APRESENTAÇÃO
Editamos mais um número da Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros. Este é o vigésimo segundo volume, uma publicação semestral, com regularidade incessante, e que tem o apoio irrestrito de seus associados na condução e preservação da história antiga de Montes Claros e região. Os escritos, pois, inseridos nas páginas deste volume revelam, com clareza, a maturidade de seus autores, graça aos conhecimentos adquiridos no decorrer do tempo. Sem dúvida, o mérito das nossas publicações deve-se à persistência de cada um de nós, em trazer para o presente todos os fatos relevantes do pretérito, sempre com a capacidade inquestionável dos historiadores de nossa terra.
Nesta oportunidade tivemos o significativo apoio dos seguintes confrades: Alceu Augusto de Medeiros, Amelina Chaves, Daniel Oliva Tupinambá de Lelis, Dário Teixeira Cotrim, Edvaldo de Aguiar Fróes,
Felicidade Patrocínio, Gilsa Florisbela Alcântara, Gustavo Mameluque,
Harlen Soares Vieira, Juvenal Caldeira Durães, Leonardo Álvares da Silva Campos, Lázaro Francisco Sena, Manoel Messias
Oliveira, Milene Antonieta Coutinho Maurício, Mara Yanmar
Narciso, Maria Inês Silveira Carlos, Narciso Gonçalves Dias, Teófilo
Azevedo Filho (Téo Azevedo), Yuri Vieira Tupinambá de Lélis Mendes
e Wanderlino Arruda.
Certamente que o propósito da Revista do Instituto é divulgar,
com a maior amplitude, o que se faz em benefício das nossas tradições
e dos nossos costumes, contando sempre com o estímulo e o prestígio
dos nossos associados. A história é dinâmica. Não se pode parar no
tempo sem fazer os devidos registros dos acontecimentos e essa é a
nossa obrigação, independente das divergências políticas, religiosas
e sociais. Ainda para este ano publicaremos a Revista de número 23,
para a qual esperamos a participação dos nossos associados.
Agora, deixamos os nossos agradecimentos a todos os insignes
confrades do IHGMC, pela indispensável colaboração, na convicção
de que o nosso trabalho valorizará, sobremaneira, a belíssima história
de Montes Claros e região. Obrigado e o meu amplexo!
Alceu Augusto Medeiros
Cadeira N. 75
Patrono: Manoel Ambrósio
APOCALIPSE NO SERTÃO
Diz o ditado popular que o sertaejo é antes de tudo um forte! Eu acrescento, de memória privilegiada. O homem que nasce e passa a sua infância no sertão, a sua infância sertaneja o acompanha por toda a sua vida. O sertão estará sempre na sua cabeça. Vai embora para longe de sua terra natal, passa muitos e muitos anos sem voltar a rever sua terra e o seu sertão. Um dia ele volta para matar a saudade, para rever sua cidade no meio do sertão. Sua cidade estava lá, mas não era a vila que ele deixou, não era a mesma vila que estava na sua cabeça. Sua cidade havia sido transformada. Havia pouca coisa que restou de sua vila. Sua cidade ainda estava lá, mas não era a sua vila. Ela estava devastada e não existia mais nada. Foi para a redondeza da cidade, que ele conhecia muito bem, tudo estava devastado. Não havia árvore, não havia nascente, não havia mais nada. Sentou-se sobre uma pedra e ficou a pensar nos tempos felizes que passou e que não existem mais. Tudo se acabou, apenas vestígios da existência humana.
Estava eu na roça, brincando
Na sombra de uma frondosa limeira,
Quando minha tia gritou:
Vamos para a Vila, menino,
Que amanhã é segunda-feira.
Você não pode faltar à aula,
Você tem muito que estudar;
Tá chegando o fim do ano,
Você precisa passar.
Subimos na charrete,
Meu tio já estava esperando;
Bateu de leve com o chicote,
E o cavalo saiu trotando.
Minha tia olhou o horizonte,
E falou: já vai entardecer;
Precisamos chegar na Vila,
Antes do anoitecer.
Para passar o tempo da viagem,
E acabar com a minha sonolência;
Minha tia contava história,
Sobre a Vila Inconfidência.
Eu sabia tudo que ela contava,
Mas fingia não saber que eu sabia;
Para não desapontá-la, fiquei calado,
Escutando o que ela dizia.
Estava quase escuro,
Quando entramos na cidade;
Havia um poste aqui, outro lá,
Com a luz de pouca claridade.
Eu gostava daquelas luzinhas amarelas,
Gostava mais do escuro onde eu ficava
Brincando de esconder, eu escondia;
Meus colegas correndo me caçavam,
Não me encontravam e eu vencia.
Pela manhã eu acordava assustado,
Com o grito do padeiro vendendo pão;
Logo vinha o leiteiro vendendo leite,
Puxando o burrico carregando dois latão.
Depois de tomar o café da manhã,
Ia para a escola, onde eu gostava de estudar;
Sentado nas carteira com os colegas,
No recreio ia para o pátio brincar.
Eu observava tudo na Vila,
Olhava para todos os lados admirado;
Olhava ruas, becos, casas e telhados,
Olhava a Igreja e também o mercado.
Tinha casas grandes e casas pequenas,
Tinha palacete e até sobrado;
A Igreja Matriz, que coisa mais linda,
Eu nunca esqueço do grande mercado.
De vez em quando, eu e os meus colegas,
Passeávamos pelos campos da redondeza;
Chegava até às nascentes e veredas,
Passeávamos pelas matas fechadas,
E fazíamos muitas proeza.
Tomávamos banho de cachoeira,
Descíamos os córregos e riacho;
Atravessávamos campos floridos,
Subia e descia os morros a baixo.
Um dia saí da minha pequena Vila,
Viajei para estudar fora;
Fui morar em uma cidade grande,
A saudade bateu forte quando fui embora.
Muito tempo passei morando longe,
Longe deste pequeno rincão;
Longe da minha pequena Vila,
No meio deste grande sertão.
Agora voltei da minha longa viagem,
Voltei para matar os longos anos de saudade;
Assustei!...Cadê a minha linda Vila?
Não é mais a minha linda cidade.
Era a mesma cidade que estava ali,
Mas não era a mesma Vila em que eu vivia;
Do passado restavam apenas algumas casas,
Agora eram prédios sem calor e sem vida,
Sem graça, sem amor e sem poesia.
Esses prédios de vidraças e sem janelas,
Acabaram com minha vida, com o meu passado,
Acabaramcom minha linda infância;
Edificados por pessoas degeneradas,
Sem gosto, usuradas e disfarçadas,
Chamam essas coisas de progresso,
Porém eu as chamo de ganância.
Saí a passear pelos campos da redondeza,
Novamente o que vi me assustou,
As nascentes foram assoreadas;
Os córregos foram secados,
As árvores foram cortadas,
Seus troncos viraram carvão,
As terras foram aradas.
Arrasaram com o nosso serrado,
Plantaram uma árvore estrangeira;
Puseram veneno na terra,
Mataram a ave Brasileira.
A árvore de nome eucalipto,
Que acabou com a água da terra;
Plantaram em todos os campos,
Até mesmo em cima da serra.
Secaram a água do sertão,
Acabaram com todas as nascentes;
Na agrura quente da terra seca,
Morreram todos os seres viventes.
Estes gananciosos vís e desgraçados,
Que na vida tudo destruiram,
E vivem a vida sem amor;
Para eles nada vale nada,
Pode tudo se acabar,
Na ganância ignóbil deles,
Só o dinheiro tem valor.
Enquanto as figuras bizarras,
Destes diaboscão
Tomavam bebidas fina,
Nas salas de sua mansão;
Suas máquinas destruidoras,
Soltando a fumaça da poluição,
Arrasavam a terra sagrada do meu sertão.
Na ganância desenfreada de sua ambição,
Destruiu tudo, a ganância venceu,
Destruiu os rios e nada ficou;
Destruiu o sagrado solo,
Acabou com a vida, e nada restou.
O sertanejo está enterrado,
Na terra do amado chão;
A terra seca devastada e arrasada,
Foi a terra feliz do meu sertão.
O tempo passou, nada restou,
Tudo ficou na solidão;
Dos gananciosos só restaram as caveiras,
Sobre a poeira de um deserto,
No lugar onde um dia no passado,
Foi o meu berço, foi o meu sertão.
Foi o meu berço, foi o meu sertão.
Amelina Chaves
Cadeira N. 47
Patrono: Hermenegildo Chaves
UM SÉCULO DE
GODOFREDO GUEDES
Só a arte, quando direcionada pelo Criador, tem o poder de eternizar o homem. Tanto que em todas as criações da antiguidade, permanecem vivas e discutidas entre nós. Por mais que seja destruída pela evolução elas permanecem na escrita, nas pedras que constroem os monumentos, nos pinceis movidos pelas mãos mágicas dos gênios, que em Montes Claros esta destacada pelo mestre Godofredo Guedes da simplicidade de um gênio.
Eu que proclamo aos quatro ventos a minha facilidade para escrever, vez, por outra minha caneta que sempre dança leve e solta no papel, queda inibida diante da sua arte as palavras se perdem no emaranhado colorido de suas telas. Ou nas planícies verdejantes do meu pensamento que busca inspiração na voz suave de Beto Guedes quando ele diz: “Quando vier setembro e a boa nova entrar nos campos” e a natureza é cantada em prosa e versos, e os pequizeiros esperando a primavera. Assim sigo a trilha do Gênio, sem palavras difícil rebuscadas no dicionário, apelo para a simplicidade para buscar no fundo do coração e da Memória a figura impar de Godofredo Guedes.
Vejo-o na feira de arte, como um artesão sem a esnobação tão
comum dos grandes artistas. Era um trabalhador de mãos grosseiras
estragadas pelo manejar dos pinceis. Marcados pela sua personalidade
simples, que não demonstrava todo colorido que morava na sua alma.
GODÔ, apelido carinhoso, escreveu uma das mais belas paginas
da nossa historia, seus quadros ocupam espaço em todas as salas
de Montes Claros. Ele pintava por vocação, sem se preocupar em
enriquecer com sua arte. Que não se limitava apenas nas tintas, que
ele transformava em poesias divinas. Conta-se que desde menino era
fascinado pela música, que ele foi construindo e armazenando para
mais tarde explodir nacionalmente na voz do seu filho Beto Guedes,
que acreditou e valorizou o potencial do seu pai. Coisa rara em família.
Assim o sobrenome Guedes passou a ser reconhecido em todo Brasil.
Escrever quase sempre me faz recordar. Ao vê-lo jamais podia
imaginar que estávamos diante de um inigualável gênio da musica
e das artes plásticas, e que mais tarde estas influenciaram seus filhos
e netos que hoje tornaram uma família musical que levou o nome
de Montes Claros além das fronteiras. Numa ponte de amor, que
fez o seu passado-presente Um prêmio compensador vindo da
sensibilidade dos seus descendentes que acreditaram no seu potencial.
Como testemunha de sua vida dedicada a um sonho Godofredo
Guedes, fez da sua arte uma oração diária, vendendo ou não, ele
estava sempre no seu atelier, que não passava de uma garagem de sua
casa. Quando passávamos pela sua rua lá estava ele como um operário
e que obrigatoriamente marcava o ponto. Porque o verdadeiro artistaé condicionado pela sua arte, ele foi sempre um trabalhador que teve
o compromisso sagrado com sua vocação doada gratuitamente pelo
Criador de todas as coisas.
O BARÃO DE JEQUITAHY
As pessoas que de algum modo se destacaram em seu tempo e fizeram diferença em sua geração, deixando legados às gerações futuras, merecem ser relembradas. Essas pessoas não podem ser esquecidas. É dever de quem atua no ofício de historiador resgatar e cultuar essas memórias. Em edições anteriores da Revista do IHGMC, procuramos realizar tal desiderato. Primeiramente (edição XVIII) falamos sobre o Capitão Camilo Cândido de Lélis, figura marcante e destacada em todo o norte mineiro, tendo sido inclusive prefeito de Montes Claros, mas cuja importância foi deixada em segundo plano pela história local. Em artigo extenso, justiçamos a memória desse cidadão notável e peculiar. Da mesma forma, na edição seguinte (n.° XIX), falamos sobre o baiano radicado em Montes Claros, Major Domingos Garcia Leal Tupinambá. Baiano esse que tinha ascendência nobre, com origem que remonta ao Brasil em seus tempos coloniais (Taparica, Caramuru, Tomé de Sousa e Garcia d’Ávila); que foi proprietário de grandes extensões de terras, dentre elas algumas que hoje são bairros importantes em Montes Claros, como o Melo, o Jardim São Luiz e o Ibituruna; e que de igual forma deixou destacada descendência em Montes Claros e região.
Embora conhecido de muitos, detalhes de sua trajetória mereciam ser
resgatados e principalmente registrados.
Mas há também figuras de destaque que são incontestes.
Conhecidas de muitos, alvos de pesquisas, artigos, projetos acadêmicos
e que, principalmente, vivem na memória coletiva. Embora seja assim
tão difundida sua história, esse material quase sempre é esparso, com
destaques para uma ou outra característica ou realização, o que às vezes
não dá conta de apresentar uma visão biográfica real. Portanto, no
artigo desta edição, falaremos sobre uma figura assim, de importância
inconteste: trata-se do Tenente-Coronel Cypriano de Medeiros Lima,
o primeiro e único Barão de Jequitaí.
Tenente-Coronel Cipriano de Medeiros Lima
Não é conhecida a origem de Cypriano de Medeiros Lima1,
embora estime-se seu nascimento por volta de 18282 ou 18293, na
Fazenda do Cedro, pertencente na ocasião ao Arraial do Senhor do
Bonfim, hoje Município de Bocaiúva (MG).
O antropólogo João Batista de Almeida Costa (ele próprio
trineto do Barão de Jequitahy) acredita, sem maiores evidências, que
Cypriano de Medeiros Lima, o futuro Barão de Jequitahy, tenha sido
um ex-escravo que soube contornar os obstáculos da vida e firmar-se
como um dos maiores empreendedores do país, sabendo aproveitar
a capacidade geradora de riquezas da região à qual estava inserido.
Senão vejamos:
Cypriano de Medeiros Lima foi um ex-escravo que, como
um self-made-man, construiu a maior fortuna regional,
conjugando a criação de milhares de cabeças de gado em
suas vinte e cinco fazendas, produção agrícola, mineração
de diamante e participação em sociedades comerciais e
industriais 4.
Máxima Data Vênia, não encontramos indícios que corroborem
essa versão, inclusive pela falta de suporte em outros autores, que
nunca antes tiveram no mulato Cypriano de Medeiros Lima um exescravo.
Inclusive, essa versão não condiz com as narrativas dos dois
maiores “biógrafos” do Barão de Jequitahy: Simeão Ribeiro Pires5 e
Nelson Washington Vianna6, de cujo substrato este ensaio se funda.
Nestes, como se vê, o menino Cypriano: I) era mulato, e não negro;
II) educou-se no curso primário, o que por si só não era comum
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1 VIANNA, Nelson. Serões montesclarenses. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1972, p.
237.
2 VIANNA, Nelson. Op. cit., p. 237.
3 PIRES, Simeão Ribeiro. Serra Geral: diamantes, garimpeiros e escravos. Belo
Horizonte: Editora Cuatiara, 2001, p. 203.
4 COSTA, João Batista de Almeida. Dossiê dimensões múltiplas do desenvolvimento
social – Tomando alho por bugalho: o decantado desenvolvimento do Norte de Minas.
Revista Unimontes Científica. Montes Claros: Editora Unimontes, v.7, n.2 - jul./dez.
2005, p. 47-62.
5 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit., p. 201-225.
6 VIANNA, Nelson Washington. Op. cit., p. 238-241.
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para nascidos escravos; e, ademais, III) exerceu ofício de ferreiro,
que embora serviço mecânico, era indústria de homem livre. Ao que
nos parece duvidosa essa versão de ex-escravo – o que, no entanto,
não impedia que fosse filho de escrava. Porém, como já dito, não
é conhecida a sua origem, não nos cabendo, em razão disso, fazer
ilações.
De instrução, Cypriano conseguiu apenas o curso primário,
embora fosse possuidor de rara inteligência, habilidade e tino
comercial7. Aprendeu, desde cedo, que sua vida de sucesso dependeria
apenas de si mesmo.
Ainda criança, iniciou a vida no ofício de ferreiro, indo trabalhar
na Fazenda Brejo Grande, de propriedade do Sr. Antônio Caetano
Nunes de Macedo (que também era dono da Fazenda Jequitaí Velho),
ali prestando serviços enquanto viveu o seu proprietário. Ficou, no
exercício de sua profissão, conhecido por toda a região, tornandose
famoso pela qualidade da fabricação de suas foices, machados,
ferraduras, correntes, etc. Era ainda um rapaz, embora já acreditado
como um bom oficial ferreiro, quando veio a falecer o proprietário
da fazenda onde trabalhava, de quem se tornara íntimo amigo, o Sr.
Antônio Caetano Nunes de Macedo.
Conta-se que, sem descendentes, Antônio Caetano e sua esposa,
dona Ludovina da Costa Ferreira, firmaram testamento determinando
que, por morte do último sobrevivente entre o casal, todos os seus
pertences passariam à propriedade de seus escravos, que seriam todos
libertados8. Outra versão dá conta que, após o falecimento de Antonio
Caetano Nunes de Macedo, seus bens foram herdados pela viúva, que
doou a Fazenda Jequitaí Velho a seus escravos9. Fato é que a viúva, em
idade já bastante avançada, pouco sobreviveu ao consorte.
Divergência há entre Simeão Ribeiro Pires e Nelson Washington
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7 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit., p. 203.
8 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit., p. 203-204.
9 VIANNA, Nelson. Op. cit., p. 237.
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Vianna, onde para o primeiro10 “todos os pertences” do casal Antônio
e Ludovina foram herdados pelos seus escravos; e, já para o segundo11,
fora a Fazenda Jequitaí Velho12 para eles (seus escravos) doada, pela
viúva (Ludovina), após esta ter herdado os bens do marido quando de
seu óbito; enquanto o restante do espólio, já após a morte da viúva,
que pouco sobrevivera ao finado marido, na falta de descendentes do
casal, fora levado em hasta pública em benefício do Estado – tendo se
verificado pouco depois que, à praça, o único licitante a apresentar-se
foi, precisamente, Cypriano de Medeiros Lima, que arrematou todos
aqueles haveres por uma quantia mais do que modesta13. E que, “com
o desenrolar dos tempos adquiriu, também, a Fazenda Jequitaí Velho
por compra aos seus donatários”14.
Já na versão de Simeão Ribeiro Pires, no entanto, tal como
testado, ocorreu... infelizmente, os novos herdeiros não possuíam um
líder esclarecido para que assumisse o controle de tão valiosa herança:
só de terras, onze mil alqueires!
E a grande propriedade tinha de ser vendida...
“Cypriano, mulato sacudido e vivo, passou a alimentar a ideia de
adquirir todo o espólio”15. Muito habilidoso, não encontrou maiores
dificuldades em alcançar seu intento, graças aos empréstimos de
numerosos amigos que completaram o capital que faltava. Cypriano
transpirava confiança e seu dinamismo e pró-ativismo eram eles
próprios as maiores garantias de seus credores...
Quanto à importância paga por Cypriano pelo espólio, há
aparente divergência entre os dois autores: enquanto para Pires a
quantia, “para a época não era uma importância pequena, pois tratava-
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10 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit.
11 VIANNA, Nelson. Op. cit.
12 Simeão Ribeiro Pires (2001) precisou a área da Fazenda Jequitaí Velho em 3.000
alqueires mineiros, servindo de criação de gado e sendo localizada onde hoje é o
Município de Jequitaí (MG).
13 VIANNA, Nelson. Op. cit., p. 237-238.
14 VIANNA, Nelson. Op. cit., p. 238.
15 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit., p. 204.
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se de arrematação de porteira fechada: terras, benfeitorias e criações”16,
para Vianna, Cypriano “arrematou todos aquêles haveres por uma
quantia mais do que modesta”17. Mas, neste ponto, a divergência
parece-nos ter sido apenas aparente. Pois, embora a importância paga
possa ter sido “modesta”, em relação ao real valor dos bens adquiridos,
isso não implica em que o valor pago tenha sido “uma importância
pequena”.
Fato é: ambos os autores são uníssonos que “data desse evento a
sua imensa fortuna”18 ou que “tal aquisição para Cypriano significou
o grande ponto de partida para novas conquistas”19.
Com firme determinação, dinamizou a exploração inteligente
da propriedade, aumentando lavouras e ampliando, por
sucessivas compras, o número de escravos. Sempre bem
sucedido, pouco tempo levou para adquirir a Fazenda Jequitaí
Velho, com três mil alqueires de terras, também doada pelos
antigos donos aos seus escravos20.
Com o desenrolar dos tempos adquiriu, também, a Fazenda
Jequitaí Velho por compra aos seus donatários. Após afazendar-se,
Cypriano resolveu estabelecer-se no comércio21. Já inteiramente
estruturado nos lucros da agropecuária, e sendo homem de grandes
empreendimentos, Cypriano passou a ter o seu nome difundido por
toda a região norte-mineira, destacadamente em Diamantina, a Meca
comercial do Sertão (comércio este fruto do pleno apogeu da exploração
dos diamantes), sendo o maior centro próximo às suas atividades, que
passou a aportar, com frequência, um grande comerciante na pessoa
de Cypriano de Medeiros Lima. Em razão disso, chegou a adquirir
uma ótima residência para os seus constantes pousos de viagens e
negócios22.
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16 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit., p. 204.
17 VIANNA, Nelson. Op. cit., p. 238.
18 VIANNA, Nelson. Op. cit., p. 238.
19 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit., p. 204.
20 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit., p. 204.
21 VIANNA, Nelson. Op. cit., p. 238.
22 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit., p. 204.
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Consta do registro histórico oficial da Prefeitura Municipal de
Bocaiúva (MG) que o Cel. Cypriano de Medeiros Lima (Barão de
Jequitahy) era “um dos chefes de maior prestígio do Partido Liberal
em toda zona Norte Mineira”, embora João Roberto Drumond
Amorim23 afirme que ele pertencesse ao Partido Conservador24. Fosse
ele liberal ou conservador, é sabido que era o maior líder político do
Norte de Minas Gerais, conforme aponta também João Batista de
Almeida Costa25, para quem o Cel. Cypriano se constituiu na principal
personalidade política regional de quem os representantes eleitos para a
Assembléia Provincial e para a Câmara dos Deputados dependiam para
concretizarem seus sonhos políticos. Tamanha era sua importância e
prestígio (político e comercial) na região que, à falta de casa bancária
no setentrião mineiro, passou o Major Cypriano de Medeiros a ser o“banco comercial” (com “carteira múltipla”) do Norte de Minas. Pois,“ao tempo não existiam bancos” na região, de modo que “o numerário
para os serviços da lavoura e compra de gado era conseguido com ele,
pois se tornara um banco sempre aberto para os amigos”26.
Além de conceder empréstimos aos seus amigos e aliados
políticos de toda a zona norte-mineira27, Cypriano também colocava
em circulação o “dinheiro” da região... É que, como à época não havia
bancos no norte-mineiro e adjacências, e portanto faltava dinheiro
para circular na região, sobretudo nas praças comerciais, o Major
Cypriano e alguns poucos outros comerciantes e industriais trataram
de encontrar solução inteligente ao problema: passaram a emitir uma
espécie de “papel-moeda” que passou a circular por todo o Norte de
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23 AMORIM, João Roberto Drumond. Oligarquias, coronelismo, caciques e populistas:
estudo de um caso. 2 ed. Montes Claros: Ed. Unimontes, 2000.
24 “O maior chefe político da região do norte de Minas no Império, o citado barão
Cypriano Medeiros, que residia em Jequitaí, pertencia à ala dos conservadores, embora
o governo provisório fosse liberal. No novo município de Bocaiúva, com a debandada, o
predomínio sobre o lugar passou ao Partido Conservador” (AMORIM, Op. cit., p. 45).
25 COSTA, João Batista de Almeida. Op. cit.
26 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit., p. 213.
27 Luiz Pires Filho dá nota de carta em que o Barão de Jequitaí consente com o pedido
de moratória por parte dos sócios da Fábrica de Tecidos do Cedro (Barão de Gorutuba,
Maj. Simeão Ribeiro dos Santos etc).
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Minas, o chamado “boró”, que era assinado por Cypriano de Medeiros
Lima (ou por outra firma emitente) para ter validade28.
Só se fazia câmbio para viagem ou para pagar mercadorias
de fora (...) No anverso da cédula era colocado o nome do
proprietário, nas grandes somas. Os borós tinham diversos
valores. Uns diziam que era vale de serviços. No verso, em
uns havia o nome do portador escrito por um dos diretores da
fábrica. Com esses borós se pagava tudo: algodão, sementes,
gêneros da região, gado e salários29.
Foi ele também o precursor das operações de factoring na
região, como bem elucidam Simeão Ribeiro Pires30 e Nelson Viana31
ao relatarem seus episódios de cobranças na região do Urucuia. A
história das cobranças começou com as andanças constantes de
Cypriano ao Arraial do Tijuco (atual município de Diamantina)
a negócios. Com isso, tornou-se figura conhecida, respeitada e
admirada. Os comerciantes locais estavam tendo problemas para
receber dívidas de produtores/comerciantes na região de Urucuia
(Noroeste), região sem lei, com predomínio da força. Assim sendo, os
comerciantes diamantinenses eram ameaçados de morte e rechaçados
violentamente quando resolviam ir cobrar as dívidas. Parecia ser esse
um caso sem solução, dado o aumento dos prejuízos reclamados
pelos comerciantes de Diamantina. Cypriano tendo ciência dos
acontecimentos desenvolveu a solução, que além de certo engenho,
exigia coragem e determinação. Pura e simplesmente comprou dos
comerciantes as dívidas com desconto de cinqüenta por cento. No
segundo momento, para receber as dívidas, preparou a primeira
expedição ao Urucuia com dezenas de homens da sua fazenda,
devidamente armados, municiados e dispostos a tudo. O ritual da
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28 WELLS, James. Explorando e viajando três mil milhas através do Brasil do Rio de
Janeiro ao Maranhão. Prefácio: Christopher Hill. Tradução: Myriam Ávila (1995). 2
volumes. 324p.
29 PIRES FILHO, Luiz. Memória de uma Aroeira. Belo Horizonte: Rona, 1994, p. 31-33.
30 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit., p. 206-208.
31 VIANNA, Nelson. Op. cit., p. 238-239.
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primeira expedição foi seguido à risca pelas demais. À frente de sua
tropa particular, com armas reluzentes colocadas à vista, Cypriano
chegava à fazenda do devedor, com ar solene, e dizia:
“– Pois é, meu amigo, estando de viagem para a região do
Urucuia, a negócio de compra de gado, e sabendo o senhor como
uma pessoa honesta, com débitos vencidos no Arraial de Tijuco,
julguei que isso não ficava bem. Eis aqui a devida quitação dos
credores. Como pretendo comprar gados, e sabendo o senhor
possuidor de grande criatório, venho fazer negócio. Negócio a
dinheiro, pois o pagamento é a quitação de seus compromissos,
com a sua assinatura pelas suas mercadorias recebidas. Tenho,
entretanto, de receber a mais, pelos juros e as despesas de
viagem, pois o amigo teria de arcar com as mesmas para fazer o
pagamento no distante Arraial de Tijuco”.
Nenhum devedor visitado jamais contestou a dívida cobrada,
pois a jagunçada de Cypriano estava ali para garantir a cobrança.
Com isso ganhou muito dinheiro e expandiu a sua fortuna. Vale
ressaltar que tais expedições garantiram para Cypriano a expansão de
sua fortuna, não sendo, todavia, a origem da mesma.
Por volta de 1850, o Cel. Cypriano de Medeiros Lima,
proprietário de 25 fazendas de gado pelas redondezas, firmou,
definitivamente, o tropeirismo em sua região (Guaicuí, Jequitaí,
Várzea da Palma etc). Com efeito, foi ainda o principal responsável
pela fundação dos povoados que dariam origem aos atuais municípios
de Várzea da Palma (MG) e de Jequitaí (MG), considerado de fato o
seu fundador.
JEQUITAÍ: Com certeza a povoação do lugar se origina a partir
das atividades de Cypriano de Medeiros Lima. Antes do povoamento,
a região era rota entre Montes Claros para a Vila Nossa Senhora do
Bom Sucesso e Almas da Barra do Rio das Velhas (hoje Barra do Guaicuí,
distrito pertencente ao Município de Várzea da Palma). Por volta do
ano de 1872, a sorte bate às portas de Cypriano de Medeiros, em sua fazenda na Barra do Guaicuí. Isso porque nessa época um escravo
de nome Damião, vindo das bandas do Jequitinhonha e encarregado
de levar até Cypriano uma carta em que o remetente Aprígio Pereira
Lima (da Vila de Terra Branca) lhe solicitava empréstimo de cinco
contos de réis, ao passar pelo rio Jequitaí, no lugar denominado Porto
Inhay (na citada rota), encontrou diamantes. Chegando ao destino
final (Barra do Guaicuí), cumpriu sua missão entregando-lhe a carta,
e ao fim, noticiando-lhe do achado. Cypriano empresta o numerário
para Aprígio e, em contrapartida, solicita-lhe escravos (treinados para
tal) e ferramentas para a exploração diamantífera. Imediatamente se
dá o início da exploração de diamantes por Cypriano de Medeiros, e
a comercialização dos mesmos em Diamantina. Desnecessário dizerque a notícia do descobrimento das preciosas pedras se espalhou,
trazendo, às margens do referido rio, gente de toda sorte, disposta a
se dedicar à exploração de diamantes, sob o comando de Cypriano.
Segundo consta, por volta de 500 garimpeiros acamparam em choças
de palha e capim e formaram um arraial. A maior parte desses
garimpeiros era procedente de Diamantina e, em homenagem a eles,
hoje existem, na cidade de Jequitaí, algumas ruas com os nomes:
Diamantina, Mendanha, Inhay etc. Pela Lei Provincial nº 1.996, de
14 de novembro de 1873, a povoação foi elevada à categoria de Vila
de Jequitaí, com sede no Arraial do Senhor do Bonfim (Bocaiúva),
até então pertencente ao município de Montes Claros. Dois anos
depois, a Lei nº 2.145/1875 transformou a Vila de Jequitaí em
distrito pertencente a Montes Claros. Um ano mais tarde, é elevadaà freguesia, pela Lei mineira nº 2.214, de 03 Junho de 187632. Sendo
ali residente o tenente-coronel Cypriano de Medeiros Lima, mais
tarde Barão de Jequitahy, o maior líder político do Norte de Minas
durante o Segundo Reinado, que gozava de notável prestígio político
(estivesse no poder o Partido Liberal ou o Partido Conservador) e
grande poderio econômico, construiu ele naquele arraial as obras
necessárias à implantação da sede do município: o fórum, o cemitério
e a escola33. Assim, fácil lhe foi obter do Governo Provincial a
transferência da sede do referido município, do Arraial do Senhor do
Bonfim (Bocaiúva) para o Arraial de Nossa Senhora da Conceição de
Jequitaí, o que se operou pela Lei mineira nº 2.810, de 04 de outubro
de 188134, ficando revogada a de nº 1.996, de 14 de novembro
de 1873. Pela Lei Provincial nº 3.276, de 30 de outubro de 1884,
foi elevada à condição de Cidade de Jequitaí, época esta de notório
desenvolvimento, motivado pela lavoura e, em grande parte, pela
extração de seus diamantes. No entanto, devido ao advento da
República, o povo de Jequitaí gozou as regalias de cidade por pouco
tempo, já que a Lei nº 44, de 17 de abril de 1890, reduziu a cidade a
um simples distrito, passando a denominar-se Vila Nova de Jequitaí
e sofrendo um grande revés, voltando a pertencer a Montes Claros.
Pelo Decreto nº 90, de 4 de junho de 1890, a sede foi definitivamente
fixada no antigo Arraial do Senhor do Bonfim.
Com a criação do Município de Inconfidência (hoje Coração
de Jesus), pela Lei estadual nº 556, de 30 de agosto de 1911, o
distrito de Jequitaí passou a pertencer à novel municipalidade.
Nessa oportunidade, foi eleito como vereador especial do distrito de
Jequitahy para a 1ª legislatura (1912-1914) da Câmara Municipal de
Inconfidência (sob a presidência interina do capitão Camilo Cândido
de Lélis), o neto do cel. Cypriano de Medeiros Lima (Barão de
Jequitahy), Álvaro Augusto de Lélis, que mais tarde também integraria
outras 04 (quatro) legislaturas ininterruptas (5ª, 6ª, 7ª e 8ª legislaturas,
de 1927 a 1954) da Câmara Municipal de Coração de Jesus – onde
serviu, no total, por cerca de 30 anos, como legislador. Em 1948,
foi proclamada a independência político-administrativa de Jequitaí,
sendo elevada novamente à categoria de cidade pela Lei estadual nº
336, de 27 de dezembro, constituída somente pelo distrito da sede.
_________________________________________
33 AMORIM, João Roberto Drumond. Op. cit., p. 38.
34 transfere a sede do município de Jequitahy do arraial do Bom Fim para o de Nossa
Senhora da Conceição do Jequitahy...
_________________________________________
Com a morte do Barão de Jequitahy, líder político da região,
o Arraial de Nossa Senhora da Conceição de Jequitaí entrou
em decadência e seria incorporado ao município de Coração
de Jesus, em 1911, passando a município autônomo somente
em 1948, com o nome de Jequitaí35.
Sobre a etimologia do nome Jequitaí, apuramos a existência de
duas versões. Como o alimento básico de que os garimpeiros se serviam
era o peixe, eles armavam um balaio (Jequi), no meio das pedras (Ita)
dentro do rio (Hy), onde nasceu o nome Jequitaí, que até hoje se
conserva, devido à sua origem e significado, sendo essa a primeira
versão. A segunda versão é apresentada pelo tupinólogo Eduardo
Navarro36 que sugere que “Jequitaí” surgiu do termo da língua geral
meridional37 îekytá’y, que significa “rio dos jequitás”38.
VÁRZEA DA PALMA: Após a decadência de Guaicuí, surge
o Tenente-Coronel Cypriano de Medeiros Lima, que incentivou o
comércio através das tropas (tropeiros), iniciando o surgimento
de diversas comunidades: Buritis das Mulatas (Fazenda Pedras da
Brígida), Jequitaí Velho, Tabua (Joaquim Felício), e o de Vargem das
Palmas (depois Porto da Palma, hoje Palma Velha), na beira do Rio das
Velhas. Em 1847, tropeiros se instalam na margem esquerda do Rio
das Velhas, vindos de Bocaiúva, Guaicuí e outros, fundando o local
chamado de “Vargem das Palmas”, Cai D’Água ou Cair D’Água. E,
com a construção da Estrada de Ferro Central do Brasil, surgiu a então
_________________________________________
35 AMORIM, João Roberto Drumond. Op. cit., p. 39.
36 Eduardo de Almeida Navarro é um filólogo e lexicógrafo brasileiro, especialista
em tupi antigo. É catedrático da Universidade de São Paulo e autor do Método Moderno
de Tupi Antigo (2004) e do Dicionário de tupi antigo (2013), importantes obras sobre a
língua tupi antiga.
37 A língua geral paulista, também chamada de língua geral meridional, era uma língua
crioula formada à época dos bandeirantes paulistas no Brasil Colônia. Hoje, tem apenas
interesse histórico, pois, desde o início do século XX, está totalmente extinta.
38 NAVARRO, E. A. Dicionário de tupi antigo. São Paulo: Global, 2013, p. 581.
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vila de Várzea da Palma39. Eram terras de gerais pouco habitadas. A
história do município surgiu com a formação de um povoado, a
presença de fazendeiros e a vinda de tropeiros, em meados do século
XIX. O crescimento de fato de Várzea da Palma e a sua formação
como cidade, inicia-se com a construção da Estação da Estrada de
Ferro, ou também conhecida popularmente como a Linha de Ferro,
fato ocorrido no início do século XX, período em que o povoado fora
elevado à categoria de distrito do município de Pirapora, iniciando
então um crescimento populacional. Com o tempo, o distrito começa
a emergir a município, mas as suas origens, enquanto povoado, devese
ao Cel. Cypriano de Medeiros Lima, na segunda metade do século
XIX.
Visionário que era, logo percebeu, em suas andanças, a
importância viária do Rio São Francisco, sobretudo após a descoberta
de diamantes no rio Jequitaí, vislumbrando intenso comércio naquela
região. Em razão disso, passou a articular o projeto de tornar-se
concessionário para a construção de uma estrada de ferro ligando
Montes Claros ao porto de Extrema (atual município de Ibiaí), o que
de fato viria a se concretizar em 1888, quando Cypriano de Medeiros
Lima recebeu do Governo da Província de Minas Gerais uma
concessão para a construção e exploração (pelo prazo de cinquenta
anos) da referida estrada de ferro Montes Claros-Extrema. Através
da lei mineira de nº 3.648/1888, “o Governo da Província de Minas
Gerais fica autorizada a contratar com a companhia organizada pelo
Ten. Cel. Cypriano de Medeiros Lima a construção da estrada de ferro
de Montes Claros ao porto de Extrema (Ibiaí)”. Tão logo recebeu a
concessão, após um ano e poucos dias, vendeu-a por alta soma a uma
companhia do Rio de Janeiro, obtendo assim um vultoso lucro (cento
e cinquenta contos de réis), na ordem de 5% do capital em moeda
corrente, a título de indenização incidente sobre o valor orçado em
3.000.000$000. Dotado que era de apurado tino para os negócios, com a venda da concessão, se antecipa à crise que viria com a abolição
da escravatura40.
“O concessionário do serviço, Tte. Coronel Cipriano de
Medeiros Lima, o mais importante fazendeiro do Norte de Minas,
Barão de Jequitaí, passou seus direitos à sociedade, cujo capital era
de três mil contos de réis]. Imediatamente os engenheiros foram
contratados e se iniciaram os estudos preliminares”. O chefe dos
engenheiros era Teófilo Benedito Otoni. Outras vias férreas foram
projetadas objetivando se integrar à sede do Município de Montes
Claros. Entretanto, não se sabe o motivo, tudo fracassou, até que
chegasse ao posto de ministro da Viação o Dr. Francisco Sá41, para dar
continuidade aos esforços iniciados em prol da integração do sertão
norte-mineiro (e notadamente Montes Claros e Várzea da Palma) ao
território nacional, por meio das vias férreas. De todo modo, foi o
Barão de Jequitaí o pioneiro do ferroviarismo no Norte de Minas!
Com o advento da abolição da escravatura, a economia
rural no país sofre grande baque, não sendo diferente a decadência
experimentada no norte das Minas Gerais. Embora tenha sentido o
golpe econômico, o Barão de Jequitaí conseguiu manter sua fortuna,
muito em função da grandeza e diversidade de seus negócios.
O tenente-coronel Cypriano de Medeiros Lima foi Comandante
da 28ª Seção de Batalhão de Reserva da Guarda Nacional dos
Municípios de Montes Claros e Guaicuí42, Juiz Municipal e Vereadorà Câmara Municipal de Guaicuhy43. Era conhecido, por toda a
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40 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit., p. 208-210.
41 PAULA, Hermes Augusto de. Montes Claros: sua história, sua gente e seus costumes.
2ª edição, 1979, Volume I, página 28.
42 Tomamos nota, sem precisar qual época, de certa composição da 28ª Seção de Batalhão
de Reserva: Major Commandante: Cypriano de Medeiros Lima; Alferes Cirurgião:
Justino José dos Santos; 1ª Companhia: Capitão, Honorato Nunes de Azevedo, Tenente,
Modesto Antonio Rabello; 2ª Companhia: Capitão, José Bulcão de Souza Meira; 3ª
Companhia avulsa de serviço activo: Capitão, Gabriel Nunes de Azevedo.
43 Tomamos nota, sem precisar qual época, de certa composição da Câmara Municipal
de Guaicuhy: Leandro Hermetto da Silva, Carlos Ulysses Monteiro de Messas, Gregorio
da Fonseca Cunha, Cypriano de Medeiros Lima e Lourenço Nunes de Macedo.
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região, como “o Barão de Guaicuhy”, embora nunca tenha possuído
formalmente tal título. O “verdadeiro” detentor do título de Barão
de Guaicuhy foi o cel. Josephino Vieira Machado, agraciado em
19 de julho de 1879, quatro meses antes de falecer (22/11/1879),
pouco desfrutando do título. O Cel. Cypriano tornou-se o Barão de
Jequitahy por Carta-Patente de 25 de setembro de 1889 (assinada
pelo Imperador Dom Pedro II e seu secretário, o Barão de Loreto)44.
Apesar disso, há ainda hoje nas Cidades de Jequitaí e de Várzea da
Palma ruas denominadas Barão de Guaicuí. Há quem diga que o Cel.
Cypriano tenha se recusado a receber o título de Barão de Jequitahy
sob a alegação de que seria ele Barão de Guaicuhy, versão que não
sabemos confirmar ou não.
Em 1891, estando distante apenas 18 quilômetros de Várzea
da Palma, ocasião em que efetuava a venda de mais de mil cabeças
de gado, em lugar denominado Pedra da Brígida, veio a falecer,
presa de incurável depressão, o cel. Cypriano de Medeiros Lima,
repentinamente, por uma síncope cardíaca. Faleceu na Guararavacã
na Fazenda Brígida, onde o colocaram numa rede e o levaram até o
Rio das Velhas. Ali colocaram seu corpo numa canoa a fim de conduzilo
até o porto da então Vila do Bom Sucesso das Almas (pertencente
ao Julgado da Barra do Rio das Velhas, hoje distrito de Guaicuí).
Dezenas de outras canoas vieram acompanhando, devido à notícia
de sua morte ter corrido mundo, motivo pelo qual muitos terem ido
ao encontro de seu corpo. Era já noite. As canoas desceram o Rio
das Velhas com Archotes de Fogo. E as pessoas cantavam lamentos,
enquanto o gado na beira do rio, ainda acordado, ia urrando. Cena
triste e bonita. Chegando em Guaicuí, foi sepultado no interior da
Igreja da Pedra (mais precisamente na parte da sacristia que chegou
a ser coberta), às margens do Rio das Velhas, sob consternação geral,
oportunidade na qual todos os presentes aclamavam “salve o major
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44 “Querendo distinguir e honrar o Tenente-Coronel da Guarda Nacional Cypriano de
Medeiros Lima: hei por bem fazer-lhe mercê do título de Barão de Jequitahy. Palácio
do Rio de Janeiro, em vinte e cinco de setembro de mil oitocentos e oitenta e nove,
sexagésimo oitavo da Independência e do Império. Dom Pedro II. Barão de Loreto.”
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Cypriano, salve o barão de Guaicuhy!”45. A Igreja da Gameleira foi
fundada por Manoel Borba Gato, que ali se achava estabelecido em
1679, quando um de seus homens matou a tiro o Intendente Dom
Rodrigo de Castelo Branco.
O Barão de Jequitahy deixou uma enorme fortuna, inigualável
até os dias de hoje no meio rural: “por esforço próprio amealhou
um patrimônio somente comparado ao criado pelo Desembargador
João Fernandes de Oliveira, o famoso Contratador de Diamantes, do
Tijuco, e instituidor do Morgado do Grijó”46.
O Cel. Cypriano de Medeiros Lima foi, inequivocamente, o
maior fazendeiro de criação de toda as Minas Gerais e o detentor
da maior fortuna do sertão de Minas – ou, nas palavras do escritor
Roberto Carlos Morais Santiago, “o mais importante empresário
norte-mineiro do século XIX”!
Foram mais de 25 fazendas, com área superior a setenta mil
alqueires mineiros de terra47, cujo criatório ultrapassava as trinta
e cinco mil cabeças de gado de toda espécie. Inúmeros imóveis,
constantes de mais de uma centena de casas esparsas em povoações
e nas cidades vizinhas. Seiscentos contos de réis em brilhantes e
diamantes brutos e lapidados. Mais de oitocentos contos de réis em
empréstimos e participações comerciais e industriais, além de cerca de
quinhentos contos de réis em dinheiro vivo.
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45 Não obstante a sua patente da Guarda Nacional ser, naquela oportunidade, a de
Tenente-Coronel (e não Major), bem como o seu título nobiliárquico ser o de Barão de
Jequitahy (e não Barão de Guaicuhy).
46 PIRES, Simeão Ribeiro. Op. cit., p. 219.
47 Fazendas Brejo Grande (Jequitaí), Caraíbas – hoje “Jatobá” (Jequitaí), das Vargens
(Guaicuí / Várzea da Palma), da Prata (m.d. do rio São Francisco e m.e. do rio das
Velhas), do Viveiro (m.d. do rio São Francisco), Rompe-Dia (Várzea da Palma), do Retiro
Velho (Várzea da Palma), Coqueiros (Várzea da Palma), Corrente ou Moinho (Várzea
da Palma), do Brejinho (Várzea da Palma), do Tamboril (Várzea da Palma), Serra do
Valo (Jequitaí), da Picada (Jequitaí), dos Morrinhos (Jequitaí), do Açude (Jequitaí), da
Lapa (Francisco Dumont), da Sussuarana (Francisco Dumont), da Camurça (Jequitaí),
da Chapada (Jequitaí), da Mãe Barba (Jequitaí), da Sentinela (Jequitaí), Sucuriú (Lagoa
dos Patos), Jequitaí Velho (Jequitaí), do Boqueirão do Anastácio (Jequitaí) e Piedade
(Várzea da Palma).
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No tocante a essa fortuna vale acrescentar que Adelaide Odília
de Medeiros, filha do Barão de Jequitaí, morou seus últimos anos na
cidade de Brasília de Minas, onde foi sepultada aos 87 anos, no dia
12 de abril de 1949. Sua bisneta, Mary Tupinambá Lélis, que muito a
conheceu, relembra de casos contados por ela, inclusive dos “litros de
diamantes” que ela possuía (mesmo no final de sua vida).
Até onde sabemos, o Barão de Jequitahy teve três filhas legítimas
(ou legitimadas): Rita Cypriano de Medeiros48, Adelaide Odília de
Medeiros e uma outra cujo nome ainda não conseguimos apurar.
A primogênita, Rita Cypriano de Medeiros (1845-1923), foi
casada em primeiras núpcias com Christiano Celestino de Almeida
(1841-1872) e, em segundas núpcias, com o capitão Antonio da Silva
Maia (1829-1897). Faleceu em Montes Claros (MG), aos 78 anos,
em 9 de fevereiro de 1923. Por este ramo (Rita Cypriano), incluemse
dentre os descendentes do Barão de Jequitahy personagens como
Christiano Celestino de Almeida (1872-1918), João Celestino da
Rocha (presidente da Câmara Municipal de Coração de Jesus), José
Christiano de Almeida (juiz de paz, inspetor escolar, presidente e
secretário da Câmara Municipal de Juramento), Maria da Conceição
de Almeida Costa (“Sãozinha”, diretora escolar, casada com Silvestre
Augusto Costa, presidente da Câmara Municipal de Jequitaí), Maria
Aparecida Costa49, Afonso Maria de Almeida Maia (economista
e professor universitário), Marilene Veloso Tófolo (historiadora e
escritora), Altamiro de Almeida Leão, Maria Rita Miranda Rocha,
Geralda Maia de Almeida, Flávio D’Amato Sobrinho, Cristiana
Benvinda D’Amato Jean, Geralda Waldane de Almeida Leão, Gláucia
Maria Leão Pereira Alvim, Maria Elizabeth Rocha Mendes50, Cel.
_________________________________________
48 PAULA, Hermes Augusto de. Op. cit., p. 99.
49 Graduada e pós-graduada em Geografia pela Universidade Estadual de Montes
Claros (Unimontes), onde foi professora, chefe do departamento de geociências e vicediretora
da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FAFIL). Foi presidente da Seção
de Montes Claros (MG) da Associação Brasileira de Geografia. É professora emérita da
Unimontes. É sócia efetiva (Cadeira 07) do IHGMC.
_________________________________________
Geraldo Christiano da Rocha (PM-DF)51, João Batista de Almeida
Costa (Joba)52, Monsenhor José Osanam de Almeida Maia53 etc.
A filha Adelaide Odília de Medeiros (1862-1949) nasceu em
Bocaiúva (MG). Ramo do qual descendemos, teve ela um filho com
o capitão Camilo Cândido de Lélis (1845-1915): Álvaro Augusto de
Lélis (28/02/1884-25/06/1965), que se casou com Felicidade Perpétua
Leal Tupinambá (1893-1989), por sua vez filha do major Domingos
_________________________________________
50. Concluiu o Curso Normal no Instituto Norte-Mineiro de Educação. É Licenciada em
História pelo Centro Universitário do Distrito Federal e pós-graduada em Administração
Escolar pela Universidade de Brasília. Organizadora da obra “Retratos de Família”
(1997). Casou-se com Romildo Charles de Leitão Mendes (policial federal), filho do Dr.
Romildo Borges Mendes com D. Maria Vanda Gomes Mendes. Filhas: Cynthia Soraya
Rocha Mendes Cury e Júnia Elizabeth Rocha Mendes.
51 Concluiu o CPOR em Belo Horizonte, fazendo estágio em Juiz de Fora, onde chegou
a 1º tenente do E.B. Na PMDF, chegou a coronel, tendo realizado o Curso Superior de
Polícia (Academia de Polícia) e o Curso da ADESG. Em Washington (USA), concluiu
o Curso Geral de Polícia Internacional (Police Academy) e o Curso de Técnica de
Instrução Policial. Foi agraciado com a Comenda do Mérito de Brasília, Medalha
Tiradentes (PMDF), Ordem Internacional das Ciências e Cultura, Medalha Imperador
D. Pedro II (CBDF), dentre outras.
52. Filho de Maria da Conceição de Almeida e Silvestre Augusto Costa, é Bacharel
(1983) em Ciências Sociais (UFMG) e Mestre (1999) e Doutor (2002) em Antropologia
(UnB). Professor da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), possui
a Gran Medalha de Honra da Inconfidência (2006), do Governo de Minas Gerais; a
Medalha Urbis de Montes Claros - 150 anos (2007), da Prefeitura Municipal de Montes
Claros; o título de Cidadão Honorário de Matias Cardoso (2008), da Câmara Municipal
de Matias Cardoso; e a Comenda Civismo e Consciência dos Gerais - Medalha Mathias
Cardoso de Almeida (2009), do Movimento Catrumano, do qual é fundador. É premiado
teatrólogo.
53. Licenciado em Teologia (Pontifícia Universidade Gregoriana – Roma / Itália);
Licenciado em Direito Canônico (Pontifícia Universidade São Tomaz de Aquino –
Roma / Itália); Vigário-Geral da Diocese de Montes Claros; Juiz-Instrutor do Tribunal
Eclesiástico da Diocese de Montes Claros; Vigário Judicial do Tribunal Eclesiástico
Interdiocesano de Montes Claros (Província Eclesiástica de Montes Claros: dioceses
de Janaúba, Januária, Montes Claros e Paracatu); Co-fundador (1992) e Reitor
(1995-2004) do Seminário Maior Imaculado Coração de Maria (Arquidiocese de
Montes Claros); Chanceler da Arquidiocese de Montes Claros; Membro do Colégio de
Consultores da Arquidiocese de Montes Claros; Conselheiro do Conselho Presbiteral
da Arquidiocese de Montes Claros; Pároco da Comunidade Eclesial Nossa Senhora do
Perpétuo Socorro e Todos os Santos; Sócio-Fundador (1986) da Sociedade Brasileira
de Canonistas.
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Garcia Leal Tupinambá (1829-1902) com dona Felicidade Perpétua
da Silveira (1857-1907). O casal Álvaro e Felicidade tiveram 13 (treze)
filhos, dentre os quais Adelaide Augusta (cujo nome homenageavaà avó paterna) e Domingos Egydio (nomes em homenagem ao avô
materno e ao tio paterno), conforme quadro a seguir.
De seu casamento com o capitão Rodolpho Cândido de
Sousa1, teve Adelaide Odília ainda dois outros filhos: Egídio de Sousa
Medeiros (1896-1950) e Jésus Chateaubriand de Souza (1902-1960),
ambos formados em Farmácia em Belo Horizonte.
Pelo ramo de Adelaide Odília, incluem-se dentre os descendentes
do Barão de Jequitahy, além de seus três já referidos netos, personagens
como Camilo Augusto de Lélis (presidente da Câmara Municipal de
Coração de Jesus), António Geraldo de Sousa Gomes (médico), Marco
Aurélio Martins de Sousa (médico), Antonio Egídio Martins de Sousa
(médico), Profª Adelaide Medeiros, Janaína Chateaubriand Bezerra
Lima (tabeliã), Tayrone Chateaubriand Bezerra Lima (tabelião), Dr.
Orlando Silqueira Leles (médico), Dr. Álvaro Raimundo Nonato de
Lélis (médico e vice-prefeito de Coração de Jesus), José Augusto de
Lélis Sobrinho (vice-prefeito de Coração de Jesus), Marcelo Eduardo
Lelis de Oliveira (premiado escritor, desenhista, ilustrador, cartunista
e quadrinista com projeção internacional), Álvaro de Lélis Neto
(vereador em Brasília de Minas), Gabriel Lafetá Prates Tupinambá
de Lélis (médico), Dra. Isméria Tupinambá de Lélis Branquinho
(defensora pública), Álvaro Luís Prates Lélis e Mares Guimarães
(vereador em Coração de Jesus), Tatiana Ribeiro Lellis Almeida
(vereadora e secretária municipal em Brasília de Minas), Oseas
Almeida Jr. (prefeito em Campo Azul), Antônia Augusta de Lélis
(professora e advogada), Mary Tupinambá Lellis (escritora) etc.
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1. Irmão do Capitão Camilo Cândido de Lélis, foi comerciante e juiz de paz em Montes
Claros, além de já ter sido professor no Vale do Jequitinhonha.
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A biografia do Barão de Jequitahy encontra-se devidamente
registrada nas obras de Simeão Ribeiro Pires2 e de Nelson Viana3.
Porém, várias outras passagens a seu respeito podem ser encontradas
em diversas obras esparsas na historiografia regional [nota I], nacional
[nota II] e até internacional [nota III].
Mas todos sabem que a forma mais antiga de se conhecer
histórias é através da oralidade. Não somente das histórias contadas
pelos familiares ao longo de gerações, mas aquelas que são contadas pelo
povo, pela comunidade. Histórias que se perpetuam como verdadeiro
patrimônio de um povo, e que ajudam na própria identidade desse
mesmo povo. Não é devido à impossibilidade de se ter o registro
escrito dessas histórias que as mesmas, quando contadas, não nos
encantam e nos fascinam. Sendo assim, para conhecermos uma
história não necessariamente precisamos da letra (escrita), mas sim
da palavra (falada). O senhor Manuel Olinto, do atual município de
Jequitaí (MG), é verdadeiro representante dessa tradição oral. Guarda
histórias e lendas sobre o Barão de Jequitaí, e as conta de forma
peculiar. Dentre elas destacamos duas que nos chamam a atenção,
pela singularidade, pelo poder de terem se perpetuado ao longo de
gerações, por pessoas que não são ligadas por consangüinidade com
o biografado deste artigo, o que por si só mostra a força e beleza da
tradição oral. Deixemos, pois, de explicações e deliciemo-nos com
as lendas e crendices populares em torno do Barão de Jequitaí, que
povoa o imaginário popular daquela região:
A ONÇA DA MÃO TORTA - Uma das lendas mais conhecidasé a lenda da onça da mão torta. Segundo essa tradição, o Barão era um
grande latifundiário (terras que iam de Jequitaí, da fazenda Vargem da
Cruz, até a Barra do Guaicuí) e detentor de muitos escravos. Conta a
lenda que o Barão era deveras rigoroso com os seus escravos, e tinha
um cuidado e orgulho de suas terras. Ou seja, era um proprietário
_________________________________________
2. PIRES, Simeão Ribeiro. Serra Geral: diamantes, garimpeiros & escravos. Belo
Horizonte: Cutiara, 2001, p. 201-225.
3. VIANA, Nelson. Serões Montesclarenses. (Capítulo “Nobiliarquia Norte-Mineira”).
Editora Itatiaia, p. 238-241.
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extremamente apegado às suas posses. Anos depois da morte do
Barão, apareceu uma onça da mão torta na região de Jequitaí, que
assombrava os fazendeiros, pois a mesma vitimava impiedosamente
as reses. Certo fazendeiro, que além de tudo era exímio caçador,
sobremaneira incomodado com as baixas em seu rebanho decidiu pôr
fim à fome desvairada daquela onça, cujo apetite implacável cada dia
se tornava maior. Armou-se de espingarda e foi rastrear o animal. De
repente, deparou-se com a onça da mão torta devorando um bezerro e
não hesitou em atirar. A onça simplesmente virou-se para o fazendeiro
e disse: “Nas minhas terras, como o que é meu”. O fazendeiro fugiu
amedrontado e certo que aquela onça da mão torta era a encarnação
do Barão, antigo proprietário daquelas paragens.
O GRITADOR – Outra lenda em torno do Barão de Jequitaí
é a de que na região das Fazendas Vargem da Cruz e Lagoa do Barro,
terras que no passado compunham a Fazenda Jequitaí Velho, sede
das fazendas do Barão, aparecia volta e meia um pássaro grande e de
um canto fino, nunca visto na região, que recebeu dos moradores o
nome de GRITADOR. Esse pássaro era raivoso, e atacava as pessoas.
Muitos tentaram sem sucesso atirar no mesmo, mas tais atitudes só
faziam a ave ficar mais e mais nervosa. Ninguém sabe por que o alvo
preferencial da ira do pássaro era uma escolinha perto da comunidade
de Jatobá, terras pertencentes antigamente ao Barão e hoje à família
Guedes. Segundo reza a lenda, o pássaro jogava pedras no telhado da
escola, apagava o que era escrito no quadro negro em vôos rasantes e
cinematográficos, isso à vista de todos. E por fim, uma das artes mais
curiosas do pássaro, que segundo a crendice é outra encarnação da
alma do Barão, era a capacidade de ligar rádios guardados em malas
fechadas.
Nota I:
VIANNA, Urbino de Sousa. Monographia do Município de Montes
Claros: Breves Apontamentos Históricos, Geográphicos e Descriptivos,
p. 106-112: “Dentre os filhos illustres desta terra, ou a ella presos por estreitos
laços de famíllia, já desapparecidos no sorvedouro da morte, ligados à sua
história, ao seu progresso e engrandecimento, e que se distinguiam pela
capacidade mental, virtudes pessoaes e qualidades de apreço; consideração,
firmeza de caracter e posição política, entre outros, destaca-se: o Cel.
Cypriano de Medeiros Lima - Barão de Jequitahy (...), que nos primeiros
tempos de vida administrativa do Município, e através do antigo regimen,
prestou serviços relevantes a esta terra”.
TÓFOLO, Marilene Veloso. Barão de Jequitaí. In: Revista do Instituto
Histórico e Geográfico de Montes Claros. Volume XI - 2º Semestre de
2013.
AZEVEDO, Carlos. Barão de Jequitaí (literatura de cordel): “Eu agora
vou contar / um caso do meu rincão / lá nas terras do Bom Fim / arraial do
seu sertão / e lá dos tempos antigos / que havia escravidão. Dezoito e vinte
nove / que Cypriano nasceu / e lá na Fazenda Cedro / o lugar que ele cresceu
/ trabalhando ferreiro / profissão que aprendeu...”.
O Barão de Jequitaí é também personagem central da websérie “A Santa e
o Bruxo”, de Grimaulde Gomes (nascido em 21/11/1975, é de Várzea da
Palma-MG) – o que demonstra a representação cultural popular do Barão
de Jequitaí na literatura regional norte-mineira...
Nota II:
P. ex., o “Archivo Nobiliarchico Brasileiro”, livro editado em 1918 em
Lausanne (Suisse), pela Editora Imprimerie La Concorde, cujos autores são
os luso-brasileiros Rodolfo Smith de Vasconcelos (2° Barão de Vasconcelos),
e seu filho, Jaime Smith de Vasconcelos (3° Barão de Vasconcelos); em sua
página 242, refere-se ao Barão de Jequitahy, o Tenente-Coronel (Guarda
Nacional) Cypriano de Medeiros Lima, cujo título foi criado por meio do
Decreto Imperial de 25 de setembro de 1889.
Outro exemplo: “JEQUITAÍ, Barão de. (Século XIX). Título de nobreza de
Cypriano de Medeiros Lima, tenente-coronel da Guarda Nacional, barão
por decreto de 25 de setembro de 1889. Seu nome está incluído na nominata
de ‘ilustres homens de cor’ organizada por Nelson de Senna. Ver bibliografia.”
(LOPES, Nei. Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana, 2 ed., Selo
Negro Edições, 2014).
“JEQUITAÍ, Barão de - Título nobiliárquico passado, a 25.09.1889, para
Cypriano de Medeiros Lima. Título de origem toponímica. Rio de arraial
de Minas Gerais. Do tupi yiki’tai, jiquitaia, e ü, rio, rio das jiquitaias. A
jiquitaia é uma formiga amazônica, cuja picada arde como sal: ü’kü, sal, e
tai, como adjetivo ‘azedo, ácido, picante’, como verbo ‘ser picante, ácido,
arder’. A definição não é muito aceitável, por ser o rio de Minas Gerais
e a formiga da Amazônia. Talvez o nome se prenda a yükü (tai), molho,
por serem salinas as suas águas. Martius tira de yi’ki, covo, ta, para tomar,
e ü, rio (?). Covo - subst. comum: aparelho para apanhar peixe, espécie de
cesto de vime, taquara (Antenor Nascentes, II, 160; Silveira Bueno, Dic.
Escolar, 363).” (BARATA, Carlos de Almeida; CUNHA BUENO, Antônio
Henrique. O Dicionário das Famílias Brasileiras, Tomo II, p. 1244).
AULER, Guilherme. Titulares do Império. In: Anuário do Museu Imperial
de Petrópolis de 1950, p. 107.
Nota III:
Dentre outros, tomamos nota de dois livros do século XIX de viajantes
estrangeiros (ingleses) que citam Cypriano de Medeiros Lima:
BURTON, Richard. Viagem de Canoa de Sabará ao Oceano. Belo
Horizonte: Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1977. (Reconquista do Brasil, 37).
Burton percorreu todo o Rio das Velhas, em 1867... Eis um trecho: “Cerca
de 10h atracamos no porto da vila do Guaicuí. O porto não passava de
uma barranca densamente recoberta de vegetação, através da qual abriase
um caminho para o alto. Recebemos então a visita do delegado de
polícia, Sr. Leandro Hermeto da Silva e vários amigos. O primeiro destacou
amavelmente um sargento para obter-nos alojamento em Porto de Manga,
uma centena de jardas rio abaixo, e perto da junção dos dois grandes rios, o das Velhas e o São Francisco. Em breve estávamos instalados na casa do
major Cypriano Medeiros Lima, que nos havia oferecido hospedagem em
Diamantina. Era uma casa no estilo das demais, com paredes de taipa, com
uma boa sala bem arejada que ostentava uma mesa, uma alcova escura com
dois ‘catres’, um deles com um forro de couro de boi e outro com tiras
de couro trançadas. Uma passagem quase obstruída por um grande pote
de água, levava a uma cozinha, que se caracterizava pelo solo de pedras
finas, e um puxado destinado para acomodação de mendigos, porcos e cães.”
(Viagens aos planaltos do Brasil – Tomo II: Minas e os mineiros, p. 379).
WELLS, James. Explorando e viajando três mil milhas através do Brasil
do Rio de Janeiro ao Maranhão. Prefácio: Christopher Hill. Tradução:
Myriam Ávila (1995). 2 volumes. 324p.
(Conteúdo: Edição ilustrada em dois volumes do relato de viagens do
engenheiro inglês James Wells, feitas por volta de 1875, pelo leste brasileiro,
numa extensão compreendida do rio Grande ao rio Tocantins. Acompanha
a introdução do eminente historiador inglês Christopher Hill, que busca
captar as especificidades do olhar do viajante vitoriano às minas).
Dário Teixeira Cotrim
Cadeira N. 93
Patrono: Simeão Ribeiro Pires
ZÉ DO CAMPO
GERALDO RODRIGUES ANTUNES
Hoje eu desejo falar do meu saudoso amigo Geraldo Rodrigues Antunes (Geraldo Sanfoneiro e Zé do Campo), com quem tive uma saudável amizade de admiração e de respeito. Geraldo era filho de Orosimbo Rodrigues Antunes e de dona Sebastiana Antunes (dona Miúda). Ele nasceu no extinto povoado do Ribeirão (município de Juramento – Minas Gerais). Casou-se com a jovem Ivanilde Oliveira Antunes. Era eletricista-mecânico (e tinha Oficina na Rua São Francisco, ao lado da Pensão Salinas) sempre com o apoio do seu tio, Gasparino Rodrigues dos Santos, e do amigo-comum Manoel Durval Batista, ambos da Oficina Mecânica Progresso. Nas horas vagas Geraldo trabalhava como taxista – Simca Chambord 1966, profissão que ele nunca deixou de fazer, não obstante ser apenas uma atividade agregadora de seus rendimentos.
Entretanto, o que mais lhe convinha era tocar a sua sanfona (ou acordeão), com muita maestria e competência comprovada. Ainda moço, ele criou o conjunto “Zé do Campo e sua Gente” e participava do programa musical na Rádio ZYD-7, fazendo grande sucesso nos meios artísticos de nossa cidade. Como tocador de sanfona ele gravou
vários discos (LP) de vinil, com a participação de Zé do Jeep, Zé
Vicente, Joaquim Papudinho (no pandeiro), Osias, e os seus irmãos
Waldemar Rodrigues Antunes (Lelê) e Luís Rodrigues Antunes (Lú).
Geraldo Rodrigues Antunes - Zé do Campo
Geraldo Sanfoneiro foi amigo incondicional do ilustre cantor Luiz
Gonzaga, o Rei do Baião e, também, do mestre sanfoneiro Ciriaco,
tendo realizado com eles inúmeros shows em Montes Claros, por
diversas ocasiões.
Era Geraldo Sanfoneiro membro efetivo da Associação dos
Repentistas e Poetas Populares do Norte de Minas, entidade cultural
fundada por Ildeu Braúna e Téo Azevedo. Eu também participei da
ARPPNM com o meu primo Adolfo de Oliveira Prado, sendo o vicepresidente
do confrade Josecé Alves dos Santos.
A minha relação de conhecimento com Geraldo Sanfoneiro se
prende na família de minha mulher Júlia Maria Lima Cotrim, sua
prima de primeiro grau. Boêmio inveterado, ele curtia a vida com
os amigos em bares e boates da cidade, pois passava a noite inteira
tocando a sua fiel sanfona e cantando as músicas do Rei do Baião.
Esteve no dia do nosso casamento – eu e Júlia – com o grupo de
amigos fazendo a alegria dos nossos convidados. Durante muitos anos
ele comandou o programa de rádio “Zé do Campo e sua Gente” que
fazia sucesso, principalmente na zona rural. Tinha uma alma bondosa
e ajudava as pessoas na edição de discos vinil, assim como ainda faz
hoje o maior repentista do Brasil, Téo Azevedo. Nas festas de Nossa
Senhora de Santana, o dia 26 de julho, era comemorado com bastante
alegria e com a fé inabalável na santidade. A pequena igrejinha do
povoado do Ribeirão ficava superlotada para receber os fiéis. Ao lado
daquela capela era montada uma cobertura, com palhas de coqueiro,
onde, depois do leilão e do terço rezado, o sanfoneiro começava
a tocar da boca da noite até o raiar do dia seguinte. E o povo na
animação festeira da religiosidade arrastava o pé, fazendo da poeira
e diversão incontida em cada alma, e em cada coração. A cidade de Montes Claros precisa homenagear este homem simples, caridoso e
amante da música popular brasileira.
Francisca Rodrigues Antunes (Miuda), Geraldo Rodrigues Antunes
e Ivanilde de Oliveira Antunes.
Edvaldo de Aguiar Fróes
Cadeira N. 01
Patrono: Alpheu Gonçalves de Quadros
UM FERIMENTO POR ARMA BRANCA NA AXILA
Um fazendeiro, pai de um colega médico, foi ferido por arma branca (faca) na axila esquerda por um desafeto, durante uma discussão, na zona rural de Francisco Sá.
Foi atendido no Hospital daquela cidade, onde recebeu os primeiros cuidados: curativo compressivo local, soroterapia e transfusão de sangue total, devido à copiosa hemorragia e estado de choque hipovolêmico.
O médico telefonou para Jansen, informando sobre o caso e transferiu o paciente para Montes Claros, para seus cuidados profissionais e lá foi ele, com o seu auxiliar, para o Hospital, preparando tudo para o atendimento.
O filho do paciente, médico, estava acompanhando o pai, idade de 65 anos e em estado grave de choque, como dissemos, palidez intensa e mucosas descoradas.
Introduzido rapidamente no Bloco Cirúrgico, já preparado, foi dissecada uma veia no braço direito e feitas novas transfusões de sangue total e soroterapia glicofisiológica.
Aquela veia foi habilmente dissecada pelo acadêmico de
Medicina, 1° auxiliar e aluno de Jansen, que conseguiu com
dificuldade identificar o vaso sangrante: a mais calibrosa veia tributária,
denominada subescapular, que foi pinçada e ligada, com êxito.
Assim que terminou a cirurgia, com o paciente sem sangramento
e reversão do estado de choque, aquele colega, filho do paciente, que
tudo assistira, perguntou a Jansen: quem é esse cirurgião que auxiliou
na cirurgia e dissecou a veia do meu pai?
E Jansen, com satisfação, respondeu: não, ele é um estudante
de Medicina, meu aluno, que me acompanha nos plantões e cirurgia
e vem demonstrando uma grande vocação e talento para futuro
cirurgião!
No pós- operatório, no dia seguinte, ao fazer sua visita rotineira,
acompanhado por aquele estudante, mais uma surpresa: a enfermagem
informou que o paciente estava com náuseas e vômitos e, ao conferir a
diurese, observou volume urinário baixo, no frasco de coleta da urina,
através da sonda vesical de demora (Foley).
Jansen falou para o seu auxiliar: isso é um quadro de Insuficiência
Renal Aguda; peça o exame de sangue urgente, com dosagem de ureia,
creatinina, potássio, além da rotina. Vou comunicar, agora, com o
Nefrologista do Hospital!
O jovem estudante, meio espantado, perguntou: como chegou
a Atal diagnóstico, só pela clínica? E a resposta veio na hora: é a
experiência adquirida com o tempo, pois, meus mestres me ensinaram
que, paciente idoso em choque por tempo prolongado, a possibilidade
de instalação de IRA (insuficiência renal aguda) é alta!
O Nefrologista, que acabara de organizar o Serviço no Hospital,
veio para o atendimento especializado: várias sessões de diálise
peritonial, até a completa recuperação da função renal.
Mais um caso resolvido com sucesso!
ABSCESSO AMEBIANO DO FÍGADO
NUM JOVEM DE 15 ANOS
O paciente foi atendido por um clínico de renome na cidade,
amigo pessoal de Jansen, desde a sua formatura, tendo feito parceria
com o mesmo em vários casos. Apresentava o seguinte quadro clínico:
dor no hipocôndrio direito, de intensidade moderada, febre, arrepios
de frio, sudorese profusa e vespertina, perda de peso, anorexia, náuseas,
vômitos e dispepsia, história de crises esporádicas de disenteria,
de início há 03 meses. Ao exame físico: emagrecimento, mucosas
descoradas, dor à palpação e à percussão da área hepática, hepatomegalia
acentuada, palpando-se a massa a 10 cm abaixo da reborda costal
direita, icterícia moderada. Exame objetivo do tórax normal.Os
exames pré-operatórios foram realizados: RX de tórax em PA e perfil
normais; hemograma que revelou anemia moderada, leucocitose de
13.000/mm³, com predominância de polimorfonucleares neutrófilos
e ausência de eosinófilos; provas de função hepáticas normais, exceto
as bilirrubinas moderadamente aumentadas. VHS (velocidade de
hemossedimentação) aumentada e exame de fezes positivo para E.
histolytica. O clínico encaminhou o paciente para Jansen que realizou a cirurgia: laparotomia paramediana pararetal interna direita, desde a
reborda costal direita até o nível da cicatriz umbilical, com hemostasia
por eletrocoagulação e uso de afastador ortostático.Visualizou-se,
então, o volumoso abscesso com abaulamento da cápsula hepática
(Glisson), notando-se, à palpação, a característica sensação de
flutuação. Procedeu-se a punção do abscesso com agulha calibre 2,0
mm, no local mais saliente e de maior flutuação, aspirando-se o seu
conteúdo de substância achocolatada característica, após proteger a
cavidade peritoneal com compressas, para evitar a contaminação das
estruturas vizinhas, seguindo-se a incisão ampla do mesmo e aspiração
de todo o seu conteúdo e retirada de quase toda a sua parede pra evitar
posterior aderência dos lábios, drenando-se a sua loja com um dreno
tubular fenestrado n°30, com exteriorização pelo flanco direito e loja
sub-hepática drenada com dreno de Penrose, exteriorizado através de
contra- abertura à direita da incisão.
A quantidade de líquido aspirada foi algo espantoso: em
torno de 1.200 ml. O fechamento da parede abdominal, por planos,
usando-se fio de algodão, com pontos separados no folheto anterior
da aponeurose do reto do abdome e na pele. O pós-operatório
transcorreu normal e o sucesso da cirurgia foi total! O paciente foi
tratado depois, da sua amebíase, com Metronidazol. Em tempo: a
incidência de abscesso amebiano do fígado é muito pequena. Em
15.681 internações na 1° Clínica Cirúrgica do Hospital das Clinicas
da FMUSP, houve 09 casos: 0,06%! Foi o único caso visto por Jansen
em toda a sua carreira, de quase cinquenta anos!
PROLAPSO UTERINO DO 3° GRAU E PARCIAL DA
MUCOSA DO RETO, COM MIÍASE
A paciente de 50 anos de idade foi encaminhada ao Posto de
Saúde para atendimento e avaliação de Jansen, apresentando um
quadro deprimente: um prolapso uterino do 3°grau (completo)
associado ao prolapso da mucosa retal, com diversas ulcerações e apresença de numerosas larvas de mosca, com um detalhe: era portadora
de doença mental, provavelmente uma variável de esquizofrenia.
Recomendou para a acompanhante e a assistente da sala de
exames rigorosa higiene local com água, sabão, além do uso de éter e
solicitou exames pré-operatórios e águia de internamento hospitalar.
A cirurgia, realizada uma semana depois, foi um sucesso:
raquianestesia com histerectomia total vaginal, colpoperineoplastia
anterior e posterior, redução da mucosa retal, com cerclagem ao nível
do canal anal, deixando-o permeável ao dedo indicador (anel de
suporte), denominada Operação de Thiersch.
Um acontecimento algo engraçado foi no dia da alta da paciente,
em que Jansen , observando no seu sobrenome Leite, perguntou-lhe
se ela era parente do então Prefeito e ela respondeu: sim, expondo as
mamas e apertando uma delas, dizendo “olhe o leite aqui”...
E todos nós, inclusive as outras pacientes da Enfermaria, caímos
na gargalhada!
PERITONITE GRAVE
NUMA CRIANÇA DE QUATRO ANOS
A criança, sobrinha de Jansen, veio da cidade vizinha, Janaúba,
trazida pelo pai, numa madrugada, apresentando um quadro grave
de dor abdominal difusa e intensa que se iniciou no início da noite,
após uma infecção gastrointestinal com vômitos, diarreia e febre:
gastroenterite aguda.
Um detalhe tornou o caso mais dramático: o carro que o pai
dirigia começou a apresentar falha mecânica e apagou de vez quando
ele se encontrava bem próximo da residência do seu irmão, na mesma
rua, em torno das 04 horas da manhã.
O estado geral da paciente era precário: sinais de desidratação
acentuada, cianose nos lábios e extremidades, taquicardia, taquipnéia
e toxemia.
O médico, no seu automóvel, juntamente com o irmão e
a criança, se deslocaram imediatamente para o Pronto- Socorro,
comunicando com o Pediatra de plantão e iniciou o tratamento
de urgência com hidratação venosa através de uma veia dissecada,
oxigenioterapia, antibiótico de largo espectro e hidrocortisona venosa
(100mg).
O Pediatra fez uma cuidadosa avaliação, solicitando exames de
sangue e urina, coletada por sonda vesical, além de um RX simples de
abdome em decúbito dorsal.
Com o equilíbrio do quadro, a criança foi levada para o Bloco
Cirúrgico, sendo submetida à laparotomia exploradora, tendo como
1°auxiliar um cirurgião amigo de Jansen e pertecente ao Quadro
Clínico do Hospital.
Na cirurgia, confirmou-se o diagnóstico de Peritonite Purulenta
Generalizada, com hiperemia do apêndice cecal e das alças distendidas,
sem nenhuma perfuração, aventando-se a hipótese de um raro caso de
infecção peritonial por via hematogência, já que não havia hiperplasia
dos linfonodos mesentéricos (linfadenite mesentérica) que indicaria
uma infecção por via linfática.
Foi realizada apendicectomia, limpeza cuidadosa e drenagem
da cavidade peritonial, com fechamento da parede, por planos.
Não havia CTI e a paciente ficou internada na Pediatria,
acompanhada por seus pais, que se alternavam (foi uma concessão
feita devido ao caso grave e consideração a Jansen, pela Diretoria do
Hospital).
Aquele colega Pediatra, já citado, continuou acompanhando
o pós-operatório, mas houve intercorrências: devido à taquicardia
persistente, o famoso Clínico amigo do cirurgião foi chamado para
o devido tratamento. E outra temível e grave complicação ocorreu:
Coagulação Intravascular Disseminada (CID), bem inicial, tratada
eficazmente pelo Hematologista do Hospital, que usou Heparina Sódica IV e outras medidas especializadas. Finalmente, após 10 dias
de internação, foi dada alta àquela pequena paciente, para felicidade
de todos nós, ficando, apenas, uma cicatriz de aspecto não estético!
OBSTRUÇÃO INTESTINAL BAIXA POR CORPO
ESTRANHO EM CRIANÇA
No plantão de sobreaviso de Cirurgia, Jansen atendeu um caso
inusitado: uma criança de 05 anos, proveniente da zona rural, foi
internada no Pronto-Socorro com um quadro de dor abdominal
tipo cólica intensa, vômitos, parada de eliminação de fezes e gases
e distensão progressiva do abdome, há dois dias, com história de
ingestão de grande quantidade de sementes de “mutamba”, segundo
seus pais. O RX simples de abdome em ortostatismo mostrou a
presença de níveis hidroaéreos e grande distensão do intestino grosso,
do sigmoide ao ceco.
A criança, em jejum, com soroterapia, foi levada ao Bloco
Cirúrgico, na pequena sala destinada aos casos infectados e, sob
anestesia geral, o toque retal confirmou a grande massa de sementes
obstruindo a sua luz, retirando-as todas com o devido cuidado, pois,
sendo um pouco pontiagudas, poderiam ferir a mucosa do reto e o
dedo do cirurgião, que usava duas luvas para proteção.
O cirurgião passou para o seu auxiliar, estudante de Medicina,
sob a sua supervisão, a continuação da manobra e ele, ironicamente,
comentou: ah, o chefe, sempre que pode, me dá oportunidade na
cirurgia...
Felicidade Patrocínio
Cadeira N. 20
Patrono: Camilo Prates
INAUGURADA A BIBLIOTECA DO AUTOR MONTES-CLARENSE:
MARIA DAS MERCÊS PAIXÃO GUEDES
Ao inaugurarmos a Biblioteca do Autor Montes-clarense Maria das Mercês Paixão Guedes, celebramos aquilo que em nós reconhecemos como humanidade.
Sim, porque a palavra é símbolo, é, por excelência o símbolo essencial para quem se fez humano. E o símbolo, todos sabemos é resultado de um baita processo de abstração, que leva e traz qualquer realidade. De acordo com antropólogos, é na revolução comportamental do paleolítico superior, quando o homo começa a desenhar símbolos nas paredes das cavernas, quando começa a emitir sons com significados, quando começa a cantar, a dançar e enterrar seus mortos de maneira ritualizada, isto é, quando, começa a se comportar de maneira simbólica, aí sim, ele se distancia definitivamente da pura animalidade. Ao longo do tempo vemos o refinamento desse processo até chegarmos às primeiras bibliotecas com inscrições de sinais em tijolos, e daí às inscrições manuais nos papiros, e daí, à primeira imprensa de Gutenberg, que foi considerado o maior invento do segundo milênio.
A partir de então com o livro nas mãos, ninguém mais segurou o
homem, ele se tornou um deus, um deus humano, capaz dos maiores
feitos.
Quem gosta de livros, percebe que o exercício e hábito da boa
leitura, além de transmitir conhecimentos, ampliam infinitamente a
capacidade de expressão e o resultado desta combinação é a vivência
da mais legítima liberdade.
Jorge Luís Borges vai além, ao dizer que, “a leitura é uma
das possibilidades de felicidade que temos”. Talvez por isto, outro, o
Thoureaux, venha dizer que, “muitos homens iniciaram uma nova era
em suas vidas, a partir da leitura de um livro”. Isto pode ser verdade,
pois essa transformação do leitor interfere na sua relação eu-mundo,
levando-o a atuar neste, de maneira consciente e construtiva. As
bibliotecas estão cheias de ideias, e estas, são, sem dúvida, as mais
poderosas armas de transformação. Os livros falam e nos fazem pensar.
Toda boa Literatura contem Filosofia. Estamos com os que acreditam
que mesmo diante do aparato da tecnologia da comunicação, que
avança sem limites no mundo contemporâneo, o Livro permanecerá.
Aliás, quem reconhece este valor e permanência é o próprio criador
da virtualidade, o Bill Gates, que disse: “É claro que meus filhos terão
computadores, mas antes terão livros.”
Como filha de professora, viciada em presentear os filhos com
livros, desde cedo aprendi a amá-los. É com base nesta relação estreita
que tenho com eles, lendo e escrevendo, que passei a recomendálos
através de projetos que desenvolvo no meu Ateliê/Galeria de arte.
Primeiro o Clube de leitura, para palestras e discussões de grandes
obras, depois o Escambo de Livros, uma reunião organizada com
centenas de pessoas a fazer trocas de livros lidos, por livros a ler e
por fim o Livro Livre, que se constitui de uma estante de ferro, em
forma de casinha, na rua, em frente ao Ateliê, onde há dois anos
disponibilizo diariamente, em torno de vinte livros, para quem queira
levar, livremente. O projeto depende de doações, por isso através da
internet comuniquei o meu pedido e livros começaram a chegar. Esse périplo em busca de livros levou-me á residências de doutores e destas,
até os catadores de material reciclável.
Foi neste exercício que percebi a enormidade da produção
literária da cidade, e então, separando e reunindo livros dos escritores
locais, sonhei este sonho que hoje se torna realidade. Ao ser eleita
presidente da Academia Feminina de Letras, dividi o sonho com
minhas confreiras que imediatamente abraçaram a causa e começaram
a trabalhar, e aí sim, livros chegavam em cascatas, tanto por parte
das acadêmicas, como por parte de amigos, parentes, conhecidos,
desconhecidos, devido a uma maior divulgação. Cada caixa ou sacola
aberta, era, é sempre, motivo de vibração. Na impossibilidade de,
aqui, citar nomes de doadores, tantos foram, expressamos a todos em
geral a nossa imensa gratidão.
Voltando às providências para instalação da Biblioteca, foi
escolhido e aceito, de maneira unânime, o nome, in memoriam, de
uma admirável confreira que deixou saudades, “Maria das Mercês
Paixão Guedes. Comunicamos ao Sr. Ivan Guedes e é neste ponto
que a história fica mais bonita. Na primeira visita, em comitiva,
nem tínhamos terminado de falar e o Sr. Ivan pegou o telefone e
pediu, ali, imediatamente à sua secretária para localizar um imóvel
vazio para nos ceder. Cheio de Amor e saudades pela companheira
que se fora, escolheu a sala que a ela pertencera como escritório, sem
dúvidas, num gesto largo e significativo de homenagem àquela que
coloriu com as cores da felicidade, os seus dias. Tornou-se o parceiro
mais perfeito que uma empreitada como esta pudesse precisar. E foi
assim que, sempre ao procurá-lo com alguma dificuldade material
ou de outra natureza, para a solução do projeto, ele, imediatamente,
sem questionar, com a mais fina educação e inigualável generosidade
nos concedia o necessário, e mais. Então tudo foi se concretizando:
reformou e pintou a sala que nos ofereceu, pagou a execução dos
móveis e fez questão de patrocinar todas as despesas da inauguração,
colocando ainda, pessoal do seu quadro de funcionários para nos
ajudar. Muitas foram as vezes que saí do seu escritório disfarçando lágrimas de emoção, pois, não é sempre que o mundo nos oferece
uma experiência como esta. A grandeza da pessoalidade do Sr Ivan,
tem ultrapassado sempre, as nossas expectativas. Agradecer é preciso,
mas, como? O benefício é incalculável. Olho para o infinito e vejo
que a dívida será eterna. Mesmo assim arrisco um humilde: MUITO
OBRIGADA SR. IVAN.
Quanto às confreiras, vi o milagre do entusiasmo suplantar
qualquer discordância e todas responderem PRESENTE, com letras
maiúsculas, à todas as solicitações feitas; voluntárias apareciam de todo
lado. Que Alegria, meu Deus! Em comissões, ou isoladas iam trazendo
livros, pesquisando escritores, cuidando de fotos, comparecendo às
reuniões convocadas, entregando convites, agendando horários para
dar assistência à Biblioteca no seu funcionamento, etc. Eu teria que
citar muitos nomes no meu agradecimento, mas para não alongar,
peço licença para alcançar a todas, nas pessoas de Alcione Vieira (a 2ª
tesoureira) e Glorinha Mameluque (do conselho consultivo) que me
encorajaram e me acompanharam nas visitas iniciais desta aventura
cultural. Agradecemos também à bibliotecária Ângela Vera que com
seriedade e compromisso chefia as voluntárias na catalogação dos
livros. De dentro do meu coração evola uma onda de gratidão em
direção à vocês. Obrigada, companheiras! Um agradecimento, mas
não posso esquecer o escritório de Arquitetura e Decoração Ana
Paula Leite, que sacrificou o seu tempo e de maneira gratuita nos
atendeu executando os projetos de decoração da sala e de desenho do
mobiliário. Obrigada Ana Paula.
Aos escritores e escritoras, solicitamos que compareçam
para conferir as estantes e ver se encontram os títulos da sua produção,
o que não for encontrado, solicitamos que venham nos trazer, pois,
a partir de agora, esta biblioteca se torna o ponto de referência, de
leitura, de busca, de conhecimento e pesquisa de toda Literatura
montes-clarense. Aqui promoveremos lançamentos de livros, painéis
de poesias, concursos literários, contação de estórias e muito mais.
E a toda a população de Montes Claros, oferecemos este tesouro, solicitando que façam deste espaço, um ponto de passagem e de
parada frequente.
A Biblioteca já está funcionando das segundas as sextas-feiras
das 8 ás 12 e das 14 as 18 horas e no sábado de 8 ás 12 horas no
quarto andar da Rua Padre Augusto 183 Centro (em cima da Drogaria
Minas/Brasil/Manipulação. Obrigada.
Gilsa Florisbela Alcântara
Cadeira N.16
Patrono: Athos Braga
O ANTIGO MERCADO MUNICIPAL DE MONTES CLAROS
Em 1988 morei em Montes Claros para estudar, sou natural de Janaúba. Meu fascíneo pelo Mercado iniciou quando me relataram que naquele estacionamento chamado “Cimentão”, havia uma exuberante construção e que era um mercado muito antigo. Pensei - como era aquele mercado? Ficava horas das tardes imaginando como poderiam ter demolido o mercado velho. Conclui que o autor da demolição era um sujeito que odiava Montes Claros. Naquela época eu morava no centro, perto da Catedral, todas as tardes passava no “Cimentão” para chegar até um estabelecimento comercial, onde fazia um curso de tricô, numa loja de aviamento.
Pensava em ser produtora rural, viver humildemente na roça, com minha mãe, criando galinhas, cabras, tirando leite fazendo queijo. Ah, como minha vida mudou. Em 1990 fui aprovada no curso de Artes Visuais, na Faceart, Faculdade de Educação Artística, da FUNN, antiga Fundação que hoje se chama UNIMONTES, onde hoje sou professora. A faculdade era particular, vendia biscoito na rua, no mercado, para fregueses, fazia entrega e grande produção, parte vendia na faculdade mesmo. Durante as aulas de fotografia, dentro do laboratório, haviam muitas fotos antigas de Montes Claros em quadros emoldurados. Neles pela primeira fez, conheci a imagem do Mercado Velho, porém no outro dia as
fotos não estavam lá mais. Em poucos minutos essas imagens foram registradas
pela minha mente de tal maneira que jamais me esqueci.
Para pagar esse curso, iniciei lecionando, peguei gosto e amor à profissão,
nela estou há mais de 25 anos. Mas concluí que minha mente registrou a imagem
de tal maneira que, ela comandou o desenho da fachada de minha casa, quando
construí em 2004. O formato da fachada da minha casa e a fachada do Mercado
antigo demolido são parecidas, porém ele era, muito mais exuberante. Em 2008,
realizando uma entrevista com uma gorutubana, tecelã e rendeira, dona Joana, me
deixou bastante curiosa. Quando ela me disse que seu pai, Cipriano Caetano
de Souza gorutubano nato, levava produtos para vender no mercado em Montes
Claros em meados da década de 1940.
Quando entrei no Facebook, em 2013, conheci a fotografia do mercado de
Montes Claros. Na página de dona Maria das Dores Guimarães. Minha emoção
foi tamanha. Imediatamente, iniciei uma confecção de roupas para meus filhos,
que seriam de pessoas do início do século. Para fazer um cenário parecido com
um mercado comprei sexto de cipó e peguei emprestado com mãe gamelas. Tentei
retratar na imagem atual, com pessoas, como se estivessem na frente do mercado
em meados de 1899.
Ainda sinto muito o desejo de reconstruir o passado, a vontade de entrar
em uma vila antiga ou uma cidade totalmente baseada no passado. Mesmo assim
sou muito feliz com a arquitetura contemporânea. As pessoas que não respeitam o
patrimônio histórico e demolem, destruindo o físico, as casas, não tem noção do
devastador impacto que sofre os que amam sua terra e origem. No Brasil sofremos a
cada dia com a demolição da história. Reconstrui a fachada do mercado de Montes
Claros, por uma imposição do meu inconsciente, na fachada de minha casa. A tela
que pintei foi doada para o Museu Regional de Montes Claros em 2013. Em casa
tenho outra tela igual, mas que não consigo concluir sua pintura. Há 4 anos iniciei
e não vou terminar. Analisando meu inconsciente, descobri que, nele guardo um
sentimento muito forte de necessidade da imagem do mercado. Assim se expor e
ter que me desfazer dele, me faz pensar que, passarei pelo sentimento de falta de
ar e terra, como em 1988, quando sofria imaginando essa construção antiga, as vozes das pessoas, dos vendedores, os compradores e o martírio dos animais que
se sacrificavam nesse mercado, ainda sentia forte e presente quando atravessva o
cimentão, em 1988. O clamor íntimo que vivo é uma necessidade profunda de
valorização, conservação de nós mesmos, amor ao povo e a sua origem. Nesse
ano durante a Exposição em Montes Claros, reconstruíram a fachada do Mercado
dentro do parque João Alencar Atayde. As pessoas eternamente carregaram o
vazio, procurando de alguma maneira, completar a lacuna que a demolição do
patrimônio físico causa.
José, Maria Florisbela e Ana Elisa no fundo do quintal, posando para fotografia que usei
para ilustrar o quadro ”Mercado Municipal de Montes Claros de 1899”.
Pintura a óleo do “Mercado de Montes Claros 1899” - Museu Regional do Norte de Minas.
Gustavo Mameluque
Cadeira N. 45
Patrono: Henrique de Oliva Brasil
REGIONALISMO POLÍTICO NORTE MINEIRO
Estudo muito interessante e que merece ser divulgado para acadêmicos, estudiosos, historiadores e para o público em geral e para os nossos políticos é a Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós- Graduação em História Econômica da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo pelo Professor norte-mineiro Laurindo Mékie Pereira com orientação da Profa. Dra. Raquel Glezer. Importante ressaltar que o Projeto do Prof. Mékie teve efetivo apoio da UNIMONTES em diversos aspectos. Prof. Mékie trabalha o regionalismo político norte-mineiro da segunda metade do século XX. O objetivo central é compreender a emergência e o desenvolvimento da ideologia das classes dirigentes, identificando os seus principais componentes, sua difusão e assimilação pelo conjunto da sociedade. Em especial ele analisa muito bem a participação da Sociedade Rural e da Associação Comercial e Industrial de Montes Claros na formulação do conceito de “desenvolvimento regional” e o envolvimento das mesmas com o” Poder político” local. A conclusão mais importante é a de que a burguesia regional se organizou como classe, nesse período, tendo evoluído de uma ação corporativa inicial para o exercício da hegemonia, ao final do século XX. Mas o que mais chama a atenção na sua bem elaborada Tese de Doutorado é a descoberta, durante as suas pesquisas, no Jornal Binômio , de Belo Horizonte de que em Montes Claros, no século XX ainda havia resquícios de escravidão, de escravidão branca, quando casais vindos do nordeste (retirantes) eram negociados . “Em 1959, os retirantes de Montes Claros foram assunto nacional. O jornal Binômio, de Belo Horizonte, divulga que um” mercado de escravos em Montes Claros”, pois os jornalistas, disfarçados de fazendeiros, teriam comprado uma casal de nordestinos por 4 mil cruzeiros, com recibo e garantias de saúde do mesmo.” Tal fato teve repercussão nacional e foi contestado pela imprensa montesclarense da época tendo como porta-voz o ex-colunista e Jornalista Lazinho Pimenta. Mékie destaca ainda a participação do Prof. Simeão Ribeiro Pires e dos Professores Alfredo Dolabella e Expedicto Mendonça na teorização das teses separatistas que fundamentaram o Estado de São Francisco e o Estado de Minas do Norte, ambos derrotados no Congresso Nacional.
Dr. Simeão é lembrado pelo Prof. Laurindo da seguinte maneira: “Destacamos, ainda, a atuação de Simeão Ribeiro Pires. Pertencente a uma das mais tradicionais e influentes famílias da região- os Ribeiros-, Simeão, formado em engenharia e história, era também fazendeiro, industrial e liderança política. Foi prefeito de Montes Claros entre 1959 e 1963 e vereador nas gestões 1963-1966 e 1967-1970. Entendemos que ele foi um dos principais formuladores da ideologia regionalista, desempenhando o papel de intelectual das classes dirigentes, organizando-as, contribuindo para lhes dar homogeneidade e exprimirem-se política e economicamente, conforme propõe Gramsci. (...) ele foi voz ativa no movimento de 1987-1988, fornecendo a esse movimento (Estado Minas do Norte) um dos seus argumentos mais fortes: a tese da primazia baiana na colonização do Norte de Minas e a similitude dessa região com o restante do Nordeste. Já em 1962 e 1965, ele publicou artigos defendendo suas idéias e as apresentou, de forma organizada e” completa”, em 1979, com o livro Raízes de Minas.”
O mérito maior do Prof. Mékie é sistematizar com clareza e precisão científica o processo de formação da “ideologia do regionalismo” traçando um perfil que se iniciam com as bandeiras paulistas, passando pelas disputas políticas de Camilo Prates e Honorato Alves, a criação da SUDENE, os movimentos separatistas patrocinados pela classe política local e contestada pelo centralismo do Governo mineiro. Deixa claro que neste período contemporâneo não houve espaço para significativas manifestações populares e que realmente o processo político foi ditados pelas classes empresariais e intelectuais, com poucas ou raríssimas exceções . Ressalta por fim que as poucas demandas populares de caráter regional foram capitalizadas pelo tripé: Sociedade rural, ACI e Políticios institucionalizados (Prefeitos, vereadores e Deputados).
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Referência: PEREIRA, Laurindo Mèkie. Em nome da região, a serviço do capital: o regionalismo político norte-mineiro. São Paulo: USP, 2007.
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Harlen Soares Veloso
Cadeira N. 26
Patrono: Cyro dos Anjos
A ORIGEM DOS VELOSO
DO NORTE DE MINAS
A família Veloso é enormemente ramificada na região do Norte de Minas Gerais. Quem primeiro se ocupou dos registros acerca da origem dessa família foi o Coronel Gregório José Veloso (1825-1900), como nos relata Rui Veloso Versiani dos Anjos na obra “A História da Família Versiani”, de 1944 (quando tratou do ramo “Versiani-Veloso” formado pela união das duas famílias pelo casamento do Dr. Antônio Augusto Veloso com Dona Elisa Versiani).
O referido autor narra, a partir dos escritos do Coronel, que “na aldeia de Santa Eulália de Gondoriz, termo da Vila de Arcos de Valdevez, comarca de Valença do Minho, Arcebispado de Braga, em Portugal, havia no século XVIII uma numerosa família de vinhateiros, da qual era chefe Antônio Veloso, casado com D. Maria Gomes Barros. Entre seus filhos estava Manuel Veloso, casado com D. Maria José Belo, provindo desse casal diversos filhos, dos quais, no meado do mesmo século XVIII, emigraram para o Brasil três e entre eles Bento Luis Veloso, que foi o fundador da família Veloso, de Montes Claros”. E prossegue: “Vinham os três irmãos atraídos pela notícia das riquezas auríferas de Minas Gerais, tendo um deles procurado
São João Del Rei, o outro Minas Novas e Bento Luis Veloso o norte
do Estado, estabelecendo-se mais tarde no arraial de Formigas, hoje
Montes Claros” (1).
Na obra de Hermes de Paula, a família Veloso é aquela descrita
com maior quantidade de informações e páginas entre todas as
genealogias estudadas pelo eminente historiador. Acompanhando a
narrativa de Rui Veloso, ele afirma que “Em meados do Século XVIII,
fixou-se em Formigas o português Bento Luis Veloso (...)” (2).
Fonte: Torre do Tombo. Arquivo Distrital de Braga, Concelho de Arcos de Val-de-Vez, Freguesia
de Gondoriz, Livro de Nascimentos nº 2. – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
A propósito dessas afirmações dos eminentes historiadores,
propusemo-nos uma investigação acerca dos dados informados, no
intuito de lançar luzes na pesquisa histórica por eles empreendida e
trazer mais elementos para a elucidação da origem da família Veloso.
Começamos pelo nascimento de Bento Luis Vellozo. Conforme
o registro abaixo, ele nasceu em 1º de novembro de 1740, no “lugar
da Costarica desta freguesia de Gondoriz”, e foi batizado três dias
depois.
A organização administrativa de Portugal contempla divisões
em Distritos, Concelhos e Freguesias. “A função que a freguesia exerce
em Portugal não encontra similar oficial no Brasil, por isso varia de
município para município. A correlação mais direta seriam os bairros
com suas associações de moradores” (3).
-
Gondoriz é uma freguesia
portuguesa do Concelho de Arcos
de Valdevez, com 33,97 km² deárea e conta atualmente com 958
habitantes, número inferior ao de
1.471 registrado em 1864 (4).
Situa-se na sub-região estatística
do Alto Minho, antiga região do
Noroeste de Portugal, que fazia parte
da província do Minho. Corresponde
geograficamente ao moderno distrito
de Viana do Castelo; no entanto,
nunca teve qualquer existência legal
como província (Wikipédia).
O Rio Minho serve de fronteira
entre Portugal e Espanha, nos últimos
70 km do seu curso. É a maior região
vinícola portuguesa, sendo tradicional
ali a produção do Vinho Verde, o que
corrobora as afirmações de Rui Veloso
e Hermes de Paula quanto à antiga ocupação dos Veloso naquela
região de Portugal.
“É uma região de solos majoritariamente graníticos, rica em
recursos hídricos, com um clima ameno e úmido de influência
atlântica. A cultura da vinha tem no Minho remotas tradições e é
possível seguir a sua história até a época romana. A vinha é cultivada
em socalcos, com vestígios de uma das mais antigas formas de
condução: a “vinha de enforcado” ou “uveira”, em que as videiras são
plantadas junto a uma árvore e crescem apoiadas nos seus ramos. No
entanto, a maioria das novas explorações opta por métodos modernos
de condução da vinha” (Wikipédia).
O batismo mencionado ocorreu na Igreja Matriz de Gondoriz.
Foto: visitarportugal.pt
“Também conhecida como Igreja de Santa Eulália de Gondoriz.
Remonta ao séc. XVIII. Sem quaisquer referências históricas, somente
um templo setecentista, apresenta uma planta longitudinal formada
por nave e capela-mor. Está adossada a esta a torre sineira, num plano
um pouco mais recuado, e um anexo como a sacristia. A fachada
delimitada por pilastras é finalizada por um frontão contracurvado.
Ao centro apresenta o portal em arco abatido sobrepujado por uma
arquitrave e encimado por um janelão, e este por um nicho com Santa
Eulália” (5).
Não há elementos precisos acerca das circunstâncias da vinda
de Bento para o Brasil. O contexto histórico português nos idos de
1750/1760 era de decadência diante de outras potências europeias,
falecimento de Dom João V (1750) e sua sucessão por Dom José
I, que delegou todos os poderes ao Marquês de Pombal. O Brasil
Colônia vivia o ciclo do ouro.
Bento casou-se no Brasil com Vitória Vieira de Azeredo
Coutinho (1), nascida em Raposos/MG (batismo abaixo, em
abril/1757), filha de José Vieira de Figueiredo e Andreza Theodora
Grinalda (ou “de Grinalda”, como aparece em alguns documentos).
Vitória está ligada à Genealogia Paulistana descrita por Luis Gonzaga
da Silva Leme (1904).
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
Outrossim, ousamos divergir de Rui Veloso e Hermes de Paula
ao constatar que não há evidências da fixação de Bento Veloso em
Formigas. Diversamente, os documentos localizados demonstram a
sua presença em Itacambira/MG. Num outro contraponto aos textos
dos eminentes historiadores, observa-se que não há elementos que
relacionem a vinda de Bento à exploração do ouro, mas sim à sua
condição de militar e ao serviço à Real Fazenda, como veremos
adiante.
Para compreensão do tema, reportamo-nos à história de
Itacambira. Dário Teixeira Cotrim afirma que a cidade “foi encravada
no topo da serra do Espinhaço como celeiro e guarnição para o distrito
das Esmeraldas”, com início de povoação em 1698, quando o capitão Miguel Domingues, em companhia de um grupo de paulistas chegou à região para promover a garimpagem. Prosseguindo, o historiador
transcreve relato de que “o Destacamento dos Dragões (Reais de
Minas - de Portugal), para policiar o cercado do ouro, era composto
de oitocentos soldados” (6).
Auguste de Saint-Hilaire menciona que o regimento era
composto de “seiscentos homens, compreendendo os oficiais”, sendo“dividido em oito companhias, para cada uma das quais há três
oficiais, a saber, um alferes, ou sub-tenente; um tenente e um capitão,
o que importa em 24 oficiais, aos quais se acrescenta um major, um
tenente-coronel e o coronel” (7).
Por oportuno, cita-se o seguinte registro de batismo de
21/10/1781, em que um dos padrinhos foi o Capitão Domingos
Francisco de Carvalho:
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisador: Harlen Soares Veloso
Curiosamente, uma das madrinhas foi Andreza Teodora
Grinalda, que viria a ser a sogra de Bento Luis Vellozo, evidenciando
que os pais de Vitória também se fixaram em Itacambira, vindos de
Raposos.
Em outro batismo, em 25/12/1782, a própria Vitória
compareceu como madrinha, já como esposa de Bento, mencionado
como Alferes:
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisador: Harlen Soares Veloso
Veremos adiante, contudo, que nessa época Bento já havia sido
promovido a Tenente.
Outrossim, o seguinte registro de um casamento ocorrido
em 1783 demonstra que Bento reconheceu um filho descrito
como “natural” (Luis José Velloso) havido com Felizarda de Jesus.
Presumindo-se que o filho em questão casara-se por volta dos 20 anos,
conclui-se que Bento já estava em Itacambira em torno de 1763,
com a idade aproximada de 23 anos (e Vitória, na ocasião, era ainda
criança, com apenas 6 anos).
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
Corrobora essa constatação o reconhecimento de uma segunda
filha por Bento (Feliciana Maria de Jesus), com a mesma mulher,
filha esta que veio a casar-se em 1785. Mantido o mesmo raciocínio
anterior, teria ela nascido em 1765, reforçando a chegada de Bento àquela época.
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
As circunstâncias antes mencionadas indicam que Bento e
Vitória casaram-se em Itacambira/MG. Eles tiveram onze filhos (1)
(2):
1 - José Antonio Velloso, nascido em 02/07/1776, falecido em
12/06/1853. Foi casado com Jacinta Catarina de Andrade;
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
2 - Maria Rangel de Azeredo Coutinho (25/06/1778), casada com
o Capitão Francisco da Fonseca Cunha (não faleceu solteira, como
anotou Hermes de Paula). No casamento dela em 15/08/1795
(registro abaixo) Bento já é mencionado como Tenente.
3 - Manoel José Velloso (06/01/1780), casado em 7/6/1801 com
Maria Roza de Souza, filha do Alferes Luciano Cardoso de Souza e
Gertrudes Rodrigues de Araújo, conforme registro a seguir:
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
4 - Francisco Felix Velloso (17/12/1781), foi casado com Marcelina
Caetana Firma (não foi Padre, como anotou Hermes de Paula).
Batismo em 27/12/1781:
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
“De Francisco Veloso, 4º filho de Bento Luis Veloso, varão
inteligente e culto, precedeu o ilustre brasileiro Francisco Sá, que foi
Secretário de Estado no Ceará e em Minas Gerais, deputado federal,
senador da República, ministro da Viação e Obras Públicas, nos
Governos Nilo Peçanha e Artur Bernardes. Entre os descendentes
de Francisco Veloso, contam-se professores de duas universidades,
médicos, engenheiros, advogados, ex-deputados federais, secretários
de Estado e ocupantes de altos cargos na administração federal” (1).
5 - João Velloso (25/01/1784-17/03/1785), batizado em fevereiro de
1784 na Fazenda Palmital, em Itacambira:
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
6 - Antonio Agostinho Velloso (15/04/1786 – 16/08/1867), casado
com Francisca Maria Cardoso de Souza, filha do Alferes Luciano
Cardoso de Souza e Gertrudes Rodrigues de Araújo. Batismo em
13/06/1786:
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
“Antônio Agostinho Veloso, como seu irmão Francisco
Veloso, foi um dedicado cultor da língua latina, à qual se dedicou
até à extrema velhice. Era dotado de memória prodigiosa e seu neto
Antônio Augusto Veloso contava que o ouvira muitas vêzes declamar
dezenas de versos da ‘Eneida’, odes de Horácio e elegias de Ovídio”
(1).
7 - Anna Caetana Velloso (22/07/1788). Batismo em 02/08/1788:
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
8 - Joaquim Inácio Velloso (17/11/1790 – 31/10/1841), foi casado
com Maria Francisca de Souza, filha do Alferes Luciano Cardoso de
Souza e Gertrudes Rodrigues de Araújo. Batismo em 14/12/1790:
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
Depois de ficar viúvo, Joaquim casou-se novamente (em
Formigas) com Maria Francisca de Jesus, filha de Filha do Capitão
José Antonio Da Fonseca Ruas e de Josefa Gonçalves de Jesus.
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisador: Aluísio Carlos da Cunha Jr.
Óbito de Joaquim em 1841, na Vila de Formigas:
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
9 - Perpétua Veloso (17/02/1793);
10 - João José Velloso (17/02/1795) foi casado com Esperança dos
Santos Lima. Batismo em 03/01/1796:
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
11 - Miguel Velloso (28/09/1798). Batismo em 04/10/1798:
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
Além de integrar o regimento militar, alguns documentos
demonstram que Bento também atuou como “administrador de
dízimos”.
O Dízimo Real era um imposto cobrado sobre a décima
parte de todos os bens dos indivíduos. Sua cobrança foi instituída
na América Portuguesa pelo Foral de Doação das Capitanias, e seu
Regimento data de 17 de setembro de 1577. Esse imposto, que
em Portugal e nos domínios ultramarinos era recolhido pela Coroa
e deveria destinar-se à manutenção de igrejas e sacerdotes, acabava
pagando os salários dos quadros burocráticos e, por isso, recebeu a
denominação de dízimo real. A partir de 1628, os dízimos reais eram
arrematados em leilões públicos nas capitanias e, em 1735 passaram a
ser arrematados em Lisboa, por intermédio do Sistema de Contrato,
cabendo ao dizimeiro – oficial nomeado pelo arrematante – fazer a
arrecadação (8).
Há várias evidências da atuação de Bento Luis Vellozo nessa
condição de administrador de dízimos.
Com efeito, nesta carta de 15/05/1791, ele comunica a“remessa de listas de créditos, e pergunta a quem deveria ser entregue
o dinheiro que era cobrado daquele contrato, sendo sua preferência
dada ao conde da Serra de Santo Antônio, que lhe auxiliaria nas
cobranças” (9):
Fonte: Biblioteca digital Luso-Brasileira – Pesquisador: Harlen Soares Veloso
Em outra missiva, de 20/07/1796, Bento Luis Vellozo informa
a “entrada na Intendência da Vila do Príncipe da quantia recebida
do tesoureiro para apresentar na Junta da Fazenda Real, e que ele
vai ficar com o resto das cobranças da administração de Itacambira e
Morrinhos” (9):
.
Fonte: Biblioteca digital Luso-Brasileira – Pesquisador: Harlen Soares Veloso
Observa-se também o seguinte “parecer em relação ao
requerimento de Bento Luís Vellozo, administrador de duas freguesias”
(Itacambira e Morrinhos – sublinhou-se), “pedindo o prêmio e a
quantia dada pelo arrematante pelo seu contrato do ano de 1789” (9).
Há, ainda, uma longa lista de 49 páginas referentes às “cobranças
que fez Bento Luís Velloso, administrador dos dízimos de 1789 das
freguesias de Morrinhos, Itacambira e beirada do Rio São Francisco”
(9), aqui reproduzida apenas em parte:
Fonte: Biblioteca digital Luso-Brasileira – Pesquisador: Harlen Soares Veloso
Por fim, identifica-se o registro do óbito de Bento Luis Vellozo
em 11 de fevereiro de 1802, com 61 anos de idade, em Itacambira,
o que reforça a constatação de que não houve a sua fixação em
Formigas.
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisador: Harlen Soares Veloso
A viúva Vitória, por sua vez, faleceu na Vila de Formigas
em 26/01/1837, tendo sido sepultada no interior da igreja Matriz,
conforme o seguinte registro:
Fonte: FamilySearch.org – Pesquisadora: Nívea Nunes Dias
Conclui-se que a viúva Vitória e seus descendentes mudaramse
de Itacambira para Formigas, de onde se ramificou a família que
atualmente tem membros em vários Estados do país e também no
exterior.
Por fim, destacam-se os seguintes aspectos:
- Na assinatura do próprio Bento observa-se a grafia original
do nome composto LUIS (sem acento no “i” e com S no final) e o
sobrenome VELLOZO (com dois L e Z);
- A reforma ortográfica de 1943 aboliu as letras dobradas (L,
M e N), de modo que o sobrenome Velloso passou a ser escrito como
Veloso, embora alguns ramos preservem a grafia original;
- A partir do exame de DNA de um descendente em linha
paterna direta de Bento Luis Vellozo, identificou-se que o haplogrupo
associado ao cromossomo Y (que passa indefinidamente de pai para
filho, neto etc.) é o R-M269, linhagem predominante em toda a
Europa ocidental. Acredita-se que este haplogrupo se tenha originado
há cerca de 9.500 anos na região do Mar Negro e depois tenha se
espalhado pela Europa (10).
- Um 6º avô de Vitória Vieira de Azeredo Coutinho foi Marcos
de Azeredo (1559-1618), famoso bandeirante, conhecido pela
descoberta da Serra das Esmeraldas; precursor de Fernão Dias Paes na
busca por essas pedras (11).
- Por força de endogamia, dois dos filhos de Bento são ancestrais
diretos do autor deste artigo (Antônio Agostinho Vellozo, 4º avô em
linha paterna; e Manoel José Vellozo, 6º avô em linha materna).
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Fontes:
1. DOS ANJOS, Rui Veloso Versiani. A História da Família Versiani. Belo Horizonte, 1944.
2.DE PAULA, Hermes Augusto. Montes Claros, sua História, sua Gente, seus Costumes – Parte II,
1979.
3.http://www.conexaoportugal.com/2011/03/entenda-divisao-do-estado-portugues.html (acesso em
fevereiro de 2018).
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4. População residente, segundo a dimensão dos lugares, população isolada, embarcada, corpo
diplomático e sexo, por idade (ano a ano). Informação no separador “Q601_Norte”. Instituto Nacional de Estatística. Cópia arquivada em 4 de Dezembro de 2013.
5. https://www.visitarportugal.pt (acesso em fevereiro de 2018).
6. COTRIM, Dário Teixeira. Ensaios Históricos de Itacambira. Minas Gerais. Editora Millennium/
Cotrim Ltda. 2014.
7. SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem pelas Províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais, p. 163.
8. ROMEIRO, Adriana. BOTELHO, Ângela Vianna. Dicionário Histórico das Minas Gerais –
Período Colonial. 2ª edição, Autêntica, pág. 116.
9. Biblioteca digital Luso-Brasileira:
https://bdlb.bn.gov.br/acervo/handle/123456789/17 (acesso em fev/2018).
10. Family Tree DNA. www.familytreedna.com (acesso em fev/2018).
11. Geni.com – perfil de Marcos de Azeredo (1559-1618).
https://www.geni.com/people/Marcos-de-Azeredo/4732400567740038868
(acesso em fevereiro de 2018).
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Juvenal Caldeira Durães
Cadeira N. 81
Patrono: Nathércio França
RELATOS
No começo do ano de 1955, depois de mais de 10 anos de andança pelo Sul, retornei à cidade de Montes Claros, minha terra natal, portando comigo o curso ginasial (1° grau), pelo Colégio Estadual de Londrina – PR e o diploma de Mecânica pela Escola Técnica da General Motors do Brasil.
Então, ingressei-me no curso científico (2° grau) no Colégio Diocesano, ocasião em que convivi com os conhecimentos dos grandes mestres do saber. Na mesma época, fui admitido na Estrada de Ferro da Central do Brasil/EFCB como torneiro mecânico, sob administração do saudoso Mestre, Raimundo de Carvalho.
Em 1957, cursando ainda o 3° ano, fui indicado pelo professor de Física para lecionar aquela disciplina, no 1° e 2º anos, visto a falta de professores. Apesar de minha resistência, levado pelo receio de não dar conta da incumbência, o diretor Monsenhor Gustavo convenceu-me a aceitar o cargo. No ano seguinte, fui indicado pelo Inspetor de Ensino, Dr. Antônio Augusto Veloso, para lecionar Matemática na velha Escola Normal, o que também, não pude recusar diante da insistência da diretora. A minha intenção era fazer o curso de
Engenharia Mecânica em Belo Horizonte e não seguir a carreira do
magistério.
No Final de 1958, foi criado um projeto, pela administração da
EFCB/RJ, para a instalação da Escola Profissional no Pátio da Central.
Eu fui indicado pelo Mestre Raimundo de Carvalho para implantar
a referida escola, que destinava a formação profissional dos filhos dos
ferroviários. Eu tomei as devidas providências, sempre em contato
com a chefia do Rio de Janeiro e com o apoio do Mestre Raimundo,
coloquei o modesto estabelecimento em pleno funcionamento no
ano seguinte, com 36 alunos selecionados.
Na EFCB, tive um grande progresso, com o apoio do Mestre
Raimundo de Carvalho. Ele era uma pessoa comedida e competente,
que valorizava os seus funcionários. O nosso chefe imediato da
Tornearia era o saudoso Joaquim Damásio, pessoa humilde e
bondosa. Certo dia, eu fui com ele a sua casa e vi uma mocinha,
sua enteada, com idade de 15 anos, mais ou menos. Ela me atraiu
com sua naturalidade, simplicidade e aparência, começando o nosso
namoro, que resultou em casamento após dois anos. O tempo passou
e nasceram oito filhos, quatro homens e quatro mulheres. Wagner, o
primeiro filho, aos 20 anos de idade, cursando o 2° ano de medicina,
veio a falecer com um disparo de arma de fogo, o que nos trouxe um
grande transtorno e sofrimento, que ainda perdura no meio de nossa
família. Contudo, a vida continua e os demais filhos seguem os seus
destinos, com cursos superiores e mais ou menos equilibrados.
A EFCB transformou-se na Rede Ferroviária Federal Sociedade
Anônima/RFFS/A e eu continuei nas suas fileiras, trabalhando e
construindo o meu futuro. Ali, eu firmei como profissional, comecei
a construção do meu lar, a carreira do magistério, tornando-me
conhecido e estimado pela comunidade ferroviária, pela população
montesclarense e do norte de Minas.
Mais tarde, já com o curso de Geografia, pelo Instituto de
Educação-BH, passei para o Ginásio Montes Claros/RFFS/A, onde assumi a cadeira de Geografia e a vice-diretoria, para tempo depois,
ser transferido para o Centro de Treinamento Profissional, recémcriado
na Rede Ferroviária. Para exercer a função ali, tive que rever os
meus conhecimentos profissionais na Escola Técnica Silva Freire-RJ
que, depois de reciclado em Física, Eletrotécnica e em princípios de
Psicologia e de relacionamentos humanos aplicados à indústria, tive
ainda, que passar pelo SENAI-BH, onde estudei técnicas especiais
versadas ao ensino industrial. Depois dessa “maratona”, voltei para
iniciar as minhas atividades no referido centro, onde permaneci até a
minha aposentadoria, em 1983.
Lutas prazerosas, que me deixaram saudades inesquecíveis
daqueles tempos passados. Contudo, ainda me sinto inconformado
com as ações lesivas, de um governo corrupto, que vieram privatizar
a Rede Ferroviária, indevidamente, prejudicando lugares por
onde passavam os seus trilhos beneficiando milhares de famílias
desprotegidas pelos poderes públicos.
Em 1964, instalaram os primeiros cursos superiores em
Montes Claros, á noite, no Colégio Imaculada: Letras, Pedagogia,
História e Geografia. Ingressei-me no curso de Pedagogia, passando
posteriormente, para o curso de Matemática instalado na FAFIL em
1968, por iniciativa de um grupo, em que eu e Rosa, minha esposa,
fazíamos parte. Formado em 1971 e especializado em Álgebra Vetorial
e Linear, pela UFMG-BH e, também, especializado em Matemática
Superior pela Universidade Católica-BH, assumi a cadeira de Álgebra
e de Análise Matemática na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras/
FAFIl. Rosa, também especializada pela UFMG, assumiu a cadeira
de Estatística. Tempo depois, fui vice-diretor da profª. D. Lourdes
na FAFIL e finalmente, tornei-me Diretor do Centro de Ciências
Humanas/CCH/UNIMONTES, até a minha aposentadoria em
1997, com 70 anos de idade.
Por indicação do Conselho de Ensino, Pesquisas e Extensão/
UNIMONTES, fui designado para receber o diploma da “Ordem do
Mérito Educacional” com Medalha, na Secretaria Estadual de Ensino,
concedida no governo de Itamar Franco.
Finalmente, aposentado e procurando alguma ocupação
tranquila e que me trouxesse satisfação, resolvi escrever algumas
passagens de minha vida. Assim saiu o meu primeiro livro:“Experiências de uma Vida”, que foi bem aceito pelos amigos e pela
minha família.
Tempo depois, atendendo ao chamado do nosso amigo escritor
Dr. Wanderlino Arruda, ingressei-me no grupo de criação do Instituto
Histórico e Geográfico de Montes Claros/IHGM e lá, assumindo
a Diretoria de Finanças da entidade no primeiro mandato, dei a
minha modesta parcela de colaboração. Ali, aproveito as amizades e
as experiências culturais dos colegas valorosos que interessam, com
sinceridade e empenho, no sucesso de seus companheiros. Eu escrevo
para a revista do Instituto e fiz o livro “Sítio Azedo”, que fala sobre as
amargas aventuras de uma senhora do Ceará. Recentemente, escrevi,
também, na Academia de Letras, o livro “Assim eu Penso”, que expõe
os meus pensamentos para apreciação dos leitores.
Eu sempre em contato com a minha ex-professora de
literatura e colega de trabalho, a escritora e Presidente da Academia
Montesclarense de Letras, D. Ivone Silveira, fui levado por ela, para
aquela nobre entidade, onde encontrei um ambiente não diferente
do IHGMC, de pessoas de alto nível intelectual e interessadas em
promover os seus colegas. A Academia é um ambiente de cultura das
letras e de conhecimento saudável e acolhedor.
Na noite festiva do dia 13/11/2018, na referida Academia, tive
a satisfação e honra de ser homenageado juntamente com as minhas
estimadas e ilustres confreiras: Mary Lelis, Diretora de Finanças da
entidade e Felicidade Patrocínio, Presidente da Academia Feminina
de Letras, além de nossa amiga e confreira no Instituto Histórico e
Geográfico de Montes Claros/IHGMC.
Na ocasião, eu tomado pela emoção, procurei agradecer a
Diretoria e os membros da mesa, na pessoa de nosso amigo, escritor
e Presidente, Dr. Itamaury Teles. Agradeci, também, a escritora e oradora, Profª. Míriam Carvalho, pelo seu generoso e enaltecedor
discurso referente a minha pessoa. E, já afetado, emocionalmente,
pela brilhante homenagem recebida, não tive condições para
cumprimentar, de modo especial, outras personalidades ilustres ali
presentes, conforme era o meu desejo. Pois, sabemos que, a emoção
não é uma boa companheira da oratória.
Aposentado na RFFSA em 1983; na EEPPR em 1984 e na
UNIMONTES, em 1997, depois de desempenhar várias funções
e cargos ao longo dos anos nos estabelecimentos por onde passei,
vivo mais reservado e afastado das atribulações naturais do mundo,
fazendo aquilo que sempre tive vontade de fazer. Mas, nem tudo
são flores, sabemos que sempre aparecem algumas dificuldades para
atropelar e dificultar o desempenho de nossas atividades. Contudo,
as dificuldades que surgiram no meu caminho não impediram,
totalmente, o cumprimento de meu dever e a realização de minhas
metas e obrigações.
No livro -“Crítica da Razão Pura” - Emmanuel Kant - recebemos
explicações que, sempre aparecem obstáculos na execução das nossas
atividades. Na realidade, são ações incentivadoras, porém inevitáveis,
impostas pelas Leis Naturais, que não há como livrar delas, contudo,
podemos suavizar alguns de seus efeitos, com paciência e sabedoria.
“É preciso que suporte duas ou três larvas se quiser conhecer as
borboletas.” O Pequeno Príncipe – Saint Exupery.
Felizmente, consegui o entrosamento com pessoas de alto
valor intelectual e peso da sociedade literária, o que me dotou de
situações satisfatórias para alcançar condições de relatar as minhas
lutas e algumas coisas do passado, para conhecimento e apreciação
das pessoas do presente e de nossa posteridade.
Lázaro Francisco Sena
Cadeira N. 55
João Luiz de Almeida
MAGNOS DENNER MEDEIROS
Dia 25 de março do corrente ano, faleceu nesta cidade um de seus mais brilhantes filhos adotivos, o professor Magnos Denner Medeiros. De seu “curriculum vitae”, consta ter nascido em Pirapora-MG, dia 05 de março de 1937, filho de Luiz Alves de Medeiros e Nelsolina de Souza Medeiros, mudando-se para Montes Claros, ainda criança, em companhia de seus pais. Foi aluno do Instituto Norte Mineiro de Educação, escola fundada pelo notável advogado e educador João Luiz de Almeida, concluindo ali o curso primário, o curso ginasial e o curso técnico de contabilidade, entre os anos de 1945 e 1955. Sua formação acadêmica se completou na antiga ,e pioneira Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da FUNM (Fundação Universidade do Norte de Minas), onde se licenciou em Geografia, entre os anos de 1967 e 1970.
Quando da fundação do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, o professor Magnos foi convidado para assumir a cadeira nº 15, cujo patrono é o jornalista Ataliba Machado. Assim, como associado efetivo do Instituto e colunista qualificado na imprensa local, sempre destacou o trabalho desta entidade em favor
da cultura regional. Em uma de suas últimas visitas à nossa sede atual,
ao ser perguntado sobre o que achava das condições e características
do antigo prédio que ocupamos, cravou uma frase que se tornou
marcante: “Isto aqui é a cara do Instituto!”
Falar de todas as qualidades do cidadão e professor Magnos
seria bastante temerário, sob o risco, sobretudo, de negligenciar
algumas delas. Mas, é imperativo que se lembre do brilho de sua
voz a solenizar cerimônias de casamento, com belas avemarias
reverberando sob a cúpula dos mais requintados templos religiosos.
Desperdício era não participar das suas promoções sociais, em bailes
memoráveis que galvanizavam toda a sociedade montes-clarense.
Também não podemos olvidar a sua persistente coluna social, na
imprensa desta cidade até os últimos tempos, com sábias lições em
linguagem elegante e culta, com preciosos ensinamentos de etiqueta
social e até alerta sobre os cuidados com a gramática portuguesa, no
meio sôfrego de comunicações em que vivemos. O destaque, todavia,
que precisamos apresentar é sobre as suas atividades no magistério,
sempre lecionando Geografia. Foi assim na própria Faculdade onde
se formou, passou pelos colégios Tiradentes, Imaculada Conceição,
Dulce Sarmento e Escola Técnica, além de ter lecionado também no
pré-vestibular Apolo.
No Colégio Tiradentes da Polícia Militar, o professor Magnos
foi titular da cadeira de Geografia, de 16-08-1971 a 12-09-1993,
quando se aposentou por tempo de serviço. Foram, portanto, mais de
vinte e dois anos de magistério nessa unidade de ensino. Ali tivemos
a oportunidade de uma saudável convivência, primeiro como seu
colega professor e, depois, como seu diretor, nos anos de 1975 e 1976.
Magnos sempre se superou em assiduidade, elegância no vestuário e
distinção no comportamento. Suas aulas tinham planos primorosos,
seus diários de classe eram os mais bem escriturados e suas provas
eram elaboradas com capricho e objetividade. Ninguém o superava na utilização do antigo quadro-negro, recurso então essencial para o
ensino e a aprendizagem. Para isso, conduzia a sua própria caixa de giz
colorido, tampada com o apagador. Causava inveja e admiração entre
os seus pares. Pelo seu desempenho e competência, foi o coordenador
geral da primeira Feira de Ciências do Colégio Tiradentes, realizada
em 1974. A foto abaixo registra a sua presença com alunos, junto a
um balcão de experiências daquele evento. A cabeleira farta do jovem
professor era própria daquela época. Pena que não aparece a calça com
boca de sino, cobrindo o sapato de salto alto. Modas que o tempo
levou!
Foto do arquivo pessoal do professor Elino Gomes
Professor Magnos Medeiros
Leonardo Álvares da Silva Campos
Cadeira N. 97
Patrono: Urbino Vianna
INFORME ESPECIAL
SOBRE CONTATOS IMEDIATOS DE TERCEIRO GRAU EM OLHOS-D’ÁGUA
Após receber toda a garantia de ser deixada no anonimato, por razões profissionais, a pessoa* que serve como elo entre o Norte de Minas Gerais e o que seria uma verdadeira legião de seres do espaço sideral, fala com ternura:
- São seres bonitos. Lindos. Lindos mesmo. São suaves. Seus corpos são um pouco transparentes. Têm peles diferentes. Mas, no geral, se parecem mais ou menos com seres humanos. Os olhos também são diferentes.
- Os seus cabelos são parecidos com o dos humanos, porém, são invariavelmente lisos. Eles têm cerca de três metros de altura, mas outros são bem menores. Andam parecendo flutuar, como se apoiassem ligeiramente nas pontas dos pés.
A pessoa, dotada de faculdades extrassensoriais (no domínio metapsíquico, uma espécie de sexto sentido para telepatia, visões, etc.) ou sensitiva, vai além, esclarecendo as razões pelas quais seus
amigos extraterrenos, conforme assegura, ainda se resguardam quanto
a contatos com a espécie humana em geral:
- Acham a nossa civilização muito atrasada e presa a questões
materiais, sendo uma civilização dominada pelo dinheiro e pelo sexo.
Acreditam eles que, por volta do ano de 1990, já terão condições
de estar andando em nossas ruas, ao lado dos humanos. Eles viam,
abismados, as lutas na recente guerra nas Ilhas Malvinas. Tinham,
como têm, o poder de paralisar os navios que faziam o transporte
de armas, mas recusaram-se a imiscuir-se nos problemas da Terra.
Acreditam que, num processo natural, o homem chegará a um estágio
de confraternização por volta de 1990, quando então poderá haver o
intercâmbio entre seres de pontos diferentes do universo.
D. Lia prossegue com outros detalhes, explicando, por exemplo,
que os ditos alienígenas não identificam seu planeta (ou seus planetas)
de origem e que confirmam a existência de um Deus superior, criador
de todas as coisas.
Marília Revert Ferraz Dias*, com seu olhar penetrante,
parecendo adentrar-se em nossa alma, já tendo hospedado o ator
Lauro Corona e o ufólogo Alexander Holândia em sua casa, prossegue
com outros detalhes, explicando, por exemplo, que os alienígenas não
identificam seu planeta (ou seus planetas) de origem, confirmando,
por outro lado, a existência de um Deus superior, criador de todas as
coisas.
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*Oportuno frisar que, pouco tempo depois, em 1988, ela concedeu entrevista a outro
jornalista de Montes Claros, sem omissão do seu nome: Marília Revert Ferraz Dias (Dona
Lia). Daí que usaremos seu nome aqui também, uma vez que se passaram cerca de trinta
e seis anos do compromisso por nós firmado verbalmente de evitar a veiculação do seu
nome, quando a ouvi para reportagens veiculadas tanto pelo“Jornal do Norte”, de
Montes Claros, nesta matéria, que ora reeditamos,dividida em duas partes, a primeira
na edição de 22 de julho de 1982 e a segunda e última na edição do dia seguinte, 23 de
julho de 1982, as quais se esgotaram, quanto pelo o jornal belo-horizontino “Estado de
Minas”, edição de 17 de agosto de 1982.
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Sempre preocupada em ser levada a sério (“Fui chamada até de
louca”), revela:
- Já disseram que sou extraterrestre (por causa de sua “terceira
visão”, tratada adiante). Uma vez no Rio, fiz um senhor sucesso. Todos
pensavam, mesmo, estar diante de um ser de outro planeta. Tenho
cara de extraterrestre? Tenho sofrido muito com isto. As pessoas não
entendem nada, não levam a sério. Fazem deboche de algo muito
sério.
O jornalista João Carlos Queiroz esteve no Morro Alto com
Dona Lia e outras pessoas da mídia montes-clarense, além do
motorista Adão Tarcísio de Castro, buscando algum contato com“extraterrestres”. O lugar fica a cerca de 25 km do distrito. Escreveu
ele (“Diário de Montes Claros”, 26/01/1988):
“Uma música leve, doce e estranhíssima começou a tocar no
gravador. “Quando estou com meus problemas, escuto essas músicas
e viajo por aí”, diz Marília Revert. Silêncio total após ter dito essas
palavras. “Que bom, gente, eles estão aqui”, foi a declaração dela, logo
passando a piscar a lanterna em direção a umas luzes que “dançavam”
adiante, dividindo-se em duas e efetuando evoluções. O movimento
das naves (?) era visível, bem como o virar dos aparelhos. A equipe
se exaltou, entusiasmando-se com o que via. D. Lia detectou outras
luzes nos espreitando, e chegou a apontar algumas. De fato, de
estrelas ou de faróis de carro a série de “lamparinas” não tinha nada!
O mais interessante é o desdobramento: elas pareciam ir aumentando
de tamanho, intensificando o colorido avermelhado para branco, para
depois “explodir” em relâmpagos novamente róseos. Os movimentos
continuavam. De onde estávamos, dava para se calcular a distância
das luzes: uns 50 quilômetros. Ou menos. Ou talvez mais. A ilusão deótica era sempre lembrada.”
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*Mulher de personalidade forte e que recebe muito bem, encontra-se hoje aposentada e em situação
financeira tranquila, pois é também fazendeira e dona de uma excelente mansão no distrito de
Olhos-d’Água, município de Bocaiúva. Construiu no quintal de outro seu imóvel vizinho um
centro de estudos ufológicos bastante frequentado, inclusive por estrangeiros.
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“A equipe, forçada pelo frio intenso em Morro Alto, acendeu
uma fogueira. Imóvel, com a lanterna piscando em direção às luzes– que, incrivelmente, pareciam “responder”, mudando de tonalidade
ou de lugar -, Marília Revert mantinha uma espécie de diálogo com
os eventuais seres que os globos continham. A música do gravador
continuava. “Acho que não veremos mais nada, além disso, pelo
menos hoje”, comentou Tarcísio (o motorista) aos repórteres.”
Há outra pessoa funcionando como contato dos chamados
extraterrenos pelos aficionados do tema. Trata-se de Luiz Gonzaga
Scontecci de Paula, que, em 15 de abril de 1982, fez palestra na
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Montes Claros (Fafil),
acerca do Projeto Alvorada. Após abordar temas tais como a projeção
de Brasília no Ano 2000, na área de desenvolvimento urbano, recursos
paranormais nos problemas ecológicos, aura, sinalizações cósmicas e
outros, entrou mais detalhadamente no primeiro item.
Ele, possuidor das mesmas faculdades sensitivas e paranormais
de Marília Revert, frisou:
- Quando se está em presença de fatos estranhos, assumimos
uma de duas posições: incredulidade ou procurar conhecer de perto
mais pessoas que vivem em estado paranormal.
Sobre o Projeto Alvorada, seu interesse maior quanto ao Norte
de Minas Gerais, falou de Porto Felipe, a Estação Celeste a ser instalada
em Olhos-d’Água, cuja construção possivelmente estará pronta até
o final de 1982. Mais três delas estão previstas primeiramente para
outras regiões.
Luiz Gonzaga Scontecci de Paula, diretor-presidente da Contato
– Associação Brasileira para a Era de Aquário -, recebeu em Brasília
(DF), onde reside, a determinação que seria extraterrena para criar as
Estações Celestes, segundo asseverou.
Curiosamente, essas duas pessoas, que não se conheciam antes,
levam um sinal semelhante um com o outro: uma espécie de corte ou afundamento na testa, com uns três centímetros de comprimento,
num plano vertical, entre as sobrancelhas e acima do nariz, só que
nele é menos profundo. Esse sinal recebe o nome de terceira visão
entre místicos. Quando do primeiro encontro entre ambos, em
Olhos-d’Água, Marília Revert, esperando-o numa varanda, disse-lhe:
- Entre. Eu já estava esperando-o...
Outra coincidência surpreendente é que a informação assegurada
ser extraterrena recebida por Luiz Gonzaga Scontecci de Paula, em
Brasília, dando-lhe conta da existência de uma anomalia magnética
naquele distrito de Bocaiúva, foi confirmada posteriormente em
estudos científicos.
Convênio por aquela época de prospecção mineralógica no
Norte de Minas Gerais entre o Brasil e a Alemanha, fez com que, além
de estudos aéreos, fosse realizada uma pesquisa de campo na área, para
que pudesse ser obtida uma explicação acerca dessas perturbações
magnéticas, que, pelo prisma de Luiz Gonzaga Scontecci de Paula,
favoreceriam a gravitação de discos voadores.
O fenômeno da anomalia magnética, naquele distrito do
setentrião mineiro, é decorrente de grandes concentrações mineralógicas
no subsolo, redundando nas perturbações. Em Olhos d’Água,
distrito distante 48 quilômetros da sede do município, viagem queé feita por uma estrada de terra em bom estado de conservação*, a
vida da população vai registrando mudanças bruscas decorrentes da
alteração do meio ambiente natural.
A vegetação nativa praticamente cedeu todos os seus espaços
para plantio de eucaliptos. De um lado e outro da estrada, em vários
pontos, há escombros registrando antigas carvoarias.
Animais silvestres são vistos fugindo para outros habitats
semelhantes ao original, porque os grandes reflorestamentos de monocultura
de eucalipto afetaram ou destSem nenhuma dúvida, o eucalipto é o responsável pela deterioração
de recursos hídricos no semiárido mineiro. Ironicamente diz
uma placa registrando uma dessas monoculturas que ali não se pode
caçar nem pegar passarinhos.
Dentro dessa cultura vegetal, que se utiliza de 230 litros deágua por metro quadrado a mais que o cerrado e é repelente até de
barbeiros, nem mesmo pássaros fazem ninho.
Após aquele núcleo populacional cerca de 28 quilômetros, onde
o Rio Jequitinhonha determina as divisas dos municípios de Bocaiúva
e Diamantina, Sebastião Ferreira Garcia, 27 anos, casado, enquanto
manobrava a balsa para se atingir o Vale do Jequitinhonha, contava
que os peixes desapareceram do manancial por causa dos serviços da
Mineração Tijucana, que retira diamante e ouro 24 horas por dia com
dragas, sendo uma delas a maior do mundo.
Podia ser notada a água do Jequitinhonha completamente
suja, uma decorrência de o seu leito ser inteiramente revirado, logo
acima, por suas máquinas. A Mineração Tijucana com certeza retirou
riquezas dali em quantidade várias vezes superior à da época do Brasil
colonial, quando os senhores de escravos contavam somente com os
braços negros no Tijuco (hoje Diamantina).
Na monotonia cotidiana em Olhos-d’Água, esquecendose
do problema da falta de perspectivas de melhores rendimentos,
grande parte da população, como numa alucinação coletiva, só tem
um assunto a tratar: quem avistou a última luz (que seria uma nave
alienígena), em que lugar, como foi e em que circunstância.
Possivelmente, pelo menos 90 por cento dos moradores têm as
suas experiências a narrar, índice considerado alto e, talvez, único na
Terra. Casos de aproximadamente 30 anos atrás até os dias atuais são
revelados, e praticamente ninguém se furta a dar o seu testemunho.ruíram os biomas de antanho.
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Trata-se presentemente de uma rodovia asfaltada.
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Moradora do lugar, que pediu a omissão do seu nome (Marília
Revert), aprofundou-se no tema, mesmo falando com algum receio.
Confirmou, inicialmente, que a Estação Celeste prevista para lá terá
mesmo o nome de Porto Felipe, dentro do Projeto Alvorada, não
sabendo, porém, se o plano contará com subvenção federal, estando
hoje nas mãos de voluntários. Continuou:
- Alguns cientistas já vieram aqui e localizaram o seu potencial.
Houve quem tentasse desviar para outro lugar, mas os cientistas não
querem. Tem de ser aqui. Sobre se é ou não disco voador, acho que
não tem mais dúvida: é disco voador mesmo, em quantidade. As
luzes são vistas constantemente. Anteontem mesmo, um grupo de
pessoas vinha de Bocaiúva e um menino pediu para ver a luz. A mãe
respondeu que após passarem os postes da Cemig, da rede elétrica
de Olhos D’Água, a luz apareceria. Quando os postes passaram, ela
mandou o filho olhar para trás. Ele olhou e viu uma luz. Em seguida,
desceram mais duas, que se emparelharam com a primeira. A esposa
do Geraldo Dirceu Dias ficou apavorada. Duas luzes se juntaram e
depois se separaram. A do meio sumiu, ficando duas. Ninguém quis
se aproximar. O grupo prosseguiu, deixando para trás as duas luzes.
Salientou ainda que muitas pessoas do distrito costumam ver
mais os supostos discos voadores logo acima da serra que fica de frente
para a porta da igreja do lugar, ao passo que o Morro Alto, situado na
outra extremidade, é também ponto de avistamentos, melhor dizendo,
o mais conhecido e buscado por curiosos e estudiosos de possíveis
OVNIs. E arrematou que as naves dos “meus amigos” tanto podem
ser localizadas a grandes alturas no céu ou mais baixas, geralmente
logo acima das serras da região.
Sebastião Ferreira Garcia, que mora num rancho próximo do
barranco do Rio Jequitinhonha, margem de Bocaiúva, vai a Olhosd’Água
de dois em dois meses, mas nunca notou nada de anormal,
mesmo porque sua moradia, no ponto da balsa para a travessia entre
os dois municípios, está distante aproximadamente 28 quilômetros.
Mesmo assim, confirmou qual é a conversa preferida naquele distrito:
- Nunca vi disco voador, mas ouvi falar demais. Todo mundo lá
em Olhos-d’Água fala que já viu, com uma certeza de quem não está
mesmo mentindo. Dizem que é uma luz que aparece no céu, quase
toda noite.
Uma das raras pessoas sem a experiência de tê-la visto é José
Agostinho Prais, 18 anos, solteiro, filho da dona da única pensão de
Olhos-d’Água (“Pensão Karine”), Luíza Versiani Dias, que por sua vez
teve esse tipo de contato há cerca de 30 anos.
Afirmou o rapaz:
- Nunca vi esse tal de disco voador, não. Mas ouço todo mundo
aí falando que já viu. O povo aí acha que é um trem parecendo que é
disco voador. Mas eu acredito que não é disco voador. Acho que é um
cabedal, um negócio assim.
Outras pessoas se prontificaram a falar, todas confirmando
algum avistamento. No entanto, preferem não acreditar em supostas
ingerências advindas de recônditos do universo. Elas geralmente falam
em luzes e, como José Agostinho Prais, têm opinião formada como
sendo um cabedal cada fato.
Talvez por uma ideia fixa do sonho de ser encontrada uma
riqueza de monta escondida pela natureza nas entranhas da Terra,
em zona de garimpeiros (diamante) e faiscadores (ouro), é comum
se falar em foco de luzes errantes, com colorações diversas, durante o
negrume trazido pela noite, querendo mostrar os tesouros do subsolo.
O assunto chega a empolgar a alma dos mineradores, em
sua ânsia de ver localizados nos terrenos os locais das catas mais
promissoras. O cabedal, para eles, significa prenúncio de riqueza,
podendo-se chegar a esta através de focos de luz ou de sonhos.
No núcleo populacional, uma pessoa contou ter sonhado com
uma revelação, a qual lhe determinava que abrisse uma escavação,
perto de sua casa, para encontrar um tesouro. Uma vez realizado o serviço, deu em muito topázio. Enquanto exibia uma pequena
amostra, dizia ter vendido as demais pedras a visitantes.
A questão do cabedal mostra bem que há muitos enigmas não
devidamente explicados pelo homem. É preciso salientar, contudo,
que a citação dessa luz (ou fogo) que surge no alto dos morros, ou
mesmo cortando o céu, não passaria da condição de lenda, posto que
não existe comprovação de sua existência em centros de pesquisa.
O I Encontro Nacional do Projeto Alvorada reuniu numa
fazenda (para cuja região está prevista a Estação Celeste Porto Cristina),
a 18 quilômetros da cidade de Caxambu, 123 participantes, que ali
passaram o primeiro dia do ano de 1982 obedecendo a uma intensa
programação: consolidação da fração da grande família “Aquarius”,
hoje a serviço do projeto; e garantia das bases legais, institucionais,
técnicas, financeiras e de apoio logístico e administrativo para que as
12 Estações Celestes programadas para o Brasil possam iniciar obras
até o final de 1982.
As Estações Celestes, quadro delas em Minas Gerais, são: Porto
Aliança (Alto Paraíso – GO); Porto Maestro (Taguatinga – GO); Porto
Cristal (Morro do Chapéu – BA); Porto Seguro (Vitória da Conquista– BA); Porto Felipe (Bocaiúva – MG); Porto Príncipe (Itabira – MG);
Porto Cristina (Caxambu – MG); Porto Marisa (Uberaba – MG);
Porto Luzia (Rio Verde – GO); Porto Estrela (Ceres – GO ); Porto
Araguaia (Barra do Garça – MT); e Porto Celeste (Chapada dos
Guimarães – MT).
Naquela propriedade rural os presentes participaram de reuniões,
palestras, práticas solares, meditação, ginástica, psicobio física, taichi,
acupuntura, ioga, agricultura, música, teatro e atividades para
crianças, vendo ainda parto natural e estudando ufologia esotérica,
lançando mão de alimentação integral e cozinha vegetariana.
O Projeto Alvorada criará os primeiros programas de estudos e
pesquisas avançados, demonstrando na prática que as Estações Celestes são centros autossubsistentes de vivência fraterna e universalista e
avançados polos multidisciplinares de desenvolvimento de estudos.
Luiz Gonzaga Scortecci de Paula observou por ocasião do I
Encontro Nacional:
- Em nenhum momento, entretanto, foram esquecidos todos
os que hoje lutam pacificamente para que a humanidade desperte
na “realidade”, para viver o sonho de paz que trazemos em nossos
corações, em comunhão com os elevados propósitos dos nossos
Mestres Universais.
O endereço do Contato, que pode ser procurada por todos
os interessados, é o seguinte: Caixa postal 10-2419, CEP 70.000,
telefone (061) 226-5692 – Brasília (DF).
Olhos D’Água, todavia, mesmo devendo receber o Porto
Felipe, nada sabe acerca das Estações Celestiais e do Contato, exceção
de Marília Revert Ferraz Dias, a Dona Lia. A população, aos poucos,
vai se acostumando com as luzes. Continuando, os relatos no
pormenor são ricos. Sebastiana Vieira Dias, 59 anos, casada, mãe de
12 filhos, toma a iniciativa de falar sobre as aparições, com visível
satisfação: - De vez em quando eu vejo a luz em cima do morro, ali de
frente para o cruzeiro da igreja. Tem vez que até clareia, parecendo um
carro que vem, mas não vem nada. Parece que é uma pessoa que está
andando com uma lâmpada. De vez em quando meus meninos me
chamam... Agora eles não estão ligando para isso. É a luz acendendo
e apagando. A luz vai para lá. Quando a gente vê lá em cima, com
pouco vê lá em baixo.
A proprietária da “Pensão Karina”, Luíza Versiani Dias, 54
anos, nove filhos, viúva, passou pela experiência há muitos anos:
- Foi uma vez só. Faz muitos anos e nem se falava em disco
voador. Nós estávamos subindo aqui na rua, pois nós morávamos
numa casa ali para cima. Faz uns 30 anos. Nós olhamos para o morro
ali, ao norte da igreja, e vimos uma luz que parecia sair do chão. Subia e tornava a baixar. Parecia fogo. Tinha muita gente comigo naquele
dia, inclusive o meu falecido marido. Foi logo que eu casei. Todo
mundo viu.Ela continuou, sem dar uma explicação:
- Muita gente aqui fala que viu e acha mesmo que é disco
voador. Mas eu não sei assegurar se é, não.
Geraldo Dirceu Dias, 42 anos, casado, seis filhos, é mais
espontâneo, fala bastante, argumenta, tenta explicar. Enquanto seguia
para a balsa que faz a travessia do Rio Jequitinhonha para o município
de Diamantina, viagem para a qual ofereceu a sua companhia, vai
narrando:
- Vi uma vez só. Eram várias luzes emparelhadas. Foi distante
daqui de Olhos-d’Água uns três quilômetros, perto da torre
repetidora da televisão. As luzes pareciam luz de carro, mas não era
carro. Pareciam uma tocha diferente, com formato de uma bola do
tamanho de uma roda de bicicleta. Tinha hora que mudavam de cor.
Era azulada uma hora, outra hora era vermelha. Eu não quis chegar
perto, por medo. Destacando as riquezas do subsolo de Olhos-d’Água,
fundamento para que se possa falar em cabedal, uma característica de
toda zona de mineração, afirmou Dirceu (nome pelo qual é tratado): -
Nos morros aqui têm muito cristal, diamantes, ouro, topázio, urânio.
Distante daqui uns cinco quilômetros tem uma lavra que dá muito
diamante. Sem contar o Rio Jequitinhonha, tem o Ribeirão de Areia,
a uns cinco quilômetros de Olhos-d’Água, que dá ouro, diamante,
cristais e outros minérios que eu nem conheço... Dos inúmeros casos
desta epidemia de clarões no céu da região, revelou o que considera
mais fora dos padrões:- O caso mais interessante foi o de Rui, chefe
da Florestaminas, que ia de carro para o Projeto 54. Num instante,
ele viu a luz. O carro apagou sozinho e não quis pegar mais. Ele então
largou o carro e voltou para Olhos-d’Água. Depois ele foi até o carro,
já com alguns companheiros. A luz já tinha sumido. Ele então ligou
o carro, que pegou normalmente, como se nada tivesse acontecido.
Um depoimento impactante foi dado por Valter Antônio
Perpétuo, 25 anos, casado, ainda sem filho na família:
- Uma mulher daqui vinha para cá montada num cavalo,
acompanhada pelo filho a pé. Era de noite. Aí, na estrada, apareceu
um homem alto na frente, do tamanho de um pé de eucalipto. O
cavalo se espantou e derrubou a mulher. Então a aparição segurou o
cavalo e deu para a mulher.
Ele também já teve uma inusitada experiência pessoal:
- Agora, a luz, eu já vi muito. Eu vi sempre do lado do Morro
Alto. Já vi a luz no céu alto e também mais baixa. Uma luz, uma
vez, seguiu o caminhão onde eu estava, junto com João (João Batista
Rodrigues). Na hora que entramos nos eucaliptos da Planta 7, a luz
desapareceu, depois de ter acompanhado a gente bem um quilômetro.
João Batista Rodrigues, 22 anos, casado, pai de dois filhos,
confirmou o que disse seu amigo Valter Antônio Perpétuo e revelou
ter tido outro contato:
- Só vi duas vezes. Uma, quando eu estava com Valter, no
caminhão, e, da outra vez, eu estava com Zé Maria, há muito tempo.
Desta vez a luz estava sobre um morro, mas nós continuamos com o
carro direto. Agora a explicação que eu acho certa é cabedal. Valter
acha também.
Enfim, várias outras pessoas deram publicidade a relatos da
mesma natureza, confirmando algo de anormal no céu deste distrito
de Bocaiúva, caso não se trate de um delírio coletivo. Porém, Geraldo
Eufrásio Teixeira, 28 anos, casado, uma filha, revelou mais um possível
contato digno de nota: - Há dois anos e meio, eu vinha de Bocaiúva
por uma estrada passando por Pedra Negra, numa companhia que tem
ali em baixo. Vínhamos eu e um colega, Zé Coroa, numa caminhonete
Ford. Essa luz vermelha nos acompanhou mais ou menos uns cinco
quilômetros. Chegou até o acampamento nosso, sumindo então. Nós
morávamos na cantina. Eu namorava uma menina na Pedra Negra, e Zé Coroa namorava a irmã dela. Fomos lá naquele dia e ficamos
até umas 11 horas da noite. Quando nós pegamos a estrada, a luz
acompanhou o carro de novo, até a cantina. Na cantina, a luz ficou
sobre um viveiro, distante uns 200 metros. Ela ficou ali uns cinco
minutos e depois sumiu. Eu nem sei como ela sumiu, pois eu estava
olhando para ela e ela simplesmente sumiu. Zé Coroa também pode
garantir.
Em Bocaiúva, o vereador Romeu Barcelos, presidente da
Câmara Municipal há 16 anos, já tomou conhecimento do que se
passa em Olhos-d’Água, mas não tem uma opinião formada a respeito.
Cita uma pessoa (a que não quis ser identificada, tratando-se, como
dito antes, de Marília Revert Ferraz Dias, a Dona Lia) como a mais
credenciada a falar sobre os surgimentos de possíveis discos voadores
em profusão.
Há estatísticas comprovando que o número de pessoas que já
viu um OVNI chega a sete por cento da humanidade. Oficialmente,
a história desses objetos voadores oficialmente imprecisos começou
em 1947, quando o norte-americano Kenneth Arnold voava em seu
avião particular nas imediações da cidade de Seattle, no Estado de
Washington, na costa oeste dos Estados Unidos, próximo ao Monte
Rainier. Repentinamente, ele percebeu uma porção de objetos
semelhantes a discos fazendo evoluções no céu.
Entretanto, as possíveis naves alienígenas poderiam ter o hábito
de visitar a Terra desde os primórdios da humanidade. O profeta
Ezequiel relata um fato que dá ideia de uma aterrissagem de uma
cápsula espacial, o que demonstra que a ovnimania está arraigada no
tempo.
Quase todo astronauta norte-americano lançado ao espaço
observou OVNIs, embora a NASA guarde sigilo. Segundo fonte com
ligação com a TV Anglia, em Londres, a NASA se viu obrigada a
mudar a área prevista para a alunissagem do módulo lunar Eagle, da
Apolo 11, porque ela já se encontrava “ocupada”. Conforme a fonte,deu-se o diálogo que se segue entre o astronauta Aldrin e o controle
da missão na Terra, em data anterior ao pouso na Lua em 20 de julho
de 1969:
Aldrin: “Que é isso?... Que diabo é isso? É só o que quero
saber.” Controle da missão: “Que foi que houve?... (ruídos confusos)...
Controle da missão chamando Apolo 11...” Aldrin: “São brinquedos
enormes, rapaz... enormes... Oh, meu Deus, vocês não acreditariam...
Aviso a vocês que há outras espaçonaves por aqui... alinhadas na outra
borda da cratera... Estão na Lua, observando a gente...”
Enfim, não é incomum depararmos, vez ou outra, com
matérias, em jornais, livros e mesmo hoje na internet, tratando de
pessoas de pouca cultura, mormente do meio rural, mencionando
objetos desconhecidos no espaço, mesmo nada tendo estudado sobre
matéria tão complexa. Para elas, são “peneiras voadoras”, “mãe do
ouro” ou “cabedal”, uma luz que salta de uma montanha para outra
e, não raras vezes, segue o viandante até desaparecer em direção ao
espaço sideral.
O que se percebe, irrefutavelmente, é que o insólito se
apresenta por quase todos os lugares do mundo, fugindo às palavras
definitivamente esclarecedoras. E o Brasil tem a sua imensidão
territorial equivalente a proporções semelhantes em mistérios, como
vimos entre os nativos de Olhos-d’Água e suas bolas de fogo.
Na verdade, o homem primitivo não preservou sua memória
evolutiva, nada sabendo dos primeiros passos do seu desenvolvimento
cultural. Ignorante, vale-se, ainda presentemente, em ocasiões
inúmeras, até mesmo de possíveis formas de vida além da Terra para
buscar compreender aquilo que está além de sua capacidade cognitiva.
Como quer que seja, ainda conforme ponderou Marília Revert,“contatos com OVNIs podem – e não podem - ocorrer. De outras
vezes, quem sabe, veremos algo mais concreto? Morro Alto existe (só)
para os humanos.”
Manoel Messias Oliveira
Cadeira N. 60
Patrono: Jorge Tadeu Guimarães
POLITICALHA
De quanto no mundo tenho visto,
o resumo se abrange nestas cinco
palavras: não há justiça sem Deus.
Rui Barbosa
Um provérbio universal nos ensina que: “A história é a mestra da vida”. Podemos dizer mais: o tempo não é algo que possa voltar para trás.
Fonte informativa do Jornal Alerta, edição 1791, de Teixeirade Freitas/BA, com data de 17 a 24 de dezembro de 2017, nos trouxe a baila dados estatísticos de que: “No princípio do século XX, o Brasil contava com 17 milhões de habitantes, 84% de analfabetos formais, quase 100% de analfabetos funcionais e 30 anos de expectativa de vida. Hoje somos 207 milhões, com 8% de analfabetos formais, cerca de 2/3 de analfabetos funcionais e mais de 70 anos de expectativa de vida”.
Isso nos obriga a uma profunda reflexão sobre o passado, sobre a vida política e social de então, com momentos tão difíceis e conturbados. Os políticos, normalmente coronéis arrogantes, se
sentiam superiores a tudo e a todos, os demais eram semelhantes
escravos oprimidos pelo mal, o dinheiro lubrificava a engrenagem do
poder
Época em que protestar significava indisciplina e ofensa aos
mandatários. O pobre, na sua maioria, se detinha no supérfluo e
poucos no essencial.
Os poderosos tinham coiteiros por todos os lados, o povo vivia
oprimido pelas bestas-feras do Reino dos Coronéis que atuavam como
um pêndulo oscilando entre o bem e o mal. Ainda, sobre os pilares
da arrogância, não distinguiam o espírito de grandeza, de grandeza
de espírito, enquanto o primeiro lhes sobrava, faltava-lhes o outro.
As eleições eram feitas a bico de pena, cheias de burlas e os eleitores
encabrestados, incluindo-se nesse contexto o Norte de Minas Gerais,
nosso torrão amado, cujos líderes políticos eram acolhidos e bajulados
sob o manto da hipocrisia midiática. Não havia exceção, era a regra
em todo o país, principalmente no norte e nordeste. Um verdadeiro
retrato de um Brasil rançoso de violência, hipocrisia, corrupção e
jogos de interesse.
Os presidentes de partidos políticos assumiam posições nas
mais altas esferas do poder, formando verdadeiros cartéis da máfia
corruptiva da nação.
Em vista disso, permeavam-se uma busca desenfreada pelo
poder, com o escopo de concentrar riqueza em suas mãos.
Já o povo oprimido desfiava seu rosário de reclamações,
reservadamente, contra os opressores e sua voz não era ouvida. Ao
fim, era como a conclusão melancólica do Eclesiastes (12.8) sobre
a pequinês da alma humana, vanitas vanitatum et omnia vanitas, ou
seja, “Vaidade das vaidades. Tudo é vaidade”.
Os chefes políticos se julgavam em estado de legítima defesa
ao praticarem barbaridades; alguns advogavam que Samuel Colt, inventor do revólver, merecia um lugar entre os quadros dos santos,
com esse tipo de raciocínio, convencidos da legitimidade atacavam
sem piedade o adversário, não admitiam tibiezas dos seus cabras, esses
também respondiam pela ingratidão e a traição com violência.
Aliás, esses cabras, eram homens treinados para aprender
a desprezar o perigo e combater como capangas de políticos e
fazendeiros, com ações assombrosas em honra a essa vil profissão por
mais encarnecida que fosse a luta.
Até hoje muitos teimam em reviver o passado. Ao iniciar a sua
gestão, esquecem de que não foram investidos em um poder, mas
em um mandato. A busca pelo poder, pela riqueza e prestígio estava
sempre no horizonte dos seus anseios.
Que qualidade nós desejamos e admiramos num governante?
Que seja voltado para o bem do povo. Porém, o que muitos desejam
e até exigem dos outros é bem difícil que alguém exija de si mesmo.
Admiram e elogiam o governante que se dedica sinceramente a
servir seu povo. Mas não eles conseguem realizar em si mesmos, essa
qualidade que admiram.
Um povo só cresce se tiver noção de sua cidadania, dos seus
direitos e deveres. Naqueles tempos os analfabetos, os menores de 18
anos e as mulheres não votavam. Portanto, não exerciam a cidadania.
O Coronelismo era uma expressão originária da patente de
coronel da Guarda Nacional, criada por Diogo Antônio Feijó, em 18
de agosto de 1831, quando era Ministro da Justiça, cargo que ocupou
de 1831 a 1832, no tempo do Império e, que, mesmo ocorrendo
a queda daquele regime político em 1889, permaneceu em vigor
durante a Primeira República ou República Velha, período em que
ser chefe político significava prestígio e poder.
Por meio de ações desastrosas, levados pela ignorância, o
coronel tudo fazia para se manter no poder. Como chefe político,
representava, ilimitadamente, os três Poderes da República no seumunicípio, mesmo porque o rabo não faz o cachorro balançar. A
jagunçada constituía força paramilitar, dando-lhe o suporte para
garantir o seu poder e prestígio político.
É difícil acreditar que existiam pessoas com comportamentos tão
radicais, mas existiam, sim, eram os jagunços, também conhecidos por“cabas” defensores do coronel com lealdade canina, cuja mentalidade
tribal instigava a reação a qualquer contrariedade. No campo de
batalha, ao troar da carabina e do bacamarte, no meio da confusão
com alaridos e gritos de vingança, quando o inimigo tombava morto
com o rosto destruído por um tiro a queima-roupa e um longo rastro
de sangue ficava pelo caminho, sentia o prazer do dever cumprido.
Eliminar o inimigo era a única alternativa.
Com suporte na sua milícia particular, muito sangue escorriapor terra, muitos embustes e muitas tramas também Na insolvência
de suas ações violentas, atacava os “contra” e ameaçava de morte os
seus adversários.
O paulista Diogo Antônio Feijó, grande idealista político,
era padre. Ordenou sacerdote em 1809, mas quando chegou ao seu
esplendor político, já havia abandonado a vida eclesiástica. Ele vivia
rodeado de “quebra-facas” como formigas no açúcar.
A guarda Nacional, subdividida em “Batalhões de Infantaria” –
Infantaria de leigos - diga-se de passagem – resultou em um verdadeiro
Exército de Ocupação de Terras, quando o Brasil era eminentemente
rural, com banditismo e justiceiros amparados pelo guarda-chuva
dos coiteiros, encarregados de acobertar os matadores de aluguel,
criminosos contumazes, facínoras que tudo faziam ao bel-prazer dos
poderosos e dos grupos políticos rivais que costumavam resolver suas
diferenças na chibata, na bala e no punhal, impunemente.
Para completar os desmandos, o fazendeiro, chefe político,
com mandato vitalício, não comprava terras, as recebia a título de
doação das Fazendas Gerais originárias das Sesmarias, e tinha como
fio condutor a corrupção. Depois que formava o seu Exército de Ocupação ampliava os seus domínios. Semianalfabetos, na maioria,
exercia a política de conchavos nos gabinetes, onde dirigentes sem
caráter valiam menos do que os seus cavalos de charrete.
A política sem princípios, o prazer sem compromisso e a riqueza
sem trabalho são fatores que destroem o ser humano.
A medida que o Brasil ia se modernizando e se tornando
urbano, o Poder de Polícia e a Justiça, aos poucos iam passando para
as mãos do Estado.
Com a República, houve profundas transformações, mas
muitos recusavam deixar definitivamente para trás o passado
imperial, no entanto o Estado jamais pensou em recuar, mesmo
porque, dar um passo para frente e outro para trás, nunca sairia do
lugar. Os republicanos históricos, afirmavam que a República teria
enorme vantagem sobre a Monarquia, porque haveria um mandato
que não seria vitalício e que o povo escolheria o mandatário, livre e
diretamente.
Depois de muito tempo aqueles que resistiam, aprenderam a
sutil diferença entre dar a mão e acorrentar uma alma. Mas ainda
precisavam aprender a aceitar derrotas com a cabeça erguida e os olhos
adiante, com a graça de um adulto civilizado e não com a tristeza de
uma criança.
Ao contrário, no desespero pela derrota nas disputas eleitorais,
ocultos sob o manto negro de suas consciências, não trepidavam
quando vencidos, trocavam farpas com seus adversários políticos à
semelhança de um cão rabugento, que do monturo onde habita, ladra
o que está fora do alcance de sua baba peçonhenta e nauseabunda.
A Guarda Nacional criada por Diogo Antônio Feijó, em
5 de novembro de 1890, tornou-se “Milícia Federal”. Depois,
gradativamente, foi perdendo força diante do Exército, que a
incorporou em 1916. Sua extinção ocorreu em 1922, ano de“Centenário da Independência”.
Milene Antonieta Coutinho Maurício
Cadeira N. 02
Patrono: Alfredo de Souza Coutinho
MEU AMIGO INESQUECÍVEL
“No chamamento da memória, o passado pode virar presente, e, mesmo no outono, pode se vestir com o encanto da primavera”
Cidade pequena, mas já fazendo finca-pé para ganhar importância. Possuía bispado, matriz grande, colégio de freiras, mercado, escola normal, um grupo escolar, comércio intenso e era, também, ponto terminal da linha férrea. Lutas políticas e rancorosas. Juiz de Direito, Promotor, Delegado e alguns soldados. Um Banco apenas e o Correios, que mandava seus estafetas em buscas das cidades distantes.
A luz elétrica era um, quase nada, vinha de uma modesta cachoeira, e o povo a chamava de “arame-quente”. Nas ruas havia um poste aqui, outro acolá no bem distante. Mas a iluminação mesmo ficava por conta do luar, quando o céu queria.
Depois das dez horas da noite, dentro das casas, ascendiam-se lamparinas, os lampiões e os fifós, com o uso do azeite de mamona apanhado nos quintais.
As ruas praticamente, não possuíam calçamento merecedor do
nome. Algumas eram calçadas com pés-de-moleque. Porém a nossa
rua não tinha nenhum calçamento, era cheia de buracos e coberta
de terra vermelha. Mas como ela era querida, gostosa e cheia de
crianças felizes! Era nessa inesquecível rua que brincávamos de um
tudo: pegador, chicotinho queimado, porta bandeira, seu loba está
pronto? Maria bacondê, cabra cega, boca de forno, e tantas e tantas
brincadeiras.
Vem do tempo dos bancos escolares a minha afeição e amizade
com o Duzinho.
Vizinho de fundo de quintal, ele, menino pulava o muro,
descia pelo pé de goiabeira para vir brincar comigo e meus irmãos.
Fomos colegas no curso primário e também no ginasial. Chamavame,
carinhosamente de Miloca e protegia-me contra tudo e todos os
outros meninos que queriam aproximar-se de mim.
Desde menino, Duzinho era diferente. Gostava de brincar mais
com as meninas, e participava de todos os nossos pequenos segredos.
Era delicado, carinhoso, solícito e fazia às vezes de juiz, aconselhando
e desfazendo as nossas pequenas brigas.
“Eu daria tudo que tivesse
Pra voltar aos dias de criança
Eu não sei por que a gente cresce
E não sai da gente essa lembrança.
_________________________________________
Eu era feliz e não sabia...”
O tempo passou e levou as crianças felizes que fomos. O tempo
tem força. Ele vem lá do principio de tudo e vai seguindo, ninguém
sabe para onde...
Duzinho era de uma família numerosa, católico e de prestigio
na cidade. Dos seis irmãos homens, comerciantes. Duzinho ficou
solteiro e jamais trabalhou no comércio. Era uma figura querida de
toda a cidade. Acessível aos mais humildes, era humano e justo.
Possuía em alto grau a vocação do servir. Era bom e não fazia
economia de bondade. Duzinho sempre serviu e ajudou sua numerosa
família. Também aos amigos, parentes e aderentes, porém fugia aos
agradecimentos usando um dos provérbios que tanto gostava de
empregar: “Quem faz o que gosta agrada a si mesmo”. Duzinho, de
quando em quando, mastigava amargura, entretanto, sustentava um
comportamento de alegria e de despreocupação. Eu sabia que era
uma astúcia que usava para fugir da tristeza e para não ser moyivo
de piedade. Ele dizia às pessoas de quem gostamos só devem ser
convocadas para a alegria das festas, nunca para a tristeza e o pranto.
“Somos Jovens em qualquer idade se fazemos plano para o
amanhã”
Duzinho fazia planos. Vaidoso, queria ser alguém na vida,
talvez um político, mas sua mãe queria um médico na família.
Crescemos e juntos começamos a frequentar os bailes de carnaval noúnico e saudoso clube da cidade. Fantasiávamo-nos nas quatro noites
dedicadas a Momo. Ela vestia-se (como ficava orgulhoso!) de toureiro,
príncipe, pirata, beduíno, pierrot, conforme a letra da canção sugeria.
E eu, menina de quatorze anos, sonhadora e feliz, vestia-me de princesa
de um país encantado. Como eram bons e respeitosos os carnavais do
passado! Quando a orquestra atacava a primeira marchinha, ele me
puxava gentilmente e juntos cantávamos:
“Oh Alah! Oh Alah!
Eu quero, quero, quero, encontrar
Aquela que roubou o meu olhar
Pois ela é a princesa morena
Mais linda de Bagdá
Se eu fosse Aladim
Era fácil pra mim
Outro amor encontrar
Mas como eu sou
Um pobre mercador, ô, ô...
Eu pela Alah pra me ajudar...”
Todos sabíamos cantar as músicas, e o carnaval era sinônimo de
alegria, de extroversão, de beleza e de poesia. Havia entre os foliões
um mútuo respeito cercado de delicados gestos, de ternos olhares,
de sorrisos francos e harmoniosas vozes. Era uma ocasião perfeita
para se começar um romance e descobrir um novo amor. A orquestra
tocava naturalmente, sem necessitar daquelas ensurdecedoras caixas
acústicas; apenas o som puro e límpido dos instrumentos de sopro e
percussão se misturavam as vozes homogêneas dos foliões varando a
madrugada. As músicas possuíam um tão grande poder de assimilação,
que era fácil decorá-las, tal o seu conteúdo de animação, de harmonia
e ternura.
“Um pierrot apaixonado
Que vivia só cantando
Por causa de uma Colombina
Acabou chorando!
Acabou chorando!”
E como deixou saudades!...
Em nossa cidade, terminado o curso ginasial, os rapazes não
tinham mais o que estudar, por isso Duzinho transferiu-se para a
capital. Fez vestibular para medicina. Não passou. Arranjou um
emprego na Secretaria da Fazenda. Alugou um quarto em um hotel
e vivia sozinho, mas rodeado de amigos os quais visitava todos os
dias, influenciado por Tereza e Dinha, suas conterrâneas, já quarentão
resolveu fazer parte do coral do maior e melhor clube da capital.
Como sócio frequentava também os bailes e festas organizadas
pelo pessoal da “melhor idade”. Continuava, contudo, a ser o mesmo
Duzinho, vaidoso, bonito e romântico. Não poderia deixar de falar,
ainda, na sua alma de poeta, pois quem aprecia a poesia é um pouco
poeta também, e ele amava os grandes poetas românticos brasileiros
como Gonçalves Dias e Castro Alves. Mas, era no parnasiano de
Olavo Bilac que se empolgava quando declamava para nós os versos
de “O Caçador de Esmeraldas”, e, ainda, “Velhas Árvores”, aqueles
encantadores versos:
“Olha essas velhas árvores, muito belas
Do que as árvores novas, mais amigas
Tanto mais belas quanto mais antigas
Vencedora da idade e das procelas...
Não choremos, amigo, a mocidade!
Envelheçamos rindo, envelheçamos,
Como as árvores fortes envelhecem
Na glória da alegria e da bondade,
Agasalhando os pássaros nos ramos,
Dando sombra e consolo aos que padecem”
E sem que ninguém pedisse, derramava, com sentimento na
voz, a sua poesia predileta: o “Tédio”, de Henri Heine:
“Venho, doutor, fazer-lhe uma consulta
A doença que me punge e esteriliza
A mocidade e o espírito, resulta
De uma chaga que nunca cicatriza.
Muito embora comum a toda gente,
A de que sofro atroz hipocondria
Tanto me torna pensativo e doente
Que já não sei o que é paz nem alegria.
Sendo v´[os o mais sábio clínico do mundo
E também um filósofo notável.
Do peito humano auscultador profundo,
Curareis este mal inexorável,
Que me esmaga o coração, fibra por fibra,
Enevoa o cérebro e o condenas.
Eu tenho um coração que já não vibra,
Suporto uma cabeça que não pensa
Este tédio mortal, tédio agoureiro,
Que me entristece e me escurece os dias
E como os beijos dados a dinheiro
Numa enervante noite de orgia.
- Refletindo, responde o médico ao cliente
- O amigo tem razão. Padece realmente!
Contudo, a enfermidade, o “morbus” que o devora
É um produto fatal do século de agora.
Uma emoção vibrante, um abalo violento,
Podem curá-lo, creia, apenas num momento,
Diga-me: alguma vez amou? Nunca em seu peito
Estrugiu das paixões o temporal desfeito
Como as vagas de um mar que se agita e encapela
Ao soturno rumor do vento e da procela?
Junto ao seu, que de dores se atormenta,
Nunca bateu um coração apaixonado?
- Nunca!
- Pois, meu caro, procure a agitação constante
Um prazer esquisito, um gozo triunfante,
Já visitou a Grécia/ o Oriente? A terra Santa?
Os sítios onde tudo evoca e decanta
As glórias de uma idade imorredoura e eterna,
Que deslumbram e amesquinham a geração moderna?
- Em híbridos festins passei a mocidade
Percorri, viajando o mundo e a humanidade
(judeus da lenda) e entre as mulheres todas
Cujos lábios em bacanais e bodas,
Mulher nenhuma eu vi sobre a terra tamanha
Que para mim não fosse uma visão estranha.
Como parti, voltei, doutor, sem achar lenitivo
Para este mal que assim me fez cativo
- Frequente o circo, amigo. A figura brejeira
Do famoso arlequim que a esta cidade inteira
Palmas e aclamações constantemente arranca,
Talvez lhe restitua a gargalhada franca
- Vejo, agora, doutor, que o meu caso é perdido!...
O truão de quem fala, o palhaço querido,
Que ainda assim no Coliseu tão aclamado
Tem um riso da morte, um riso mascarado,
Que encobre a dor sem fim do tédio e do cansaço...
Sou eu, doutor, sou eu este palhaço...”
“O romantismo é uma permanência na alma da gente”
Duzinho gostava também de cantar. Não sabia uma só nota
da música, mas tinha uma bela voz de tenor que nos emocionava. E
quanta emoção ele punha no que cantava!
Não perdia uma comemoração e nem um aniversário na casa
de parente e amigos e, quando chegava, chegava também a alegria.
Entoava canções tristes e apaixonadas, como a belíssima canção
portuguesa: Foi Deus!
“não sei
Não sabe ninguém
Porque canto fado
Neste tom magoado
De dor e de pranto.
E neste momento
Todo o sofrimento
Que sinto na alma
Cá dentro me acalma
Nos versos que canto.
Foi Deus
Que me pôs no peito
Um rosário de penas
Que vou desfiando
E chora a cantar.
Pôs estrelas no céu
Fez o espaço sem fim
Deu luto as andorinhas
Ai!... Deu-me esta voz a mim!”
Nossa saudosa cidade era tida como uma das cidades seresteiras
de Minas Gerais, e nas noites enluaradas, resistir quem há de? Canta
mesmo quem não sabe cantar; canta desafinado, canta em saudade,
em pensamento, em silencio.
E o Duzinho, entre outros seresteiros, soltava a sua bela voz
cantando: Elvira Escuta, Gondoleiro do Amor, Acorda Minha Beleza,
Sereno da Madrugada, e a inominada – Não vês que te chamo?
“É a ti flor do céu que me refiro
Neste treno de amor, nesta canção.
Vestal dos sonhos meus por quem suspiro
E sinto palpitar meu coração.
Impossível esquecer, quantas vezes,
Ah, Quantas, na lira debruçado,
Cantando em teu colo adormeci
Era o sono dos anjos, nas tardes de verão,
Ditosa era.
Em que junto de ti, amor gozei...
Não te esqueças de mim por piedade
Um só dia, um só instante, um só momento
Não me lembro de ti sem ter saudades
Nem me podes fugir do pensamento.
A marcha do tempo é inexorável. “Todo dia a gente toma um
golinho de velhice”. Lembrou-nos Guimarães Rosa. A verdade é que
a vida só oferece duas opções:
Morrer novo ou ficar velho, dando razão ao provérbio chinês:
“Não ria do velho e reze para chegar lá”.
Duzinho tinha muito medo de envelhecer.
Sempre que perguntavam, desconversava, e brincando respondia
em versos:
“Pelo que sei e que vi
O tempo vai sempre embora.
Depressa se a gente ri
Devagar se a gente chora”.
Um amigo querendo fazer graça, insinuou: “Diga, Duzinho,
quantos anos você mesmo tem?” E ele, filosofando, passando a mão
na vasta cabeleira grisalha, respondeu:
- Eu não tenho anos. Os anos que eu tinha fui gastando. Agora
só tenho esperança do amanhã. O que tenho é só o agora, que daqui
a pouco vai embora, vira passado. Não volta mais.
Duzinho era fingidor.
“Fingia que não era dor a dor que deveras sentia”.
Fingia que vivia feliz a sua solidão, e tão bem que jamais
imaginávamos que sofresse calado.
Algum tempo se passou. Ele já com sessenta anos, continuava
alegre e visitava sempre a nossa cidade, especialmente nas Festas de
Agosto, dedicadas a Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e o
Divino Espírito Santo. Também no Natal quando saíamos juntos para
visitar os presépios e depois assistir, a meia noite, a Missa do Galo.
Mas, já não tínhamos a alegria da juventude e Duzinho comentava:“A vida é bela, porém a vida é curta. O sol vai ficando mais baixo e
o entardecer vai-se vestindo de melancolia”. Foi a última vez em que
esteve aqui e falei com o Duzinho.
“Eu sinto por toda parte
A morte seguir-me os passos
Quer no silencio da noite
Ou no tumulto do dia...”
De repente recebemos uma noticia inesperada. Duzinho estava
gravemente enfermo. A triste notícia abalou profundamente seus
inúmeros amigos. Nossos corações estavam inquietos e as cabeças
transtornadas. Foram proibidas visitas. Duzinho não queria ver os
amigos e pediu que guardássemos as boas lembranças do passado. E
Duzinho ficou em paz, dormindo o sono dos justos.
Ele foi um testemunho vivo da fé, da coragem e da aceitação
sem revolta.
Ele nos deixou há quinze anos, mas a saudade, a lembrança de
sua pessoa, sua presença amiga, nunca abandonou os corações de seus
amigos.
Ele foi realmente:
“Um personagem importante na história de minha vida”.
REQUIÉM PARA DUZINHO
Dai-lhe, Senhor, o repouso eterno.
Senhor Jesus. Nosso Pai. Nosso irmão e nosso amigo, aqui
estamos os amigos de Duzinho, perdoando ao Senhor por nos tê-lo
tirado. Mas, louvando o seu nome e dando glórias a Ti, Senhor, por
ter colocado Duzinho na estrada de nossas vidas, onde vai ficar para
sempre.
Amigos não se questionem, não se magoem, pois quando
Duzinho teve a certeza de que somente paliativo teria para a sua
saúde, o que ele fez? Usufruindo de um dos dons que Deus lhe deu,
segurou nas mãos dos maiores médicos e fez para Ele a mais linda
seresta de sua vida, cantando:
“Conceda-me, meu Deus
Esta graça final.
Deixando-me rever
O meu torrão natal.”
E Jesus Cristo, seu médico e amigo, concedeu-lhe asas e
transformou o Duzinho...
“...em um passarinho
Com vontade de voar,,,”
De voar para a sua cidade natal e, no domingo ele foi...
“...de volta para o seu aconchego
Levando na mala bastante coragem...”
E agora, Duzinho é com você que falamos. Aqui, na missa
de sua vitória, as vozes do coral que, nas músicas cantadas, tão bem
interpretam a sua fé, as mesmas vozes vão homenagear você, a dizer
por nós o que cada um tem no coração: Amo-te, amigo. Até um dia.
Mara Yanmar Narciso
Cadeira N. 98
Patrono: Virgílio Abreu de Paula
IRMÃ RAIMUNDA DORILENE
Saiu da Ilha de Mosqueiro no Distrito Administrativo de Belém do Pará, onde nasceu em 31 de agosto de 1951, e, anos depois, foi criar na cidade de Grão Mogol – MG, em janeiro de 1988, com o apoio do Bispo Dom Geraldo Magela de Castro, a Congregação das Irmãs Franciscanas Missionárias Diocesanas da Encarnação. Raimunda Dorilene Pinheiro Pereira, a primeira de 11 irmãos, é uma mulher de 67 anos, especialista em multiplicar bondade. Os feitos históricos da sua Irmandade foram publicados agora no livro “30 anos de Missão Profética no Norte de Minas”, lugar onde plantou suas sementes, especialmente em Montes Claros.
Graduada em Biologia e pós-graduada em Gerenciamento Ambiental, a Madre Superiora Irmã Raimunda Dorilene é pessoa de grande capacidade escondida, momentaneamente, por detrás da sua pequena estatura, cor parda e humildade gritante. Mal começa a falar, e já se destaca pela segurança, serenidade, sabedoria e coragem para mudar a vida de gente de perto e de longe. Aqui não é livro oficial, então posso deixar meu agnosticismo de lado e falar, sem contenção, do que vejo e sinto.
Pertenceu por 18 anos à Congregação das Irmãs Missionárias
de Santa Terezinha, mas criou sua própria Irmandade para trabalhar
com a população mais esquecida da Terra: os mais perseguidos, os
mais frágeis e os mais famintos. Seu lema é “ir aonde ninguém quer
ir”, e para isso é preciso começar logo, acordar cedo, andar muito e,
na caminhada, cada parte do dia poderá ser perigosa e imprevisível,
numa batalha pelo resgate de pessoas e almas.
Contar sobre o trabalho dessa freira é falar de amor, fé, doação,
desprendimento, abnegação e até negação de si mesma. É ver o seu
eterno ajudar, sem pensar no sacrifício nem na dor do caminho,
antevendo o resultado da ação, da intervenção, da construção, do
acolher, ouvir, chorar, compreender. E adiante, colher frutos, vendo o
renegado crescer e sorrir. Isso ainda existe e emociona!
Quando abracei a Irmã Raimunda Dorilene na festa de
lançamento do livro da Congregação, disse a ela: hoje você é
rainha, hoje você é gigante! E tudo estava acontecendo de uma maneira
imensa, resultado da união, colaboração e serviço formiguinha da
comunidade e amigos. A bondade e a compreensão que fluem dela
espalham uma iluminação contagiosa. Nas proximidades, muitas
outras podem brilhar.
A cerimônia constou de duas partes e aconteceu no auditório
do Colégio Marista São José. A celebração religiosa foi oficiada pelo
Arcebispo Dom José Alberto Moura e concelebrada pelo arcebispo
adjunto Dom João Justino de Medeiros e mais seis padres, inclusive
Padre Abraão Ambessum Sambú. Da Guiné Bissau, ele veio para
a festa. Naquele país, recepcionou as freiras, que prestaram serviço
na África durante quatro anos. Também estão na comunidade três
moças guineenses chamadas Hortênsia, Lisandra e Teia. Seguindo as
tradições do seu país, fizeram o Ofertório dançando e depois cantaram
com voz de timbre angelical. Atenta, ouvi o Bispo Dom José Alberto
Moura pedir menor apego ao ter, poder e prazer, ainda que sejam
bens aceitáveis em pequenas medidas.
No auditório cheio, com participação das comunidades de
base e autoridades, o lançamento do selo comemorativo dos Correios
mostrou o reconhecimento da vitoriosa caminhada missionária das
Irmãs Franciscanas Missionárias Diocesanas da Encarnação.
Um grupo de jovens fez uma representação da essência de São
Francisco de Assis, levando paz e pão para quem precisa, acontecendo
depois, o lançamento do livro. A obra conta, através de 18 autores,
eu no capítulo africano, os 30 anos da missão das irmãs e o resgate
de vidas. Os resultados dos destinatários, que prestam depoimento
no livro, dão mostras do grande coração que possuem. E, para além
da cerimônia e da Madre, outras pessoas abnegadas compõem a
Congregação: Ana Francisca, Etelvina, Hortênsia, Lisandra, Lúcia
Otávia, Maria das Graças, Maria Valmeres, Miraci e Teia.
É preciso falar em compaixão e acolhimento, divulgar ações e
despertar o desejo de doação nos demais. Irmã Raimunda Dorilene é
pessoa tão vocacionada para o amor e a caridade que se poderia falar
em ardor profético. Da fortaleza da fé e da coragem dessa grande
religiosa vem uma luz do bem, que impregna tudo em que toca, e
assim, segue os passos de Jesus Cristo e de São Francisco de Assis.
Maria Inês Silveira Carlos
Cadeira N. 38
Patrono: Francisco Sá
DISTRITO 4760 - ANO DA GOVERNADORIA: 2009-2010
Tomando conhecimento da entrevista concedida pela Confreira Maria Inês Silveira Carlos à Governadora Vera Bertagnoli - para publicação em livro do Rotary International - Distrito 4720 - e julgando-a de grande interesse para nós do IHGMC, em virtude da ação efetiva de 25 clubes rotários na região norte-mineira, o primeiro deles, o RC de Montes Claros, fundado em 1926 (o terceiro do Brasil), tomei a liberdade de convidá-la também para publicação na Revista XXII.
Wanderlino Arruda
1 - Quando foi que você descobriu o Rotary? Por que você entrou para o Rotary?
No ano de 1959 foi fundado o Rotary Club de Francisco Sá. Eu tinha dez anos e meus pais (Antônio e Alzira) gerenciavam o único hotel da cidade e era lá que aconteciam as reuniões, com os homens mais importantes fazendo parte do Clube. Eram momentos de muita elegância, quando chegavam com ternos de linho, camisas de puro algodão, gravatas de seda e sapatos no maior brilho. Minha mãe caprichava na elaboração do jantar e eu ajudava a servi-lo.
Como eu prestava muita atenção nas conversas, descobri que o
Rotary era uma real organização do bem. Pela primeira vez vi
uma foto de Paul Harris e fiquei sabendo que aquele homem era
o fundador do Rotary International. A fundação do Clube mudou
a face da minha cidade, porque foram grandes as transformações
sentidas pela população. Eu só não entendia porque as mulheres
não podiam ser rotarianas. Por que somente homens? Tempos
depois, já adulta, fiquei sabendo que o Estatuto do RI vetava o
ingresso de mulheres. O ano de 1989 foi um marco histórico para
nós mulheres, quando fomos convidadas a ser rotarianas. Só em
1994 que o Governador Wanderlino Arruda fundou o Rotary Club
de Francisco Sá-Norte, um clube misto, e eu fui uma das primeiras
mulheres a ser convidadas para o Quadro Associativo. Entrar para
o Rotary pareceu-me mais do que natural, uma vez que já me sentia
rotariana desde minha infância.
2- Se fosse a primeira governadora do seu Distrito, como se sentiu
quando foi eleita?
Sim, fui a primeira Governadora do 4760 e me senti
orgulhosa e feliz e, ao mesmo tempo, preocupada com a grande e
honrosa missão de conduzir meu Distrito com responsabilidade e
muita dedicação.
3-Qual foi o melhor conselho que você recebeu quando foi eleita?
O meu Instrutor Distrital, Governador Wanderlino Arruda,
me aconselhou a sempre confiar no Colégio de Governadores, um
suporte importante sempre aberto ao diálogo, pronto a tirar dúvidas
e a nos dar incentivo. E assim eu fiz, estando sempre ao lado dos
companheiros Governadores.
4 - Qual foi o maior desafio que você enfrentou como governadora?
Por ser o Distrito 4760 um dos maiores do Brasil, as distâncias
são enormes. Passei os seis primeiros meses em visitas oficiais,
ficando às vezes mais de quinze dias fora de casa.
5 - O de que mais gostou na sua gestão?
O carinho, a atenção e a admiração com que fui recebida
por todos os 84 clubes do Distrito. Foi experiência única o contato
com as companheiras, companheiros, familiares e autoridades.
Meu universo foi acrescentado de centenas de novos amigos,
conhecimentos rotários e culturais. Presenciar o trabalho de cada
clube é poder ver de perto o “Dar de Si antes Pensar em Si”.
Conhecer a dedicação das senhoras das Casas da Amizade foi
também muito gratificante.
6 - Qual a lição aprendida mais importante na sua governadoria?
Aprendi que a Governadora não é melhor do que os
companheiros e era preciso estar perto deles para ouvi-los. O cargoé passageiro e que devemos plantar boas sementes para termos
uma ótima colheita.
7 - Na sua avaliação, qual foi o resultado mais importante na sua
governadoria?
Tive dois resultados que acho igualmente importantes: O
primeiro lugar em crescimento do Quadro Associativo na Zona
22B do RI, com três novos clubes e o dobro de mulheres. Pela
primeira vez num Ano Rotário, o Distrito 4760 ultrapassou mais
de cem Comendas Paul Harris.
8-Sabendo o que sabe hoje, o que teria feito diferente quando
começou o mandato?
Não sei se faria mais do que fiz. Interessada em tudo de
Rotary e muito intuitiva, dei tudo de mim e tive o máximo de
minha equipe.
9 - Quais as funções você já exerceu no Rotary após sua
governadoria?
Instrutora Distrital, Instrutora de Clube, Presidente e Diretora
de Protocolo.
10 - O que “sucesso” significa para você?
O sucesso não vem por acaso; é o coroamento de muita
dedicação, estudos e sacrifícios pessoais e profissionais.
11 - Qual é o seu lema de vida?
Aproveitar cada dia que nos é concedido por Deus. Ser
tolerante, perdoar e transmitir paz.
12 - Cite uma mulher que você admira e porque o faz?
Minha mãe, Alzira Andrade da Silveira, está com 100 anos
de idade e até hoje é uma mulher guerreira e determinada. Sempreà frente de sua época, enfrentou muitas lutas para criar seus nove
filhos.
13 - Qual das suas qualidades você mais se orgulha?
Sempre procuro estender minhas mãos e meu coração aos mais
necessitados de pão e de amor.
14 - Na sua concepção, o que o mundo de hoje mais precisa? E o
que precisa menos?
Precisa mais SER do que TER. Precisa consumir menos,
porque o Planeta Terra está se exaurindo.
15 - Se tivesse mais três horas por dia, o que faria com este tempo?
Estudaria mais, visitaria mais os amigos e apreciaria mais a
Natureza.
Narciso Gonçalves Dias
Cadeira N. 9
Patrono: Antônio Lafetá Rebello
O FILÓSOFO LEANDRINO
Em 1976 eu fui nomeado Fiscal da Carteira Rural do Banco do Brasil aqui no norte de Minas Gerais, e nas minhas andanças diárias por quase todas as comunidades, cheguei à conclusão de que já éramos muito mais evoluídos do que as demais regiões do Estado. Testemunhei um grupamento de artistas que se equilibravam em seus múltiplos dons, muitos sequer sem dar conta do seu estrelismo e a admiração do mundo à sua volta, por tão belo espetáculo praticado nas suas simplicidades, com extrema maestria. Vejamos o caso do Leandrino, que com apenas trinta anos, já era filósofo, fotógrafo, dentista prático e médico, sem formação acadêmica, claro, além de outras mil e uma ocupações que a ocasião e a “precisança” se lhe fizessem necessárias. Confessou-me que frequentou escola por pouco menos de seis meses, tempo suficiente para tornar-se um autodidata famoso por seus dotes filosóficos, de cura e elaborador de chás e emplastos de rara eficiência.
As comunidades circunvizinhas atestavam para todos os fins de direito que o seu conhecimento era tão grande quanto à confiança que toda região depositava em suas ações e a sua boa vontade em
servir ao próximo. Pois se tinha dificuldade em estudar, tinha o dobro
da facilidade em aprender, proser um exímio observador. E como a
voz do povo é a voz de Deus, quem sou eu para duvidar dos méritos
do grande Leandrino.
Na área filosófica gravei alguns ditos de sua lavra que me
encantaram, tais como:
a) O mineiro não procura saber o nome certo dos animais, das flores ou
plantas e trata-os por “trem”.
b) O ser humano é desonesto e nem desconfia disso. Veja que quando está
em cima de uma balança, para se pesar, sempre mexe para tentar roubar no
peso, seja para menos ou para mais.
c) As pessoas aceitam com paciência e moderação as dores alheias.
d) O rico pega o carro e sai, já o pobre se sair o carro pega.
e) O ser humano é igual ao relógio. Se der um pequeno defeito, nunca mais
andará direito.
f ) Viver é como escrever, sem o direito de apagar os erros.
g) É a camisa que denuncia o tamanho da sua barriga.
h) Quem não tem cão, não caça. E mais uma infindável série de pérolas de
que ele pronunciava com formalidade e sabedoria.
O nosso homem de mil e uma atividades, me confidenciou que
vendeu uma vaca leiteira e adquiriu o material básico necessário para
extração de dentes. Contratou um dentista-prático já com experiência,
para ficar uma semana no consultório improvisado, atento a todos os
atos para aprender o ofício, que embora fosse ilegal, era tolerado pelas
autoridades, em razão da ausência de Cirurgiões Dentistas na região.
Decorridos oito dias, observador ávido que era já se julgava apto
a sair pelo nosso sertão extraindo dentes para amenizar o sofrimento
do sertanejo. Muitas vezes desnecessárias, mas uma ação que eliminava
as terríveis dores de um dente cariado, que impedia o cristão de comer
e dormir. Uma visão atrasada, mas a realidade antiga de um povo
simples e vítima da desinformação.
Aos domingos e feriados, onde houvesse uma missa, vaquejada,
feira ou qualquer outro ajuntamento de gente lá estava ele oferecendo
seus serviços de “rancar dente” como ele expressava e nos momentos
em que o serviço de dentista terminava, guardava seu equipamento
e abria uma nova caixa e se valia da arte de eternizar os momentos
de alegria ou de uma comemoração do povo do lugar, com seus
serviços de fotografia. Leandrino adquiriu uma máquina fotográfica
apropriada para os famosos monóculos, que eram uma peça fabricada
com um tipo de plástico resistente, com formato de uma pequena
caixa retangular, com uma lente de aumento para visualização da
fotografia colocada ao fundo. E ele chamava a freguesia dizendo:“Aproxime pessoal, vamos tirar uma foto, pois mais vale um gosto do
que dinheiro no bolso”.
Isso sem falar de sua habilidade em encanar pernas, e enfrentar
outras mazelas que demandariam intervenção de um acadêmico de
medicina, coisa que não existia num raio de quilômetros, naqueles
tempos idos. Claro que o tratamento das fraturas ósseas nem sempre
ficavam perfeitas, pois alguns membros teimavam em ficar tortos e os
seus pacientes iam se adequando ao novo tipo de andar e assimilar os
novos apelidos, que naqueles tempos eram certeiros e grudavam que
nem visgo.
Certa ocasião, o “doutor” Leandrino foi procurado por um
paciente, que desrespeitou as leis da “estoporação”, que vem a ser um
mau súbito provocado por comer pirão escaldado e logo depois tomar
banho frio. Tratando-se de uma temeridade das mais graves, é sorrir
para o azar e certamente entortará a boca do vivente. E realmente
o paciente alegava que a paralisia facial tanto o deixara feio, como
estava incomodando muito. Leandrino imediatamente prescreveu o
tratamento: mandou o cidadão comer tantos outros pirões escaldados
seguidos de banhos frios, para a boca ir entortando até chegar ao ponto
ideal. E dizem que deu certo, o aleijão foi girando como um relógio
até chegar a horizontal. Não confirmo e nem desminto, até porque
duvidar do povo norte-mineiro é comprar briga que dificilmente se
ganha. Eita povo artista sô!
Teófilo Azevedo Filho
Cadeira N. 90
Patrono: Romeu Barcelos Costa
HOMENAGEM A
LUIZ DE PAULA FERREIRA
Grande amigo e empresário, poeta e compositor Mote 7 sílabas
Luiz de Paula Ferreira
Grande homem brasileiro
Filho do norte mineiro
Que pessoa hospitaleira
Uma família de primeira
Irmanados no amor
Seu coração uma flor
Coteminas seu hinário
Grande amigo e empresário
Poeta e compositor
Nasceu em Várzea da Palma
Norte de Minas Gerais
Tradição dos ancestrais
Entregou a sua alma
Batalhou com muita calma
Um bravo empreendedor
Catrumano e doutor
Com a virgem e o rosário
Grande amigo e empresário
Poeta e compositor
Um guerreiro da cultura
E da “Vovó Centenária”
Nossa região agrária
Da cachaça e rapadura
Essa linda criatura
Foi um bardo lutador
Com todo seu esplendor
Da calma de um campanário
Grande amigo e empresário
Poeta e compositor
Luiz de Paula ferreira (sucessor)
Decassílabo
Vários livros de sua autoria
Alguns que já foram publicados
“Arvoredos”, “A viagem” caprichados
A “Venda do meu Pai”,foi alegria
Aceito com muita simpatia
E “Aspectos do Desenvolvimento
De Montes Claros”, mais um tento
“Momentos”, e o “Armazém de Ideias”
“Nossa família” as epopeias
Empresário, e um homem de talento
Uma bela família abençoada
E a Patrícia junto ao Luiz
Juliana e João Gustavo, que diz
Que Maria Cecília é encantada
Danilo companheiro e camarada
Maria Isabel foi uma guerreira
Esposa, mãe e companheira
Ficou junta e passou do centenário
De amor ele era bilionário
E patrimônio da terra mineira
Vinte e sete de junho foi o dia
De mil novecentos e dezessete
Veio ao mundo firme no basquete
Um varão com bastante energia
Tão cheio de vida e alegria
Em dois mil e dezessete ele chegou
Vinte e três de novembro que marcou
Deus no céu controla abençoando
E assim se passaram os cem anos
E Luiz de Paula encantou
Wanderlino Arruda
Cadeira N. 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza
PROFESSOR
MAGNUS MEDEIROS
O grande e admirado Magnus Medeiros, companheiro dos melhores desde os nossos tempos da iniciante Faculdade de Filosofia, com aulas ainda no Colégio Imaculada, foi sempre um companheiro fiel de todos os momentos. Ele da turma de Geografia, com aulas lideradas por Dalva Dias, era sempre o melhor papo no intervalo das aulas, que começavam pontualmente às dezenove horas. Início de ensino superior, muita gente ainda não sabendo da seriedade exigida, as turmas eram enormes. No Curso de Letras, por exemplo, nós éramos sessenta e cinco, boa parte de advogados, professores, jornalistas, até o médico João Valle Maurício. Os formandos de Geografia terminaram com uma turma bem mais respeitável, porque nós das Letras, só chegamos ao final com uma turminha de sete.
Com uma valorização bem vistosa para todas as escolhas, os alunos de Geografia foram os líderes na festa de formatura, principalmente por contarem com Magnus Medeiros, professor de prestígio, marca de destaque no colunismo social, excelente capacidade de redação, elogiável grau de informação, porque sempre circulando pelos segmentos mais importantes da sociedade. Sua coluna foi sempre um
ponto de destaque no noticiário, principalmente pelo alto nível de
conhecimento e de cultura, situação que ele soube cultivar durante
todos os anos e todas as décadas, a esta altura, acredito, em torno de
um meio século.
Embora a boa redação ensina-nos usar o mínimo de adjetivos,
nunca um bom redator, ou orador, conseguiu descrever e qualificar
Magnus Medeiros sem um portentoso conjunto de complementos
para destacar credibilidade, competência, inteligência, responsabilidade,
elegância, capacidade de bem-querência, dignidade profissional,
lealdade, ética, integridade, coleguismo, jeito bom de ser na vida.
Tudo a favor de Magnus, que antes de ser jornalista, escrevia o nome
com “o”, Magnos, nem sei se menos nobre que com “u”, bem mais
latino. O sobrenome Medeiros, então, tem sido sempre uma garantia
maior e de elogiável marca.
Magnus, o grande e notável montes-clarense, nasceu na cidade
vizinha de Pirapora, vindo para cá ainda criança, aqui estudando,
aqui se fazendo, principalmente na Padaria Flor do Sertão, do Sr.
Tota, seu avô, um bom vizinho de Godofredo Guedes e Dona Júlia,
com a Rua Rui Barbosa, ainda na fase romântica das platibandas de
casas e cômodos de comércio de início do século, a via pública mais
caprichada e cultivada na arquitetura, principalmente depois da Rua
São Francisco.
Foi lá que conheci o jovem Magnos Medeiros, cantor de voz
primorosa, principalmente quando cantava “New York, New York”,
ou músicas Agustín Lara e Nelson Gonçalves. Foi no antigo Diário
de Montes Claros, Rua Doutor Santos, o nosso maior convívio no
meio de muitas notícias e do entusiasmo de Júlio de Melo Franco e de
Décio Gonçalves. Importante também citar a nossa participação na
Revista Encontro, ponto de união de muita gente boa da imprensa e
das artes, entre elas, o saudoso Konstantin Christoff.
Vivamos quantos anos viver, a vida será sempre rica quando a
vivemos em benefício de muita gente, quando fazemos o que sabemos
fazer, e trabalhamos com o nosso maior desejo de produzir qualidade.
Tenho certeza de que não inflaciono valores nesta minha fala sobre o
amigo e colega, o companheiro e o confrade Magnus Medeiros, com
quem além do jornalismo, nunca deixei de participar dos movimentos
de Cultura, principalmente no Instituto Histórico e Geográfico de
Montes Claros, onde ele ocupa, como fundador, a Cadeira número
15, que tem como Patrono o jornalista Ataliba Machado.
Gratificante destacar aqui, em final de crônica, que Magnos
Denner Medeiros, uns três anos mais novo do que eu, foi juntamente
comigo, dos maiores amigos de Haroldo Lívio de Oliveira, o melhor
de todos nós!
Magnus Medeiros
Impresso
na oficina da
GRÁFICA EDITORA MILLENNIUM LTDA.
Rua Pires e Albuquerque, 173 - Centro
39.400-057 - Montes Claros - MG
E-mail: mileniograf@hotmail.com
Telefone: (38) 3221-6790