
Braz e Marta Verônica
Vasconcelos Leite, Diretor
Executivo e Diretora
de Biblioteca, respectivamente,
do IHGMC, tomaram
posse como membros
titulares do Instituto
Histórico e Geográfico de
Minas Gerais, em concorrida
cerimônia.
IHGMC FAZ PARTE DO COMPAC
O INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE
MONTES CLAROS agora faz parte do Conselho Municipal
do Patrimônio Cultural – COMPAC. A entidade será
representada, nos próximos dois anos, pelo seu atual presidente,
Itamaury Teles de Oliveira, que terá como suplente
a confreira Filomena Luciene Cordeiro. No dia da posse,
no Gabinete do prefeito Ruy Muniz, ambos foram eleitos
para ocupar cargo na diretoria do órgão consultivo. Itamaury,
vice-presidente; Filomena, secretária geral.
BIBLIOTECA DO INSTITUTO
HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE
MONTES CLAROS É INAUGURADA
No dia 4 de dezembro de 2013, foi inaugurada a Biblioteca
Simeão Ribeiro Pires, em espaço cedido pela Prefeitura
de Montes Claros, na Casa da Cidadania.
O acervo, com oito mil volumes, que pertenceu ao Patrono
do IHGMC, Simeão Ribeiro Pires, encontrava-se depositado
em sala cedida pela Escola Estadual Prof. Plínio Ribeiro,
mas sem condições de ser colocado à disposição de pesquisadores.
A procura por local mais adequado demandou bastante
tempo, resultando na escolha da Casa da Cidadania.
Para o Prefeito Ruy Muniz, presente à solenidade, “a
data ficará marcada na memória cultural da cidade. Conheci
Simeão pessoalmente. Foi um homem à frente do seu tempo.
Engenheiro, professor e um pesquisador que gostava das
letras e investiu em livros. O exemplo de Simeão Ribeiro Pires
ilumina a nossa sociedade” – concluiu o Prefeito.
Wanderlino Arruda, escritor, contemporâneo na
Câmara Municipal e amigo pessoal de Simeão, confirmou
o interesse do homenageado pela literatura, acrescentando
que “ele era uma figura encantadora. Era possível ficar
de duas a três horas ouvindo Simeão. Posso afirmar
que ele era a expressão máxima em oratória em toda a
história de Montes Claros”.
Os cuidados com o espaço ficarão a cargo de Roseno
Reis, que não economizou elogios: “é uma biblioteca
muito rica. Já tenho experiência no setor, mas sei que aqui
vou aprender mais ainda”, revelou entusiasmado.
Entusiasmo também não faltou em Everaldo Ramos,
Presidente da Casa da Cidadania, que confirma a pluralidade
do espaço: “resgatar e preservar a memória de um
povo é importante para consolidar passos significativos
em direção ao desenvolvimento. Nossa casa se orgulha
muito de abrigar esta biblioteca e fazer daqui um espaço
de difusão do conhecimento”, frisou.
“Finalmente conseguimos um local para preservação
deste acervo, que é uma riqueza para todos aqueles que
querem ler e aprender”, comemorou Yvonne de Oliveira
Silveira, Presidente da Academia Montesclarense de Letras.
Durante a solenidade, o prefeito Ruy Muniz foi presenteado
com todas as edições da Revista do Instituto Histórico.
Foi inaugurado também no mesmo espaço uma sala
que abriga objetos que pertenceram a Simeão Ribeiro Pires,
que atuou como vereador, prefeito, escritor, membro
da Academia Montesclarense de Letras, Academia Municipalista
de Letras de Minas Gerais e do Instituto Histórico
e Geográfico de Minas Gerais, entre outras atividades.
ARTIGOS DIVERSOS
DOS SÓCIOS DO IHGMC
A CIDADE ALTA E A CIDADE BAIXA
Dário Teixeira Cotrim
Cadeira nº 93
Patrono: Simeão Ribeiro Pires
Quando eu vim para Montes Claros, com o objetivo
de dar prosseguimento aos meus estudos, me apaixonei
pela cidade. Pois bem, foi esta a cidade que eu escolhi para
morar, para constituir a minha família e viver o resto de
minha vida. Em vista disso tenho procurado aprender um
pouco de sua história com muito interesse. E assim, retrocedendo
algumas décadas passadas, encontro-me agora
no início do século XX, quando a cidade de Montes Claros
também trazia no seu bojo os apelidos de “Cidade Alta” e “Cidade Baixa”.
Mas, o certo é que, em nossa cidade de Montes Claros
o povo leva a sério toda essa falta de analogia vigente
e, em vista disso, cria-se uma política especifica para cada
segmento da sociedade. Segundo o historiador Nelson Vianna
os nomes “de baixo” e “de cima” se referiam as residências
dos dois chefes políticos daquela época. O Dr.
Honorato Alves, que era deputado federal, e residia na
parte superior da cidade, e por isso os seus correligionários
pertenciam ao grupo político do “Partido de Cima”. E,
por outro lado, o também deputado federal Dr. Camilo
Prates, que morava nas imediações da Matriz de Nossa
Senhora da Conceição e São José, chefiava o grupo político
do “Partido de Baixo”.
Disse ainda Nelson Vianna que “convém esclarecer,
todavia, que esses dois grandes partidos – os únicos da cidade – eram igualmente poderosos, contando com respeitáveis forças políticas bem equilibradas, que se refletiam por vários
outros municípios”. Além dos apelidos geográficos da cidade,
havia também os apelidos das facções políticas. Quem
morava na parte de cima pertencia ao grupo dos “pelados”,
e quem morava na parte de baixo, ao grupo dos “estrepes”.
É interessante entender que esses nomes se originaram
das duas bandas de músicas existentes naquela ocasião: “A Banda de Música Operária” da parte alta da cidade
e “A Bando de Música Euterpe” da sua parte baixa. Em
razão disso, os nomes “pelados” nasceu da corruptela
de “Operário” e “estrepes” da corruptela de “Euterpe”.
São curiosidades que engrandecem a história política
de nossa terra.
Em 1899, com a inauguração do Mercado Municipal
de Montes Claros, ocorreu o fato mais importante da
cidade que ficou evidenciado a desagregação da “Cidade
Alta” e da “Cidade Baixa”. “A edificação do Mercado
Municipal, na parte de Cima da Cidade, foi um golpe nas
ruas de Baixo. No decorrer da construção, caiu a torre do Mercado. – Que coisa formidável! Coisa Boa! – Foi o que
escreveu no seu pequeno caderno de notas o velho comerciante
Sílvio Teixeira, que habitava uma das ruas de Baixo,
e assim registrou o acontecimento”.
Hoje a cidade de Montes Claros é uma verdadeira
metrópole. Não há mais essas divisões, nem mesmo em
virtude dos aspectos físicos/geográficos da terra. Mas, com
o tempo, surgiram algumas citações em vista do seu crescimento
populacional e do seu desenvolvimento comercial
e industrial. O Dr. Francisco Sá lhe denominou de “Coração
robusto do Norte de Minas” e o dramaturgo Reginauro
Silva, por sua vez, o da “Cidade da arte e da cultura”.
Salve Montes Claros!
FALA, CALUNGA! VIDA
E MORTE NOS CEMITÉRIOS
Fabiano Lopes de Paula
Cadeira nº 66
Patrono: José Lopes de Carvalho
Introdução
A análise de túmulos é um campo fértil para a compreensão
de como as pessoas e sociedades agem em relação
à morte. Os jazigos são uma fonte imprescindível para uma
melhor compreender os questionamentos, incertezas e desejos
que os seres humanos têm em relação à morte e, por
consequência, à vida. Nos túmulos, encontram-se representações
dosmomentos finais dos viventes, permeadas de símbolos
e significados diversos. O tema da morte, principalmente
em sua versão da produção arquitetônica, é um lócus
das invenções e construções culturais, porque nele é
possível demarcar padrões e regras de pensamento.
Interessante é perceber como no passado havia a hierarquização
do espaço a partir do status social das pessoas,
aspecto visualizado em nossa dissertação de mestrado
(1997) quanto à realidade constatada no cemitério inglês
da antiga Mineração de Morro Velho, em Nova Lima, MG.
Para falar das construções tumulares, é necessário
passar, mesmo que rapidamente, pela ideia de formalização
de um local propício para o depósito dos defuntos, ou seja, o cemitério. Proveniente do vocabulário cristão, a
palavra grega koimetérion designava o lugar onde deter-minada pessoa dormia. Em sua vertente religiosa, o cemitério
passou a representar o local onde se descansava após
a morte e esperava-se pela ressurreição, que favorecia os
ideários “de conservação do corpo em local espaçoso e
simples como o cemitério” (BORGES, 2002, p.128).
________________________________________
1 -Calunga: nas religiões africanas, Calunga Pequena significa cemitério, enquanto Calunga Grande
significa o mar.
2 - Doutorando em Quaternário: Materiais e Cultura, Universidade de Trás-Os-Montes e Alto
Douro (UTAD), 2013.
________________________________________
Iconografia
Iconografias funerárias apresentam transformações
das atitudes dos homens e mulheres ocidentais diante da
morte. As posturas individuais e coletivas perante a morte
modificam-se ao longo do tempo, mostrando que nem sempre
se pode atribuir uma origem longínqua e única para
determinadas emoções e práticas funerárias contemporâneas.
Não há continuidade, mas maneiras distintas de se
relacionar com a perda de uma pessoa querida: o velho sentimento
de família em relação ao defunto não é tão velho
assim. Na verdade, é um sentimento da modernidade do
século XIX, não da antiguidade clássica (ARIÈS, 1989).
Mas o que tais representações dizem de importante
para o mundo social? Elas são construtoras e afirmadoras
de discursos, e não são neutras. Pensando na prática discursiva
da plástica funerária, Borges (2002) aponta que a
arte funerária possui um universo cultural próprio, inegável,
além de refletir a mentalidade e o gosto dominante do
grupo social de que procede, cuja abrangência é mais ampla
do que se supõe. Em outras palavras, o cemitério propiciava
a toda a comunidade entrar em contato com um tipo
de obra veiculadora de um ideário estético da população.
Seguindo a mesma linha de reflexão e tendo como
objeto de estudo os símbolos e imagens funerárias do Cemitério
Municipal de São José, Ponta Grossa, PR, Schneider
e Lamb (2009) afirmam que as esculturas, as formas
tumulares, os adornos funerários e todas as representações
contidas nos cemitérios são formadores de ideias, servem
de instrumento de poder, transmitem crenças e valores
morais, produzem cosmovisões. Assim, interpretá-las é uma maneira propícia de compreender como o social é
arquitetado e estruturado.
Na fronteira da morte
Expressões como ‘morremos todos’ ou ainda ‘a única
coisa que sabemos é que morreremos’ constituem fórmulas
que denotam um sentimento de resignação ao destino de
todo ser humano. Para Ariès (1989), esse é um dos modos
mais antigos de encarar a morte. Já nos tempos medievais,
cavaleiros e monges conheciam o seu fim antes de sua efetivação
e mesmo Dom Quixote, em seus devaneios, também
o percebeu previamente. Contudo, cabe um questionamento:
qual a necessidade de se afirmar o conhecimento
do fim trágico? Talvez a resposta resida no fato de que seja
preciso domar a morte a fim de que se torne menos árdua e
se tomem as devidas providências para que tudo ocorra de
maneira adequada nos últimos momentos.
Essa borderline nos faz lembrar que, por ocasião dos
levantamentos para a elaboração dos Estudos de Impacto
Ambiental (EIA) da Mineração Barro Alto, em Goiás, tivemos
a oportunidade de levantar algumas considerações
populares em relação à morte. Consta que no caso de alguém
ser picado por ‘Cabo Verde’ (o cascavel macho), se
o ofendido fosse homem, a morte era certa e, caso contrário,
escaparia. A origem desse mito é desconhecida, mas
importante frisar a questão do cruzamento de gêneros.
Induzido pela sexualidade ou por inspiração no mito de
Adão e Eva, na sedução? Condenado assim a perder a
vida, ao ofendido restava aguardar seu fim, mesmo que
houvesse algumas tentativas de driblar a morte. A prática
era impedir sua entrada na casa, colocando o leito do
moribundo atravessado na porta de acesso à rua. Esse
costume também já foi observado no Vale do Jequitinhonha,
em Minas Gerais, especialmente na zona rural.
Outras práticas ligadas ao morrer podem ser encontradas
nesse universo da cultura popular, sendo exemplo a varrição da casa após a saída do féretro, sempre
de dentro para fora, eliminando qualquer resíduo da
condição de não vida.
Nesse sentido podem ser citados, também, comportamentos
durante a Semana Santa, em que se relembra o
sofrimento e o velório de Cristo. Por dois milênios, havia
uma transposição de sentimentos vivificados. Alguns interditos
permeavam nossos atos, como, por exemplo, as
mulheres de nome ‘Maria’ não podiam pentear seus cabelos,
eram indicados os jejuns, a beberagem de ervas amargas,
as imagens de santos envolvidas em mantos roxos, as
conversas necessárias em tom baixo e o impedimento de
realizar transações comerciais. O luto era mais socializado:
poderia ser fechado, com uso de vestimenta negra, ou
mais leve, predominando cores sóbrias. Nas camisas dos
homens apenas uma tarja, que poderia aparecer, também,
junto ao bolso ou na manga de camisa, e estampado de
negro e branco para as mulheres.
Em Portugal, é comum o uso de joias destinadas à
reiteração do luto além de sisudas vestes. Em sua origem, o
luto serve para avisar que o utente está em contato e contaminado
pela energia da morte. Em outras religiões espalhadas
pelo mundo, o luto é e foi encarado de várias formas. Na Índia, antes da proibição pelos ingleses, havia a prática do
Sati (ou Sutiie), ou seja, a mulher, ao enviuvar, atirava-se à
fogueira onde eram queimados os restos mortais do marido.
Seguindo a tradição, o procedimento era necessário pois ficaria
abandonada e ninguém a manteria.
É inevitável nossa constante ligação com nossos
mortos, pois, além da saudade e da dor pela ausência, há
rituais post-mortem, como a missa do sétimo dia que, segundo
algumas religiões, é o período em que o falecido
toma consciência de sua morte. Missas de 30º dia, 1º aniversário
de morte, centenários e dia de finados constituem
especificidades para o reatar de vínculos.
Ritos
Até o século XVIII, era bastante comum a prática de
sepultamento em igrejas, mas com o advento de preocupações
higiênicas, bem como do crescimento das cidades,
fundaram-se os cemitérios urbanos. A retirada dos corpos
dos mortos das igrejas fez com que se secularizassem e
tornassem públicos os rituais funerários, fato que, inicialmente,
desagradou as autoridades eclesiásticas. Outro
ponto importante diz respeito à localização dos cemitérios
seculares.
A fim de se evitarem doenças e diminuírem-se as
epidemias, as necrópoles, a partir dos oitocentos, foram afastadas
dos centros das grandes cidades e ocuparam as regiões
periféricas. Por fim, cabe salientar que o ato de afastar
o cemitério das igrejas não é o mesmo que torná-lo não
religioso. Pelo contrário, sendo público, o cemitério pôde
abarcar tanto questões referentes à religiosidade popular
quanto a instituições culturais. Assim, as ‘casas dos
mortos’ fazem
[...] parte da invenção moderna, compartilha da reestruturação da
sociedade que, de agora em diante, trabalha com o confronto dialético
de duas realidades conceituais de vida: a cidade dos mortos e
a cidade dos vivos. Com referência à cidade dos vivos, a burguesia
preocupou-se com novos modelos gerais de urbanização e com
novas tipologias de serviços, como residências, escolas, teatros,
hospedarias e fábricas. As construções, numa primeira instância,
visavam ao bem-estar coletivo e ao progresso, advindos da Revolução
Industrial. Quanto à cidade dos mortos, a burguesia sentiu-se
no direito de construir uma arquitetura funerária que expressasse
seu gosto e suas pequenas fantasias. Repropôs, em miniatura, os
tipos arquitetônicos da cidade ideal, construída de castelos, catedrais,
templos e palácios suntuosos (BORGES, 2002, p.130).
Para Canella (1984, citado por BORGES 2002), nos
modernos cemitérios existem duas metáforas que acompanham
as imagens da morte: uma que remete ao mundo
agrário, ou seja, a que põe a terra como mãe e que faz
das ações de procriação e das estações períodos biológicos a morte faz parte de uma etapa da vida, é o momento
do repouso, do sono, e outra que afirma certa continuidade
entre vida e morte, sendo que esta é vista como uma ruptura do social e, por isso, é preciso restaurar,
através dos rituais públicos e familiares, os antigos enlaces
(BORGES, 2002).
Ainda segundo Canella (1984) são quatro os modelos
de cemitérios que perpassam essas duas metáforas:
o agrário, o monumental, o urbano e o industrial.
O primeiro é um cemitério mais rústico, instaurado no
meio de uma natureza pura; o segundo dá à morte um
caráter heroico; o terceiro integra vivência institucional
e social da cidade ao cemitério que, muitas vezes, se
avizinha do mercado; e o quarto é a necrópole funcional
e comunitária da grande cidade. Por restrições metodológicas
aqui não detalharemos esses diferentes paradigmas
funerários.
O tema ‘morte’ é realmente muito rico na cultura
popular. Os sitiantes de Laranjeiras em Itapecerica da Serra,
São Paulo, à época da pesquisa de Lia Garcia Fukui
(1983), cultivavam milho, feijão e mandioca e tinham uma
pequena criação de gado em sítios afastados. Viviam sob
uma economia de subsistência e frequentavam uma série
de festas religiosas, dentre elas a Semana Santa, que tinha,
na noite da Sexta Feira da Paixão, o culto aos mortos,
exatamente anterior ao Sábado de Aleluia (dia da ressurreição
de Cristo, segundo a tradição cristã). Nesse culto,
não há padres. Os fiéis seguem em silêncio os rezadores
em ruas escuras, sem lanternas. Diante de uma cruz,
homens e mulheres, de joelhos ou de cócoras, celebram a
Recomendação das Almas:
Diz o capelão:
Vamos rezar um padre-nosso e ave-maria
Para a sagrada morte e paixão
Do defunto Padre Artur
Respondem todos cantando:
Seja pelo amor de Deus
Seja pelo amor de Deus (FUKUI, 1983).
Intercalam-se nomes diferentes em cada uma das
orações, as quais são seguidas de um Pai-Nosso e uma Ave Maria. Os sitiantes percorrem um longo caminho tocando
matraca e parando em frente a cruzes para realizar essa
oração sete vezes. No final, canta-se pela “alma dos esquecidos”,
“dos que morrem afogados”, “dos que morrem
matados”. A oração é finalizada com uma recomendação
das almas:
Seja Bendito
Para sempre seja louvado
O Corpo de Cristo Sacramentado
A Maria Sagrada da Eucaristia
E do fruto e do ventre sagrado
Para a virgem Puríssima Santa Maria (FUKUI,1983)
Pode-se notar, então, que mais que revelar os interstícios
do ritual dos sitiantes ao apresentar alguns pontos,
a intenção é demonstrar que nem sempre, na atualidade,
homens e mulheres desejam um afastamento da morte ou
um esquecimento dos seus mortos. Como fica claro, os
habitantes de Laranjeiras, na Recomendação das Almas,
expõem seu desamparo e seu sentimento de opressão social.
O que se celebra é a morte de todos, visto que na
Quaresma – período em que não se tem auxílio dos santos,
pois estão ‘recolhidos’ – eles estão sozinhos e aflitos.
Desse modo, nas palavras de Fukui (1983), quando a vida
está desequilibrada é o momento de apelar aos mortos, às
almas como intermediárias dos mortais, como um apelo
dos vivos aos mortos, em nome do desamparo da vida.
Nomear os parentes, os vizinhos, os que morrem esquecidos,
os que morrem matados constitui a prévia de resgatar,
no sábado de Aleluia, o equilíbrio da vida e o pacto
com os santos.
No início do século XX em Várzea da Palma, no
sertão norte mineiro, Maria Aparecida de Paula teve
interesse em reunir em uma obra ‘Assim era Jasminópolis’
algumas passagens de ritos funerários da primeira
metade do século XX, em que as rezas e incelenças
eram cantadas em altas vozes para que toda a cidade pudesse ouvir em destom, o que aumentava o tom lúgubre. A principal reza era:
Vai irmão, tão bunitim!
Vai vivê na Glória de Deus Pai.
Vai irmão, vai irmãozim,
que Jesus perdoe seus pecados
que morreu sem deles arrepender.
Vai, meu irmão,
vivê no lugar sagrado,
livre de todas as dores,
livre de todos os males.
Louvado seja Jesus
que foi pregado na cruz.
Uma incelença a Nosso Senhor,
uma incelença à Mãe de Jesus
que receba este pecador
Uma paliana à Nossa Senhora,
que tenha pena desse pecador
Vai irmão, tão bunitim!....
O trajeto até o cemitério era feito a pé e, caso o peso
do caixão se tornasse demasiado, a solução era dar uma
surra de cipó verde tirado do caminho no caixão pelo lado
dos pés. Pela tradição, essa prática de surrar o caixão e proferir
palavras durante o ato somente era necessária quando
o falecido estava ‘pesado’ pela conduta em vida, pelas maldades
e injustiças. Além disso, era uma maneira de espantar
o demônio, que também acompanhava o féretro .
Segundo a mesma autora, havia o ‘Ajudador da Morte’
que, por algum motivo, tinha apenas um ‘cotoco’ de uma
das pernas. Recorria-se à sua ajuda quando o moribundo
se encontrava em fase terminal, morria e retornava à vida
em seguidas vezes. Essa alternância de estágios era chamada
de ‘Termo’, que também punha limite a essas idas e vindas,
tendo o moribundo apenas três chances para fazê-lo.
Quando ultrapassava esse limite, o João Ajudador era chamado
e, apoiando seu ‘cotoco’ de perna no peito do cristão,
cumpria seu dever de ‘encaminhá-lo’. Para os moradores e
mesmo para o Ajudador de Morte essa era uma prática
normal. A Morte se tornou ato rotineiro.
Hermes de Paula (1957, p.25) também recolheu recortes semelhantes. Reputamos como o mais interessante a história
de Ritinha e Izabelona, duas ex-escravas que, juntamente,
comemoravam anualmente a abolição da escravatura.
Ritinha era a carpideira-mor, especialmente dos defuntos
mais abastados. Sempre a soluçar, em seu choro falava:
Essa boquinha? Nunca falou mal de ninguém, só tinha boca para
comer.
Essa mãozinha? Nunca ofendeu uma pulga.
Esses olhinhos? Nunca olhavam o que não era de sua conta.
E seu choro continuava para o importante defunto.
Apresenta-nos, também, Hermes de Paula (1957,
p.211), outro exemplo de convivência e lida com a morte,
cuja prática se torna imparcial e incólume aos sentimentos. É o caso do coveiro Leandro, do cemitério municipal
de Montes Claros, denominado de ‘Chacrinha do Leandro’
em decorrência de seu zelo com aquele campo santo.
Sempre atencioso, inclusive ao oferecer seus préstimos,
assim dizia:
“Já plantei aqui seu avô, (Eta véio bom!) sua avó (uma
santa!), seu pai (especial!) e, se Deus quiser, o Sr. pode
contar com a minha ajuda”.
Hermes de Paula (1957) ainda comenta que, dependendo
do prestígio do morto, o ritual se dava de maneira
mais solene. O féretro era transportado pelos amigos a
partir da igreja até o cemitério e, no caso de pessoas comuns,
o caixão era transportado em carro fúnebre. E, ainda,
como prestígio, o enterro era acompanhado por Banda
de Música. Essas práticas, hoje, seriam impossíveis, pois
até os velórios residenciais caíram em desuso, bem recentemente.
A vida mudou e a morte também!
Memorial da morte no norte de Minas
Em Montes Claros, como em milhares de cidades do
período colonial, a igreja servia de último leito, abrigando
o morto junto aos santos e seus olores, em busca da indulgência
e do paraíso.
Registros históricos do século XVIII dão conta de
que uma das preocupações do Alferes José Lopes de Carvalho
era assegurar para si, sua esposa e a seus familiares
um local privilegiado junto à Capela-Mor, tendo doado
extensa gleba como patrimônio de uma capela a ser
erigida na Fazenda dos Montes Claros. Desde o primeiro
documento dessa igreja principal mais antiga, consta que
essa ‘garantia’ foi obtida em 20/06/1769, um dia após
ter sido lavrado o Termo de Doação. Essa condição se
perpetuou nos templos que, sucessivamente, foram erigidos
no mesmo local.
Cemitério do Bonfim de Montes Claros - alegoria da Pranteadora.
A desolação. Pode-se perceber pela veste, um apelo à sensualidade,
caráter da arte funerária a partir da segunda metade do século XIX.
Por tradição, a construção do Altar-mor é uma incumbência
geracional da Família Lopes que abria, inclusive,
subscrições a outros colaboradores. Foi assim na velha
matriz do século XIX e na atual que aí está. No cristianismo,
desde o período medieval, buscar lugar junto aos altares
dos santos significava, além de prestígio, o aumento
da chance de ser apiedado por eles e de se tornar mais
leve no Juízo Final. Esta é a origem da construção de muitos
pequenos templos construídos nas cidades e em zonas
rurais mineiras e brasileiras.
A primitiva capela patrocinada pelo Alferes José
Lopes de Carvalho deu guarida aos sepultamentos tanto
em seu interior como em suas laterais. Havia até sepultamentos
no Largo da igreja, não se sabendo a razão da
escolha desse local, mas isso favorecia os citadinos. Ressaltamos
que os pequenos cemitérios particulares nas fazendas
também favoreciam os habitantes, pois nas zonas
mais distantes, pela dificuldade de transporte, esse costume
perdurou por mais de um século. Em Montes Claros, o
cemitério mais conhecido é o da Fazenda São Marcos, no
alto da Serra que outrora se chamou Serra da Bandeirinha,
na antiga estrada de Coração de Jesus (Inconfidência)
a Montes Claros (PAULA, 1957).
Na igreja dos Morrinhos, há o túmulo de D. Germana
Maria Olinda, e nas criptas da catedral repousam os
restos mortais de alguns dos nossos bispos. Era um espaço
hierarquizado, que acontecia desde as pequenas capelas
até os templos monumentais edificados. No norte de Minas,
há outros exemplos, dentre eles a igreja de Nossa Senhora
da Conceição em Matias Cardoso, que data do século
XVII, uma das duas igrejas mais antigas de Minas
Gerais, onde Januário Cardoso repousa no altar-mor. Em
Salinas temos outros exemplos, uma capela onde descansa
a lendária Adriana e, na Fazenda do Engenho, o túmulo
de um padre que construiu a capela. A cobiça por esses
espaços privilegiados pautava seus diferentes aspectos. Nas cidades coloniais mineiras o enterro era outra atribuição
das irmandades, também hierarquizadas.
No século XIX, já com o novo templo em Montes Claros,
os enterramentos aconteciam no interior da igreja, permanecendo
as campa. Não se sabe se por razões do Código
Sanitário de 1850, que condenava essa prática em razão
dos miasmas mefíticos, ou se pela falta de espaço, os
enterramentos aconteciam nas laterais, onde o campo santo
era estabelecido.
Cemitério do Bonfim, de Montes Claros - Alegoria do anjo da
Ressurreição. Uma das mãos aponta para o alto, a vida celestial,
enquanto a outra para baixo, a vida terrena. A iconografia da trombeta
em uma das mãos remete ao chamado para dia do Juízo Final.
Embora careça de pesquisa para a comprovação
se havia na Matriz uma diferenciação nos espaços santos
e/ou privilégios nos enterramentos, atrelada ao estado
social daquele que passava para o outro mundo,
pela documentação consultada - o livro dos óbitos - não
foi possível perceber qualquer distinção: a partir de janeiro
de 1832 senhores coronéis e um grande contingente
de escravos eram sepultados no âmbito da igreja,
sem registro se ocorria em seu interior ou no cemitério
lateral.
Em 21 julho de 1835, a comissão encarregada de escolher
o terreno para o novo cemitério da Vila de Formigas
opinou favoravelmente, estabelecendo que deveria “ser
marcado o lugar de saída dessa vila para o Ribeirão, defronte
aos esteios levantados para a igreja do Rosário, donde
o fabriqueiro ficou inteirado do lugar marcado” (VIANA,
1964; 2007). O Parecer foi aprovado, mas, conforme
Paula (1957), quatro anos foram necessários para a apresentação
da planta desse cemitério que descrevia, em 12
de agosto de 1839, “duzentos palmos em quadro, um portão
grande na sua entrada, um nicho no fundo e um cruzeiro,
devendo o muro ser fabricado de taipa, como melhor
invenção fosse e mais barato”. Muito pouco se sabe
sobre esse campo santo, seu desmembramento foi quase
total e não há registros fidedignos.
Em 1877, o engenheiro Alberto Schrimer apresentou
na Câmara Municipal o orçamento do novo cemitério
público da cidade de Montes Claros. O local seria a
continuação da rua Jatobá, atual Coronel Prates, nas
proximidades da Santa Casa, mas não chegou a ser
construído. Houve sugestão de mudança de local, sendo
a opção uma área menos povoada na rua Padre
Augusto, nas proximidades da Catedral. Ficou pronto
em 1882 sob a coordenação do Padre Antônio Augusto
Alkmin, que abriu uma subscrição, doando trezentos
mil réis. O gerenciamento desse campo santo instalouuma demanda entre as autoridades do município, eclesiásticas
e legislativas. Até o ano de 1896 a administração
foi leiga. Em razão da doação inicial do Padre Antônio
Augusto, a igreja reivindicou a administração,
tendo o apoio dos vereadores. Em 1906, a discussão foi
retomada pela Câmara Municipal, sendo a reivindicação
retirada pelo autor do projeto, vereador Honor Sarmento.
Após mais de cinquenta anos de utilização, o
cemitério tornou-se pequeno.
Em fins de 1934 construiu-se um cemitério junto
ao Alto Santa Terezinha, onde hoje funciona a Autonorte.
O primeiro cadáver nele sepultado foi o de Francisco
Luiz de Carvalho (Chico Dominguinho), tio-avô
do autor deste texto. Foi muito pouco utilizado e logo
abandonado. Nessa mesma época, por iniciativa de
Francisco José Guimarães, foi deflagrada uma campanha
sob os auspícios da União Operária para a construção
de novo cemitério nas proximidades do Morrinhos,
também conhecido por Cecé. Foi inaugurado em
13 de julho de 1935, sendo o primeiro sepultamento o
da indigente Antônia Paulina de Jesus. É este o atual
cemitério de Montes Claros. Recentemente (há três décadas)
foi construído um novo espaço em área contígua
ao Cemitério Municipal.
Outros cemitérios surgiram, como o da Malhada de
Santos Reis e o Cemitério dos Paus Pretos, que ficava ao
lado do viaduto da BR-135. Embora em ruínas, este último
poderia ser visto até os anos de 1990.
Hermes de Paula (1957) comenta com muita propriedade
que, em 1951, o Bispo Diocesano requereu à Câmara
Municipal a revogação de uma das cláusulas do Código
de Posturas Municipais, permitindo a venda em lotes
do velho cemitério. A Câmara, em respeito à opinião pública
e pelo grande apelo sentimental, recusou-se à tal desconsideração
para com a população montes-clarense. Fazendo
uso de seu poder, o prefeito da época efetivou a concessão. Foi um momento de discórdia, polêmicas e insatisfações.
A Câmara reuniu-se novamente apenas com
os vereadores favoráveis à Mitra, fechando os olhos a qualquer
argumento e deu ganho de causa à Igreja, apesar do
descontentamento geral, o que também não constitui novidade
se nos transpusermos para os dias atuais. Assim,
analisando os velhos alfarrábios montes-clarenses, constatamos
que essa prática de alienação do patrimônio da
Igreja foi um recurso sempre utilizado, desde o início de
nossa paróquia em 1840.
Remonta ao período do Cônego Chaves uma requisição
pelo vereador e também vigário da freguesia, que
propôs, por intermédio do Governo, fosse pedida a autorização
à assembleia para que se vendesse o patrimônio
da igreja. Com o apurado na venda, seriam angariados
meios para o início das obras da matriz, já que essa possuía
‘uma légua de boas terras que estavam sendo desfrutadas
sem nenhum benefício para a matriz’:
A proposta foi aprovada, porém com a seguinte cláusula condicionante,
apresentado pelo Revmo. Padre Felipe Pereira de Carvalho,
Presidente da Câmara: Reservando-se para pastos e aguadas os
lugares mais vizinhos à vila, que, avaliados separadamente dos demais,
passarão a ser propriedade municipal, pago o seu preço pelas rendas municipais
(VIANA, 2007).
No cemitério municipal, como em qualquer outro, é
possível fazer uma correlação entre a cidade dos vivos e a
cidade dos mortos. Alguns valores ainda prevalecem e o
espaço se organiza e se edifica reafirmando os mesmos
valores, o mesmo apego material, como forma de perpetuar
a leitura do que se fez em vida de alguns cemitérios,
principalmente o do Bonfim, para o qual não havia uma
norma estética a ser seguida. O mais novo, em área contígua,
possui uma proposta diferente - Cemitério-parque,
em que familiares do falecido devem respeitar os critérios
estéticos e os padrões estabelecidos. Se conseguiram inibir
a construção dos mausoléus, não conseguiram impor uma diferenciação inerente ao ser humano em representar-se
pois, olhando com cuidado, há formas de se distinguir
mantendo o gabarito estipulado, seja em placas de diversos
materiais, seja na ornamentação, por meio de diferentes
recursos botânicos e decorativos. É da natureza humana
manter essa digna diferenciação, mesmo que seja no
campo santo, onde se preconiza que somos todos iguais
perante a morte.
É justamente essa distinção em vida que se observa
em cemitérios mais antigos: os mais ricos constroem mausoléus
mais arrojados, onde caberão mais membros da família,
fotos apostas aos túmulos, invocações religiosas as
mais diversas, perpetuação por meio de trechos de poemas
e diversos dizeres qualificativos nos epitáfios, simulacros
de assinaturas e mesmo a representação da profissão,
imagem que se eterniza.
No cemitério de Montes Claros, apesar de ser construído
no século XX, a grande maioria dos jazigos segue
um padrão já proposto pelas marmorarias, ou seja, a predominância
de carneiras, podendo ser utilizado granito
preto e de diferentes tonalidades, com arremates, floreiras,
cruzes e santos em bronze, que vão variar com a invocação
e o custo. Há, no entanto, túmulos que podem remeter
a um período anterior (fins do XIX), onde imperava
um gosto tendendo ao neoclássico, situação que pode levar
a crer serem eles procedentes do antigo cemitério da
Rua Padre Augusto. Pode-se dizer, então, que a leitura
dessa ‘cidade dos mortos’, de seus diferentes modelos de
mausoléus e carneiras, representa a cidade e situações de
vidas passadas.
As crendices populares também incentivam o culto
aos mortos e cemitérios, haja vista nossos ‘santos’ milagreiros.
Irmã Beata, por exemplo, sempre reverenciada
e solicitada a interceder por milagres. E os mistérios?
Nos anos de 1960 surgiu, em Montes Claros, um
boato de que havia um túmulo que ‘chorava’. Enfim, o campo santo é um espaço de comemoração e até de júbilo
para nós, montes-clarenses. O poeta João Chaves,
com sua célebre música ‘O Bardo’, prometeu ao amigo
Reis que cantaria em seu túmulo quando de seu sepultamento
e assim o fez. O fato foi revivido pelo grupo de
serestas João Chaves, sendo, inclusive, matéria apresentada
na rede Globo no programa Fantástico por ocasião
do sétimo dia de morte do poeta. Podemos, também,
nos remeter a 1941 quando, em uma cerimônia do
Instituto Dom Bosco, após servido o ‘copo d’água, proferida
a palestra do bispo e executada uma audição
musical de Godofredo Guedes, os convidados foram até
o cemitério cantar em homenagem ao Cel. Luiz Antônio
Pires, amigo do Instituto.
Em seu livro Efemérides Montes-clarenses Nelson
Viana (1964; 2007) descreve um trecho da crônica de
Levy de Queiroga Lafetá por ocasião do traslado das
urnas contendo os restos mortais de Camilo Prates e de
sua esposa:
Quarta feira havia uma festa no Cemitério Velho, cedo ainda Matias
- pró Hermes, lançava a grande nova. Seu Camilo e D. Amélia
chegavam. Saíram de manhã de Belo Horizonte (...)
E arremata:
Vem com a companheira de cinquenta anos ao encontro dos amigos
que aqui deixou. E, como quis, troca a modorra daquele sofisticado
Cemitério do Bonfim por um sono definitivo nesta terra
vermelha que tanto amou.
As imagens funerárias, ao refletirem sobre a morte,
trazem à baila centenas de discussões acerca da vida: ‘o
que seria o fim de tudo?’ ‘O ser humano e o mundo, como
um todo, pode ser aniquilado? Caso afirmativo, como?‘Existe continuidade da vida após a morte?’
Conclusão
Finalizando, pode-se afirmar que entrar em contato
com os artefatos e construções tumulares constitui outra maneira de nos depararmos com a estrutura do pensamento
e das ações das pessoas em torno do social.
As imagens do mundo da morte podem revelar o
mundo dos viventes, o que reputamos interessantíssimo
em termos de resgate de memórias, pessoas, culturas, vida.
REFERÊNCIAS
ARIÈS, Philipe. O homem diante da morte. Tradução: Luiza Ribeiro.
Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1989 (2 Volumes).
BORGES, Maria Elizia. A arte tumular na região de Ribeirão Preto. In:
Arte funerária no Brasil (1890-1930): ofício de marmoristas italianos
em Ribeirão Preto. Belo Horizonte: C/Arte, 2002.
CANELLA, Guido. Mors Construens. Milano: Hinterland, 1984.
FUKUI, Lia Garcia. O Culto aos Mortos entre Sitiantes Tradicionais
do Sertão de Itapecerica. In: MARTINS, José de Souza (Org.). A Morte
e os Mortos na Sociedade Brasileira. São Paulo: Hucitec, 1983.
PAULA, Hermes Augusto de. Montes Claros, sua história, sua gente e
seus costumes. Belo Horizonte: IBGE, 1957.
PAULA, Maria Aparecida de. Assim era Jasminópolis. Belo
Horizonte, Edição Independente e Artesanal, Setembro de 2008.
SCHNEIDER, S. D.; LAMB, R. E. Cemitério Municipal São José:
Símbolos e Imagens Funerárias. História, Imagem e Narrativas, n.8,
p.1-26, abril 2009.
VIANA, Nelson. Efemérides Montes-clarenses 1707-1962. Rio de
Janeiro: Pongetti, 1964.
VIANA, Nelson. Efemérides Montes-clarenses. Montes Claros:
Editora Unimontes, 2007 (Coleção Sesquicentenário).
GIANNI BARBAGLIA, ARTE DA ITÁLIA
EM MONTES CLAROS
Felicidade Patrocínio
Cadeira nº 20
Patrono: Camilo Prates
Proveniente de Invório, província de Novara, Itália,
esteve no Brasil muitas vezes e, precisamente em Montes
Claros, na primeira década deste milênio, de maneira silenciosa
e anônima, o escultor sacro GIANNI BARBAGLIA.
Necessário se faz estender a todos da “Cidade da Arte e
da Cultura” o privilégio desta presença, já que, além de
ser uma pessoa muito especial, este escultor deixou aqui
marcas expressivas do seu trabalho.
GIANNI BARBAGLIA foi integrante do Grupo de
Empenho Missionário Italiano (GRIM), uma ONG internacional
que, entre outras atribuições, percorre o mundo
construindo obras que possibilitem a correção de distorções
sociais e capacitem a dignificação das condições humanas.
O escultor GIANNI, que já fizera mais de 40 viagens
pelo mundo a serviço do GRIM, visitou Montes Claros em
torno de 10 vezes, trabalhando em obras religiosas. Eu o
conheci quando emprestava o seu esforço operário e talento
artístico às obras das irmãs da Ordem da Sagrada
Família. Sua humildade e religiosidade dinâmicas não escolhiam
trabalho. Executava o que fosse necessário à concretização
de mais um espaço de espiritualidade. Quando
o vi pela primeira vez, lá no Centro da Criança e do Adolescente
Paula Elizabete (Km 6 da estrada da produção),
ele executava portas, janelas e telhados de um grande bloco
arquitetônico que abriga hoje um eficiente centro de formação, espiritualização
e capacitação
profissional
para crianças,
jovens e famílias
carentes da periferia
da cidade. O
complexo arquitetônicoé composto
de várias unidades
construídas,
na maior parte,
por mãos e dinheiro
dos italianos.
Funciona no mesmo
local o Convento
das Irmãs
da Ordem da Sagrada
Família.
Nas obras artísticas
feitas para a
capela e para o
hall de entrada deste convento já se pode conhecer um
pouco da magnitude da arte de GIANNI. Percebe-se aí
que a beleza artística é mesmo uma manifestação superior
da natureza humana.
Lá estão esculturas em bronze, resina e terracota,
entalhes em madeira, cuja contemplação leva-nos a uma
comunhão intuitiva com o autor, propiciando a experiência
interior da visualização do BELO.
O magnífico trabalho de escultura deste artista se
estendeu a outros espaços religiosos desta cidade ensolarada.
A igreja da Rosa Mística foi premiada com uma bela
e comovente obra do Cristo Crucificado. Trata-se de uma
escultura feita em madeira clara, o tílio, cujo entalhe, sempre
igual e preciso, sugere pequenas marteladas, e o rosto, apesar de suave, denuncia o extremo sofrimento daquele
sacrifício. Diante desta imagem, o então arcebispo
de Montes Claros, Dom Geraldo Majela de Castro, fez reverências,
tocando-o com um significativo beijo.
Sensibilizada pela beleza e expressividade desta arte,
busquei conhecê-la e ao seu criador de maneira mais completa.
Vi, então, de maneira clara, na percepção geradora
desta obra, uma profunda ligação com os elementos aculturados
do seu meio - a Itália - grande centro religioso e
eterna sede da igreja católica. Pelas fotos da arte do artista
distribuídas pela Europa, Ásia, África e América, vi permear
uma temática intencionalmente aplicada a motivos
sacros e sociais, enfatizando a caridade, a devoção, a solidariedade,
a divisão do pão.
Quanto ao estilo deste autor, poderia eu dizer, de
maneira ainda incompleta, que a arte sacra de GIANNI
BARBAGLIA nasce do princípio acadêmico e, no seu desenvolvimento,
mescla leves toques de barroco e expressionismo
modernos. O resultado desta escolha engrandece
a totalidade da sua figuração. O fato é que, apesar da sua
formação ter sido acadêmica, o trabalho artístico de GIANNI
não se prende a normas rígidas, mas utiliza o princípio
da liberdade que a arte oferece e prioriza a capacidade
criadora e inventiva. Na totalidade do acervo construído
ao longo da vida, nota-se uma frequência maior às
temáticas voltadas para o sacro, mas o artista executava
qualquer ideia do mundo humano.
Como matéria prima sempre preferiu a madeira - o “legno” como dizia - mas trabalhava muito bem a resina,
a terracota e o bronze. A diversidade dos materiais que
valorizava pressupõe, por certo, que a arte não é algo que
se reduz à sua pura materialidade, mas sim, que se vale
desta para ir além. E isto o GIANNI fez muito bem. Em
todas as suas obras conferiu à matéria bruta a espiritualidade
que ela, por si só, não possui.
Cheia de admiração tornei-me sua parceira em di versas obras sacras espalhadas
pela cidade. Na
capela do Seminário Diocesano,
enquanto eu trabalhei
toda a cerâmica
que reveste a capela do
Santíssimo, inclusive a faixa
em baixo relevo figurando
cachos de trigo e
uvas numa extensão de
dezoito metros de comprimento
por 20 centímetros
de largura, o GIANNI
fez a larga porta entalhada
capela geral. Num
baixo relevo em madeira
com mais de 2 metros de
altura ele talhou de maneira
magnífica a figuração
da Anunciação de
Nossa Senhora.
Sagrada Família – Baixo relevo em
madeira, no hall de entrada do Convento
das irmãs da Ordem da Sagrada Família,
em Montes Claros
Ao alto do centro da
nave principal, projeto arquitetônico moderno do arquiteto
Gilner Rocha, vê-se um gigantesco Cristo Ressuscitado
de GIANNI, como também, no corredor largo de entrada
da mesma capela, os quadros da Via Crucis, para
mim a mais bela obra do GIANNI feita para esta cidade. É
de fato excepcional, de beleza ímpar.
A minha parceria na arte com o GIANNI se estendeu às edificações do Centro da Criança e do Adolescente
Paula Elizabete. Nos jardins de entrada do convento, vêse,
de minha autoria, uma Sagrada Família feita de concreto
com um metro de altura. Já no jardim do edifício
central, vê-se outra Sagrada Família em bronze em tamanho
natural, numa concepção magnífica do artista
italiano. Na igreja maior do complexo trabalhei todos os vidros e uma pequena versão escultórica de Santa Paula
Elizabete, afixada no altar. O GIANNI, por sua vez, lá
deixou o seu belo entalhe nas portas de entrada e ao fundo,
por detrás da igreja, num belo jardim, a representação
da via crucis dolorosa, em grandes painéis com baixos relevos
executados em resina na coloração terracota. Em
outro espaço de convívio, onde são recebidas diariamente
em torno de 400 crianças e jovens para extensão de sua
formação, está o busto do padre italiano Dom Serafino, o
presidente da ONG GRIM, na Itália, executado por GIANNI,
cuja perfeição
causa admiração.
Cristo ressuscitado, em madeira tílio, 3 metros
de altura, no alto da Capela do Seminário
Diocesano de Montes Claros.
Surpreendida
fiquei com o fato de
um talentoso e produtivo
escultor internacional
interromper o seu
fazer artístico e se entregar
por alguns meses
de cada ano a um
labor humilde e gratuito
nas construções
em centros de formação
em países distantes,
arcando com suas
próprias despesas e,
por acréscimo, doando
o seu dinheiro. Minha
admiração crescia.
Pesquisei, então, a
sua história e descobri
que o GIANNI BARBAGLIA,
nascido em
1932, em Invório, Itália,
dos 14 aos 22 anos foi
ajudante do escultor e professor de desenho Luigi Fornara. Aos 22 anos, foi para
Gênova fazer o serviço militar e lá frequentou o Liceu de
Artes da Academia Militar. Neste período, fez esculturas
de várias temáticas. Casou-se, teve 4 filhos e passou a dedicar-se à fabricação de móveis de madeira, atendendo a
uma tendência regional, já que residia a 50 Km de Milão,
o polo mundial do design moveleiro. Exportava para outros
centros da Itália, para a Suíça, Holanda e França. Aos
50 anos, era um empresário bem sucedido. Silenciou por
30 anos o seu trabalho de escultura, embora preservasse
em sua indústria o contato com a madeira. Logo após completar
50 anos, já a trabalho do GRIM, GIANNI visitou
vários países da África. Ficou traumatizado com a miséria,
com a situação degradante e desumana que presenciou
naquele continente. Derramou muitas lágrimas diante
das realidades que ali descobria. Retornando à Itália,
mudou radicalmente a sua vida. Fechou a indústria e se
entregou ao trabalho voluntário do Grupo de Empenho
Missionário ao redor do mundo. Sentiu um desejo imenso
de voltar a fazer esculturas e, desde então, foi este o seuúnico oficio.
Da fertilidade e espiritualidade do seu sentir, passando
pela habilidade de suas mãos, começaram a surgir
madonas, santos, anjos e cristos de belezas ímpares.
Sua obra responde às necessidades de variados espaços.
Constitui-se de peças pequenas para oratórios, peças
monumentais (cristos de até 5 metros) para praças,
esculturas para interiores de igrejas, peças para galerias,
museus, portas imensas de catedrais, entalhadas etc.
Talhando a madeira, fundindo o bronze e a resina,
GIANNI espalhou sua arte pelo mundo. Suas peças valorizam
espaços públicos e religiosos em diferentes regiões
da Itália, como: Invório, Mercurago, Briga, Vascovados,
Torella dei Lombardi, Sizzano Miassino, Palazzolo, Boner,
Talonno, Borgomanero, Gandino, Suno, Talorino,
Palmoli Desio, Meda Veruno, Ornacasio, Verbania, Mon te Mesma, Gozzano, Gênova, Dormeleto, Arona, S. Andra,
Boladello e Roma.
Está presente também em outro paises como a República
Centro Africana, Olten(Suíça), Latacumga e Las
Pampas (Equador), Sirata, Kênia, Novosibirski( Sibéria),
Albânia, Gore Crad, Gatare Ruanda, Mitwango, Tanzânia,
Kaparu, Zâmbia, Tenerif, Ilhas Canárias, Capanema,
Boa Vista, Roraima, São Paulo, Paraná (Brasil).
Montes Claros esteve na sua rota produtiva de maneira
muito afetiva.
O GIANNI faleceu em 2005, na Itália, aos 75 anos
de idade. Morreu quase de pé, como queria. Poucas semanas
antes ainda estava na África produzindo. No entanto,
não se pode considerar como morto o artista que criou
uma grande arte. Sua presença nela permanece.
Montes Claros, tem muito que mostrar desse acervo
valioso, tem muito a agradecer pela presença deste
italiano.
O AMOR e a BELEZA que habitaram o coração de
GIANNI BARBARGLIA aqui escorreram pelas suas mãos
e espiritualizaram espaços. Sem medo de errar posso dizer
que o volume de arte sacra, em mais expressivo da
cidade de Montes Claros, existente na atualidade, nasceram
das mãos abençoadas desse artista italiano.
A PARTIDA DE “SEU” GODOFREDO
Haroldo Lívio
Cadeira nº 82
Patrono: Nelson Viana
Noel Rosa, o filósofo
do samba, entre
dois copos de chope,
disse que a saudade
não tem cor. Isso nos
faz lembrar que o baiano-montes-clarense
Godofredo Guedes, o
artista que descobriu a
cor da saudade, está
partindo para Belo Horizonte,
pois sentiu a
necessidade de galgar
as alturas, voar em
céus mais amplos,
onde a linha do horizonte
não seja tão próxima
como em Montes
Claros. Durante vinte e sete anos, GG viveu, pintou, entalhou,
solou e compôs aqui na terra. A sua partida, portanto,
representa uma perda para a cidade, pois o seu talento
versátil já havia sido incorporado ao patrimônio cultural
do lugar. Já era considerado bem público de uso comum
do povo, tal como a Praça da Matriz ou a capela dos Morrinhos,
que cantara e decantara em suas telas famosas. Realmente, o vazio da ausência de GG só encontraria fato análogo no desmonte dos Morrinhos.
O pintor privilegiado, que soube interpretar a alma
das ruas, das casas coloniais e das igrejas centenárias de
Montes Claros do passado, em busca de novo clima, trocou
o ambiente provinciano de nossa comunidade pelo
brilho e pelo fausto espiritual que encontrará, por perto,
na Capital da formosa província de Minas. Lá, nas galerias
de arte, onde pontificam os grandes mestres da pintura
mineira, GG finalmente encontrará o seu habitat, o
lugar que sempre mereceu, para cultivar a vocação. O
baiano de Riacho de Santana desde criança sentiu o chamado
da Arte universal. Meninote ainda, meteu-se no
mundo das tintas e das notas musicais. Aprendeu a manejar
o pincel sozinho, sem auxílio de terceiro. Ainda de
calça curtas, fez a decoração da sacristia da gruta de Bom
Jesus da Lapa. Chegando a necessidade de ganhar o pão
de cada dia, GG aprendeu prática de farmácia, com um
seu parente, médico baiano formado em Paris. Como os
livros de Química fossem todos escritos em francês, GG
não teve outro caminho senão que aprender, sem mestre,
o idioma de Balzac.
Sentindo-se solitário na Pintura, aprendeu a tocar e
dominou três instrumentos musicais: violão, saxofone e
clarineta. Já construiu, em seu atelier, dois instrumentos
de grande porte: uma marimba e um piano. Parece brincadeira,
mas o homem não sabe tocar piano. Construiu os
instrumentos na esperança de ter um pianista em casa.
Os garotos, no entanto, o decepcionaram. Gostam mesmo é do violão.
Não negam, assim procedendo, sua origem da Boa
Terra.
Na célebre época da construção da Central rumo a
Monte Azul, GG dedicou-se à música das dez da noite às
cinco da manhã. Tocava tanto no fidalgo Clube Montes Claros
como nos cabarés afamados da zona boêmia, dos quais o
romancista carioca Marques Rebello disse que ferviam como os night-clubs da Broadway.
Mesmo fugindo de nós, Godofredo Guedes já estava
fixado na História local, por ter esbanjado aqui vinte e
sete anos de inteligência, beleza e emoções.
Seus quadros a óleo ornamentaram muitos lares da
cidade, suas estatuetas estão por toda parte, aqui, ali,
alhures no Brasil. Sua valsa Saudade da Bahia percorreu
o País, como se fosse de autor desconhecido, muito antes
do samba homônimo de Dorival Caymmi. Dificilmente
se poderá falar de Montes Claros sem mencionar o nome
de GG. É uma verdadeira associação de ideias: um homem
que se doou a uma cidade; a cidade que admira seu
valor de artista.
Agora, Godofredo partiu e nos deixou. Deixou a
poeira e o sol abrasador do sertão; foi viver no asfalto.
Quem se candidata a pintar as ruas de Montes Claros?
(O Jornal de Montes Claros, 26/03/63)
SERRANO DE PILÃO ARCADO: ESSE
SEGREDO CHAMADO GERAIS
Ivana Ferrante Rebello
Cadeira nº 56
Patrono: João Luiz Machado Lafetá
Na madrugada do dia 14 de novembro de 1929,
Antônio Dó foi assassinado. Com ele se perderia uma história
essencial ao povo do sertão; história acontecida na
contramão dos fatos oficiais e cujos segredos, aparentemente,
seriam por muitos anos resguardados pelo mugido
das vacas no curral, pelo sussurro do vento nos leques
dos buritizais e pela voz do matuto contador de “causos”.
Em 2009, chegou-me às mãos um exemplar do Serrano
de Pilão Arcado, de Petrônio Braz – não consegui desvencilhar-me da leitura. Página por página eu via ali realizado
um projeto literário grandioso, nascido do fôlego de
pesquisador de seu autor e da inspiração que este herdara
do pai, de suas muitas leituras (as dos livros e as do mundo)
e daquelas ditadas pelo profundo amor a sua gente.
Sempre que me disponho a falar de Literatura, retomo
uma questão cada vez mais premente, nesses tempos
de palavras tão escassas quanto inférteis e de muitos prenúncios
da morte da arte da escrita, como se nossa época
não suportasse mais o verbo trabalhado e uma letra manejada
por mão de mestre.
O que faz, afinal, uma obra literária? Entre os motivos,
inúmeros, que poderia elencar, reporto ao poder de
transformação e de resistência que toda Literatura, a rigor,
deveria ter. Transformação porque o signo literário
revolta-se contra o óbvio e o repetido. De uma forma ou
outra, seja por meio da revolução da língua ou pela forma com que o escritor cria imagens ou símbolos, ou ainda por
conseguir dar nome e forma a uma dada experiência, o escritor
transforma a linguagem conhecida, imprimindo nela
sua dicção e sua inspiração pessoal. E resistência, porque
as obras da Literatura não se prendem a modelos ou modas,
elas carregam uma dimensão transversal, atemporal,
que atravessa os anos e nos permite lê-las com os olhos de
hoje, independente de sua marcação cronológica.
E sendo eu uma leitora de Literatura devo reconhecer
que poucas coisas comparam-se ao prazer de ler um
romance contemporâneo, narrado à maneira clássica,
exemplar, capaz de capturar o leitor do início ao fim da
narrativa, pela razão primeira de encenar uma história
bem contada, no sentido mais abrangente do termo, entre
outras razões, que pretendo aqui, sucintamente, apontar.
O romance em questão é este Serrano de Pilão Arcado. A
saga de Antônio Dó, escrito pelo mineiro de São Francisco,
Petrônio Braz.
Trata-se de um livro que, sob todos os aspectos, reconheço
como obra literária e, além disso, trata-se de um
livro escrito por Petrônio Braz, a quem admiro como profissional,
cidadão e “homem humano” – naquela dimensão
maior a que se refere o incomparável personagem Riobaldo,
do romance Grande sertão: veredas.
O livro une a investigação histórica, a análise do advogado
e a capacidade de fabulação, portanto são sob três
vozes distintas que Petrônio Braz narra seu romance. Inspirado,
talvez, por Euclides da Cunha, que, ao narrar a
batalha de Canudos, em seu fabuloso Os sertões, dividiu o
livro em três tomos, para representar três aspectos distintos
daquela página crucial da história do sertão brasileiro, Petrônio
Braz divide, também, a sua narrativa em três fases: “As origens”; “Os Antecedentes” e “O Revide”.
Há, na estratégia de escrita, uma intenção programática:
representar as fases distintas da vida de Antônio Dó.
Trata-se de fases perfeitamente interligadas, mas cada qual mantendo uma unidade em si; são separadas, mas apontam
para uma progressão necessária: unir as pontas da vida,
como diria o personagem Bentinho do memorável romance
Dom Casmurro; para além da história conhecida e oficializada,
desvendar os esconsos do homem, descobrir nele
os vestígios do menino, perscrutar os mistérios que rondam
todos os fatos. Desde o início do livro, o leitor se vê motivado
pela mesma inquietação que inspirou Petrônio Braz a
escrever o livro: quem foi, afinal, esse António Dó?
Sem cair na tentação de idealizar, Petrônio avança
na construção do personagem, dando-lhe constituição
humana. Antônio Dó, perseguido pela polícia e protegido
pelos fazendeiros locais, que lhe davam acolhida e guarda,
transformar-se-á, com o tempo, na figura mais lendária
dos Gerais. O jagunço feroz, que a historiografia oficial
e os fatos de jornal retratavam, é remontado, no romance,
com seus defeitos e virtudes, seus impulsos de vingança
e seu senso de justiça, suas fraquezas de homem e
seus ideais de sertanejo. Petrônio Braz não cria um herói,
no sentido clássico do termo, mas desmitifica o bandido.
Das páginas de seu romance, emerge um homem premido
pelas circunstâncias, corajoso o suficiente para ir contra
tudo e todos; sendo um fora-da-lei, tinha um código
de condutas marcado por um curioso senso de ética e respeito
aos oprimidos; há nele uma inquietante fúria e uma
enternecedora falibilidade.
Mas, para além da história do homem, conta-se a história
de um sertão vasto, que emerge desde a Bahia, em Pilão
Arcado, até a cidade de São Francisco, princesa barranqueira
do norte de Minas Gerais e sobe até a Serra das Araras.
Serrano de Pilão Arcado trata, sobretudo, do sertão
dos Gerais, que foi, por muitos anos, relegado ao atraso
social e ao esquecimento político. Recriado literariamente
na ficção de Petrônio Braz, encontra acento na história
literária de uma terra e de uma gente. Por traz do drama
vivenciado pelo jagunço Antônio Dó, a obra coloca em cena uma identidade mineira fragmentada, diferente, e
mais difusa que a unidade mineira forjada, em que se privilegiava
o consenso e se excluíam todos os conflitos. O
mundo dos jagunços, com seu novo código de condutas,
explicita as facetas da marginalidade, da exclusão e da
rebeldia, que a história oficial não conta.
Nas descrições da paisagem, descobre-se uma incontestável
declaração de amor do autor pela natureza do
sertão:
As terras da vazante, naquele ponto, como uma obra prima da
natureza, formavam um paraíso ainda não maculado pelas mãos
do homem, o mais pernicioso agente geológico. Somente o gado,
em pastoreio livre, por ali passava (...). O arrulho de uma juriti, o
voo rasteiro e curto de uma garça, provocado pela presença intrusa
do cavaleiro, contemplavam a beleza natural da vazante virgem.
(BRAZ, 2011:234)
“O senhor tolere, isto é o sertão”. A fala do jagunço
Riobaldo, no trecho introdutório de Grande sertão: veredas,
serve de epígrafe à obra de Petrônio Braz. Em seu
romance, lê-se um sertão que é tudo, metáfora da onipresença
e da ambiguidade, visto que nele tudo cabe e tudo
falta, ao mesmo tempo. Essa forma de conceber o sertão
resulta de uma percepção da condição humana e da sua
fragilidade, que faz do jagunço Antônio Dó um homem
da modernidade. Para ler esse autor, inspirado, como não
poderia deixar de ser, nas lições de Guimarães Rosa, é preciso
tomar como ponto de partida a compreensão do sertão
não como um recorte geográfico ou um lugar de fronteira
demarcada, mas como um espaço imaginário, onde
cada homem projeta a sua individualidade. O sertão de
Rosa, que se afirma como “o sertão dentro de mim”, encontra
respaldo no sertão recriado por Braz, que, entre
outras coisas, dedica o seu livro aos
pássaros, que voam livres pelos céus do vale do rio São Francisco;
aos poucos animais silvestres, que ainda perambulam livres e soberanos
pelas suas vazantes e pelos cerrados; aos peixes sobreviventes
que povoam suas águas; às árvores, que até agora sobrevivem à devastação do homem; às veredas do Grande Sertão, que ainda correm límpidas com suas linfas cristalinas, desafiando os
desordenados desmatamentos de suas cabeceiras e de suas margens;às chuvas que, às vezes, regam o sertão e, numa busca pelos
escaninhos da existência invisível das lendas regionais, à Iara, ao
Caboclo-d’água, ao Famaliá, à Mula-sem-cabeça, ao Romãozinho,
ao Lobisomem e ao Caipora. (BRAZ, 2011:7).
Esse sertão é uma composição entre a criação poética
e a pesquisa histórica, representando ainda uma dilação
espacial que se estende da ribeira do São Francisco
aos trâmites políticos e sociais de Minas Gerais do final do
século XIX. Nesse livro, leem-se os Gerais como o território
de uma tensão permanente, produto de uma luta entre o
pessoal e o coletivo, entre o progresso que chega e a sobrevivência
dos ritos, crenças e sabedorias antigos.
Ao encerrar o seu livro, Petrônio Braz recorre ao fecho
requisitado por José de Alencar para dar termo à fábula
de formação do Ceará, Iracema – “E tudo passa sobre
a terra.” Discordo, meu caro amigo Petrônio, como
Machado de Assis discordou de Alencar, ao fazer sua crítica à obra Iracema. Discordo, porque passam os anos,
passam os governos e passam as modas, mas permanecem
os grandes homens e os grandes livros.
Eis como compreendo esse Serrano de Pilão Arcado.
A saga de Antônio Dó.
ELOGIO A NEWTON PRATES,
PATRONO DA CADEIRA Nº 84
Itamaury Teles de Oliveira
Cadeira nº 84
Patrono: Newton Prates
Filho de Antônio
Prates Sobrinho (Major
Prates) e de Januária Olegária
Lafetá Prates, o jornalista
Januário Newton
Prates nasceu em Coração
de Jesus (então distrito
de Montes Claros-MG), no dia 31 de março
de 1905. O primeiro prenome,
Januário, homenageia
sua mãe e o avô
materno, Januário Lafetá,
o famoso conde.
A infância e os primeiros
anos da juventude
passou em Montes
Claros. Nesta cidade, sua
vocação aflorou-se, quando ainda era aluno do Grupo
Escolar Gonçalves Chaves. Nessa época, Newton Prates –
como era conhecido – já fazia jornais manuscritos, com
destaque para “O hóspede” e “Vênus”, com a ajuda de
Cyro dos Anjos, o grande amigo de toda a vida. Ambos
cursaram o Grupo Escolar Gonçalves Chaves, alunos da
professora Eponina Pimenta, que era pouco mais velha
do que seus alunos, com apenas 12 anos de idade.
Após sair do “Gonçalves Chaves”, Newton Prates
foi para a Escola Normal e, ali, continuou a fazer jornais
manuscritos.
Em 1922, transferiu-se para Belo Horizonte, onde
concluiu os estudos secundários e dedicou-se à vida de
imprensa.
O jornalismo sempre foi a maior paixão da vida de
Newton Prates, tendo ajudado a fundar importantes jornais
em Belo Horizonte. Em 1928, aos 23 anos de idade,
quando da fundação do “Estado de Minas”, foi contratado
para o cargo de “repórter de setor”, incumbido de notícias
policiais. Em 1930, numa meteórica carreira, já era
Redator Chefe do jornal e em 1932, ano da fundação do “Diário da Tarde”, o primeiro vespertino da imprensa
mineira, Assis Chateaubriand, seu ardoroso admirador, o
nomeou Diretor do recém-nascido jornal.
Ainda em Belo Horizonte, ocupou posições de relevo
no “Diário do Comércio”, na “Folha Acadêmica”, no “Diário de Minas”e no “Minas Gerais”. Cronista primoroso,
escreveu para a revista “Alterosa”, e foi diretor das
revistas “Cidade Verde”e “Novidades”.
Foi um dos fundadores da Rádio Inconfidência, na qual
exerceu as funções de subdiretor geral e de redator-chefe e
dos jornais falados.
Fundou e foi o primeiro presidente do Sindicato dos
Jornalistas de Minas Gerais.
Foi membro do Instituto Histórico de Ouro Preto e
fez parte da direção da Associação dos Escritores de Minas
Gerais, e da União dos Trabalhadores do Livro e do
Jornal.
Na capital mineira, casou-se com a educadora Isa
de Mattos Prates com quem teve três filhos: Felippe, Maria
Luiza e Newton Filho, este já falecido.
Em 1946, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde
teve atuação destacada em jornais, revistas e emissoras
da então capital do país. Ali, foi Redator-Chefe da “Folha Carioca”e Redator Político de “A Noite”.
Além disso, durante muito tempo, assinou crônica
diária “A tarde é nossa”, na Rádio Nacional do Rio de
Janeiro.
Publicou livro de histórias para crianças intitulado “João Manoel, o braço da lei”.
Inéditos, deixou livros de crônicas e o de memórias: “Histórias de um menino”.
Nas décadas de 50 e 60, colaborou intensamente com
crônicas na Revista “Montes Claros em Foco”. Mesmo
ausente de Montes Claros, acompanhava com entusiasmo
os acontecimentos na cidade e bem conhecia a nossa
história e nossas tradições.
A propósito dessa sua característica peculiar, destacamos,
a seguir, carta que dirigira ao escritor Cyro dos
Anjos, em agosto de 1924, quando residia em Belo Horizonte:
‘‘‘‘CARTA A UM AMIGO
Alarmou todo o Estado de Minas o reboliço que agitou
o sertão por ocasião dos preparativos das grandes festas
em honra ao Ministro Francisco Sá. As informações
acerca das homenagens em perspectiva, e, sobretudo, as
que se referiam a um celebrado banquete de cem talheres
aqui chegavam tão ampliadas e inverossímeis que a gente
tinha a impressão de que Montes Claros era um vasto
manicômio...
Emissários cruzavam estradas em busca de tapetes,
quadros célebres, objetos de arte, coisas maravilhosas, e,
tão grande era o afã de cada um em superar o outro em
aquisição mais valiosa e rara, que nos vinha à memória a
história do Achmét de Mil e Uma Noites, com que a Anninha
Cabellos à roda divertia a nossa infância longínqua...
Afinal, o brilhantismo das festas justificou plenamente
o arrojo dos preparativos. A régia homenagem que Montes Claros dispensou ao Ministro Sá e sua luzidia comitiva,
causou ótima impressão em toda a terra mineira.
A pompa excepcional de que se revestiram todos os festejos,
e, principalmente, o alto cunho de distinção que em
tudo se fez notar, deram à nossa terra foros de grande
cidade.
Perdida na vastidão ignota e erma do sertão sem fim,
Montes Claros nunca tivera ensejo de dar mostras de seu
grau de cultura e de seu progresso material. Sem nada
que lhe preparasse o espírito, a impressão do Ministro da
Viação foi excelente. Ali a cidade parecia-lhe Milagre do
Sertão; e aqui, longe do nosso povo e, portanto, sem o
menor intuito de lisonja, o ministro não hesitou em prognosticar
que Montes Claros, depois de servida por estrada
de ferro seria uma das principais do interior do Brasil...
Os moços componentes da comitiva ministerial foram mais
além. Encantou-lhes acima de tudo a graça sem par das
nossas patrícias. E, enchendo de cuidados e zelos a todos
nós, que temos a presunção de supor que aí alguém nos
espera, enquanto estamos longe em dura batalha, eles saíram
dizendo, em verso e música, que “Montes Claros lhes
ficará no coração”.
Somente uma pessoa não está satisfeita com as grandes
festas montes-clarenses. Essa pessoa, meu caro, é este
seu velho amigo.
Agora quando das faladas festas só restam ecos,
quero desabafar a profunda mágoa que elas causaram aos
meus brios de cidadão eminentemente jacobino.
As festas de Montes Claros não foram montes-clarenses.
Faltou-lhes a cor local, o sabor sertanejo. Realizaram-se num ambiente puramente artificial.
Tudo foi de fora.
Para os serviços do decantado banquete das municipalidades,
os dirigentes das festas levaram daqui o Sr. Felipe
Roxo, do Hotel Avenida, acompanhado de uma turma de garçons de casaca e de smoking... Prescindiram dos
préstimos de Dona Joaninha Teixeira – a grande mestra
na arte culinária – e o arroz de forno, o tutu de feijão, o
leitão assado, foram substituídos por pratos de nomes arrevesados,
dos quais ninguém gosta, e que são obrigatórios
nos grandes regabofes...
Os inigualáveis doces de Dona Aninha Pinto e das
demais sucessoras da saudosa Dona Alda Queiroga, nem
de longe apareceram. A sobremesa constou de frutas geladas
e de compotas encomendadas fora.
O baile foi um sucesso. Belas e ricas toilettes femininas
deram sugestivo aspecto ao vasto salão de danças. Os
modelos, com que se apresentaram as nossas patrícias,
eram francos atestados do bom-gosto que impera nas rodas
femininas de Montes Claros. Mas, meu amigo, tenho
uma pequenina ressalva a fazer no tocante às toilettes
femininas. (Que me perdoem as minhas patrícias a indébita
intromissão em negócios de sua exclusiva jurisdição!)
Revoltou-me o fato de terem sido encomendados alguns
vestidos no Rio! A moda é caprichosa. Assim como algumas
espécies de flores necessitam de um clima especial
para que possam vicejar em toda a sua plenitude, certas
toilettes femininas requerem, também, um ambiente especial
para que possam causar bom efeito. Por isso, meu
amigo, os modelos femininos confeccionados no Rio não
podem ser expatriados e, quando o são, apresentam sempre
um aspecto triste e sem graça, nunca se identificando
com as suas donas...
Devem, pois, as nossas patrícias dar sempre preferência
aos vestidos saídos das mãos competentes de Dona
Secinda, de Dona Nazinha Maurício, de Dona Deolinda
Prates, de Dona Servilha, não só para prestigiar as coisas
da terra, como também porque, assistindo à confecção de
seus vestidos, elas lhes transmitem os seus atrativos e encantos...
Enfim, meu amigo, somente uma instituição resistiu
galhardamente aos pruridos inovadores dos maiorais da
nossa terra. Essa instituição foi a velha e querida “Euterpe”
de todos os tempos... Ela não se preparou com exagero.
Não mandou buscar nada de fora. Apareceu como sempre.
E, nos sons alegres e festivos de seus dobrados e de
suas marchas, falou à alma popular, franca e sincera, que
um protocolo impiedoso baniu de todas as manifestações
ao Ministro da Viação.
As festas ministeriais marcaram época em Montes
Claros. Nunca a nossa querida cidade esteve em tanta
evidência. Mas, enquanto em toda parte se entoam loas à
“Princesa do Sertão”, fico a pensar em quanto seria maior
e mais sincera a admiração dos nossos visitantes , se, ao
invés de uma Montes Claros irreal e fictícia, tivessem eles
conhecido a verdadeira e inigualável Montes Claros de
sempre, com suas tradições, seus costumes e seus incomparáveis
encantos naturais.
Belo Horizonte, agosto de 1924. “”
Rubem Braga, lançado em jornal por Newton Prates – além de Fernando Sabino e Paulo Mendes Campos -
, ao receber o prêmio de “Príncipe da Crônica”, disse em
seu discurso de agradecimento: “se me consideram Príncipe
da Crônica, Newton Prates é o Rei, o grande mestre
do jornalismo”.
Newton Prates relembrou, em entrevista, sua primeira
impressão do capixaba Rubem Braga, quando, em 1932,
aos 19 anos, chegou à redação do Diário da Tarde, em
Belo Horizonte: “A turma da casa não topou muito o jeitão
daquele camarada de ar agreste, mal-ajambrado, sobrancelhas
cerradas, rosto fechado, arisco, desconfiado”.
A reportagem de estreia, sobre uma exposição de cães,
dissolveu a má impressão - e valeu ao novato um convite
para ser também cronista. Começou falando, com áspera
ternura, de certa “mocinha feia”: “Se você fosse bonita, seria linda...”
O romance “O Amanuense Belmiro”, que alçou Cyro
dos Anjos à imortalidade, contou com a decisiva colaboração/
influência de Newton Prates. Na coluna diária que
escrevia no Estado de Minas, sob pseudônimo“W”, Newton
Prates critica uma das crônicas de Cyro dos Anjos, que transforma
Belmiro em “dentista”, com “consultório na Serra”.
Por ser ocupação muito prática, entendia Newton que esta
não era a vocação de Belmiro, e exigiu do cronista maior
respeito pelas tendências do seu personagem, advertindo-o
de que Belmiro Borba já adquiria personalidade autônoma,
independente, que não podia se submeter aos caprichos, às
liberdades do seu criador.
Seguindo as sugestões de Newton, Cyro dos Anjos
reconhece a autonomia de seu personagem, retira “a placa
de dentista da porta de Belmiro” e o faz retornar aos “contratempos
sentimentais” e “divagações poéticas”. Na época
em que o livro começou a ser esboçado, Newton Prates
afirma que influenciou outras alterações no romance, como
o envelhecimento de Belmiro em dez anos e o transporte da
ação romanesca do Rio de Janeiro para Belo Horizonte.
O personagem Belmiro, segundo revelou Cyro, é o
resultado da mistura da personalidade de três grandes
amigos: Newton, Monzeca e Ari Teodolino, além do próprio
Cyro. Com efeito, na primeira edição do “Amanuense”, em
espanhol, após candente dedicatória, num PS Cyro escreveu: “Newton, procure sua parte no Belmiro.”
Amigos da vida inteira, afinadíssimos, compadres
de fogueira desde a infância, a presença de Newton Prates
na vida e obra de Cyro sempre foi uma constante.
No seu último livro, “A menina do sobrado”, praticamente
escrito a quatro mãos e graças à incrível memória do
amigo/irmão, o nome de Newton é citado 57 vezes! – conforme
teve o cuidado de contar o seu filho Felippe.
Felippe, nosso particular amigo, colaborou com minhas
pesquisas sobre o seu pai, fornecendo-me relatos interessantes sobre sua vida, seu jeito de ser e de suas amizades.
Segundo ele, Newton Prates era “inteligentíssimo,
intelectualmente muito preparado e dono de uma conversa
deliciosa, um papão de várias horas. Com perspicácia
de notável repórter, o que sempre foi, com dez minutos de
conversa já sabia do que e de quem seu interlocutor gostava.
Tinha um dom especial em descobrir o aspecto crítico
das pessoas e das situações, brilhando intensamente. Bem
humorado, já no fim da vida, nos queixou, certa vez, que
estava ouvindo mal de um dos ouvidos. Imediatamente nos
prontificamos a levá-lo a um otorrinolaringologista, mas ele
recusou: “Precisa não, meu filho. Do jeito que esse povo
anda falando besteiras, quando começam viro o ouvido
surdo para o lado deles. De nada sabem e eu me poupo...”
Januário Newton Prates faleceu no Rio de Janeiro,
em 01/12/1988, aos 83 anos de idade, levado por um
quinto infarto. É hoje considerado, ao lado de Hermenegildo
Chaves – o Monzeca -, os dois maiores jornalistas já
nascidos em Montes Claros.
Montes Claros, 15 de junho de 2013
BIBLIOGRAFIA:
Efemérides Montes-clarenses, de Nelson Washington Viana.
Montes Claros, sua história, sua gente, seus costumes, de Hermes de Paula.
Depoimentos de Felippe Matos Prates, em e-mails trocados com o autor.
Pesquisas em sítios, na internet.
GUARANI ESPORTE CLUBE
José Ferreira da Silva
Cadeira n° 49
Patrona: Irmã Beata
A cidade de Porteirinha sempre apresentou um bom
futebol de campo, porém no ano de 1956, segundo informações
de alguns atletas da época, os dois clubes que existiam,
Império e Recreativo, vieram a paralisar suas atividade
futebolísticas. Não se sabe o motivo deste lamentável
episódio. Diante desta triste realidade, resolveram reativar
esta única alegria que então havia na pacata e próspera
cidade de Porteirinha. Para consumar esta brilhante
ideia, no dia 10 de Junho de 1957, reuniram-se, nas dependências
do Grupo Escolar João Alcântara, alguns adeptos
do esporte para dar origem ao novo clube de futebol.
Dentre as pessoas interessadas em criar o novo clube, figuravam
os senhores Amintas Pinheiro, David Maroto,
Osmar Santos Silva, Décio Andrade Pessoa, Chico Padeiro,
Pacheco, Etelvino Cangussu, Sebastião Pinheiro, Osvaldo
Pires (mestre) e outros.
Na oportunidade, foram apresentados muitos nomes
para a nova agremiação. Após apreciação e votação, o
nome escolhido foi Guarani Esporte Clube, sugerido e defendido
por Chico Padeiro, um humilde e simples baiano,
que viera trabalhar no ofício de padeiro com o senhor
Orozimbo Martins, em sua modesta padaria.
Afinal, estava criado o clube de mais de meio século,
e que permanece até o presente: Guarani Esporte Clube.
O novo clube foi crescendo com boa estrutura, organização,
dedicação e para tanto a sua formação oficial se deu no dia 15 de Janeiro de 1974, em Assembleia Geral,
presidida pelo senhor Etelvino Cangussu, que passou o
cargo para o senhor Domingos Mendes de Carvalho e
Orlando Marcos, presidente e vice respectivamente. Após
esta oficialização, o Guarani ingressou na Liga Porteirinhense
de Desporto, presidida pelo senhor Ananias José
dos Santos no dia 25 de agosto de 1974.
O Guarani que demonstrava força, um futebol de
qualidade e excelente organização, almejou filiar-se no
Conselho Regional de Desporto de Minas Gerais e no Ministério
de Educação e Cultura, fato este que ocorreu no
dia 10 de setembro de 1975.
O Guarani Esporte Clube fundamentou-se na busca
de novos incentivos para valorizar seus atletas, na educação
com todos, no respeito, na solidariedade, na organização,
na harmonia fora e dentro de campo, principalmente
em busca de vitórias e representar com orgulho a
cidade de Porteirinha.
Além do futebol de campo, o clube praticou futebol
de salão, ótimas apresentações, voleibol feminino com
grandes atletas, handbol e outros. No futebol de campo foi grande destaque, pois vencia seus mais difíceis adversários
tais como: Asa, de Salinas; Vasco e Municipal, de
Janaúba; Minas, de Taiobeiras; 9 de Março, de Espinosa;
Odon Oliva e Maec, de Monte Azul; seleção e alguns clubes
de Montes Claros, seleção de Mato Verde, Larama e
América de Capitão Enéas, Guanambi ,da Bahia, e o arqui-rival Mackenzie Esporte Clube, de Porteirinha.
Para justificar a grandeza e a exuberância do Guarani,
podemos citar alguns nomes de atletas que fizeram
parte do Clube como: Bé de Santo, Elísio Silva, Edno Aguiar,
João Teixeira, Luiz Carlos (BB), Fio, William Teixeira,
Ronaldo Bezerra, David Maroto, Zitão, Denício Andrade,
Sinvaldo, Bené (BNB), Anisinho, Leu Porquinho, Dorzinho,
Isac Lidório, Pelé de Galdino e o grande astro João
Ramos, apelidado pelo escritor Itamaury Teles como o
Maradona do Sertão, e muitos outros.
Ao longo dos mais de cinquenta anos de atividade o
Guarani foi dirigido pelos seguintes presidentes: Acário
Mendes, Agamenon José Victor, Alexsander Oliveira de
Souza, Altamir Carlos Martins, Anísio Higino Filho, Ariovaldo
Santana Bastos, Benedito Gomes Andrade, Carlos
Humberto Silva, Domingos Mendes Carvalho, Edilson
Mendes Matos, Etelvino, Cangussu, Filogênio Teles de
Menezes, Jaime Soares Durães, João da Mata Neto, José
Cangussu, José Joaquim dos Reis, Milton Fernandes de
Souza, Miraldo Flávio Chaves, Nei Lima, Odon Mendes
Soares, Orlando Marcos Costa, Paulo Roberto Santos, Pedro
Ivan, Welson Teixeira e Jairo Santos com destaque para
Etelvino Cangussu, que presidiu por várias vezes.
E. E. PROF. HAMILTON LOPES
José Ferreira da Silva
Cadeira n° 49
Patrona: Irmã Beata
A ESCOLA ESTADUAL DE MONTES CLAROS, de
ensino médio, foi criada pelo decreto 24424/85 e autorizada
a funcionar através da portaria 252/85 de 25-01-85.
A escola supra tem suas origens no curso de segundo
grau que foi criada na escola estadual de primeiro e
segundo graus, prof. Dulce Sarmento em convênio com a
Prefeitura Municipal de Montes Claros, proprietária do
prédio. Na gestão do prefeito Antônio Lafetá Rebello, com
influência do deputado estadual Dr. Jairo Magalhães, a
escola foi autorizada a funcionar, por meio da lei 5501 de
12-02-70, e pela portaria 110 de 02/04/70.
Em 1976, na gestão do diretor Domingos Hamilton
Lopes, foi transferida para a Av. Carlos Ferrante, 451 –
bairro Edgar Pereira (prédio onde funcionava o antigo Tiro
de Guerra de Montes Claros). A edificação passou por uma
simples adaptação onde funcionaram quatorze turmas,
distribuídas nos turnos matutino e noturno.
Em 1985, funcionaram vinte e duas turmas, dentre
elas oito de primeiro grau, do turno vespertino, vinculadas à E. E. Prof. Dulce Sarmento.
Em 1985, conforme portaria 252/85, Minas Gerais
de 28-03-85-SED/SEE-MG, foi autorizada o funcionamento
do curso de magistério de primeiro grau. No ano de
1986, as turmas de primeiro grau da E.E. Dulce Sarmento
foram incorporadas pelo Estado à escola com o nome de
Escola Estadual de Montes Claros.
Em 1986, de acordo com a portaria 243/86-MG de
20-02-86-SED/SEE-MG, criou-se o curso técnico em contabilidade.
A escola passou a funcionar com dois cursos profissionalizantes
do segundo grau, distribuídos em oito turmas
no matutino, oito turmas no noturno, de quinta a oitava
série do primeiro grau, do turno vespertino, somando
um total de 24 turmas.
A partir do ano de 1996, a Escola Estadual Montes
Claros começou a ministrar o ensino médio geral nos turnos
matutino e noturno, amparado pela portaria 333/97-MG de 19-02-97.
Em 1998, esta escola sofreu várias alterações determinadas
pela Vigésima Segunda Superintendência Regional
de Ensino e SEE: a extinção do ensino normal e técnico
do ensino normal e técnico em contabilidade.
Nessa gestão, foi sugerida por representante do segmento
dos pais, pela direção e por uma ajudante de serviços
gerais, a mudança do nome para Escola Estadual Prof.
Hamilton Lopes. O assunto foi levado ao plenário e depois
para reunião do colegiado, que deu parecer favorávelà a mudança do nome.
Além do Diretor Professor Hamilton Lopes, tivemos
até o momento vários diretores indicados pela Secretaria
Estadual da Educação, e outros aprovados em concursos
e eleitos pela comunidade escolar, que tiveram a oportunidade
de administrar a referida escola: Geraldo Honorato
Marques: de 17/09/1985 a 14/02/1990; Maria da Conceição
Medeiros: de 16/02/1990 a 21/01*1992; Zenaide
Alkmim Oliveira: de 24/01/1992 a 31/10/1992; a supervisora
Marilda Oliveira Nepomuceno: de 15/10/1992 a
27/01/1994; Marília Sofia Ferrante Rebello: de 04/02/1994 a 29/01/1997; a supervisora Irce dos Reis Guimarães:
de 30/01/1997 a 12/01/2000; a supervisora Adélia
Alves Pereira: de 12/01/2000 a 28/04/2004; Marilda Oliveira
retorna ao cargo em 29/04/2004 até 20/01/2012.
De acordo com os fatos, vale destacar e sensibilizar
o trabalho e comprometimento do Senhor Hamilton Lopes
em dar origem à escola; a supervisora Irce dos Reis
Guimarães Cardoso empenhou-se para a construção de
um novo prédio, que era desejo de todos. E, no último ano
de seu mandato, conseguiu a doação do terreno para realizar
o grande sonho. Porém, a escritura do terreno foi
conquistada com muito empenho e sacrifício da diretora
Adélia Alves Pereira, com apoio da Vereadora Maria Helena
Lopes, alunos, funcionários e o tesoureiro, Professor
José Ferreira da Silva.
O terreno foi doado ao Estado de Minas Gerais através
da Lei n° 2.982, de 02 de Janeiro de 2002, tendo como Prefeito
Municipal de Montes Claros, o Sr. Jairo Ataíde Vieira, que
sancionou a Lei sem qualquer disposição em contrário. A
Diretora Marilda Oliveira praticou, em seus três mandatos,
um ótimo relacionamento com funcionários, superintendência,
comunidade escolar, alunos, colegiados, tesoureiro (José
Ferreira) e demais segmentos da sociedade. Dirigiu com capacidade,
habilidade e transparência em todas as realizações
inerentes à sua função e administração. Observo também
que a sua maior realização foi a construção do novo
prédio que teve o apoio do Deputado Estadual Arlen Santiago,
concretizando o sonho de todos nós.
A partir de Janeiro de 2012, a escola é administrada
pela professora Adélia Magda Sepúlveda Santos e que tem
como vice as professoras Doralice Macedo Prates e Nilza
Maria de Oliveira.
Observamos que esta escola vem desenvolvendo um ótimo trabalho, é reconhecida e valorizada, pois atualmente
muitos alunos são aprovados em concursos e vestibulares,
principalmente na Unimontes, o que faz da escola uma
das preferidas em âmbito municipal.
O bom andamento do educandário se deve à capacidade
e liderança da direção, a harmonia dos demais funcionários,
a aptidão dos alunos e o apoio da comunidade escolar.
O VAQUEIRO
Juvenal Durães Caldeira
Cadeira nº 81
Patrono: Nathércio França
Nas edições passadas, escrevi, com título “Coisas do
Passado” sobre o “carreiro” e o “tropeiro”, agora, falo do
vaqueiro, assunto tão importante quanto os outros para
aquela gente simples de outrora. Eu, como nos outros, estive
lá presente e participando daquela atividade que hoje
não existe mais no nosso meio. Em alguns lugares mais
afastados e longínquos do norte de Minas ainda há essa
prática, porém, considerada obsoleta para a nossa época.
Nasci em Montes Claros, mas fui criado até os dez
anos de idade na fazenda Cantinho, hoje integrada na área militar do 55º Batalhão do Exército brasileiro, nas vizinhanças
de Montes Claros. Ali, acompanhei meus irmãos
mais velhos e os vaqueiros da fazenda com as lides e
manejos do campo. Criávamos o gado zebu de origem
Malabar/Índia. Uma parte era amansada e destinada à
leiteria ou ao engenho e carro de bois. Para negócio, meu
pai criava manada de novilhos de corte para os açougues.
As vacas leiteiras davam o leite para o consumo nosso
e dos agregados. O que sobrava era para fazer doces,
queijo, requeijão, quitandas, coalhada e merenda com a
farinha de milho. O soro era para criação de porcos. Os
bois de carro transportavam cana para o engenho, produtos
agrícolas e lenha para cidade.
O gado de corte era arisco pelo fato de viver nas
invernadas mais afastadas, com menos contato com os
vaqueiros e para a venda nas devidas ocasiões. De quando em quando, meu pai vendia um lote de reses gordas
para os matadores. Era costume também, abater alguns
novilhos para o consumo da fazenda e para atender a
vizinhança.
Nas décadas de trinta e quarenta, chovia muito e os
fazendeiros viviamabastados com os fartos produtos agropecuários.
As fazendas eram quase autossuficientes com
a lavoura e com o gado para a manutenção da família e
das propriedades. Meus parentes eram grandes fazendeiros
com muito gado. As terras do tio José Gonçalves na
margem direita do Rio Verde Grande alcançavam a região
de Vaca Brava. Era uma propriedade de criação extensiva
de gado destinado aos frigoríficos. Entre os seus
vaqueiros de fama lembro-me de Aurelino. Era um moço
destemido e campeava o dia inteiro montado num dos
cavalos treinados para o campo. O meu primo Beguito o
acompanhava na vigilância do rebanho arisco. Aurelino,
dedicado ao campo e descuidado de sua saúde, foi acamado
e morreu ainda moço, isolado num quartinho ao
lado do curral, fato comum naquela época sem recursos.
As grandes fazendas, geralmente, não tinham cercas
e o gado vivia solto e sem rumo certo. Os vaqueiros
campeavam e tratavam as reses feridas ou doentes na
mata, laçando e imobilizando-as numa árvore para os
curativos necessários.
Eu era criança, mas montava com segurança nos
cavalos de campo e participava nas buscas do gado com
os vaqueiros da nossa fazenda. Mas, um dia meu pai, com
desejo de mudar de ramo, dispôs daquele lugar saudoso e
nós voltamos para a cidade. Tempos depois, fomos para o
povoado de Tamborilzinho, município de Coração de Jesus,
onde abrimos uma loja de tecidos, secos e molhados.
Eu já tinha doze anos de idade e trabalhava no balcão
com meu pai, porém, sem esquecer das aventuras do campo.
Ali, conheci a família de Dona Maroca e logo me identifiquei
com seus filhos: Joaquim, Nozinho, Aldenor e Geraldinho. Eles eram vaqueiros famosos da região e sempre
solicitados para conduzir boiadas dos fazendeiros da redondeza.
Eu, já amigo deles, deixava a loja e os seguia
sem interesse de qualquer pagamento. Aquilo, para mim,
era uma diversão. Eles eram alegres, honestos e gostavam
da minha companhia.
Uma vez, conduzimos uma boiada do Sr. Antônio
Athayde, de sua fazenda Tamboril, distrito de São João
da Vereda para o embarque em Montes Claros. Pernoitamos
na fazenda das Quebradas de Pedro Veloso e no dia
seguinte chegamos à cidade, onde tivemos um pequeno
descanso. Depois, embarcando o gado nos vagões da EFCB
com destino “pra cima”, era o que o encarregado nos informava.
Naturalmente, deveria ser para os grandes centros
como Belo Horizonte, São Paulo ou Rio de Janeiro.
Missão cumprida com sucesso e muita satisfação, nós estávamos
de volta ao povoado de Tamborilzinho. Lá, os
rapazes ficavam na expectativa de um novo chamado, e
eu voltava ao balcão da loja, mas, sempre em contato com
aquela inesquecível família alegre e amiga.
Tempos depois, eles foram solicitados para buscar
uma boiada de Tiel Mota, numa fazenda do Antônio Branco
no distrito de Barreiras, vizinho de Santa Rosa de Lima.
Eu, mais que depressa, deixei a loja e juntei-me aos “marocas”,
e lá fomos. Chegando à fazenda com chuvas intermitentes,
ficamos sabendo que teríamos de pegar os
novilhos bravios na mata fechada. Enquanto eles achavam
aquilo um trabalho penoso, eu estava ansioso para
participar daquela aventura. Lá, conhecemos o Elói, rapaz
alto, moreno e já vaqueiro famoso, pronto para nos
ajudar naquela árdua tarefa.
No dia seguinte, começamos a caçada aos bois esquivos,
que aos poucos foram encurralados. Num daqueles
dias, eu saí pela mata e encontrei um novilho que me
vendo embrenhou-se no mato. Parti no seu encalce e na
próxima clareira o derrubei. Eu o lacei e o amarrei numa árvore próxima antes que ele se levantasse. A galope, fui
avisar aos colegas de minha grande façanha, pela primeira
vez. O novilho foi levado para o curral e eu festejado,
pois, derrubar um boi era tarefa de vaqueiro profissional e
experiente e não de um jovem inexperiente e amador.
Depois de preso um bom número de reses, tocamos
a boiada até a fazenda de Tiel Mota e de lá, voltamos ao
Tamborilzinho, contando com entusiasmo nossas aventuras
naqueles dias chuvosos de dezembro da década de
quarenta.
Meu pai resolveu montar uma pequena loja filial na
região do Espigão, município de Brasília de Minas e colocar
o seu caixeiro de confiança Zezinho Oliveira como
gerente. Eu, que flutuava aqui e ali, fui parar lá, não com
o propósito de trabalhar na loja, mas à procura de aventuras
e de me divertir. Logo, encontrei o Zezinho Fagundes,
filho da viúva fazendeira, Maria de Neco, dona de
muitas terras e de muito gado. Eu deveria ter uns quatorze
anos de idade e o meu novo amigo, pouco menos. Tornamos
amigos com o mesmo objetivo, correr e derrubar os
novilhos ariscos, só para ver a queda. Dona Maria ficava
apreensiva, mas aprovava a nossa amizade e fazia vista
grossa de nossas proezas.
Um dia daqueles, Dona Maria teve a ideia de oferecer
aos vaqueiros da redondeza uma novilha famosa pela
sua braveza, com a finalidade de reunir os peões do campo
e suas famílias para um churrasco. Porém, eles teriam
que pegar aquela rês xucra na larga para o banquete e
alegria de todos. A notícia correu e o dia foi marcado para
o acontecimento. Os vaqueiros famosos começaram aparecer
para participar da façanha e mostrar suas melhores
perfórmances. Logo, na manhã daquele dia, já havia vaqueiros
com suas vestes de couro, montando espirituosos
cavalos de campo, em volta do pátio da casa grande, prontos
para a caça à novilha de chifres pontiagudos e afiados.
Para minha surpresa, lá estava Elói, aquele vaqueiro que conheci em Barreiras. Naquele dia fiquei conhecendo
o Rotilo, com fama de melhor vaqueiro da região. Havia
outros, também renomados, prontos para pegar a novilha
gorda de mais de doze arrobas.
As famílias da vizinhança chegavam aos poucos,
ansiosas para conhecer o melhor vaqueiro da competição
e participar da festa. Dona Maria mostrava grande satisfação,
porém agitada e preocupada com os afazeres das
cozinheiras envolta dos tachos em ebulição, cheios de fava
e arroz para servir com o esperado churrasco. Todavia,
ela não descuidava das visitas espalhadas nas imediações
da sede. Umas sentadas dentro dos galpões, outras, em
baixo das árvores em derredor do pátio. A rapaziada assentada
nas cercas do curral “de olho” nas mocinhas,
que exibiam charmes pelo pátio, e a meninada agitada
correndo pelo terreiro.
Às nove horas, mais ou menos, Dona Maria ordenou
a caça e os cavaleiros, já prontos, partiram rumo à
larga, onde deveriam encontrar a novilha bravia, destinada
ao churrasco. Eu, montando o meu portentoso cavalo
alazão e Zezinho no seu veloz cavalinho pampa, pegamos
a fila, pensando que éramos gente grande. Chegando à larga de mata fechada, os treinados cachorros de vaquejadas
deram o sinal. Os peões embrenharam na mata
rumo aos ganidos dos cães que já estavam em perseguição
à novilha. A corrida estava iniciada e cada um queria
mostrar mais serviço do que seu companheiro, porém, alguns
foram, aos poucos, perdendo dentro da mata e ficando
para trás. Eu e Zezinho, como peixes fora d`água,
corríamos pela estrada seguindo aquela movimentação em
ziguezague da caçada implacável. Nas constantes travessas,
víamos passar a novilha, o Elói no seu encalce e o
Rotilo logo atrás. Depois, os outros que ainda restavam na
competição. À tardinha, os vaqueiros conseguiram derrubar
e sangrar a novilha numa clareira da mata. Um carreiro
tocando um carro puxado por dois bois troncudos tomou conta de transportar a rês, já abatida até à sede.
Aqueles homens valentes do campo, cheios de garbo
e sentindo missão cumprida, gabavam-se de suas bravuras
por quebrar o mito de que ninguém conseguiria pegar
aquela novilha arisca na mata intrincada, onde ela
vivia isolada.
O churrasco tão esperado ficou para o dia seguinte,
por causa da avançada hora para realizar aquela tarefa.
Elói foi eleito vencedor e Rotilo ganhou o segundo lugar,
sem direito de reclamar.
Depois do grande churrasco, eu e Zezinho continuamos
com nossas aventuras extravagantes sem objetivos
de pré-adolescentes. Um dia, na tentativa de derrubar
uma vaca alvacenta, o meu cavalo caiu e a cabeça da sela
pegou o meu peito esquerdo, obrigando-me a procurar o
Dr. Pedro Santos para demorado e doloroso tratamento
em Montes Claros. Após aquele trauma, perdi o entusiasmo
do campo e fui para o Sul, onde encontrei um amontoado
de estrangeiros com línguas e costumes diferentes.
Lá, desconhecido e só, comecei a minha vida estudantil e
profissional, esquecendo as minhas aventuras perigosas.
Voltei a Montes Claros, minha terra de origem, depois
de quase doze anos, já no fim da década de cinquenta
e encontrei uma realidade diversa daquelas das décadas
de trinta e de quarenta, tempo em que o gado era a
fonte de riqueza e movimentava o norte do estado, dando
ao luxo da cidade de Montes Claros ter até luxuoso Cassino,
do brejeiro João Pena, na esquina das ruas Carlos Gomes
e Visconde de Ouro Preto, que abrigava mulheres
bonitas do Norte de Minas e do Sul da Bahia para alegrar
aos afortunados fazendeiros do gado zebu.
Os rebanhos que encontrei eram mansos e mantidos
com manejos intensivos e aprimorados. As largas de
matas fechadas de outrora se transformaram em invernadas
com pastagens cuidadas com tratores e técnicas modernas.
O transporte das reses passou para os caminhões gaiolos nas estradas asfaltadas, diretamente para os grandes
centros. Aurelino, Beguito, os “Marocas”, Elói, Rotilo
e outros ficaram num passado remoto, como também,
aquelas movimentações com boiadas compridas e empoeiradas
nas estradas mineiras. Coisas que existem só nas
recordações de alguns que ainda vivem para contar à
posteridade. Tudo passou até mesmo a vida daqueles
heróis do campo. Hoje, ainda existe grande criação de
gado no Norte de Minas, porém com manejo intensivo
e com tratamento racional. Há exposições de reses de
sangue puro para atividades leiteiras e de cortes, escolhidas
de raça especiais através de pacientes experiências,
como: holandês, nelore, gir, guzerá e outras raças
precoces de genéticas aprimoradas, tratadas nas modernas
cocheiras com rações preparadas para leiteria
ou para engorda.
Atualmente, não se fala mais daquele tempo passado.
A mocidade de hoje não interessa saber a respeito de assuntos
dessa natureza, e nem mesmo, como viveram seus antepassados,
com os costumes e recursos regionais da época.
Os carreiros, os tropeiros e os vaqueiros foram, no
passado, a mola mestra na fomentação da economia do
sertão norte-mineiro e da sobrevivência de seu povo.
Hoje, há peões especializados em torneios de grandes
parques de exposições com finalidade financeira e de
diversão popular. Também, as prefeituras municipais promovem
rodeios constantes para entreter o “povão”. Mas,
aqueles vaqueiros, com vestiduras regionais feitas de couro
curtido que rasgavam com o peito matas fechadas no
encalce do boi bravo, foram substituídos pelos “Cowboys”
vestindo roupas exóticas, com botas elegantes e chapéus
abas largas, para alegrar o povo nas grandes festas rurais
com programações sofisticadas e de instalações luxuosas.
Também, os cavalos espirituosos e treinados para o campo,
não existem mais, foram substituídos por marchadores
de raça pura para demonstrações públicas e também, pelas motocicletas modernas de altas cilindragens dos camponeses.
Os cachorros campeiros deram lugar às raças
estrangeiras de fino trato. Hoje, objetos de luxo aconchegados
e até com direito a salão de beleza, custeado por
madames pedantes.
È pena que os heróis do passado morreram desamparados
e não tiveram a sorte de alcançar a lei recente,
que agora ampara os modernos peões com suas pompas e
mordomias. Assim é a vida!
O 10º BATALHÃO EM BRASÍLIA (DF)
Lázaro Francisco Sena
Cadeira nº 56
Patrono: João Luiz de Almeida
A participação do 10º Batalhão no movimento cívico-militar
de 1964 foi sintetizada pelo historiador e sociólogo João Camilo
de Oliveira Torres, em sua obra Razão e Destino da Revolução,
publicada ainda no final daquele ano:
“Uma operação menos focalizada pelo noticiário e
talvez mais difícil foi a do 10º Batalhão da Polícia Mineira,
sob o comando do Tenente-Coronel Georgino Jorge de
Souza. Deslocando-se de Montes Claros em direção a Paracatu – seu objetivo era fechar a porta da Capital – esta
tropa, por estradas apenas carroçáveis, atravessou o território
mineiro de Leste a Oeste, numa arrancada fulminante,
digna de um Rommel. As tropas da guarnição da capital
volveram a suas posições originárias, para balizar afinal
a entrada do batalhão mineiro em Brasília. Foi um feito
de armas que, embora incruento, revelou capacidade
de movimentação, poder de direção, competência dos comandantes
e bravura de nossos soldados.”
O boletim interno nº 59, de 31 de março de 1964,
uma terça-feira, ao publicar a “ordem do dia” do comando
da Unidade para a quarta-feira seguinte, reflete a mais
pura normalidade para a tropa, inclusive prevendo chamada às 07h00 e dispensa às 12h00, após a revista geral,
como já era o costume naquela época. O então tenente
Antônio Moreira Neto foi escalado para 1° de abril como “fiscal de dia” e não “oficial de dia”, como deveria ser em
caso de qualquer possibilidade de alteração da ordem, situação em que o oficial, obrigatoriamente, deveria pernoitar
no quartel. Mas não foi o que aconteceu...
É preciso relembrar que, política e ideologicamente, àquela época, as nações se encontravam polarizadas, sob
a síndrome da “guerra fria”: de um lado os Estados Unidos
da América, como símbolo do capitalismo, e do outro
a extinta União Soviética, como timoneira do comunismo.
O pobre planeta terra vivia sobressaltado com as ameaças
recíprocas de emprego dos arsenais atômicos, o que seria
capaz de varrer, de uma só vez, toda forma de vida então
existente. A União Soviética havia “conquistado” Cuba e
ali implantado o seu regime comunista, criando, na antessala
dos Estados Unidos, uma base estratégica para chegar
aos demais países do continente americano e neles implantar
a sua ideologia política. É claro que o Brasil, pela sua
dimensão territorial e pelo potencial econômico, transformou-se no alvo principal. Junte-se a isso a pusilanimidade
e a leniência do governo brasileiro, instabilizado após a renúncia
do presidente Jânio Quadros, em agosto de 1961.
Para a nação brasileira de então, era iminente e, ao
mesmo tempo, inadmissível a implantação do comunismo
ateu em nosso país, rompendo toda uma tradição cultural
de fundamentos cristãos e democráticos. As forças
conservadoras se insurgiram e o povo foi às ruas, paramentado
de símbolos religiosos, para afastar o perigo da
sovietização e implantação da ditadura do proletariado,
de tão funestas consequências, como ainda o atestam os
regimes políticos de Cuba e da Coreia do Norte. Nasceu
daí o movimento cívico-militar que derrubou o governo
tendencioso do presidente João Goulart, que por duas décadas
foi chamado “Revolução de 31 de Março de 1964”,
e que, logo após e até o presente, passou a ser tratado como “Ditadura Militar” pelos meios de comunicação dominados
pela ideologia “esquerdista”.
Dentro de tal ebulição política que ameaçava a República,
não era de se esperar outra coisa das forças ar madas, pela sua competência legal e movidas pelo espíirito
cívico, senão que assumissem o comando do movimento
e espantassem de vez aquela intervenção estrangeira
em nosso país.
Como força reserva do Exército Brasileiro, e atendendo
ao chamado do seu comandante-em-chefe, o então
governador José de Magalhães Pinto, a Polícia Militar de
Minas Gerais aderiu incontinenti ao movimento, cabendo
ao 10º Batalhão a difícil missão de participar da ocupação
de Brasília, capital da República, para implantação do
novo regime político.
Noite de sobressaltos para o 10º Batalhão, aquela de
31 de março de 1964. Em vez de ser dispensada a tropa às
18h30, como era o costume, a Unidade recebeu ordem para
embarcar, imediatamente, para Brasília-DF, para integrar
as forças revolucionárias que participariam da deposição,
pelas armas, do presidente João Goulart, se assim fosse
preciso. Embarcar como, se o Batalhão não dispunha de
um único veículo ao menos adaptado para o transporte
de pessoal ?! Em situação como aquela, isso não é pergunta
que se faça. Requisite-se os veículos necessários, onde
quer que eles se encontrem. Foi assim que o DNOCS –
Departamento Nacional de Obras Contra as Secas entrou
na campanha revolucionária, fornecendo a sua frota de
novos caminhões, sob requisição, para o transporte da tropa
até o seu destino. Não é preciso, e nem possível, dizer
como tudo aconteceu naquela noite, mas um fato pitoresco,
embora indigno para os princípios militares, precisa ser
dito, para reflexão: conta-se que um soldado de nome não
citado, quando já se encontrava formado em seu pelotão,
armado e equipado, pronto para o embarque, aproveitouse
da confusão do momento e pediu a um seu companheiro
que segurasse o seu fuzil, enquanto ele iria ao banheiro. E
assim ele se foi, para nunca mais voltar, desertou.
Buscando um testemunho pessoal da operação realizada
pelo 10º Batalhão em Brasília, entrevistamos o Cel. Antô nio Moreira Neto, do quadro de oficiais da reserva da Polícia
Militar, residente em Montes Claros, que participou efetivamente
daquela campanha como Tenente, a quem fizemos as
perguntas que se seguem:
1 – Como se explica a aparente normalidade da
ordem pública registrada nos boletins diários do Batalhão,
até mesmo no dia 31 de março de 1964?
Respondeu que as informações sobre o emprego da
tropa eram sigilosas. A normalidade era apenas aparente,
“de fachada”, pois a Unidade já se encontrava “de prontidão”,
preparada inclusive para deslocamentos. Naquela
data, já à noite, com o seu pelotão, participou da requisição
dos caminhões junto ao DNOCS. Disse que o diretor daquele
órgão, à época, alegou que não poderia ceder os caminhões,
razão porque foram requisitados à força, em número
de doze unidades, com alguns motoristas incluídos.
2 – Como foi o deslocamento da tropa até Paracatu?
A saída de Montes Claros foi por volta de 03h00 da
madrugada do dia 01 de abril, chegando a Paracatu ao
meio-dia, em jornada ininterrupta, passando pela cidade
de Pirapora, por estradas de terra, até alcançar a rodovia
que liga Belo Horizonte a Brasília. Naquela cidade, o Batalhão
parou para alimentar tropa e preparar para o ataque,
já que o objetivo inicial era a retomada da ponte sobre
o rio São Marcos, na divisa de Minas Gerais com Goiás,
que já se encontrava ocupada por tropas do Batalhão
da Guarda Presidencial. O confronto só não ocorreu porque
o Exército já havia aderido ao Movimento e desocupado
a área. O pelotão sob seu comando recebeu a missão
de vanguarda e reconhecimento do terreno, tendo ali encontrado,
ainda recentes, as marcas de calçados e pneus
deixadas pelos ocupantes que se retiraram. Ainda em Paracatu
foi integrada ao 10º Batalhão uma Companhia do
7º BI, da cidade de Bom Despacho. Foi ali também que o Batalhão se incorporou ao 12º Regimento de Infantaria
do Exército, integrando o que se denominou GT-12, para
o desenvolvimento das ações das Forças Armadas em nível
nacional.
Ponte sobre o rio São Marcos, onde quase aconteceu o confronto armado
entre o 10º Batalhão e frações do Batalhão da Guarda Presidencial
3 – Superada a primeira missão em Paracatu, quais
as ações seguintes desenvolvidas pelo Batalhão?
Já integrando o GT-12, o Batalhão se deslocou para
Brasília, onde se instalou precariamente nas dependências
do Teatro Nacional. Depois foi deslocado para a cidade
satélite de Taguatinga, onde permaneceu acantonado até
o regresso para Montes Claros, no final do mês de abril.
Durante o período, atuou na “operação limpeza”, prendendo
comunistas e subversivos, que eram entregues ao
serviço de triagem das Forças Armadas. Foram muitas as
prisões realizadas, inclusive em outras cidades satélites e
até em Unaí-MG. O Batalhão participou ainda das solenidades
de posse do novo Presidente da República, o Marechal
Humberto de Alencar Castelo Branco, como integrante
do grande desfile cívico-militar em continência ao em possado, pelas principais avenidas da cidade. Além disso,
o Batalhão participou do policiamento da Capital, que
antes era feito pela Polícia do Exército, e, ao lado das Forças
Armadas, ocupou pontos sensíveis da cidade, em missão
de guarda.
4 – Como a população reagia à presença e ação da
tropa?
O povo entendeu e aceitou bem a Revolução. Ainda
em Brasília foi grande a concentração de pessoas ao longo
das avenidas, para aplaudir as tropas que desfilaram em
continência ao Presidente Castelo Branco. Já no retorno a
Montes Claros, o Batalhão foi homenageado e festejado
nas cidades por onde passou - Paracatu, João Pinheiro,
Pirapora e Jequitaí -, com a presença de autoridades e grande
concentração de pessoas. Em Montes Claros, após as
homenagens das autoridades e povo em geral, houve o
desfile da tropa pelas principais ruas da cidade, aplaudida
durante todo o percurso.
Desfile do Batalhão em Brasília, pela posse do Presidente Castelo Branco
5 – Quais episódios, na sua opinião, foram marcantes
naquela jornada?
- Um momento de apreensão e dúvida:
Antes de saber da adesão das Forças Armadas ao
movimento revolucionário, em razão da superioridade do
armamento, equipamento e outros recursos que elas possuíam.
Tal apreensão, todavia, nunca chegou a ser medo,
pois moralmente estávamos preparados para qualquer
confronto.
- Um momento de tristeza e dor:
O acidente com o caminhão, na estrada de Unaí,
que provocou o disparo do fuzil do Soldado João Cordeiro
de Aquino, que o atingiu mortalmente. Houve ferimentos
leves em outros PM, em decorrência do tombamento
do caminhão.
- Um momento de alegria e regozijo:
A comemoração carnavalesca da tropa, ao saber do
sucesso do movimento revolucionário, dentro do Teatro
Nacional de Brasília, antes de seguir para Taguatinga.
Também foram marcantes os aplausos da população, nas
concentrações e nos desfiles realizados pelo Batalhão.
Retorno festivo do Batalhão a Montes Claros
6 – Qual a sua avaliação sobre o comando da tropa
e o desempenho dos comandados naquele movimento
revolucionário?
Foi um comando muito firme, conduzido pelo então
Tenente Coronel Georgino Jorge de Souza, com decisões
sábias e determinadas em muitas situações críticas, apesar
da grande carência de meios apropriados. O desempenho
da tropa esteve à altura de seu comando, com demonstrações
de arrojo, disciplina e preparo, nos momentos
em que foi empregada.
7 – Como você avalia, hoje, aquela operação?
Foi uma operação necessária, que teve grande influência
no desfecho da Revolução. Se preciso fosse, repetiria,
hoje, a mesma operação, inclusive com as ações específicas
da requisição dos caminhões e da retomada da ponte
sobre o rio São Marcos.
Tenente Antônio Moreira Neto, em 1964
Da entrevista com o Coronel Neto,
forma-se uma visão
geral da participação
do 10º Batalhão no
movimento cívico-militar
de 1964 que derrubouogoverno
populista
do Presidente João
Goulart. Percebe-se
também que as ações
eram desenvolvidas
quase sempre de
modo inesperado, de
acordo com os acontecimentos,
dispensando-se planejamentos
escritos e relatórios dos fatos para a posteridade. Consultando-se, todavia, os boletins diários da Unidade, é possí-vel registrar algumas informações complementares sobre
aquela efeméride.
Embora tenha ocupado a cidade de Paracatu a
partir de 01 de abril ao meio-dia, o Batalhão somente
adquiriu a sua organização plena a partir do dia 04,
quando recebeu uma companhia organizada posteriormente
em Montes Claros, com os PM destacados, sob o
comando do Cap. Vicente Gomes da Mota, que se encontrava
em gozo de licença para tratar de assuntos
particulares. Os poucos PM que permaneceram em
Montes Claros, para os serviços essenciais, ficaram sob
o comando de Capitão Miguel Abdo de Araújo, que era
o Delegado Especial de Polícia da cidade. Também foi a
4 de abril que se incorporou uma companhia do 7º Batalhão,
da cidade de Bom Despacho, sob o comando do
Cap. Nilson Nunes. Taticamente o Batalhão ficou assim
organizado:
Comando e Estado Maior
Tenente Coronel Georgino Jorge de Souza – Comandante
Capitão Nilson Nunes – Subcomandante
Capitão Vicente Gomes da Mota – Chefe da 1ª Seção
Aspirante Antônio Alves – Chefe da 2ª Seção e Secretário
1º Tenente Antônio Onofre de Alkmim – Chefe da 3ª Seção
Capitão José Coelho de Lima – Chefe da 4ª Seção
1º Tenente Adm Antônio Gomes da Costa Filho – Tesoureiro
Capitão José João Beckhauser – Capelão
Dr. Alvimar Gonçalves de Oliveira – Médico
Aspirante Adm Vicente de Paula Félix – Aprovisionador
Aspirante Adm Hamilton Dias da Silva – Almoxarife
Primeira Companhia
1º Tenente Tomás dos Santos Rodrigues – Comandante
1º Tenente Nilson Simões Cândido – 1º Pelotão
2º Tenente Antônio Moreira Neto – 2º Pelotão
2º Tenente Waldir Eny de Almeida – 3º Pelotão
Segunda Companhia
1º Tenente Nilo Alves – Comandante
2º Tenente Antônio da Cunha Ramos – 1º Pelotão
Aspirante Aírton de Araújo Campos – 2º Pelotão
Terceira Companhia
1º Tenente Daniel Alves de Oliveira – Comandante
Aspirante João Alves da Silva – 1º Pelotão
Aspirante Pedro Ivo Vasconcelos Santos – 2º Pelotão
Aspirante Jaime Gotelip Júnior – 3º Pelotão
Companhia de Metralhadoras Pesadas
1º Tenente Jair Alves Pinheiro – Comandante
Aspirante Waldemar de Almeida Mota – 1º Pelotão
Subtenente Japyassu de Oliveira Furtado – 2º Pelotão
1º Sargento Alexandre Teodoro de Souza – 3º Pelotão.
Com essa organização, dispondo de um total de 646
homens, sendo 24 oficiais, 59 subtenentes e sargentos e
563 cabos e soldados, o Batalhão se deslocou para Brasília,
onde pernoitou no dia 4 de abril. A partir do dia 5 se
instalou em Taguatinga, ali permanecendo até o dia 27,
quando editou o seu último boletim de campanha, regressando
a Montes Claros no dia seguinte. A normalidade
funcional da Unidade foi restabelecida a partir do dia 4
de maio daquele ano de 1964.
A avaliação da campanha pelo Comando do Batalhão
pode ser percebida no elogio mandado registrar nos
assentamentos de todos os que participaram das operações,
nos termos seguintes:
“No recente movimento revolucionário, o 10º BI teve
atuação destacada, tornando-se admirado quer no plano
nacional, estadual e regional. Elevou bem alto o seu próprio
nome, da PM e do nosso Estado.
Desde 15 de março até o término de abril nos encontramos
empenhados em uma árdua e gloriosa jornada que,
graças aos esforços de todos, teve o seu epílogo feliz com
as calorosas manifestações de apreço, por ocasião de nosso
regresso.
Os louros conquistados para a Unidade resultaram
de um trabalho profícuo e harmonioso, único capaz de
conduzir ao ápice do êxito nessa honrosa missão.
Os oficiais, subtenentes, sargentos, cabos, soldados
e recrutas não vacilaram na hora decisiva em que foram
convocados para, numa arrancada cheia de patriotismo,
pudéssemos reconduzir nossa pátria ao caminho da liberdade
e exercício da mais autêntica democracia.
Afastado o perigo do comunismo escravizador, o
comando se sente no dever imperioso de elogiar todos os
componentes desta magnífica Unidade que pode, sem falsa
modéstia, servir de modelo para toda a Corporação.
Desde nossa partida, do desconforto de Paracatu,
das constantes ameaças, da expectativa de Taguatinga,dos gloriosos desfiles que realizamos na Capital Federal,
só houve em todo o Batalhão um único pensamento: sermos
dignos da confiança que depositaram em nós. Se o
Soldado João Cordeiro de Aquino, no seu sacrifício cruento,
passou à história de nossa Unidade, os que lhe sobreviveram
continuam honrando o nome do Batalhão, para
que este cumpra a sua destinação histórica.
Os elogios das autoridades federais, estaduais e do
povo em geral corroboram nosso ponto de vista de que comandamos
uma tropa tão aguerrida quanto disciplinada.
Na impossibilidade de citar nominalmente todos
aqueles que contribuíram para o bom êxito de nossa campanha,
determino seja consignado um caloroso elogio individual
a todos os componentes do 10° BI que estiveram
empenhados na campanha fora de nosso Estado, na sede
ou nos destacamentos, conforme a determinação superior,
por ser de justiça..
Que o exemplo de nossos bravos companheiros sirva
de estímulo para as gerações vindouras, para que mantenham
sempre elevado o conceito conquistado pelo nosso
glorioso 10º BI.”
Ao final deste singelo trabalho, queremos deixar também
a nossa opinião sobre o movimento cívico-militar de
1964. Não participamos dele com o 10º Batalhão, mas sim
em Belo Horizonte, onde estávamos concluindo o curso
de formação de oficiais. Quando aqui chegamos, ao final
daquele ano, ainda encontramos bem acesa a chama que
refulgiu sobre os caminhos daquela campanha.
O povo brasileiro, assim como veio a acontecer no
governo do presidente Collor de Melo, foi às ruas e fez a
revolução, por entender que eram indignos da pátria os
atos então praticados pelos seus governantes. A diferença
é que, em 1992, tínhamos um vice-presidente para assumir,
enquanto em 1964 o presidente deposto já era o resto
de um governo vacilante e contraditório que se equilibrava
no poder a partir da eleição do renunciante presidente Jânio Quadros. Foi o mesmo povo que decidiu, através dos
seus legítimos representantes no Congresso Nacional –
então preservado e respeitado -, escolher um presidente
militar, o Marechal Castelo Branco. Estava portanto contida
a intenção de implantar o regime comunista no Brasil
por meio da anarquia política. Mas os vendedores da pátria
não desistiram e foram preparar-se em Cuba e alhures,
financiados pelos recursos soviéticos, para retomar o
governo brasileiro pelas armas da guerrilha, uma estratégia
covarde para instabilizar autoridades constituídas.
Estava pois decretada a guerra e, como informa o ditado
popular, “guerra é guerra”
A quem insiste em macular o regime de governo
implantado em 1964, fazemos uma única observação:
durante os quatro primeiros anos do regime, até 1968,
nenhum sangue foi derramado, apesar de ter sido feita
uma Revolução, onde normalmente “rolam cabeças” dos
derrotados. Aos que discordarem desta nossa afirmativa,
desafiamos que busquem a verdade histórica e descubram
que a primeira vítima da guerrilha foi um jovem soldado
do Exército Brasileiro, abatido covardemente em seu posto
de sentinela em um quartel de Salvador, certamente
por algum inspirador da mais do que tendenciosa atual “comissão da verdade”.
NORTE DE MINAS E
A DESERTIFICAÇÃO
Manoel Messias Oliveira
Cadeira nº 60
Patrono: Jorge Tadeu Guimarães
A desertificação é um dos mais graves problemas
ambientais da atualidade, com ocorrências de grandes
proporções.
Ao tratar desse tema, lembremos que o Norte de
Minas Gerais apresenta grande período de déficit hídrico
no ano, capaz de apontar uma situação passível de desertificação
se não houver política de barrar o desmatamento,
o assoreamento dos nossos rios e colocar em prática o
efetivo reflorestamento de suas nascentes e margens, em
caráter generalizado. Os índices de aridez, extraídos do
Balanço Hídrico Climatológico – BHC, do Norte de Minas
Gerais, para as estações de Espinosa, Monte Azul, Janaúba,
Salinas, Januária, Pirapora e Montes Claros foi considerado
moderado com classificação subúmida seca. Enquanto
o restante dos municípios recebeu a classificação de subúmida úmida e, portanto, não suscetível à desertificação.
É nítida uma relação muito forte entre os termos
desertificação e deserto, uma vez que o termo desertificação
vem etimologicamente da palavra deserto que significa:
desabitado, árido, lugar vazio, solitário. A desertificação
não chega a tanto, assemelha-se a degradação aviltante
com agressão as características de origem, com sérios
prejuízos e males ao ecossistema. Quando ocorre a desertificação,
a paisagem de fato apresenta feições tipo desértica,
porém apesar e dessas semelhanças em uma
associação entre os dois termos, e até mesmo uma confusão entre eles, ambos expressam temáticas diferentes. A
desertificação não está relacionada com a formação ou
ampliação de desertos, assim como também não se confunde
com seca.
Desde 1977 é consenso mundial a utilização do chamado índice de aridez para o estudo da suscetibilidade à esertificação,
a partir da metodologia desenvolvida por Thornthwaite
(1948). Tal índice considera a pluviosidade e a perda máxima
possível de água pela evaporação e transpiração.
De acordo com a Convenção das Nações Unidas de
Combate a Desertificação – UNCCD esse processo ficou
entendido como “a degradação da terra nas regiões áridas,
semiáridas e subúmidas seca, resultante de vários fatores,
entre eles as variações climáticas e as atividades humanas”.
O Norte de Minas Gerais apresenta grande diversidade,
tanto no que se refere às características físicas, como
clima, relevo e vegetação, bem assim as diferenças relacionadas
ao caráter socioeconômico com irregularidades entre
a distribuição de renda, concentração da população e
condições de vida. De maneira geral, a região norte do
Estado mineiro apresenta tais características semelhantes à região Nordeste do país, tanto que a Superintendência
do Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE incluiu esta
região no seu campo de atuação, por estar inserida no
domínio do clima semiárido. Considerada um fenômeno
natural e estritamente meteorológico, as secas são recorrentes
em regiões semiáridas. É fenômeno que tem início
lento, de longa duração, trazendo grandes efeitos principalmente
em regiões que sofrem com a indisponibilidade
de água, seja em lugares onde a oferta desse bem é menor
do que o consumo, ou onde a oferta tenha grande variedade.
Para a Bacharela Kelly de Oliveira Barros, graduada
em Geografia pela Universidade Federal de Viçosa –
MG, as consequências de um longo período de seca dependem
não só de sua duração e intensidade, mas também
das condições socioeconômicas e culturais da população da área afetada.
A SUDENE, desde a sua criação em 1959, engloba
municípios mineiros em sua área de atuação. Atualmente,
são 168 municípios em Minas Gerais e destes, 54 fazem
parte da Região Norte de Minas, considerados semiáridos
pela nova classificação (SUDENE, 2010; OLIVEIRA, M.
F., 2000, BRASIL, 2005), uma vez que a cobertura vegetal
da região é composta principalmente de Cerrado e Caatinga
conforme asseveram os estudiosos do assunto, porém
outras formações vegetacionais são encontradas: Campo,
Campo Rupestre, Veredas e Florestas, principalmente
plantadas como Pinus e Eucalipto .
A própria história da ocupação da região norte de
Minas Gerais levou a grande exploração dos recursos naturais
existentes, fato este apontado como um dos grandes
responsáveis pela tendência à desertificação. Foi pela
sua utilização, pela mineração, pecuária, agricultura ou
extrativismo, que a sobrevivência foi garantida, uma vez
que a região foi posta às margens do foco de atenção por
parte do governo desde o período colonial até os anos 60.
No que se refere aos recursos hídricos, apesar da existência
de um rio com relevância em caráter nacional, o São
Francisco, percebe-se uma escassez muito grande de água,
em que conflitos pelo uso desse recurso já são comuns em
vários pontos da região. Nessa realidade de pouca disponibilidade
de água, pode-se incluir a baixa quantidade de
chuva anual assim como a rede hidrográfica pobre, sendo
comum a ocorrência de rios intermitentes. Seja por questões
relacionadas ao clima, ou mesmo por atividade agropecuária
irracional, alguns rios apresentam fluxo irregular,
no qual a água da superfície desaparece durante o
período da estiagem, como Rio Riachão, um dos afluentes
do Rio Pacuí, que desde a década de 80 se tornou intermitente
em razão da má utilização dos recursos da bacia.
Outro exemplo é a bacia do Rio Verde Grande, afluente
do São Francisco que, em razão da sua potencialidade paraa agricultura irrigada, vem sofrendo disputa pela água
cada dia mais escassa.
O clima da região é outro fator que colabora veementemente
para que a desertificação ocorra nas chamadas
terras secas, que correspondem as regiões áridas, semiáridas
e subúmidas secas. A ocorrência dos períodos
secos pode chegar até oito meses. O cálculo do BHC para
o Norte de Minas Gerais aponta para um grande déficit
anual de água justificado pela baixa pluviosidade, além
das chuvas serem mal distribuídas durante todo o ano, e
isso associado ao desmatamento desordenado para a indústria
do carvão e outros fins, como também a exploração
de jazidas minerais e as areias para a construção civil
vem agravando o necessário equilíbrio ambiental.
Ressalta-se, ainda, que a agricultura é considerada
uma atividade que apresenta elevado grau de impacto no
meio ambiente do semiárido em razão de sua fragilidade
natural, uma vez que a vegetação nativa é suprimida, expondo
o solo em processo erosivo pela ação da chuva e
utilização de insumos químicos, bem assim as grandes fazendas
de gado que substituem a mata nativa pelo capim
e com o pisoteio dos animais destroem a vegetação nativa.
Tal contexto assume drásticas consequências quando da
identificação do problema, o que pode acarretar a desertificação
na impossibilidade de combatê-lo, quando já estão
em um nível avançado de aridez.
______________________________________________
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
Oliveira – Galvão, 2003 e 2010;
Espíndola, 2009;
Pacheco. 2006
Jacomini, 1979
Monografia do Curso de Geografia da UFV (MG)– Kelly de Oliveira
Barros – 2010.
______________________________________________
FRANCISCO JOSÉ DE SÁ, UM
REPUBLICANO DO NORTE DE MINAS
Maria do Carmo Veloso Durães
Cadeira nº 04
Patrono: Antônio Augusto Veloso (Desemb.)
O Cel. Francisco José de Sá nasceu no dia 2 de dezembro
de 1802, na Fazenda da Matrona, que, naquele tempo,
pertencia ao município do Rio Pardo de Minas, hoje, distrito
de Nova Matrona e pertence ao município de Salinas. Com a
morte do pai, herdou essa fazenda, vendendo-a posteriormente.Construiu a Fazenda Brejo de Santo André, próximo
ao distrito de Brejo das Almas, hoje cidade Francisco Sá, Norte
de Minas Gerais. Casou-se com Jacintha Francisca Velloso e,
desse consórcio, nasceram 14 filhos.
Como naquele tempo quase não existiam escolas
primárias e o papel era coisa rara, o então jovem Francisco
José aprendeu ler e escrever na areia, tornando-se, pelo
seu esforço, um homem “letrado”, que lia os jornais do
Rio de Janeiro e de outros lugares, transportados por animais
até a sua fazenda. Assim se mantinha sempre bem
informado, principalmente sobre a política nacional. “Muito
indagava o coronel Sá das coisas da religião e da política,
por isso tinha na fazenda os melhores jornais do Rio
de Janeiro e de outros lugares... Nada faltava aos habitantes
do Brejo de Santo André para serem felizes, nem mesmo
lazeres de ordem intelectual...” Conta-se que na sua
biblioteca se encontravam os mais diversos livros, inclusive
a História da Revolução francesa, de Thiers, História
do Brasil, de mais de um autor, História da Revolução
Mineira de 1842, etc. “Quando escrevia as suas cartas aos
políticos, nunca deixava de ter sobre a mesa um bom dici-onário e um bom compêndio de ortografia da língua portuguesa...”
Sempre preocupado com a formação intelectual
da família, dois de seus filhos foram enviados para
estudar no Rio de Janeiro e os outros foram para o Atheneu
de Diamantina e o Colégio de Mariana. As filhas tiveram
professores particulares na fazenda. “Muitos de seus
netos e bisnetos graduaram-se em ciência médicas, jurídicas
e matemáticas...”
Como político, o Cel. Sá foi sempre republicano. “Nunca pude entender - dizia ele - como é que um homem
pode herdar o direito de governar os outros.” Ele
acompanhava com cuidado a vida dos políticos brasileiros
e tinha, entre eles, acentuadas preferências. Admirava
Martinho Campos, até o dia em que ele se declarou
um escravocrata, depois dessa declaração, nunca mais
leu os seus discursos no parlamento. Grande admirador
de Theóphilo Ottoni, foi o Cel. Sá também um dos chefes
republicanos rebeldes, no sertão, em 1842. Fazia parte
desse grupo republicano mineiro, entre outros, Theóphilo
Ottoni, Antônio Felício, Cônego Marinho, Francisco
José de Sá, Major Domingos Pereira, Cônego Gonçalves
Chaves e João Soares da Costa.
Conta-se que certa vez, acolheu na fazenda do Brejo
de Santo André, muitos rebeldes, entre eles, o major
Antônio Felício dos Santos e Vaz Mourão, que vieram asilar-se na Fazenda do companheiro e correligionário do
sertão, o Cel. Sá, fugindo das forças legalistas da Monarquia,
que os perseguiam. Em consequência, foram mandados
um alferes e alguns soldados ao encalço do Cel. Sá,
que recebeu dos companheiros vários avisos para fugir. O
coronel se recusou a fugir e, não tardou muito, a escolta
entrou no pátio da sua fazenda. O Cel. Sá fez vir a sua
presença, o alferes, chefe da milícia e, mesmo sabendo que
vieram prendê-lo, indagou-lhe o motivo da longa viagem. “Viemos prendê-lo, Coronel” foi a resposta, mas o coronel
não se abalou, vendo o estado lastimável dele e dosoutros soldados, todos com péssima aparência, cansados
e famintos, pois não encontraram comida e abrigo ao longo
da viagem, de Ouro Preto à Fazenda do Brejo, porque,
por onde passavam, todos já estavam avisados de se tratar
de soldados que tinham por incumbência aprisionar o
Cel. Sá, chefe político respeitado e estimado em toda a
região. Assim, após ouvir o alferes, o Cel. Sá lhe respondeu
que isso ficaria para depois, que primeiro eles precisavam
tomar banho, jantar e descansar da longa viagem
que fizeram. Mandou preparar a alimentação e ofereceu
a eles hospedagem até que se refizessem para a viagem de
volta. Eles ficaram alguns dias na fazenda e, quando voltaram,
haviam esquecido a incumbência que os levaram à
fazenda do Cel. Sá.
Republicano convicto, Sua opção política era tão forte
que, por várias vezes, lhe foram oferecidas distinções honoríficas
pela Monarquia e ele, delas sempre recusou, dizendo
que não trocava o posto de coronel, o qual fora eleito,
referindo-se à organização militar que antecedeu à
Guarda Nacional, por cargos de nomeação. Depois de
velho não cuidou mais da política local, deixando essa incumbência
ao seu filho Carlos Sá, que, igualmente republicano,
como o pai, fundou no distrito de Santo Antônio
do Gorutuba, o único núcleo de eleitores republicanos que,
antes de 1888, votavam em candidatos republicanos a
cargos de representação popular. Este foi o primeiro colégio
eleitoral republicano fundado no Norte de Minas. “De
nenhum outro colégio eleitoral republicano havia notícia
no Norte de Minas.”
O Cel. Sá soube criar bem a sua família “... não foi
inútil o seu esforço quando, em longínquo sertão mineiro,
soube criar uma família, inspirando-se nas indefectíveis
leis da moral privada e social...” E, assim, teve o prazer de
ver a ascensão de muitos de seus descendentes na vida
social e política. “Teve ainda o Cel. Sá a fortuna de assistir à realização de um dos seus mais acariciados sonhos da mocidade, qual o de ver muitos de seus descendentes se
elevarem a altas posições sociais e figurarem entre os dirigentes
do país.” Ainda era vivo, quando seu filho Carlos
Sá foi eleito senador republicano e dois de seus netos, Francisco
Sá e Camillo Prates, eleitos para a Assembleia Provincial,
como deputados, o último no Congresso Constituinte
mineiro, tendo sido Francisco Sá deputado às Cortes
e estando à frente de uma secretaria de Estado no Governo
de Minas. Pena ter partido antes e não ter visto esse
neto que lhe trazia o nome ser considerado um competente
homem de Estado, à frente do Senado Federal, como parlamentar,
Ministro da Viação e Obras Públicas no governo de
Artur Bernardes e Ministro da Agricultura e Comércio no
governo Nilo Peçanha. Também não viu outro neto seu,
Alfredo Sá, eleito senador estadual e vice-presidente do Estado
e três de seus bisnetos, Francisco Sá Filho, Lincoln Prates
e Gudesteu Pires ocupando cadeiras na representação
nacional. No Poder Executivo Municipal alguns de seus
descendentes ocuparam cargos de Prefeito: Camillo Philinto
Prates, Montes Claros - MG (1890-1892); Gasparino Bittencourt
de Quadros Sá, Agudos - SP (1905 e 1925-1930);
Alpheu Gonçalves de Quadros, Montes Claros- MG (1942,
1947-1950 e 1955); Francisco de Sá Lessa, Rio de Janeiro-RJ (1955-1956); Antônio da Silva Maia, Juramento - MG
(1955); Francisco Durães Coutinho Sobrinho, Juramento-MG (1973); Marcelo Ferrante Maia, Glaucilância - MG
(1996-2000 e 2005-2012); Marilúcia Rodrigues Maia, Juramento
- MG (Vice-Prefeita 2009-2012) . Se vivo fosse,
teria o Cel. Sá visto que os seus esforços de homem honrado, ético e coerente com os seus princípios, ajudaram na
formação de pessoas que contribuíram com a política brasileira “... prestando serviços à sua pátria, que o Cel. Sá
tanto desejava ver respeitada e ilustre entre os povos.”.
Assim era o Cel. Sá, firme nas suas convicções e extremamente
bondoso e justo, tinha o espírito aberto às grandes
causas humanas. “Não obstante ter tido instrução ele nobre, os seus sentimentos grandemente humanitários, a
sua inata filantropia faziam com que todo o povo que circulavam
a sua fazenda, até grande distância, o estimasse
e respeitasse no mais alto grau.” Além de republicano, era
um abolicionista e teve a satisfação de ver decretada a
abolição da escravidão no Brasil e essa reforma já não encontrou
nenhum escravo na sua fazenda, pois libertara
todos, que continuaram residindo na fazenda, onde tinham
casa, mas trabalhando com salário e fazendo suas
próprias roças nas terras da fazenda, sem que o proprietário
dela lhes exigisse qualquer indenização. Assim como
plantavam, também criavam animais e alimentavam bem
as suas famílias. Teve o Cel. Sá a grata satisfação de ver
também proclamada a república, o sonho político que
norteou a sua existência e viveu ainda quase cinco anos
no novo regime, vindo a falecer no dia 14 de novembro de
1894, aos 92 anos.
(*) Trineta do Cel. Francisco José de Sá
A IDENTIDADE RELIGIOSA
EM FRANCISCO SÁ: AS FESTAS
DE SETEMBRO DO POVO
FRANCISCO-SAENSE
Maria Rejane R. Ruas Colares
Cadeira nº 26
Patrono: Cyro dos Anjos
RESUMO
O artigo se pautará em analisar a importância da
festa de setembro, enquanto movimento que celebra a
identidade do povo de Francisco Sá. Será trabalhado o
surgimento da festa e as influências que ela vem sofrendo
desde a sua criação. Como em inúmeras cidades espalhadas
pelo Brasil e pelo Norte de Minas, Francisco
Sá também é permeada por tradições, que foram resistindo às novidades do tempo. Dentre essas tradições temos
a famosa Festa de Setembro. No entanto, esta festa é de caráter religioso, ocorrendo então, a sintonia entre
Igreja e população para a sua realização. Onde se mostra
a sobrevivência das tradições e da cultura regional,
através de um festejo típico e singular na região. O objetivo
deste trabalho então é analisar a construção cultural
e de identidade em torno de uma festa tradicional
da cidade de Francisco Sá, e quais as influências e mudanças
ocorridas nessa festa com o passar dos anos.
Além de analisar o que mudou e o que permaneceu das
tradições. Demonstrando o quão importante é a formação
de identidade de um povo, onde os mesmos se identifica
com o meio cultural em que vive e nem sempre
irão romper esta linha em nome de uma tradição e de seus costumes.
1.1 BREVE HISTÓRICO DA CIDADE
DE FRANCISCO SÁ
Francisco Sá é uma cidade que se situa à região norte
do Estado de Minas Gerais, próximo ao Rio Verde Grande,
bacia do São Francisco. A cidade tem uma economia
baseada na pecuária, agricultura e comércio local.
Não existe um consenso sobre a origem da cidade,
mas admite-se que a mesma está ligada às expedições de
Fernão Dias, na tentativa de desbravar os sertões, por
volta do século XVII. Gonçalves Figueira que era um bandeirante
que acompanhava Fernão Dias, queria ligar suas
fazendas às regiões da Bahia. Assim, quando chegou à
região demarcou as terras ali existentes e as denominou
Cruz das Almas das Caatingas do Rio Verde, por ser um
dia de finados. Uma outra versão é a de que, em busca
de pedras preciosas muitos homens passavam pela cidade,
o que gerava a cobiça dos fazendeiros da região que
preparavam emboscadas para saquear as suas cargas,
então matavam os tropeiros e jogavam seus corpos na
lagoa ali próximo para evitar suspeita. Daí o nome de
Brejo das Almas.
Mas existem ainda outras possibilidades para esta
nomenclatura, como por exemplo porque o seu nascimento
se deu em uma localidade onde existia uma lagoa e próximo à mesma havia uma cruz fincada, deste modo a crendice
dizia que na região havia almas penadas.
De acordo com Olinto da Silveira no livro “Brejo
das Almas” no ano de 1760 o conde de Bobodela concede
uma carta de sesmarias ao major Antônio Gonçalves
da Silveira e sua esposa Maria Pereira. E de acordo com
o tipo de colonização praticada pelos portugueses, era
importante iniciar o povoamento através da construção
de uma capela, e assim foi feito em 1768, onde ergueram
a, em homenagem a São Gonçalo. Assim, foi chegando cada vez mais pessoas para povoar o lugar, e junto com
essas pessoas que faziam parte do povoamento da região,
no caso brancos, que vinham em busca de trabalho
e riquezas, os acompanhava também um grande número
de escravos.
Mas como a região era muito violenta, fato comum
nos sertões norte-mineiro, o major não consegue impor
controle sobre a região e seus herdeiros acabam por vendê-la ao Sargento–Mor Jerônimo Xavier de Souza, e com
este algumas famílias de Vila Rica também se estabelecem
na região, trazendo consigo mais negros, que reproduziam
na região as festividades de Vila Rica, “os negros, com recordação
de Vila Rica, do monarca, Chico Rei, vestiam-se seus
trajes típicos dançavam nesses dias festivos.”1 O que pode
vir a significar o surgimento das festas dos catopês na região.
As terras são distribuídas entre os acompanhantes
do sargento, onde nasceram várias fazendas e engenhos,
o pequeno povoado então irá se elevar ao posto de distrito
sob a jurisdição de Grão Mogol, por volta do ano de 1830.
Num primeiro momento o novo distrito irá se portar à Itacambira,
depois a Grão Mogol e por volta da década de
setenta do século XIX é anexado a Montes Claros, o que
irá facilitar a organização administrativa e comercial da
região, que ainda foi anexada com o nome de Brejo das
Almas. No entanto como podemos ver no decorrer da história,
esta situação irá se modificar e a região passa a receber
uma nova nomenclatura, desta vez em homenagem
ao ministro Francisco Sá.
“Pelo Decreto – Lei nº148 de 17 de dezembro de 1938, assinado
pelo Interventor Federal Benedito Valadares Ribeiro, o município
de Brejo das Almas passou a denominar-se Francisco Sá, tendo
como primeiro prefeito o Dr. Arthur Jardim de Castro Gomes. Esteé o breve histórico sobre a criação da cidade.2
A noção de cidade engloba a sua estrutura física e cultural, é onde as pessoas se reúnem, expressam os seus
desejos, os seus anseios e constroem a sua identidade, através
das suas tradições e dos seus costumes. Em Francisco
Sá não poderia ser diferente. E durante a sua formação
física, ou seja, a construção da cidade nasceu também a
tradição das Festas de Setembro ou Festa dos Catopês.
______________________________
1 SILVEIRA. Opadre velho. p.26.
1.2 NASCEUMA TRADIÇÃO:
FESTAS DE SETEMBRO
Não se sabe exatamente quando surgiram as festas
de Setembro na cidade de Francisco Sá. A festa na realidade
homenageia e saúda Nossa Senhora do Rosário, do
Divino Espírito Santo e São Benedito, acontecendo atualmente
juntamente com as comemorações do aniversário
da cidade, indo do dia 7 de setembro ao dia 10 do mesmo
mês. Logo que se tem notícias dessas comemorações, o seu
aspecto religioso se encontra em grande destaque, principalmente
nas homenagens aos santos, considerando que
a população ia para a festa com as cores de cada bandeira
no seu respectivo dia. “Assim, no primeiro dia, as mulheres
e as crianças vestiam roupas azuis. Os homens usavam
camisas da mesma cor. No segundo dia, o vermelho
das saias e das camisas coloriam as ruas. No terceiro e último dia, era a vez do rosa”.3 Hoje segundo a ex-secretária
de cultura e ex-vereadora da cidade de Francisco Sá,
Valda Vasconcelos, a festa “é época de reencontro entre
brejeiros, as Festas de Setembro ... tendo como principal
objetivo o resgate das tradições cívicas, folclóricas e religiosas”.
A festa então, toma outra conotação, saindo do
campo religioso e adentro em aspectos culturais, sociais e
cívicos. E ainda segundo ela as “Festas de Setembro, são
de fé religiosa, alegria e descontração.” Esta, portanto, é
uma festa de várias gerações e várias tradições, pois, aconteceu
em momentos diferentes da história da cidade. Sendo assim, no início
_____________________________
1 Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, pag. 165.
2 CAMPOS. Ventos e vivências no Brejo das Almas. p.66.
Quando os negros, como recordação de Vila Rica, do monarca
africano, “Chico – Rei “vestiam-se de trajes típicos, dançavam nas
ruas e escoltavam os “reinados” do Divino, de Nossa Senhora do
Rosário e Benedito. Esses catopês obedeciam ao comando do negro
velho Gonçalo Preto, o mais antigo capitão dos dançantes do
Brejo das Almas.
Deste modo, os costumes no decorrer da festa vão se
modificando, mas a tradição permanece. E para demonstrar
esses costumes com suas mudanças e permanências,
descreveremos abaixo os vários componentes das Festas de
Setembro, a começar pelas homenagens aos seus santos.
1.3 FESTADOSNEGROS:ACOROAÇÃODOREI
Devido ao processo de colonização e também da utilização
dos negros como escravos, acontece de modo significativo
o sincretismo religioso, entre as crenças dos africanos
e do catolicismo. Esse sincretismo começa a acontecer
desde a chegada dos europeus à África, e assim como
estratégia de catequese, o culto a santos negros, como
Nossa senhora do Rosário ganha destaque dentro do catecismo
perante a população africana. E assim também
acontecerá no Brasil, esse costume e devoção irá se alastrar
por praticamente todo o território nacional, dando
mais ênfase às tradições.
O culto de Nossa Senhora do Rosário fora criado por São Domingo
de Gusmão, mas estava fora de moda, sendo restabelecido justamente
na época em que os dominicanos enviaram seus primeiros
missionários para a África; daí, sua introdução e sua generalização
progressiva nos grupos escravizados. Estes fatos bem indicam
que o culto de santos negros ou de virgens negras foi, de início,
imposto de fora ao africano, como uma etapa de cristianização, e
que foi considerado pelo senhor branco como meio de controle
social, um instrumento de submissão do escravo.4
_______________________________
1 BATISTE apud COSTA. A festa dos catopês em Montes Claros. p.6.
Essa é uma das hipóteses sobre a relação de fé e
devoção entre os negros e Nossa Senhora do Rosário. Háainda outra possibilidade, que fala da aparição de uma
imagem da referida santa em Argel, e que assim se inicia
o processo de devoção trazido para o Brasil. Nesse sentido,
Nossa Senhora do Rosário é tida como a santa protetora
dos negros, fato transmitido oralmente de geração
em geração. Como é comum na tradição oral, as narrativas
se modificam na medida em que vão sendo contadas,
adquirindo novas conotações e características próprias
dos lugares. Por isso em Minas Gerais numa das
versões sobre este tema:
Diz uma lenda histórica, que certa época, Nossa Senhora do Rosário
apareceu sob as águas do mar. Imediatamente os caboclos, já
devotos da Santa Virgem através de catequeses de jesuítas, rezaram,
dançaram, cantaram, tocaram seus instrumentos, para que a
Santa Virgem viesse até eles. Mas ela não veio. Em seguida, os
Marujos, também devotos, foram até a praia, e empreenderam
sua tentativa de trazer a Virgem do Rosário até eles.5
Enfim, esta forte ligação com os santos negros também
traz para o Brasil o tradicional congado, que para
uns está ligado às lutas religiosas europeias da Idade
Média e para outros está associada a uma tradição luso -
afro-brasileira, onde “o catolicismo de Portugal forneceu
os elementos europeus da devoção à Senhora do Rosário,
a igreja no Brasil reforçou essa crença, enquanto
os negros, de posse desses ingredientes, deram forma ao
culto e à festa.”6 Então, o famoso congado que acontece
em várias partes do Brasil, iniciou do sincretismo cultural
e religioso entre brancos e negros, e ainda hoje é tradição
em regiões como Francisco Sá.
Outro personagem ligado à história do congado em
Minas, é Chico Rei, um africano que durante a festa de
Nossa Senhora do Rosário foi coroado rei, em menção à
tradição dos brancos em coroar os seus reis.
Francisco foi aprisionado com toda a sua tribo e vendido com ela, incluindo sua mulher, filhos e súditos. A mulher e todos os filhos
morreram o mar, menos um. Vieram os restantes para as minas de
Ouro Preto. Resignado à sorte, tida por costume na África, homem
inteligente trabalhou e forrou o filho ambos trabalharam e forraram
um compatrício; os três, um quarto, e assim por diante até
que, libera a tribo, passaram a forrar outros vizinhos da mesma
nação. Formaram, assim, em Vila Rica em Estado no Estado. Francisco
era o rei, seu filho o príncipe, a nora a princesa, e uma segunda
mulher, a rainha.7
_________________________________
1 GOMES; PEREIRA. Negras raízes mineiras: os arturos. p.102.
2 GOMES; PEREIRA. Negras raízes mineiras: os arturos. p.176.
Deste modo, pode-se perceber que a história do congado
está ligada a situações de repressão vivenciadas pelo
negro escravo, além de remeter ao seu passado glorioso
na mãe África, numa tentativa de reviver os momentos
em seus reinos. Nesses momentos em que elegiamumnovo
rei, era colocado em prática um ato de rememoração do
passado africano e também um momento de fé e adoração
aos santos católicos, demonstrando mais uma vez um
sincretismo religioso, numa tentativa de sobrevivência dos
costumes africanos aqui no Brasil. Não que fosse fácil realizar
esses ritos, no entanto, para se evitar maiores atritos
e rebeliões, o Estado acaba por conceder essa possibilidade
aos negros, sendo mais uma forma de controle sobre os
africanos e seus descendentes.
Este era, portanto, um momento em que podiam
manter suas tradições, sua organização social e também
política, na forma de coroação do seu rei, demonstrando
deste modo, a sua liderança. Onde também, podiam manifestar
as suas crenças através das músicas que saíam
dos seus instrumentos, sendo um momento de fé e permanência
cultural-religiosa.
A voz dos tambores, proibida no interior da igreja, soava nas ruas,
expressando ao seu môo as invocações ao santos. Éramos santos
da hagiologia católica desdobrados em outras significações, revestidas
da concepção mítica que remeti para o murmúrio íntimo dos
ancestrais.8
__________________________
1 GOMES; PEREIRA. Negras raízes mineiras: os arturos. p.35 - 36.
2 GOMES; PEREIRA. Negras raízes mineiras: os arturos. p. 92.
A permanência desses rituais é uma forma de manter viva a memória cultural de um povo, mas vai além,
pois, adquire nova conotação no decorrer do tempo e
hoje não remete somente a história do negro, mas também
a história do Brasil., com todos os seus conflitos sociais,
através das representações religiosas e culturais.
Principalmente através dos seus santos negros, neste caso
específico, Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e o
Divino Espírito Santo.
2.1 A FESTA NA CIDADE DE FRANCISCO SÁ
As Festas de Setembro, em Francisco Sá, tem início
no dia 7 de setembro, com o hasteamento da bandeira de
Nossa Senhora do Rosário e finda no dia 10 do mesmo
mês. Os catopês assumem vários compromissos no decorrer
da festa e quando têm início os reinados, eles participaram
dos hasteamento de bandeiras, participaram das
missas, das procissões, dos cortejos e dos almoços festivos.
Os ensaios que se iniciavam meses antes, atualmente não
contam a participação de todos os catopês, havendo alguns
que aparecem já no dia das comemorações.
Os catopês contam com pandeiros, tamborins, tamboril
e zabumbas como instrumentos musicais, que em sua
maioria ainda são produzidos pelos próprios integrantes.
2.2 A BANDEIRA
É o hasteamento da bandeira que marca o início da
festa. É o momento em que os catopês saem às ruas em
cortejo, usando trajes típicos, indo em direção à casa dos
mordomos para pegarem a bandeira, e chegando ao local
pedem licença cantando.
Ô dono da casa, vamos pedir a licença
Ô dono da casa, vamos pedir a licença
Vou pedir a licença senhora
Olé vamos senhora
Olêlê senhora, olêlê senhora.
E dando prosseguimento aos festejos, os catopês se dirigem à Matriz de São Gonçalo, que é o padroeiro da cidade,
onde será realizado o hasteamento da bandeira, o que dará
início oficialmente a festa. E seguindo este cortejo vai também
a bandeira do santo ou da santa do dia. No momento
em que a bandeira está sendo hasteada, mordomos, familiares,
convidados e catopês, em altas vozes anunciam:
Levantou, levantou
A bandeira do mastro levantou
Levantou, levantou
A bandeira do mastro levantou
Em seguida, os catopês dançam e cantam em torno
do mastro, a baraiada, que consiste em uma dança de
movimentos rápidos onde os catopês vão trocando sucessivamente
de lugar.
Baraiada menino baraiador
Quero ver você baraiar
Olé olá quer ver você baraia
Baraia um, baraia dois.
Quero ver você baraia
Olê olá quero ver você baraia
Baraia dois, baraia três.
Quero ver você baraia
Olê olá quero ver você baraia
Õ baraê olêlê, ô baraê olala
Logo após os integrantes dos catopês se dispersam
pela cidade, indo em direção à casa do seu mestre. Este
processo se dá com todas as bandeiras, a de Nossa Senhora
do Rosário, a do Divino Espírito Santo e a de São Benedito.
2.3 CHEGA O DIA DO REINADO
No dia seguinte ao hasteamento da bandeira, acontece
o reinado, exceto no caso do Divino Espírito Santo,
que se chama Império do Divino. Neste dia, por volta das
cinco horas da manhã as pessoas começam a se reunir
para iniciarem a alvorada, onde a comunidade é acordada
por fogos de artifício e partem em direção às ruas da
cidade cantarolando suas canções. No clarear do dia se guem para casa do festeiro onde será servido o tradicional
café da manhã. Nesse dia ainda, por volta do meio dia é
servido também um almoço a todos os participantes da festa.
Como os festeiros são pessoas abastadas financeiramente,
são eles próprios que custeiam o café da manhã, o almoço,
a decoração da igreja, das ruas por onde passam o cortejo
e também pela banda de música que o acompanha.
E como prêmio por todos esses gastos atualmente
são os próprios festeiros ou os seus filhos que são coroados
reis e rainhas da festa. E nesse trajeto em direção a casa
do festeiro vão entoando canções como:
Nós viemos, nós viemos, nós viemos
Nós viemos, com amor e alegria
Nós viemos para festejar
A virgem Santa Maria
E em direção à igreja onde acontecerá a missa cantam:
Lá vem o nosso rei
Com sua rainha ao pé
Lá mais atrás o pretinho de guiné
Os catopês organizam-se em fileiras e vestem-se com
camisas brancas e chapéus ornamentados com espelhos,
papel picado e fitas de cetim coloridas., o mestre se veste
de modo diferenciado e distinto, sob o comando dele os
catopês dançam e cantam fazendo reverência., saúdam a
bandeira. E seguindo os catopês, segue-se a corte em geral,
como o rei, a rainha, os príncipes e todos os outros,
relacionados ao santo ou santa do dia.
Em seguida o andor do santo é carregado, por homens
ou mulheres com roupas da mesma cor da bandeira,
sendo acompanhados pelo rei e pela rainha, logo atrás
vem o a banda de música e todo o cortejo.
À aproximação da igreja, os cantos se tornam mais
intensos, e exaltam o reinado:
Ô viva o rei, viva a rainha
Viva a coroa do nosso rei
Ô viva o rei, viva a rainha
Viva a coroa do nosso rei
Em seguida reverenciam o santo, como por exemplo
São Benedito.
Viva São Benedito que está no altar
Ele está me chamando eu vou lá
Viva São Benedito que está no altar
Ele está me chamando eu vou lá
Depois entram na igreja, seguidos pelo rei e rainha,
e durante a missa são convidados a reverenciarem mais
uma vez o santo, na frente do altar. Sendo uma missa especial
em homenagem ao santo.
Ô meu Divino, Espírito Santo
Ô meu Divino, Espírito Santo
É o santo, santo Deus
Meu Divino Espírito Santo
Ô meu Divino, Espírito Santo
Ô meu Divino, Espírito Santo
A frente do altar, cantam e dançam expressando sua
fé e encerram desta forma.
Viva o Espírito Santo
Viva São Benedito
Viva o dono da casa
Viva o nosso capitão
Viva o nosso suplente
Viva o nosso general
Viva o nosso comandante
Viva tudo quanto é bom
Viva Nossa Senhora do Rosário
Viva o mestre o batalhão
Viva quem já foi
Viva quem pode ser
Após a missa, se retiram na mesma alegria para o
local onde será servido o almoço. No mesmo dia ainda
acontece a procissão e para finalizar a coroação do rei e
da rainha do ano seguinte. No dia 7 acontece o hasteamento
da bandeira de Nossa Senhora do Rosário, no dia 8
a festa de aniversário da cidade, no dia 9 é hasteada a bandeira do Divino Espírito Santo e por fim no dia 10 a
bandeira a São Benedito. E na finalização levam o novo
rei e rainha as suas casas entoando:
Vamos dar a despedida
Como deu Santa Isabel
Olé, olé como deu Santa Isabel
Agora fica pro ano
Pro ano se Deus quiser
Olé olé pro se Deus quiser.
A festa então se finda quando são feitos todos os
agradecimentos aos santos e pedidos para que se encontrem
novamente no ano seguinte.
2.4 MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NAS
FESTAS DE SETEMBRO
Não se sabe exatamente quando as Festas de Setembro
tiveram início na cidade de Francisco Sá. Esta é também
a Festa dos Catopês. É o momento de expressar a fé,
de reencontrar os amigos, enfim, de reunir os habitantes e
os brejeiros ausentes para comemorar as tradições e os
costumes locais. É uma festa de cunho político, pois, coincide
com a data de aniversário da emancipação política
da cidade, no dia 8 de setembro e tem início no dia 7, com
o congraçamento dos brejeiros ausentes indo até o dia 10
do mesmo mês. Onde as Festas de Setembro possui uma
programação que envolve toda a população, havendo “cortejos
de Reinado, procissões, hasteamento de bandeias e
exposição de artesanato são a marca registrada do evento
e... o congraçamento dos brejeiros ausentes.”9
Na medida em que o tempo vai passando, novidades
vão sendo introduzidas na festa, não podendo dizer
que ela permanece igual às do passado, considerando que
a própria população se modificou, algumas pessoas se debandaram
para outras religiões e/ou seitas e não mais
participam da festa, outras não são assim tão religiosas e
preferem participar somente dos shows artísticos e do comércio, além de se considerar que a cidade cresceu e também
aumentou o número de visitantes e os festeiros já não
têm condições de custear grandes banquetes e um número
tão grande de pessoas, deste modo,
na atualidade vertiginosa em que vivemos, não mais se reveste do
brilho e animação dos tempos das “vacas gordas”, em que os
festeiros ofertavam a todo mundo banquetes grandiosos, regados
com muita bebida... e mesmo os catopês estão aos poucos desaparecendo.
Os seus tempos áureos, em que participavam o general
Gonçalo Preto, capitão Camilo, tenente Manuel Urubu, capitão
João Tomás, general Dodô, comandante do terno de São Benedito.
Existe ainda um pequeno grupo que a prefeitura ajuda apenas
para o sustento da tradição, porém, sem graça e o entusiasmo dos
velhos antecessores. Os atuais catopês são apenas um arremedo
dos primitivos.10
Através dessas falas, podemos perceber que a festa
foi se modificando e adquirindo novos contornos. Dentre
eles também podemos citar o fato de que os catopês já não
vão mais buscar os membros da corte em suas casas. Onde
eles alegam que isto se deu por causa de padre que reclamava
do atraso das missas e proibiu esta busca. E ainda
de acordo com a ex-vereadora e ex-secretária de cultura
do município, foram introduzidos novos elementos e outros
foram retirados.
O imperador do Divino era sorteado entre os homens de melhores
posses do município e não havia imperatriz. Realizavam-se sempre
por volta do meio dia na Igreja de São Gonçalo, onde o povo se
reunia para saber quem era o imperador do Divino do ano seguinte.
Os festeiros de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito não
eram sorteados, aqueles que o desejassem se apresentavam espontaneamente.
Nesses reinados havia príncipes, princesas, duques,
duquesas, juízes e juízas... os catopês levavam o reinado até
a porta da igreja e voltavam à casa o festeiro para almoçar. E
passavam a se reunir a partir do dia 13 de maio, todos os sábados
na casa do festeiro, até o dia da festa.11
E já pelos motivos citados acima, principalmente os
de ordem econômica, parte dessa realidade se modificou,
considerando que o número de catopês reduziu e os festeiros não possuem condições financeiras de custear um
período tão longo de comemorações, apesar dos mesmos
serem pessoas abastadas da sociedade franciscosaense.
_______________________________________________________
1 Arquivo Pessoal de Ana Valda Vasconcelos.
2 SILVEIRA. Minha terra e nossa história. p.262.
_________________________________________
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BARÃO DE JEQUITAÍ
Marilene Veloso Tófolo
Cadeira n° 95
Patrono: Terezinha Vasques
As terras de Minas Gerais,
no meio do sertão, são
palco de vidas criadas neste
rincão! Mais precisamente em
Várzea da Palma e Jequitaí,
onde os rios se encontram,
onde a mata rala, as cercanias
se descortinam, os animais
correm soltos, e as primeiras
pedras de cascalho aparecem
no rio. O título do Barão de
Jequitaí provém deste local,
onde possuía as suas terras,
bens e residiam os seus familiares.
Na época que os títulos
nobiliárquicos não eram
hereditários, as pessoas abastadas
os compravam na corte ou na guarda nacional.
O Barão de Jequitaí foi Cypriano de Medeiros Lima, era
Tenente- Coronel da Guarda Nacional. Conforme retificação
ao ANB no “Titulares do Império” por Carlos G.
Rheingantz, RJ 1960, páginas 112 a 121, o nome correto
era Cipriano de Morais Lima, nascido em 1829, falecendo
posteriormente em 1891.
Aí começa a minha história, entre fatos, contos e lendas
de homens e mulheres que habitavam por esses Gerais a fora. Em segundas núpcias, Antônio da Silva Maia,
casou-se com Rita de Medeiros, filha do Barão de Jequitaí.
A família Maia II origina-se de aí e depois se ramifica para
Montes Claros. Domitília Maia casou-se com Jacinto Veloso,
iniciando-se a ligação entre as famílias Veloso e Maia.
Volto às raízes, pela atração que sinto pelo garimpo, pelos
engenhos, pela vida do campo, pelas atividades rurais,
principalmente as ligadas a terra, ao plantio e a criação
de animais. O campo não sai da nossa vida por mais que a
gente procure a cidade grande, leva na sua bagagem a
origem rural.
O ar do campo, a chuva que cai devagar ou forte, o
pássaro que canta, o rio que corre, as nuvens que formam
figuras no céu, a viola que corta a noite escura com seus
gemidos, a alegria e a tristeza do caboclo moram no meu
coração... Gosto das coisas simples, dos dias de sol, da
chuva, da lua cheia, do vento, das matas fechadas, e da
vida do sertão!
Quem foi o Barão de Jequitaí? Foi um ancestral que
morou no campo, adquiriu um título na corte, fez do seu
garimpo a sua vida e a sua riqueza. Acumulou terras, reses,
casas, brilhantes dos rios que os cercavam! A pedra
preciosa era a cobiça de muitos que iam vendê-la na corte,
montados no burro e levada dentro do embornal (bolsa de
pano)... O brilho das pedras fascinou e levou muitos a
morte...
Ao olhar o brilhante no meu dedo, o meu pensamento
vai ao longe e vejo toda a trajetória que o trouxe a
mim, os caminhos que percorreu e os percalços do caminho!
Vejo o uniforme do Barão, o seu bigode, colete, chapéu
e botinas, sentado na varanda esperando os homens
voltarem do garimpo... Os olhos brilhantes e faiscantes com
a pedra alegram-se com o colono que as trazem junto à
lama e a solidão do sertão! Quanto sacrifício para achar
uma pedra e quantas vidas custou no passado!
A pedra branca e faiscante brilha indiferente aos sacrifícios dos colonos, e a figura do Barão de Jequitaí esfuma-se em uma visão, nos olhos do passado junto a um
retrato apagado pelo tempo, mas o brilhante permanece
inalterado!
Valeu a pena o sacrifício? Penso, medito, questiono,
vale a pena dar tanto valor a uma pedra? Olho para ela
que faísca, indiferente a tudo, não questionando o garimpo
do Barão!
PRAÇA CEL. RIBEIRO
Palmyra Santos Oliveira
Cadeira nº 64
Patrono: José Gomes de Oliveira
Antigamente, essa praça se chamava Largo São Sebastião,
depois passou a chamar-se Praça Cel. Ribeiro.
Ali, no dia 2 de abril de 1920, nasci no chalé nº 19,
especialmente construído para o evento. Antigamente, a
praça era de terra cheia de buracos feitos pela erosão das águas que desciam do Cecé, em enxurradas, nas quais colocávamos
nossos barquinhos de papel, que singravam as águas até o rio da fábrica. A praça já foi lugar de footing
para moças e rapazes que se encontravam e depois de um
flerte, começavam o namoro. Hoje, é uma praça limpa, com
jardim, cuidada pela municipalidade, cheia de carros, com
dois pontos de ônibus, que percorrem a cidade.
O nosso quintal era muito grande onde se plantaram
flores, verdura, milho, feijão, mangueiras e laranjeiras.
Tinha um pé de magnólia que, quando floria, exalava
um perfume delicioso, e dois pés de bananinha de macaco,
além de outras árvores.
Anos mais tarde meu pai vendeu uma parte para o
Sr. Genesco Veloso, outra parte para o Sr. Juca de Chichico,
e lá foi construído o Hotel São José, que depois foi alugado
para o senhor Romano.
Naquele tempo, onde foi o Diretório dos Estudantes,
na esquina com a Rua Barão do Rio Branco, era a casa do
Sr. Clemente Moreira, pai de Sinhá, Iracema, Bela, João e
Geraldina. Ele era viúvo e trabalhava na prefeitura. Ao lado morou o Sr. Joãozinho Gonçalves e sua esposa D.
Honorina de Quadros, pais do Dr. Alfeu Gonçalves de
Quadros que foi prefeito de Montes Claros. Eles tinham
um filho adolescente, o José que na fazenda, caiu de um
cavalo e morreu.
Nessa casa tempos depois, morou o Dr. Ruy Braga,
odontólogo, com sua esposa Lígia. Hoje, no local, existe
um estacionamento de carros. A casa da outra esquina
com a Rua Bocaiúva, pertencia à professora Dulce Sarmento,
hoje é lugar abençoado, casa de oração, visitas ao
Santíssimo Sacramento.
Onde era o Cine Coronel Ribeiro, foi casa de orações
e hoje abriga uma instituição educacional. Na esquina com
a Rua João Souto havia um chalé na década de trinta que
era a casa do Sr. Mariano, um presbiteriano, e havia pregações
de sua igreja.
Antes, foi casa de D. Ladu Prates Guimarães, mãe
de Maninha, Bejé, Telê e outras crianças amigas. Naquela, hoje, há uma casa comercial onde se vendem mercadorias
populares. Na outra esquina com Rua Tiradentes era
a casa de Sá Coleta. No dia dois de fevereiro havia reza
em sua casa e cada pessoa saía com uma lamparina de
azeite com o pavio aceso, cantando, e seguia até os pés do
cruzeiro e a depositava lá, nas pedras. Essa lamparina era
uma vasilha de barro com um cabinho. No dia seguinte,
minha amiga Efigênia Câmara e eu, crianças, íamos lá
pegar quantas panelinhas pudéssemos para fazer guisados,
que muitas vezes não passavam de terra com água.
Anos depois, nessa casa de Sá Coleta, funcionou uma venda
do meu tio Tião, que vendia “Secos e Molhados”. como
se dizia na época. Um dia chegou um freguês e pediu:
_ Sr. Sebastião Gomes, me dá um bate?
(Bate era uma certa porção de cachaça)
O meu tio, bem nervoso, batendo com força, as mãos
no balcão disse:
_ Cê qué bate, cê que bate? Gomes é meu irmão rico.”
– ele se referia ao meu pai, Manoel Gomes.
O freguês saiu tão assustado que nunca mais voltou à venda do meu tio.
Anos depois, na casa de Sá Coleta funcionou uma
farmácia do meu primo Amândio José de Carvalho. Atualmente,
estão construindo um prédio de muitos andares.
Ao lado ficava a casa da Sr. Pio, fazendeiro. Aí, depois,
foi a casa dos fogões.
Situava, logo após, a casa do Sr. Arcelino Ribeiro da
Cruz, que era esposo de Dona Pomba, que penteava o
cabelo com um coque no meio da cabeça. Eram pais de
Benjamim e Brasiliano, e avós de Cida, Carmélia, Alciliano,
Mariinha e Geraldinha, minhas amigas, filhas de Tininho,
porteiro da Escola Normal. Hoje, é estacionamento
de carros. Na esquina, moravam os meus tios Ulisses Pereira
e Maria Antonieta, irmã da minha mãe. Seu quintal
era um jardim florido.
Na outra esquina, com a Rua Barão do Rio Branco, morava D. Mariquinha Serradeira, tia da minha amiga
Gelisa de Figueiredo Brandão. Morou também nessa casa
D. Caçula Mendes, de Porteirinha, mãe do ex-prefeito
Alcides Mendes da Silva. Ali, depois, funcionou o escritório
do advogado Antônio Eustáquio Tolentino, também
ex-prefeito de Porteirinha.
Na esquina seguinte, morava o Sr. Leonides de Andrade
Câmara, o Coló, escrivão do crime, esposo de Glicéria
Cardoso Câmara, minha querida Cera, mãe de Laís,
Evandro, Efigênia, Décio, Antônio, Maria Aparecida, Aideé
e Ester, Depois, era a casa dos meus pais, Manuel
Gomes de Oliveira e Laura Pereira dos Santos, o chalé que
foi demolido em 2011.
No centro da praça ficava o pluviômetro, em que
Joaninha, mãe de Inês e de Sinhá olhava quanto havia
chovido.
DISCURSO DE POSSE NO HISTITUTO
HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE MINAS
GERAIS, CADEIRA Nº 85,
PRONUNCIADO NO DIA 23
DE NOVEMBRO DE 2013
Petrônio Braz
Cadeira nº 18
Patrono: Brasiliano Braz
Conhecia o Instituto Histórico e Geográfico de Minas
Gerais, mas era um conhecimento distante. Ocorreu
que, na Fazenda Cabangu, quando me foi outorgada a
Medalha “Santos Dumont”, em 2007, assentei-me ao lado
da ilustre professora Regina Almeida, mineira de São João
do Paraíso, também homenageada, no aguardo dos atos
oficiais da outorga. Ali principiamos uma amizade e conversamos
muito.
Para minha surpresa, algum tempo depois, recebi
da professora Regina Almeida uma correspondência informando-me que havia indicado o meu nome para integrar,
como sócio correspondente, o corpo desta Casa de
Cultura e pediu-me as informações e documentos complementares
necessários.
O convite emocionou-me. À força de tanto imaginar,
fui transportado a outra dimensão como o cavaleiro
de Cervantes. Iria eu participar, por um convite não buscado,
do seleto corpo de luminares da respeitável Casa de
João Pinheiro.
João Pinheiro, para os meus guardados da memória,
era a próspera cidade mineira onde residi por quatro
anos de boas recordações, exercendo as funções do cargode Secretário Geral da Prefeitura Municipal, na administração
do Dr. João Batista Franco, nos anos setenta do século
passado. Não existia de plano, em minha consciência,
uma relação presente entre o nome e o homem – este
um dos mais importantes brasileiros de todos os tempos.
Regularmente investido como sócio correspondente,
ingressei nesta Casa hesitante. Aqui fiz amizades inestimáveis,
e adquiri saberes que não se podem enumerar.
O enaltecido professor Zanoni Eustáquio Roque Neves
já era meu conhecido, com quem tenho uma convivência
fraterna. Membro fundador, como eu, da Academia
de Letras, Ciências e Artes do São Francisco, ele é um
cultor das letras, das artes e das ciências. A sua biografia,
o valor de seu trabalho está parcialmente gravado no sítio
eletrônico da Academia e dele extrai-se que ele “nasceu
na cidade de Pirapora”, nas barrancas do Velho Chico, “o grande caminho da civilização brasileira”, como definido
pelo historiador João Ribeiro e atestado por Euclides
da Cunha.
No convívio desta Casa, ressalto a reverência a mim
deferida pelo presidente emérito professor Herbert Sardinha
Pinto. Foi ele o patrono de minha indicação como sócio
efetivo e quem levou o meu nome ao Plenário da Casa. É mister, portanto, que eu relate uma pequena coincidência,
que eu, a essa altura da vida, credito mais à providência
amiga que mero gesto do acaso.
Eu viera para demandar informações sobre a minha
posse e, sem que houvéssemos combinado, encontrei-me
com o professor Sardinha nas escadas de acesso a esta
Casa. Disse-me ele que não havia programado sua vinda
naquele dia, mas uma força inexplicável o havia conduzido
até ali.
Conversávamos sobre a posse, quando ele me perguntou
quem, entre os sócios efetivos, iria fazer a minha
apresentação e eu disse que ficaria honrado se o professor
Zanoni Neves aceitasse a incumbência. Mal acabara de pronunciar seu nome e eis que aparece, na porta da sala,
a pessoa do meu ilustrado amigo Zanoni Neves! Tinha que
acontecer, porque já estava escrito no Livro do Destino,
como querem os sectários do islamismo, essa misteriosa
força que governa o mundo.
Doutos membros da Mesa.
Da estrutura organizacional do Instituto coube-me,
por escolha entre as poucas Cadeiras vagas, a de nº 85,
que tem como patrono Álvaro Astolfo da Silveira e antecessores
Simeão Ribeiro Pires e Edir Carvalho Tenório, três
insignes imortais. Eles nos fazem cientes de que “só temos
uma vida, mas podemos ficar na História”.
Dizem que são imortais os que integram um sodalício
cultural. São imortais os que somam valores pessoais a
feitos que os distinguem, entre os comuns. E são imortais
porque sublinharam suas passagens na história de um lugar,
de um povo, de uma instituição, por isso serão sempre
lembrados.
A imortalidade depende, conforme sabemos, de atos
ou de fatos. Para tornar-se imortal, Zeus, ao nascer, pediu
a Hermes que o levasse para junto do seio de Hera, quando
esta dormia, e o fizesse mamar. O leite divinal concedeu
a Zeus o poder de ser grande entre os grandes.
Em relação similar, são imortais os humanos que
sorveram o leite de Atena, a deusa grega da sabedoria.
Como repete uma máxima: “A morte não é para sempre;
só morre o que se esquece”. A imortalidade, assim, se
constitui não pelo acaso, mas pela memória de uma existência,
que deixou marcas particularizantes.
Lembrando-me de Érico Veríssimo, em “Caminhos
Cruzados”, reconheço que o tempo passa, as pessoas envelhecem,
mas seus escritos os perpetuam. As pessoas nascem,
sofrem e morrem, cumprindo um ciclo natural; mas
há as que nascem, realizam e eternizam-se. A arte, caros
senhores e senhoras, é um meio de eternizar o homem.
O renomado escritor Eça de Queirós no “Prefácio dos Azulejos do Conde de Arnoso” sentencia: “A arte é
tudo - tudo o resto é nada. Só um livro é capaz de fazer a
eternidade de um povo. Leônidas ou Péricles não bastariam
para que a velha Grécia ainda vivesse, nova e radiosa,
nos nossos espíritos: foi-lhe preciso ter Aristófanes e Ésquilo.
Tudo é efêmero e oco nas sociedades - sobretudo o
que nelas mais nos deslumbra. Podes-me tu dizer quem
foram, no tempo de Shakespeare, os grandes banqueiros e
as formosas mulheres? Onde estão os sacos de ouro deles
e o rolar do seu luxo? Onde estão os olhos claros delas?
Onde estão as rosas de York que floriram então? Mas
Shakespeare está realmente tão vivo como quando, no estreito
tablado do Globe, ele dependurava a lanterna que
devia ser a Lua, triste e amorosamente invocada, alumiando
o jardim dos Capuletos. Está vivo de uma vida melhor,
porque o seu espírito fulge com um sereno e contínuo
esplendor, sem que o perturbem mais as humilhantes
misérias da carne!”.
Desta forma, o professor Álvaro Astolfo da Silveira,
está vivo, sem que o perturbem as misérias da carne. Como
Patrono, ilumina para sempre a Cadeira nº 85 da Casa de
João Pinheiro.
Ele é mineiro de Passos, de família ilustre, onde nasceu
em 1867, na vigência plena do glorioso Império brasileiro.
Engenheiro pela Escola de Minas de Ouro Preto ocupou,
já no início de sua carreira profissional, a partir de
1892, as funções de geólogo da Estrada de Ferro Central
do Brasil. Mas ele não foi uma pessoa acomodada e alçou
voos mais altos. Já em 1895 era ele Chefe da Comissão
Geográfica de Minas Gerais. Foi diretor da Imprensa Oficial
entre os anos de 1904 a 1907, para logo depois assumir
a chefia técnica da Diretoria de Agricultura do Estado,
tendo se aposentado, em 1931, como Diretor da Comissão
Geográfica e Geológica de Minas Gerais.
Homem das letras, botânico, geólogo e naturalista, intelectual
de larga visão e competência cultural, publicou várias obras técnicas e literárias, escritas a mão, com o uso
da caneta tinteiro. Tantas que seria cansativo enumerar.
Ele foi membro da Academia Mineira de Letras, da qual
foi presidente, reeleito por três mandatos, entre 1915 e 1920, e é Patrono da Cadeira nº 85 do Instituto Histórico e Geográfico
de Minas Gerais, tornando-se duplamente imortal.
Segundo a valorosa lição de Machado de Assis,emmensagem
no Livro de Ouro, em homenagem a Eduardo Lemos: “uma palavra é pouco, para dizer o que ele merece; uma linha é demais”. E declara o mestre da língua pátria que, se não
pudermos dizer tudo, é preferível o aperto de mão.
Não posso, entretanto, apertar a mão de Álvaro Astolfo
da Silveira. Mas sou capaz de conhecer seus feitos e
sua história. E posso ler a letra que traçou em seus livros,
seu acento eterno na História de Minas Gerais.
Hoje estou eu aqui, na simplicidade de um mineiro
do Norte. Trago ao convívio dos ínclitos confrades e confreiras
a fala de um sertanejo que, por um processo hipocorístico
de simplificação, diz cosca em lugar de cócegas,
toá em vez de tauá, abobra em lugar de abóbora; um sertanejo
que, guardando a forma do português arcaico, diz
menhã em vez de manhã, somana em lugar de semana,
guaiaba, em lugar de goiaba, vocábulos que guardam a
grafia anterior ao metaplasmo por dissimilação vocálica;
que fala coresma, em lugar de quaresma; que usa como
advérbio a terceira pessoa do singular do presente do indicativo
do verbo andar: andou que cai – quase cai; que
diz pé-de-manga e pé-de-laranja, em lugar de mangueira
ou laranjeira.
Esse homem rude e de vocabulário pitoresco, por
meio de uma evolução semântica inconsciente, emprega
acesso, ingresso, chegada, com a acepção de convulsão,
síncope, ataque epiléptico; açoitar, que significa bater, fustigar,
com o sentido de tanger longe, arremessar; que diz
barrear, atravessar com barras, para indicar o romper do
dia, a aurora; que se utiliza do verbete remeter, mandar, enviar, para indicar o ato de chifrar, agredir com os chifres;
que transformou o verbo pensar, fazer reflexões, refletir,
raciocinar em aplicação local de remédio em ferida;
que se utiliza do verbo delatar, denunciar alguém como
autor de um crime, com o significado de demorar, retardar;
para quem romper, fazer em pedaços, rasgar, é começar
a andar, seguir em frente.
Assim, chego falando a linguagem do povo do Norte
de Minas, experiente em anos e leituras, mas “rompendo
em frente”, com entusiasmo de menino novo. Como afirmou
José Lins do Rego em seu discurso de posse na Academia
Brasileira de Letras, “não me complicarão a sintaxe a
presença de sábios e os rigores dos que manejam o estilo”.
Esse momento conforta-me, pois o que fiz na construção
de uma vida não foi em vão. Esse momento, reportando
novamente às palavras de Machado de Assis, é “a
gloria que fica, eleva, honra e consola”.
E quem seria eu, se não me lembrasse daqueles a
quem amei e amo? Meus pais Brasiliano Braz e Maria
Augusta, no silêncio de seus jazigos, estão sorrindo. Minha
esposa, meus filhos, netos e bisnetos estão eufóricos.
Meus amigos estão felizes. Eu, entre tantas emoções da
hora, sinto-me acalentado pela lembrança, exaltado pela
honraria, emocionado por frequentar esta casa ao lado
dos que são grandes!
Senhores e senhoras,
Que nome devemos dar ao orgulho sem vaidades
vãs, às alegrias maiores, à comoção verdadeira? Podem
faltar palavras a esse sertanejo simples, mas orgulhoso,
mas não me falta a consciência de que são momentos como
este que tecem o fio comprido da vida e que devo vivê-lo
segundo os princípios de Horácio: carpe diem quam minimum
credula postero.
Há dias, como afirmou Emerson, “em que o mundo
alcança a perfeição, quando o ar, os corpos celestes e a
Terra estão em harmonia, como se a Natureza se regozi jasse com os seus filhos”. Hoje é um desses dias dos ensinamentos
de Alexandre Graham Bell extrai-se: “Nunca
ande pelo caminho traçado, pois ele conduz somente até
onde outros foram”. Mas, certamente que o bom caminho
poderá nos levar às outras diretrizes!
Pela Cadeira nº 85, que doravante ocuparei, passaram
dois nomes ilustres: Simeão Ribeiro Pires e Edir Carvalho
Tenório. Humildemente pergunto-lhes: Como deixar
de seguir seus passos? Que eu possa pisar suas pegadas
e servir-me de suas caminhadas...
Senhor Presidente,
A terra de Montes Claros, celeiro de cultores das letras,
deu a Minas e ao Brasil a figura ímpar de Simeão
Ribeiro Pires, um dos fundadores da nossa Academia
Montesclarense de Letras.
Ele diplomou-se em Engenharia Civil pela Faculdade
de Engenharia da Universidade Estadual de Minas
Gerais, em 1943. Foi presidente do Diretório dos Estudantes
de Engenharia, Aspirante Oficial do Exército pelo CPOR.
Premiado na Convenção Nacional de Engenheiros com a
monografia “Ensino da Engenharia”. Ocupou o cargo de
Oficial Técnico da Rede Mineira de Viação.
Recebeu, dentre outras, as comendas: Medalha de
Ouro – Mérito Industrial – da Federação das Indústrias de
Minas Gerais no ano de 1967 e a Medalha da Inconfidência
do Governo do Estado de Minas Gerais. Professor por
concurso público na Escola Estadual “Prof. Plínio Ribeiro”
de Montes Claros e foi professor de Estudos de Problemas
Brasileiros da Faculdade de Direito de Montes Claros.
Homem de elevado espírito público, grande tribuno.
Foi diretor do Colégio Tiradentes da Polícia Minas de Minas
Gerais no ano de 1964,
Como pecuarista foi diretor do Frigonorte. Como
político foi prefeito e vereador em Montes Claros, sendo
uma das principais personalidades da história do Município.
Como pesquisador, dedicou sua atenção ao passado da região norte-mineira, que Wanderlino Arruda qualifica
como “de sonhos e de sonhadores”.
Ele é Patrono da Cadeira nº 93 do Instituto Histórico e
Geográfico de Montes Claros, a Casa de Simeão Ribeiro Pires.
Sinto-me culturalmente realizado ao ocupar, nesta
Casa, lugar por ele anteriormente honrado.
Não conheci Edir Carvalho Tenório, mas para se
conhecer seu valor não há necessidade de ter conhecido o
homem.
Verifico, pelo seu currículo que integra os anais desta
Casa, que ele internacionalizou-se com Mestrado na
Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, mas foi,
principalmente, um brasileiro, um mineiro.
Ele integra a Galeria dos Imortais da Academia de
Letras do Brasil – Seccional do Estado de Minas Gerais,
onde foi empossado in memoriam. Exerceu inúmeras atividades
públicas e privadas, mas foi, antes de tudo, poeta,
Sócio efetivo desta Casa, empossado em 7 de abril
de 2001, e da Arcádia de Minas Gerais, empossado em 4
de dezembro de 2002.
Senhor Presidente,
Entre tantos a agradecer, expresso minha gratidão,
com especial reverência, à professora Regina Almeida, ao
professor Herbert Sardinha Pinto e ao professor Zanoni
Eustáquio Roque Neves. À primeira por ter aberto para
mim as portas desta Casa. Ao segundo, pela demonstrada
consideração ao indicar meu nome para integrar a gloriosa
Casa de João Pinheiro como sócio efetivo e, ao terceiro,
pelas inolvidáveis palavras com que me fez conhecido
pelo seleto corpo desta Casa.
Aos amigos, que me honraram com suas preciosas
presenças, o meu “muito obrigado”.
Aos parentes que aqui estão a “minha benção”.
Aos confrades presentes os meus respeitos e a minha
consideração.
Na pessoa de Cássia Maria, o meu abraço fraterno aos atenciosos servidores da Casa.
Estejam certos de que vim para aprender, mas, certamente,
alguma coisa tenho a oferecer. Sinto-me afetivamente
acolhido por todos os presentes e por isso, antes de
tudo, devo dizer que hoje estou aqui, confirmando um dito
euclidiano: como um sertanejo forte.
Freud já observara: “Como fica forte uma pessoa
quando está segura de ser amada!” Esse amor justifica tudo.
Muito obrigado.
O GLAMOUR DOS CASSINOS
Ronaldo José de Almeida
Cadeira nº 25
Patrono: Corbiniano R Aquino
O ambiente era de alegria, salão repleto de luzes, orquestra
ao fundo, brilho de cristais por todo lado. O crupiê
distribuindo fichas sobre o pano verde, cercado de mulheres
bonitas em longos vestidos e homens de black-tie. Era
inegável o glamour dos cassinos. Como num lance de roleta,
o presidente Dutra decretou o fim do jogo e a era de ouro
dos cassinos no Brasil.
Cerca de cem países permitem o funcionamento de
casas de jogos. Neles, os cassinos representam uma das
maiores forças de atração de visitantes, verdadeiros catalisadores
do crescimento da indústria turística.
Cassinos funcionam em quase toda a Europa. O Principado
de Mônaco se tornou um grande centro financeiro
e de lazer graças aos jogos de azar. Aruba, pequena ilha
do Caribe, é hoje a meca do turismo americano, com atividades
voltadas aos jogos. Na Europa, na famosa Côte
D’Azur, destacam-se os cassinos de Monte Carlo, na Riviera
francesa, e o de San Remo, na Riviera italiana.
A cidade de Veneza também abriga famosos cassinos.
Na América do Sul, os cassinos mais conhecidos se situam
no Uruguai, Argentina, Paraguai. Chile, Equador e
Venezuela, sendo frequentados por milhares de brasileiros.
O Cassino da Urca, no Rio de Janeiro, foi o mais conhecido
de todos, tendo recebido as maiores atrações
musicais da época, de Carmen Miranda e Dalva de Oliveira
a Edith Piaf, Amália Rodrigues e Tony Bennett.
O edifício à beira-mar onde funcionava foi construído
na década de 1920 para ser um hotel. Em 1933, com a
regulamentação do jogo, foi transformado no mais famoso
cassino do país.
Durante o período de liberação do jogo o Cassino da
Urca foi o centro da vida noturna do Rio de Janeiro, com trânsito
livre de artistas, políticos, homens de negócios, intelectuais
e turistas. Diga-se de passagem, uma atração à parte.
O Cassino Atlântico, no Posto Seis, rivalizava em luxo
com o Cassino da Urca. Possuía palco giratório e as belas
coristas se alternavam com os grandes nomes da música
popular brasileira, artistas que faziam sucesso nas rádios.
Lá se apresentavam Emilinha Borba, Dircinha Baptista,
Grande Otelo, Francisco Alves e outros monstros
sagrados do Brasil. Estrelas internacionais em passagem
pelo Rio marcaram sua presença na plateia como Henry
Fonda e Orson Welles.
No bairro de Copacabana, dois grandes cassinos fizeram
história; o Cassino Copacabana, localizado nas
dependências do Hotel Copacabana Palace, era destinado
a sociedade carioca.
Em Petrópolis, na serra fluminense, surgiu o maior
cassino-hotel da América do Sul, o Quitandinha. Com
característica dos cassinos europeus, seu teatro, com três
palcos giratórios, tinha capacidade para 2 mil pessoas.
Na cidade de Guarujá, litoral paulista, o Hotel Cassino
La Plage, era frequentado por magnatas paulistanos,
personalidades nacionais e internacionais. Uma curiosidade;
foi num dos quartos do La Plage que o inventor
Alberto Santos-Dumont tirou a própria vida, em 1932.
No dia 30 de abril de 1946, o presidente Dutra assinou
o decreto-lei que proibiu o funcionamento de cassinos
em todo o país. Desempregou milhares de brasileiros
com uma canetada. A notícia do decreto causou estupefação
geral. Segundo comentários da época e que ainda
hoje frequenta o imaginário popular, o decreto se deu por força e graça da esposa do presidente, dona Santinha, uma
beata, mas que, ditava as ordens e o marido cumpria de
cabeça baixa.
O presidente teria assinado o decreto-lei atendendo às pressões da mulher, que considerava os cassinos verdadeiros
antros do pecado e a casa do demônio, segundo
suas palavras.
O Brasil possuía cerca de setenta cassinos em atividade,
e o ato desempregou milhares de brasileiros com
uma simples canetada.
Após a publicação do decreto, dois desempregados
cometeram suicídio em plena Avenida Rio Branco, no centro
do Rio Janeiro. Na classe artística o desespero era geral.
Atores, dançarinos, comediantes, músicos, cantores,
coristas, cenógrafos e técnicos perderam para sempre grandes
oportunidades profissionais.
O Cassino da Urca continuou por algum tempo
como casa de shows, em seguida serviu de sede para a
extinta TV Tupi. Tombado, o prédio aguarda as obras para
sua transformação em museu.
O grupo musical que se apresentava no Cassino da
Urca, chamado Os 3 Carijós, esteve em Montes Claros,
sob contrato, para inauguração da Rádio ZYD-7, carinhosamente
chamada de A Furiosa.
Um dos integrantes do conjunto musical, passeando
pela cidade, conheceu uma estudante do Colégio Imaculada,
iniciando um namoro que rapidamente chegou
ao casamento, e por aqui ficou, constituindo numerosa
família. Nunca mais retornou a cidade maravilhosa. Capricho
do destino!
Fonte: “Nossa História”, Janne Santucci.
NA FASE DOS “BATE PAUS”
Ruth Tupinambá Graça
Cadeira nº 96
Patrono: Tobias Leal Tupinambá
Os montes-clarenses de hoje não são capazes de avaliar
o que foi a nossa cidade nos anos 30.
Hoje vivem medrosos, aflitos e preocupados com a
violência e os crimes absurdos em decorrência do tráfico
de drogas. Mas não sabem que a nossa cidade, no seu
passado, foi vítima de violências terríveis, iguais às de hoje,
talvez piores.
Tudo aconteceu depois da terrível tragédia de 6 de
fevereiro de 1930, quando os jagunços de Dona Tiburtina
(a seu mando) atacaram a comitiva do Dr. Fernando de
Melo Viana, Vice–presidente da República, que veio a nossa
cidade fazer política, almejando a Presidência, anunciando
um grande comício, tudo apoiado com muito entusiasmo
pelos adversários da Aliança Liberal, da qual
Dona Tiburtina era a forte correligionária.
Embora eu morasse bem perto da Estação Ferroviária,
apesar da minha vontade de acompanhar a comitiva,
eu não fui. O pai da amiga Alaíde, o Sr. Arthur Amorim,
nos preveniu: “vocês não vão descer acompanhando a
comitiva. Fui avisado por um amigo que haverá tiroteio
(caso haja provocação). Os jagunços já estão prevenidos”.
Foi a minha sorte.
Quando a comitiva passava em frente à casa da
Dona Tiburtina, os jagunços de cima das árvores, armados,
dispararam suas carabinas sobre a multidão. O desespero
foi total. Dr. João Alves gritava: “não atirem! Há crianças e mulheres”, mas já era tarde. Nunca saberemos
ao certo se houve alguma provocação. O fato é que os jagunços
obedeceram o mandado.
Sabemos que morreram várias pessoas, inclusive o
Secretário do Dr. Melo Viana, Dr. Fleury da Rocha, Yracy
de Oliveira Novais (Irmã de Jair Oliveira), o jornalista João
S. da Silva, mas há dúvidas sobre o número de mortos,
pois para o comício tinha vindo muitos políticos e pessoas
das cidades vizinhas. Supõe–se que talvez algum tenha
sido vítima desta monstruosidade. Talvez esta suposição
tenha fundamento por que na construção da sede do
Automóvel Clube de Montes Claros, justamente no local
onde fora a residência da Dona Tiburtina, houve um boato:
que nas escavações encontraram uma cisterna cheia
de esqueletos. Mas nunca saberemos, ao certo, quais foram
estas vítimas...
Após o tiroteio, os parentes recolheram as vitimas.
A comitiva também recolheu suas vítimas. Desceu a
Rua Dom João Pimenta, parando na esquina (casa da
Dona Fininha Silveira), para se refazer do choque, beber água, voltando imediatamente para Belo Horizonte.
Foi a minha sorte não ter acompanhado a comitiva.
Talvez eu teria morrido também (e não estaria aqui hoje
contando para vocês esta história) nesta fatídica noite em
que Montes Claros perdeu filhos inocentes.
No dia seguinte ao tiroteio, satisfazendo minha curiosidade
de adolescente, resolvi sair de casa (apesar dos
apelos da minha mãe) e, passando onde ocorreu o sinistro
acontecimento, tive que saltar vários pocinhos de sangue
espalhados entre as pedras em todo o quarteirão.
Fiquei atordoada e, para meu desespero, a cidade
estava completamente deserta, paralisada, ninguém nas
ruas. Todos, ainda chocados e assombrados, permaneciam
em casa, patéticos.
A revolta e o sofrimento permaneciam no ar.
Aí começou a fase negra dos anos 30.
A valentia daquela mulher não parou. Veio a fase
da vingança, aproveitando a força da política.
Naquela época, o chefe do Décimo Batalhão de
Polícia era o Cel. Coelho, nomeado pelo Governador.
Com ares de protetor da humanidade, resolveu criar
um batalhão para proteger a cidade, mas, na verdade,
era para atacar os adversários da Aliança Liberal, partido
do Dr. Antônio Carlos Ribeiro de Andrada (governador
de Minas Gerais), do qual Dona Tiburtina era forte correligionária
em nossa cidade. Dr. João Alves era o chefe do
partido Aliança Liberal, mas ele era um médico dedicado à sua profissão, muito pacifico, pouco ligava para a política.
Dona Tiburtina é quem mandava no partido dando
rédeas à sua maldade.
Criou-se o “Batalhão”, mas infiltrado nele estavam
os mais valentes jagunços de Dona Tiburtina: Velho de
Lília, Ezupério Ferrador, Joaquim Preto, Manoel Baiano e
outros...
Este grupo de “voluntários”, fantasiados de soldados,
com uniforme de brim cáqui, polainas, boné, revólver
na cintura (durante o dia) e, à noite, armados com cacetes
bem fortes, percorriam as ruas atacando os adversários
da Aliança Liberal, os correligionários de Júlio Prestes.
Como sofreram estes políticos!...
Com a vitória da Revolução de 30 (vitória de Getulio
Vargas) esta valente mulher ficou com mais força política.
Foi a fase negra dos ”Bate Paus.”
À meia noite, eles percorriam a cidade já sabendo a
quem iriam atacar.
Assaltavam a residência da vítima, tiravam-na da
cama, levando-a para o suplício. Onde é hoje a Catedral,
havia um cemitério velho. Lá era o palco da maldade, onde
os “Bate Paus” surravam covardemente as vítimas.
No dia seguinte, eram levados para casa quase mortos,
pelos parentes. Milhares de pessoas honestas, senhores
respeitáveis foram massacrados e muitos morreram em consequência dos ferimentos. Luis Carlos Novaes (Peré)
que o diga, pois alguns dos seus familiares foram vítimas
destes “falsos soldados”.
Terríveis violências contra o ser humano foram cometidas
naquele período e nada aconteceu aos criminosos.
A Gazeta do Norte, jornal da cidade, foi brutalmente
vítima dos “´Bate Paus”. Quebraram todas as máquinas,
queimaram tudo até a Bandeira Nacional e, ainda, não
satisfeitos, derrubaram a casa onde funcionava o nosso
melhor jornal.
Dona Tiburtina estava com a corda toda: proteção
do nosso Governo e da nossa polícia.
Anos depois, houve um júri muito especial e os criminosos
nada sofreram.
Este reinado de maldades e injustiças durou anos. E
a nossa Montes Claros ficou conhecida em todo país como “cidade assassina”
Mas política é como uma fruta: brota, cresce, amadurece,
depois apodrece.... e cai.
Com o passar dos anos (Deus não dorme) a política
mudou, mudando também as reações governamentais.
Quem estava por baixo subiu.... e esta história se repete.
Dona Tiburtina perdeu o prestígio e a valentia. Caiu na realidade.
Viúva pela segunda vez, teve um fim de vida muito
triste, doente e abandonada pela sociedade, fazendo jus
aos danos e tantos sofrimentos que causou às famílias de
nossa cidade.
Moral da história: Colhemos o que plantamos.
LENDAS, TRADIÇÕES E SUPERSTIÇÕES DE
REISADO DAS FOLIAS DO NORTE & VALE
Teófilo de Azevedo Filho (Téo)
Cadeira nº 90
Patrono: Romeu Barcelos Costa
COMPONENTES DA FOLIA
De acordo com a lenda do Norte & Vale, baseada na
Bíblia, os foliões eram só os Três Reis Magos – Baltazar,
Gaspar e Melchior – com arregimentação musical da seguinte
forma: caixa, viola, rebeca e vozes dos próprios reis,
e a estrela guia que fazia o papel de bandeireiro. No entanto,
um Terno de Folia precisa no mínimo de cinco componentes:
uma viola, uma caixa, um pandeiro, um bandeireiro,
uma rabeca, duas vozes de respostas dos mesmos
componentes que tocam.
Imperador: É qualquer pessoa que assume a responsabilidade
total pela festa de Reis ou o dono da última
casa visitada no dia seis de janeiro, quando encerra a Folia
com reza do Terço.
Chefe: O mesmo que mestre ou capitão.
Mestre: É uma espécie de diretor, tem que ter um
grande conhecimento de religião e organização de Folia.
Para ser ummestre é preciso ter no mínimo trinta anos de
atividade na folia.
Decurião: O mesmo que mestre.
Guia: É o cantador de Reis que faz a primeira voz
da dupla que puxa os cantos (o mesmo que puxador de
reis).
Ajudante de guia: (Contramestre): É o cantador de
Reis que faz a segunda vos do guia.
Resposta: É a primeira voz que responde os cantos
do guia.
Ajudante de Resposta: É o cantador de Reis que
faz a segunda voz da resposta.
Segmento: É a sequência de versos dentro da continuação
da história. O mesmo que enredo.
Resposta no segmento: Quando a dupla de cantadores
de resposta sabe o segmento, não é preciso responder
os mesmos versos cantados pelos cantadores – guias, e
pode se continuar o segmento.
Obs.: Há lugares no Norte & Vale em que a resposta
não é feita só pela dupla e, sim, por cinco tipos de vozes.
Estrofe e verso: Em algumas regiões, o povo chama
a estrofe de verso e o verso de linha ou pés.
Guaiano e Lundu: Pode ser cantado por qualquer
componente da Folia.
Toalha: A toalha branca representa a pomba da paz,
Deus, Divino Espírito Santo, a pureza, a fé cristã e é o
símbolo sagrado do Menino Jesus. Na falta da toalha, todo
Folião deve, ao menos usar uma fita branca na viola ou no
pescoço.
Bandeira: A Bandeira, Quadro ou Estandarte significam
o símbolo sagrado do Terno de Folia e todo Terno é
obrigado a ter o Quadro ou a Bandeira, carregada nas
duas mãos ou estandarte, que é o mais tradicional em um
pequeno mastro com no máximo dois metros de altura.
Bandeireiro: É o Folião que carrega o Quadro, Bandeira
ou Estandarte. É obrigado a andar na frente da Folia
e quando a Folia chegar na casa, ele tem que colocar o
Quadro, Bandeira ou Estandarte em frente à porta principal
da casa que está fechada. E, assim, que for aberta a
porta, é seu dever fazer a entrega para a pessoa responsável
pela casa.
Esmola: A esmola é uma tradição religiosa e só pode
ser gasto o dinheiro arrecadado com a festa de reis no dia
6 de janeiro ou com o material de uso do Terno.
Uniforme: Na nossa região, nenhuma Folia é obrigada
a ser uniformizada. Mas no Norte & Vale encontramos
alguns ternos que usam uniformes.
Riscar: Ato de começar o toque ou a dança.
Instrumentos do Terno de Folia de Reis: Segundo
a tradição, os instrumentos de Terno só podem ser usados
nas épocas de apresentação. Se usado para outros tipos
de música, pode dar atraso de sete anos na vida de quem
desrespeitar a tradição.
Fitas: São seis cores de fitas que devem enfeitar os
instrumentos e que têm valor religioso muito grande.
CORES
Vermelha: Representa o fogo do incenso que o Rei
Baltazar deu de presente ao Menino Deus, o sangue de
Jesus.
Amarela: O ouro que o Rei Belchior deu ao Menino
Deus e o sol, a claridade da vida.
Verde: A mirra, essência perfumada, tirada da planta
e dada ao Menino Deus pelo Rei Gaspar. A mata por
andam os foliões.
Azul: Maria Mãe de Jesus; cor de Maria; O céu, Nossa
Senhora das Graças que protege o Folião contra cobras,
pois Maria está pisando numa cobra e tem o domínio sobre
a mesma.
Cor-de-rosa: São José, pai de Jesus, e a beleza e o
perfume das rosas.
Branco: Deus, a paz, pureza, Divino Espírito Santo,
a pombinha e o Menino Jesus.
Roxa: Nenhum Folião deve usar fita roxa, pois ela
representa o pacto com o Tesoura, com exceção se for por
luto da morte de outro colega. O luto é da seguinte forma:
com a fita preta dá-se um laço na branca.
MONSENHOR OSMAR NOVAIS DE LIMA
Wanderlino Arruda
Cadeira nº 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza
Não me canso de ter saudades do tempo bom e gostoso
das aulas do Colégio Diocesano, de quando podíamos,
todos os dias, sentir e ouvir a alegria do Monsenhor
Osmar, a braveza do Padre Agostinho e a terna amizade
do Monsenhor Gustavo. É de fato um momento inesquecível,
de quando cada gesto era uma lição, cada atitude
uma experiência de seres em luta e em paz com a vida. Os
três juntos, ou cada um em particular, eram para nós,
meninos-rapazes, o grau mais alto da sabedoria, a fonte
inesgotável de conhecimento, os degraus por onde alcançar
a segurança do futuro. É claro que, particularmente,
um por um tinha o seu séquito de seguidores, dependendo
da esperteza ou do grau de inteligência de cada aluno,
ou mesmo da maturidade ou falta de juízo, como podíamos
encontrar nos mais sérios como Geraldo Miranda e
Nivaldo Neves, ou nos mais afoitos como Pai da Mata e
João Doido. Em órbita havia gente de todo jeito, tipo Tereziano
Dupin, Renato Pobre, Renato Almeida, Dezinho
Dias, Ivan Guedes, Lazinho Pimenta, Raimundo Santana,
José Maravilha, personalidades marcantes que iam do
folclore à poesia, do trabalho sério à justa compenetração.
Cada dia era um novo esquema de novidades, de
surpresas, uma sensação de estarmos construindo o mundo,
preparando-o para a nossa geração e para todas as
outras que poderiam vir depois de nós. Ninguém fugia da
luta, tirar o corpo de banda, em qualquer tarefa, era um sacrilégio. Matar aulas era pecado capital. Durante a semana
não valia nem cinema nem namoro. A ordem era
estudar! Uma única transgressão era permitida e só ao
Miranda, porque ele havia inovado o sistema, inventado
uma saída, namorando com a professora Lourdes, inteligentão
que era. O Dezinho Dias, já mais velho um pouco,
falava de fazendas, de vez em quando. O Raimundo Santana
era um importante, pois tinha bicicleta e tomava uísque
antes das provas de matemática. Ivan impunha grande
respeito: de vem em quando jantava em restaurante,
sábado à noite depois do grêmio. A maioria, como eu, não
tinha dinheiro nem para picolé ou quebra-queixo, e quando
muito, bebíamos caldo de cana. Cafezinho era luxo!
Professor bom mesmo era o Pedro Santana, vibrante,
grã-fino, dominante nas cadeiras de História, Ciências
e Inglês, um terror par quem não tivesse as matérias na
ponta da língua, a capacidade de responder, falando ou
escrevendo, sem gírias. Pedro era tão imponente, que não
repetia ternos e gravatas durante um mês, cada dia uma
nova cor, hoje um três-botões, amanhã um jaquetão, tudo
dentro do melhor figurino de Vavá ou Wilson Drumond.
O cabelo, ah! O cabelo era que merecia o maior cuidado!
A barba, de um barbear diário na barbearia de Antônio
Guedes, com massagem facial, na mesma hora em que também
estavam sentados os grã-finos Júlio de Melo Franco e
Nelson Vianna, fregueses de manhã cedinho. Errar com
Pedro ou com o Padre Agostinho – outro elegante – era
imperdoável. A nota menor que um bom aluno podia tirar
era dez. O nove era um feito vergonhoso!
Havia outros professores famosos e entre eles o Tabajara,
a Terezinha Pimenta, Doutor Carlyle, a Maria
Inês, D. Rosita Aquino e o Belizário, que falava latim e
tinha o cabelo parecido com o de Castro Alves. Em certas
ocasiões, o bispo D. Antônio chegava a assistir a algumas
aulas, sentado conosco, perguntando e participando,
como se não soubesse de tudo! Foi a maior inteligência que conheci, uma cultura universal, um poder
oratório que Montes Claros nunca teve igual, nem com o
Simeão Ribeiro... Era um admirável mundo novo, principalmente
para mim, que sem ternos e sem paletós – o
primeiro foi o Vadiolando Moreira que me deu - achava
tudo aquilo um sonho em realização. Maravilhosamente
encantado, sedento de aprender, nunca cedendo o primeiro
lugar a ninguém, uma coisa marcou-me profundamente
a diretiva na vida e me tem servido constantemente
de bom exemplo: a alegria de viver de Monsenhor
Osmar Novais de Lima, nosso diretor!
SAMUEL FIGUEIRA,
MESTRE DA PINTURA
Wanderlino Arruda
Cadeira nº 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza
Lembro-me como se fosse ainda hoje o dia em que,
na casa de Samuel Figueira, eu dera palpites, mais do que
o usual, na sua forma de pintar, no uso das cores, na escolha
dos temas e creio que até na evolução dos seus quadros.
Devo ter exagerado na função de crítico, e foi daí
que veio o desafio: Por que eu, que queria saber tanto de
pintura, não tentava fazer um quadro ali mesmo, diante
dele, de Mila, sua mulher, e de Shirley Durães, que os visitava
naquela tarde de domingo? Insulto ou convite, chamamento
ou convocação, fosse o que fosse, não me fiz de
rogado e lancei-me ao trabalho, imediatamente, pintando
a minha primeira paisagem azul, branca e verde, chapada,
lisinha e até com um pouco de transparência. Para
começo, creio que foi até um sucesso, em pouco mais de
duas horas, com ele Samuel orientando aqui, orientando
ali, e até ajudando dar uns retoques nos coqueiros, pois
me faltava naquela hora uma certa leveza que, aliás, falta
até hoje.
Mais tarde em Mirabela, Shirley me lembrou da façanha
e perguntou-me se valeu a pena todos estes anos de
aventura no mundo das tintas, dos pincéis, das espátulas
e das telas. Quis saber também se eu me considerava mais
feliz com a atividade de pintor, metiê que sofre tanta crítica
de quem entende do assunto e até muito mais de quem
não entende nada. E qual seria minha resposta?
Claro que tudo ia bem, a pintura vinha sendo um grande passatempo, um exercício de paciência realmente
maravilhoso, uma nova fonte de estudos, um encontro e
reencontro com a arte que tem atravessado séculos de
admiração e encantamento. Enquanto pinto ou enquanto
escrevo, as horas passam como verdadeiros sonhos, interessantes,
cheias de gratificação mental, gostosas mesmo.
E quanto às críticas, principalmente as desfavoráveis, sempre
me ajudam muito, contribuem para mudanças e busca
de melhor desempenho.
Na verdade, não sabia a quanto andava, porque sempre
ficava muito tempo sem me encontrar com Samuel e
com Konstantin, meus dois orientadores mais exigentes
que, mesmo elogiando, ainda faziam reparos, davam sugestões,
nunca se mostravam totalmente satisfeitos. Não
falo de Godofredo, porque este nunca achava boa a pintura
de ninguém e só raramente dava uma palavra de incentivo,
tanto faz para velhos como para novos. É que o
bom GG achava a profissão muito sofrida, trabalhosa, difícil.
E também para ele, pintura só valia a clássica, a acadêmica,
a real nas cores e na forma. Essas invenções nossas
são coisas de gente que acha que sabe, mas, não sabe...
Cristina Rabelo, em certa ocasião, olhou quase tudo que
preparei para uma exposição no Centro Cultural, disse
que gostou, mas, perguntou porque eu havia abandonado
a pintura de flores... Os críticos da família, a Olímpia,
a Wladênia, a Rízzia, a Nádia, estas sempre seguiram cada
trabalho, serviam e servem de feedback no exato minuto de
cada pedido de avaliação.
É o que tem acontecido e não posso me queixar. Não
me têm faltado os melhores e mais proveitosos momentos
nestes mais de trinta anos de trabalho, exatamente quando
vou completar os três quartos de século de vida. Pintar
sempre fora uma distração, uma forma de paz interna e
externa, uma evocação de viagens, um rememorar de paisagens.
Depois que comecei a pintar, a Natureza jamais
passou por mim (como eu tenho passado por ela), como página em branco. Cada estrada, cada pedaço de céu, cada
folhagem, uma superfície de água, por menor que seja, é
sempre uma festa para meus olhos e para a minha imaginação.
O pintor é um ledor de cores, de movimentos, de
formas, um visualizador e dimensões que existem e que
não existem...
Já ia me esquecendo de fazer um conserto sobre o
relacionamento de Godofredo com os seus colegas menores
da arte pictórica. Ele não gostava é da pintura dos outros.
Dos pintores ele sempre fora grande amigo. No que
me toca, o mestre Godô só deu palavras de incentivo e de
entusiasmo. Talvez seja eu a única pessoa a quem ele tenha
ensinado as técnicas de desenho e de pintura. E soulhe,
eternamente, muito grato por isso!
ARLEN DE PAULO SANTIAGO,
HOMEM DE AÇÃO
Wanderlino Arruda
Cadeira nº 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza
Só existem duas formas de viver a vida. A
primeira é pensando que o milagre não existe; a
outra é pensando que tudo é milagre.
Albert Einstein
Minhas primeiras palavras são de agradecimentos a
Paulo César Santiago, por dois motivos: primeiro, por ter
permitido a Montes Claros ter uma praça bonita e moderna
com o nome do seu pai Arlen de Paulo Santiago; segundo,
por realizar um ato de agradecida justiça a um homem
que sempre soube ser grande no poder e no amor, o homem
Arlen Santiago, que sempre teve a coragem de pensar grande,
sonhar alto e acertar alvos, o homem que teve sonhos
de realizar, de arriscar, de nunca parar por nada até que
seus projetos fossem integralmente realizados.
A praça Arlen Santiago, que enfeita Montes Claros e o
coração de três importantes bairros, o Major Prates, o Augusta
Mota e o Morada do Sol é a marca e registro dos sonhos
de Paulo César e da sua família, com a ousadia do arquiteto
Cascão – dr. Luiz Cláudio Duarte de Oliveira - praça
composta de símbolos importantes, imaginação das mais dignas
para enfeitar as cores do progresso de uma cidade que
tem vocação de pioneirismo e sedução para as artes. Por isso,
os agradecimentos de todos nós, de quem vive o hoje e daqueles
que viverão o amanhã montes-clarense.
Conheci, bem de perto, o meu amigo Arlen Santiago,
o “seu” Arlen, como muitos por respeito o chamavam.
Conheci-o, no início da década de sessenta, como companheiro
de diretoria nos bons tempos do Sindicato dos Bancários,
quando sob a batuta de Raimundo Lírio Brant, fizemos
a primeira greve de Montes Claros, movimento que
mudou rumos e destinos, abrindo perspectivas para inúmeras
lideranças. Convivi com ele na organização e no lançamento
e na trajetória vitoriosa do Major Prates, desafio
que não tinha tamanho para a época, pelas dimensões e
pelo desprendimento no alargar ruas e criar avenidas e praças
até então pouco imaginadas a não ser por sonhadores.
Participei de corpo e alma na campanha política em que ele– arquiteto e engenheiro de cidadania - me lançou candidato
a vereador e me elegeu para a Câmara Municipal de
Montes Claros, quando eu tinha apenas 27 anos, passo
muito importante na minha diretiva de vida.
Compartilhei, noites e dias, com Arlen na sua importante
missão de diretor do jornal Diário de Montes
Claros como nunca vi um espírito de equipe, por ele supervisionada,
funcionar tão bem e com tanta eficiência,
trabalho e escola ao mesmo tempo. Arlen Santiago sabia
que a palavra, falada ou escrita, sempre fascinou a inteligência
e maravilhou a emoção, sempre encantou, sempre
comoveu, sempre convenceu e entusiasmou. O jornalismo
para Arlen, como poema de amor e grito de desafios,
fez-se altivo, respeitável e respeitado, canto e epopeia, discurso
inflamado e tribuna viva para as reivindicações em
busca de melhor e mais justa participação social. Para
Arlen, a verdadeira e perfeita sociedade jamais poderia
ser justa se não contasse com a participação de todos os
segmentos do ser e do viver, do pensar e do fazer.
Termino, como comecei, com a emoção do agradecimento
a Paulo César, cérebro e bolso, mestre de obra e
paisagista maior desta praça, centro da família Santiago
em tudo de grandioso que ela possa sonhar e realizar. O velho Arlen, “seu” Arlen, Arlen de Paulo Santiago em todos
os dias da sua existência soube que a vida foi criada
por Deus para ser intensamente vivida. Para ele, que tenho
certeza está aqui conosco nesta hora de alegria, cada
momento de entusiasmo, cada momento de amor, cada
busca do melhor e do mais bonito tem que ser desenhado
e colorido sem qualquer indecisão, sem uma única gota de
medo. Aos invejosos, a vitória de quem sabe fazer o certo,
a consciência de que o melhor tem que ser realizado!
Parabéns a Rita Santiago, que soube domar o guerreiro
que foi o seu marido Arlen, e que soube e sabe criar e
dirigir esta família maravilhosa que constitui o clã dos
Mota Santiago.
HAROLDO LÍVIO, BARÃO
DE GRÃO-MOGOL
Wanderlino Arruda
Cadeira nº 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza
A história é bem normal de tudo de conformidade
com os cânones do comércio de nossos dias, fruto dos princípios
da oferta e da procura. Negócio de toma-lá-e-dá-cá,
envolvendo naturalmente valores e moedas comuns de
qualquer ato comercial. Só põe romantismo numa operação
dessas quem pode vê-la com olhos de poesia, com traços
românticos de filosofia literária. Em tudo, não resta
dúvida, mesmo nos atos de pura barganha e interesses
outros, a gente consegue dar um colorido de fantasia, bem
própria dos que vivem do trato das artes de das letras.
É que a verdade é bem interessante, amigos. Haroldo
Lívio, cidadão brasileiro, brasilminense de nascimento,
montes-clarense de coração, agora assina um atestado de
amor à terra de Grão Mogol. Assina e paga. Paga com
toda a força que o dinheiro põe e dispõe no mundo moderno,
mesmo em se tratando de coisas antigas. Haroldo
Lívio – é bom dizer logo – acaba de efetuar uma transação
comercial de alto coturno na cidade de Grão Mogol. Comprou
e pagou e tomou posse, com registro em Cartório,
mediante todas a cláusulas, inclusive a de evicção.
Haroldo Lívio, ou melhor, Doutor Haroldo Lívio de
Oliveira, brasileiro, advogado, casado com a socióloga, D.
Maria do Carmo, é hoje senhor de um solar antigo e sensorial
na cidade de Grão Mogol. Senhor legítimo de uma
antiga casa, grande e imponente, construída possivelmente
por mãos escravas, de paredes de pesadas pedras, escavadas com o suor do século passado. Caso de amor à primeira
vista, Haroldo embeiçou-se pela nobre vivenda e sentiu-se imediatamente na pele de um poderoso grão-proprietário,
dono da segurança de uma fortaleza ao mesmo
tempo urbana e histórica. Viu e gostou. Gostou e comprou.
Comprou e pagou. Pagou por ser o incontestável
possuidor da possuída posse.
A casa de Haroldo, amigos, não é uma casa comum,
que a escritura diz construída de alvenaria, de simples e
perecíveis tijolos. É obra granítica, com paredes de meia
braça, a sustentar janelas coloniais, portas imensas, de duas
bandas, com pesadíssimas traves e ferrolhos, frutos, não
só da segurança mineira como da senhorial competência
de suados ferreiros de antanho. A casa de Haroldo, de
telhado de aroeira lavrada a golpes de enxó por mãos competentes,
tem repetidas ripas de jacarandá! As paredes das
salas mais nobres são revestidas com lambris e o piso é
digno das passadas de um comandante-centurião. Na frente,
o arquitetônico ornato de uma resistente cimalha dá o
toque do poderio e da força de uma escolha consciente do
construtor e mestre-de-obras, orgulho da arte de cantaria.
O fundo do nobre solar, após generoso quintal de frutos
opimos, divisa com as mais cristalinas águas do rio de
areias brancas, leito de pedras polidas, barrancas atapetados
de grama verdinha e capim gordura. Ao longe, mas
não muito distante, o perfil elegante de centenárias árvores
a formar moldura com o azul de ferrugem das serras e a
linha cinzenta-celeste do horizonte. Tudo uma graça, um
encanto para os olhos e um prazer para o coração...
Por tudo isso, pelo amor, pelo romantismo da decisão
comercial, pela poesia, pelo gosto, pela nobre humildade
e pela humilde nobreza de sã consciência, prevalecendo-me não sei de que autoridade, não tenho dúvida de
atribuir a Haroldo Lívio, culto e intelectual senhor das
Minas Gerais, o título de Barão de Grão-Mogol.
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