COMISSÃO
FUNDADORA 2006-2007
Dr. DÁRIO TEIXEIRA COTRIM
Dr. HAROLDO LÍVIO DE OLIVEIRA
Jornalista LUIS RIBEIRO
Dr. WANDERLINO ARRUDA
DIRETORIA
2010- 2011
PRESIDENTE
DE HONRA |
Dr.
LUIZ DE PAULA FERREIRA |
PRESIDENTE |
Dr.
DÁRIO TEIXEIRA COTRIM |
1º
VICE - PRESIDENTE |
Dr.
WANDERLINO ARRUDA |
2º
VICE - PRESIDENTE |
Dr.
HAROLDO LÍVIO DE OLIVEIRA |
DIRETORA
EXECUTIVA |
ROBERTO
CARLOS M. SANTIAGO |
DIRETOR-SECRETÁRIO |
Dr.
PETRÔNIO BRAZ |
DIRETOR-SECRETÁRIO ADJUNTO |
Profa.
MARTA VERÔNICA V. LEITE |
DIRETOR DE FINANÇAS |
Coronel
LÁZARO FRANCISCO SENA |
DIRETOR
DE FINANÇAS ADJUNTO |
Profa.
KARLA CELENE CAMPOS |
DIRETORA
DE PROTOCOLO |
Dra.
MARIA DA GLÓRIA C. MAMELUQUE |
DIRETORA
CULTURAL |
Profa.
FELICIDADE PATROCÍNIO |
DIRETORA DE BIBLIOTECA |
Profa.
RUTH TUPINAMBÁ GRAÇA |
DIRETORA
DE MUSEU |
Profa.
MARIA LUÍZA SILVEIRA TELLES |
DIRETOR DE RELAÇÕES PÚBLICAS |
Jornalista
REGINAURO R. DA SILVA |
DIRETORIA
DE JORNALISMO |
Jornalista
BENEDITO DE PAULA SAID |
DIRETORA
DE CURSOS |
Profa.
MARIA GERALDA DE SENA SOUZA |
CONSELHO
CONSULTIVO
Dr. JOSÉ GERALDO DE FREITAS DRUMOND
Dr. WALDYR DE SENA BATISTA
Profa. YVONNE DE OLIVEIRA SILVEIRA
COMISSÃO
DE GEOGRAFIA E ECOLOGIA
Prof.
IVO DAS CHAGAS
Profa. ANETE MARÍLIA PEREIRA
Profa. MARIA APARECIDA COSTA
COMISSÃO
DE HISTÓRIA E ARQUEOLOGIA
Profa.
MARTA VERÔNICA VASCONCELOS LEITE
Prof. CÉSAR HENRIQUE DE QUEIROZ PORTO
Profa. FELICIDADE PATROCÍNIO
COMISSÃO
DE ANTROPOLOGIA, ETNOGRAFIA
E SOCIOLOGIA
Prof.
GY REIS GOMES BRITO
Profa. CLÁUDIA REGINA ALMEIDA
COMISSÃO
DE CLASSIFICAÇÃO E DE
ADMISSÃO DE SÓCIOS
Jornalista
MAGNOS DENNER MEDEIROS
Profa. MIRIAM CARVALHO
Dra. FELICIDADE VASCONCELOS TUPINAMBÁ
Profa. ZORAIDE GUERRA DAVID
Dr. WANDERLINO ARRUDA
Dr. DÁRIO TEIXEIRA COTRIM
COMISSÃO
DA REVISTA DO INSTITUTO HISTÓRICO
E GEOGRÁFICO
Dr. PETRÔNIO BRAZ - coordenador
Dr. DÁRIO TEIXEIRA COTRIM
Dr. ITAMAURY TELLES DE OLIVEIRA
Dr. WANDERLINO ARRUDA
Prof. JUVENAL CALDEIRA DURÃES
Profa. MARTA VERÔNICA VASCONCELOS LEITE
Jornalista LUIS CARLOS NOVAES
COMISSÃO
REVISORA DA REVISTA
Dr.
DÁRIO TEIXEIRA COTRIM
Dr. HAROLDO LÍVIO DE OLIVEIRA
Coronel LÁZARO FRANCISCO SENA
Dr. WANDERLINO ARRUDA
LISTA
DE SÓCIOS EFETIVOS DO IHGMC
CD |
Sócios |
Patronos |
01 |
Dr José Santos Rameta |
Alpheu
Gonçalves de Quadros |
02 |
Escritora
Milene A. Coutinho Maurício |
Alfredo de Souza Coutinho |
03 |
Padre
Antônio Alvimar Souza |
Antônio
Augusto Teixeira |
04 |
Professora
Claúdia Regina Almeida |
Antônio
Augusto Veloso (Desemb.) |
05 |
Profª
Yvonne de Oliveira Silveira |
Antônio
Ferreira de Oliveira |
06 |
Prof Marcos Fábio Martins Oliveira |
Antônio
Gonçalves Chaves |
07 |
Professora
Maria Aparecida Costa |
Antônio
Gonçalves Figueira |
08 |
Professora
Anete Marilia Pereira |
Antônio
Jorge |
09 |
Professora
Isabel Rebelo de Paula |
Antônio
Lafetá Rebelo |
10 |
Professora Maria Florinda Ramos Pina |
Antônio
Loureiro Ramos |
11 |
Jornalista
Reginauro Rodrigues da Silva |
Ary
Oliveira |
12 |
Dr
Antônio Augusto Pereira Moura |
Antônio
Teixeira de Carvalho |
13 |
Dr
Cesar Henrique Queiroz Porto |
Ângelo
Soares Neto |
14 |
Professora
Karla Celene Campos |
Arthur
Jardim Castro Gomes |
15 |
Jornalista
Magnus Denner Medeiros |
Ataliba
Machado |
16 |
Dr
Waldir de Senna Batista |
Athos
Braga |
17 |
Profa.
Marta Verônica Vasconcelos Leite |
Auguste
de Saint Hillaire |
18 |
Dr Petrônio Braz |
Brasiliano
Braz |
19 |
Dr Luiz de Paula Ferreira |
Caio
Mário Lafetá |
20 |
Professora Felicidade Patrocínio |
Camilo
Prates |
21 |
VAGA
|
Cândido
Canela |
22 |
Professora
Lygia dos Anjos Braga |
Carlos
Gomes da Mota |
23 |
Historiador
Hélio de Morais |
Carlos
José Versiani |
24 |
Dr
João Carlos Rodrigues Oliveira |
Celestino
Soares da Cruz |
25 |
VAGA |
Corbiniano
R Aquino |
26 |
VAGA |
Cyro
dos Anjos |
27 |
Professora
Regina Maria Barroca Peres |
Dalva
Dias de Paula |
28 |
Escritora
Amelina Chaves |
Darcy
Ribeiro |
29 |
Professora Filomena Luciene Cordeiro |
Demóstenes
Rockert |
30 |
VAGA
|
Dona
Tirbutina |
31 |
Professora
Clarice Sarmento |
Dulce
Sarmento |
32 |
Dr
Edgar Antunes Pereira |
Edgar
Martins Pereira |
33 |
Dr
Wanderlino Arruda |
Enéas
Mineiro de Souza |
34 |
Profa.
Geralda Magela de Sena e Souza |
Eva
Bárbara Teixeira de Carvalho |
35 |
Dr.
Antônio Ferreira Cabral |
Ezequiel
Pereira |
36 |
Dra. Felicidade Vasconcelos Tupinambá |
Felicidade
Perpétua Tupinambá |
37 |
VAGA |
Francisco
Barbosa Cursino |
38 |
Professora
Maria Inês Silveira Carlos |
Francisco Sá |
39 |
Professor
Ivo das Chagas |
Gentil
Gonzaga |
40 |
Drª
Maria da Glória Caxito Mameluque |
Georgino
Jorge de Souza |
41 |
Dr
Reinine Simões de Souza |
Geraldo
Athayde |
42 |
Professora
Maria Luiza Silveira Teles |
Geraldo
Tito da Silveira |
43 |
Professor
Benedito de Paula Said |
Godofredo
Guedes |
44 |
Hist.
Roberto Carlos Morais Santiago |
Heloisa
V. dos Anjos Sarmento |
45 |
Jornalista
Angelina de Oliveira Antunes |
Henrique
Oliva Brasil |
46 |
Professora
Eliane Maria F Ribeiro |
Herbert
de Souza – Betinho |
47 |
Jornalista
Paulo César Narciso Soares |
Hermenegildo
Chaves |
48 |
Professora
Raquel Veloso de Mendonça |
Hermes Augusto de Paula |
49 |
Dra.
Maria Fernanda M. Brito Ramos |
Irmã
Beata |
50 |
VAGA |
Jair
Oliveira |
51 |
Dr
José Carlos Vale de Lima |
João
Alencar Athayde |
52 |
Profa.
Maria Isabel M. F. Sobreira |
João
Chaves |
53 |
Dr
João Carlos M. Sobreira de Carvalho |
João
Batista de Paula |
54 |
VAGA |
João
José Alves |
55 |
Cel.
Lázaro Francisco Sena |
João
Luiz de Almeida |
56 |
Escritor
João Aroldo Pereira |
João Luiz Lafetá |
57 |
Jornalista
Luiz Carlos Novaes |
João
Novaes Avelins |
58 |
Professor Necésio de Morais |
João
Souto |
59 |
Jornalista
Luiz Ribeiro dos Santos |
João
Vale Maurício |
60 |
VAGA |
Jorge
Tadeu Guimarães |
61 |
Jornalista
Girleno Alencar Soares |
José
Alves de Macedo |
62 |
Profº
José Geraldo de Freitas Drumond |
José
Esteves Rodrigues |
63 |
Historiador Pedro de Oliveira |
José
Gomes Machado |
64 |
Professora
Palmyra Santos Oliveira |
José
Gomes de Oliveira |
65 |
Dra.
Maria de Lourdes Chaves |
José
Gonçalves de Ulhôa |
66 |
Arqueólogo
Fabiano Lopes de Paula |
José
Lopes de Carvalho |
67 |
Dr
Elias Siuffi |
José
Monteiro Fonseca |
68 |
Professora
Rejane Meireles Amaral |
José
Nunes Mourão |
69 |
VAGA |
José
(Juca) Rodrigues Prates Júnior |
70 |
Jornalista
Márcia Sá |
José
Tomaz Oliveira |
71 |
Dr João Caetano Canela |
Júlio
César de Melo Franco |
72 |
Jornalista
Theodomiro Paulino Correa |
Lazinho
Pimenta |
73 |
Dra.
Maria das Mercês Paixão Guedes |
Lilia
Câmara |
74 |
Professor
Laurindo Mekie Pereira |
Luiz Milton Prates |
75 |
VAGA
|
Manoel
Ambrósio |
76 |
VAGA |
Manoel
Esteves |
77 |
Profª
Maria Jacy de Oliveira Ribeiro |
Mário
Ribeiro da Silveira |
78 |
Jornalista
Américo Martins Filho |
Mário
Versiani Veloso |
79 |
Professora
Maria José Colares Moreira |
Mauro
de Araújo Moreira |
80 |
Jornalista
Hélio Machado |
Miguel
Braga |
81 |
Prof. Juvenal Caldeira Durães |
Nathércio
França |
82 |
Dr
Haroldo Lívio de Oliveira |
Nelson
Viana |
83 |
Historiador
Paulo Costa |
Newton
Caetano d’Angelis |
84 |
Dr
Itamaury Telles de Oliveira |
Newton
Prates |
85 |
VAGA
|
Armênio
Veloso |
86 |
Professora
Zoraide Guerra David |
Patrício
Guerra |
87 |
Profa.
Marta Edith Sayago M Marques |
Pedro
Martins de Sant’Anna |
88 |
Professora
Miriam Carvalho |
Plínio
Ribeiro dos Santos |
89 |
Jornalista
Rosângela Silveira |
Robson
Costa |
90 |
Hostoriador
José Henrique Brandão |
Romeu
Barcelos Costa |
91 |
Dr
Wesley Caldeira |
Sebastião
Sobreira Carvalho |
92 |
Professor
Roberto Pinto Fonseca |
Sebastião
Tupinambá |
93 |
Dr
Dário Teixeira Cotrim |
Simeão
Ribeiro Pires |
94 |
Dr
Luiz Pires Filho |
Teófilo
Ribeiro Filho |
95 |
VAGA |
Terezinha
Vasquez |
96 |
Professora
Ruth Tupinambá Graça |
Tobias
Leal Tupinambá |
97 |
Professor
Gy Reis Gomes Brito |
Urbino
Vianna |
98 |
Jornalista
Rafael Freitas Reis |
Virgilio
Abreu de Paula |
99 |
VAGA |
Waldemar
Versiani dos Anjos |
100 |
Professora
Maria Clara Lage Vieira |
Wan-dick
Dumont |
Sócios
Correspondentes
Dr.André
Kohene |
Caetité
-BA |
Prof.
Regente Armênio Graça Filho |
Rio
de Janeiro- RJ |
Dr.
Ático Vilas-Boas da Mota |
Macaúbas
- BA |
Dr.
Augusto José Vieira Neto |
Belo
Horizonte - MG |
Dr.
Avay Miranda |
Brasilia
- DF |
Jornalista
Carlos Lindenberg Spínola Castro |
Belo
Horizonte - MG |
Escritora
Carmem Netto Victória |
Belo
Horizonte - MG |
Historiadora
Célia do Nascimento Coutinho |
Belo
Horizonte - MG |
Historiador
Daniel Antunes Júnior |
Espinosas
- MG |
Dr.
Enock Sacramento
|
São
Paulo - SP |
Dr.
Fernando Antônio Xavier Brandão |
Belo
Horizonte MG |
Dr.
Eustáquio Wagnar Guimarães Gomes |
Belo
Horizonte - MG |
Escritor
Flávio Henrique Ferreira Pinto |
Belo
Horizonte - MG |
Jornalista
Geraldo Henriques (Riky Tereze) |
New
York - USA |
Prof.
Herbet Sardinha Pinto |
Belo
Horizonte - MG |
Jornalista
Jeremias Macário |
Vitória
da Conquista - BA |
Jornalista
João Martins |
Guanambi
- BA |
Dr.
Jorge Lasmar |
Belo
Horizonte MG |
Prof.
José Eustáquio Machado Coelho |
Belo
Horizonte MG |
Prof.
Dr. Jorge Ponciano Ribeiro |
Brasília
- DF |
Dr.
Marco Aurélio Baggio |
Belo
Horizonte MG |
Profa.
Dra. Maria da Consolação M. Figueiredo Cowen |
London
- England |
Prof.
Moisés Vieira Neto |
Várzea
da Palma - MG |
Jornalista
Paulo César Oliveira |
Belo
Horizonte - MG |
Jornalista
Paulo César Oliveira |
Belo
Horizonte - MG |
Escritor
Reynaldo Veloso Souto |
Belo
Horizonte - MG |
Prof.Thiago
Carvalho Makiyama |
Gunma-Ken
- Japão |
Prof.
Wellington Caldeira Gomes |
Belo
Horizonte - MG |
Historiador
Zanoni Eustáquio Roque Neves
|
Belo
Horizonte - MG |
NOTAS
DOS COORDENADORES DA EDIÇÃO
A ordem de publicação dos trabalhos dos sócios
efetivos obedeceu à seqüência alfabética
dos nomes dos autores. Em seguida, foram ordenados os trabalhos
dos sócios correspondentes; A Revista não se responsabiliza
por conceitos e declarações expedidos em artigos
publicados; A revisão dos disquetes originais foi feita
pelos próprios autores dos artigos publicados.
HOMENAGENS
EPITÁFIO
Para um túmulo de amigo
“A morte vem de manso, em dia incerto
e fecha os olhos dos que têm mais sono...”.
(Alphonsus de Guimaraens – ossa mea, I.)
FINS
DO IHGMC
Art. 2º - O IHGMC tem como finalidade a promoção
de estudos e a difusão de conhecimentos de história,
geografia e ciências afins, do município de Montes
Claros e da região Norte de Minas, assim como o fomento
da cultura, a defesa e a conservação do patrimônio
histórico, artístico e cultural.
APRESENTAÇÃO
Estamos
agora folheando mais um volume da Revista do Instituto Histórico
e Geográfico de Montes Claros. Elas se fazem necessárias
para que possamos divulgar os nossos projetos que visam o conhecimento
humano; o resgate da memória histórica e a preservação
do patrimônio público e privado. Nota-se, contudo,
que não houve nenhuma mudança significativa no layout
gráfico de seu miolo e nem de sua capa. Mas, por outro lado,
o leitor certamente continuará a encontrar nesta coletânea,
uma série de pesquisas sobre a nossa terra, a nossa gente
e os nossos costumes, com textos repletos de gravuras e ilustrações,
os quais apresentam uma visão geral de um passado glorioso
e que merece maior atenção dos geógrafos e
historiadores do nosso Instituto.
Portanto,
recomendamos todos os leitores para que leiam mais uma Revista do
nosso Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros.
Pode-se dizer que ela foi escrita com carinho extremoso e, em sendo
assim, é licito afirmar que não há, aqui, nenhuma
ambição científica ou filosófica por
parte de seus editores, porque é dever dos nossos ilustres
confrades a valorização da nossa história com
a divulgação de artigos que complementam os fatos
ainda poucos conhecidos. Não queremos com isso dizer que
tenhamos realizados plenamente a nossa tarefa de editor/historiador
e não o fizemos por uma simples razão: é que
estamos apenas iniciando os primeiros passos na busca da história
antiga de nossa terra.
Pode
e devem ter ocorridos lapsos e senões durante a sua formatação.
Não creiamos que isso seja evitável quando se trata
de uma obra que abrange nada menos que três ciências
especializadas: a história, a geografia e a genealogia. Neste
caso seremos gratos ao leitor competente por qualquer correção
que se fizer necessária. Sendo assim, é chegado o
momento em que é preciso resgatar o passado do nosso povo
com o fito de por em evidência as nossas origens. O presente
apenas nos oferece a oportunidade de se fazer tudo isso. Portanto,
para tudo dizer com poucas palavras, que estamos concluindo com
honestidade e competência mais uma Revista do Instituto, esperando
que as próximas gerações possam se sentir orgulhosos
de tudo do que hoje produzimos.
Finalmente
devemos agradecer a todos os confrades que nos ajudaram na confecção
desta empolgante Revista. Também queremos agradecer penhoradamente,
a comissão de revisão dos textos, que teve a gentileza
de rever todos os manuscritos com o máximo de esmero, objetivando
fazer da nossa Revista o melhor documentário histórico
e geográfico de Montes Claros e, também, do Norte
de Minas. Não devemos tampouco, esquecer de registrar aqui
o nosso reconhecimento de gratidão aos diretores da Millennium
por terem eles incumbidos, com um profissionalismo inquestionável,
do melhor propósito na publicação desta obra
e de outras tantas referentes ao nosso Instituto Histórico
e Geográfico. Em poucas palavras podemos dizer que esta antologia
trata-se de uma obra essencial, altamente instrutiva e certamente
de valor artisticamente incontestável para todos nós.
Dário
Teixeira Cotrim
Presidente do IHGMC
Revista
do Instituto Histórico e Geográfico de
Montes Claros
Fundado em 27 de Dezembro de 2006
UMA
VIAGEM NO DORSO DE EROS
Amelina
Chaves
Cadeira N. 28
Patrono: Darcy Ribeiro
Texto
de Domingos Diniz
Minha
prezada Amelina Chaves.
A chegada de um livro, seja qual for, é sempre bem-vinda,
para quem ama a literatura. Um livro de contos da escritora Amelina
chaves é muito mais que bem-vindo é festejado. Recebo
com incontida alegria, foguetes e banda de música.
Li-o
de um fôlego só.
Você Amelina, mostra, no livro, uma outra Amelina.
Deixou um pouco de lado os textos e fatos folclóricos ou
biográficos para trilhar em outra vertente literária,
a história com histórias curtas, o conto, a narrativa
ficcional.
Em PRIAPO DE ÉBANO, você ousadamente rompe os interditos
da repressão a Eros e abre as porteiras por onde o prazer
e o gozo total vão fazer parte de suas personagens em condições
inusitadas. É bom lembrar que Eros não significa pornografia.
É enorme a diferença. Como a diferença entre
um pé de pequi e
um pé de buriti.
Lendo
o livro, montei no dorso de Eros e viajei nos prazeres e no gozo,
vivendo as angústias e os amores, ideal do ego de suas personagens.
As tramas dos contos são bem urdidas. O alinhavo verbal se
dá em boa técnica e estilo leve As ilações
e o derramamento narrativo que ocorrem não chegam a comprometer
a qualidade literária da obra às vezes agem no sentido
de prolongar o desfecho da trama e, com isso, aguçar ainda
mais a curiosidade do leitor. Outras vezes com o vezo de denúncias
sociais.
Você não encerra os contos com o clássico anticlímax.
Deixa porém uma brecha para o leitor, que se faz de co-autor,
continuar a trama e dar o final que mais lhe aprouver. Aliás,
toda obra literária sobrevive e se torna atemporal na interpretação
e recriação
do leitor. Donde os grandes mestres da literatura universal estão
vivos até hoje.
Amelina, esta palavras são apenas de apreciação
de um leitor, nunca de um especialista, ou de um crítico
literário, longe de mim querer exercer tal função.
Cara
amiga, fiquei muito feliz em receber o seu PRIAPO DE ÉBANO.
Demorei agradecer-lhe pelo fato de eu estar aqui às voltas
com a edição do álbum de fotografias dos vapores
do São Francisco. Estou na fase de redação
e revisão finais. Creio, que até o fim deste ano,
ou no principio de 2010, estarei com este trabalho pronto, para
lançar em Montes claros.
Continuo contra a transposição das águas do
São Francisco.
Atenciosamente. Barranqueiramente.
Domingos Diniz e Amelina Chaves.
100
ANOS DO INESQUECÍVEL HERMES
AUGUSTO DE PAULA
Amelina Chaves
Cadeira N. 28
Patrono: Darcy Ribeiro
Texto de Amélia Prates Barbosa Souto
Honor e glórias a Dr. Hermes pelos cem anos de nascimento
e pelo muito que fez por amor a nossa terra, na dedicação,
na preservação da história, no trazer o desenvolvimento
em todos os segmentos sociais, polivalente que era. Filho do digníssimo
e conceituado funcionário da Prefeitura por longos anos,
o senhor Basílio de Paula, e da prendada e inteligente Dona
Joaquina Mendonça de Paula, ambos de famílias tradicionais
da nossa região. Teve como irmãos o artista plástico
João de Paula, o escritor Antônio de Paula, as irmãs
Maria e Helena, todas pessoas de destaque, promovedoras, contribuintes
para o desenvolvimento político social da cidade.
Hermes de Paula nasceu em 06/12/1909 e foi chamado por Deus em junho
de 1983, deixando nossa terra natal que veio a amar com todas as
forças desde muito jovem. Inteligente, brilhante, se dedicou
aos estudos sobre nossa adorada terra, que o fez contar de maneira
magnífica com detalhes, dados comprovadamente fidedignos
e reais, os mais variados atos e assuntos, como ninguém até
então o fez, minuciosamente relatados os fatos históricos,
políticos, folclóricos, no seu livro, que é
sem dúvida o melhor e maior ponto de referência para
se conhecer a cidade de Montes Claros desde os seus primeiros tempos.
Nas primeiras páginas do livro em pauta, em texto denominado
“Um Retrato”, o escritor mostra importante e significativa
referência feita pelo ilustre amigo da cidade, o Ministro
Francisco Sá, transcrito: “Um milagre do Sertão”.
Foi assim que o notável estadista chamou um dia a cidade
acolhedora, generosa e forte que brotou da terra morena, como um
presente do céu.
E o nosso muito querido, inteligente e brilhante Newton Prates comenta:
Quem nela viveu, nunca a esquecerá. Se está distante,
a lembrança da cidade querida permanecerá sempre ao
seu lado, carinhosa e fiel. E cita: “Já no seu fim
diante de Virgília, Brás Cubas assistiu à volta
de outros tempos mais felizes. Sentiuse não como era, mas
como fora. A terra interrompera a sua marcha em torno do sol. Voltara
para trás, em busca de seu tempo perdido. Tempo alegre e
descuidado”. Continua: “assim é como você
Montes Claros”.
Seus filhos que vivem longe, ao reverem a cidade amiga, sentem o
rejuvenescimento da alma e do espírito. Repete-se então,
aquilo que Machado de Assis põe no coração
de Brás Cubas ao colocá-lo diante de Virgília,
numa hora de desencanto.
A vida se torna mais bela. Há claridade no céu. É
este o sortilégio da sua presença, Montes Claros.
Visão do amante que estimulou e dividiu seu sentimento com
os que o conheceram e com os que leram sua obra. Teve papel de grande
importância para nossa terra quando desbravador de iniciativas
do mais alto gabarito, com presença forte, lutador, guerreiro
pelas causas justas e necessárias. Presente em comissões
para se criar, fazer funcionar instituições em benefícios
do povo. Com valores pouco comuns a muitos, lutou, venceu junto
a conterrâneos que o admiravam e apoiavam. Graças ao
seu imensurável trabalho, muitas conquistas
se
realizaram. Podemos citar: a criação da primeira Universidade,
do Colégio São José, da última reabertura
da Escola Normal, da Academia Montesclarense de Letras, do retorno
das festas de Agosto, preservação do folclore e história
da terra. Criador do primeiro clube campestre, o Pentáurea.
Amigo de todos importantes e simples, a quem tratava de uma mesma
forma. Recebia personalidades de vários segmentos que se
hospedavam em sua casa. Aliás diga-se de passagem, uma casa
também de todos. Se envolvia entusiasmando na prática
do esporte. Sua piscina era freqüentada por jovens e adultos
que se encontravam na famosa chacrinha sua residência. Talentoso
às raias de genialidade, amava a arte, muito especialmente
a música. Criou o famoso grupo de seresta João Chaves
que até os nossos dias representa gloriosamente aqui e alhures,
a nossa cidade, onde sempre se apresenta com muito sucesso. Hermes
de Paula, um homem muito especial.
Cedo, jovem e recém formado em medicina, de volta à
cidade, se casou com sua linda prima Josefina que encantou aos convidados,
na festa da celebração do casamento, tendo sido por
muitos anos considerada a mais bela noiva da terra. A primeira noiva
vestida de rosa, com grande sucesso.
Tiveram os filhos Walmor, também médico, casado com
Maria Walderez Costa, que lhes deram os netos: Maria Clara, Maria
Tereza e João Bazílio. Virgilio, jornalista e historiador,
casado com Gláucia Leão que lhes deram a neta Patrícia.
As filhas Valéria casada com Mauro Cardoso, que também
lhes deram os netos Marcelo Marcone, Érica e Ana Maria. Virgínia
sua filha mais nova, apaixonada e envolvida com a história
dos montes, com apreciadas crônicas. Pessoas do mais alto
gabarito de dignidade, solidariedade social, também contribuidores
em beneficio de um mundo melhor. Estes os seus descendentes que
de acordo com o ditado popular: Quem sai aos seus não degenera.
Amam e abrilhantam a cidade, a região, como o Dr. Hermes
de Paula, um dos grandes da terra, que amou e se deu de corpo e
alma em favor do seu desenvolvimento, da preservação
da sua história. Neste ano
de 2009 se comemora o centenário do nobre e ilustre conterrâneo,
a quem os montesclarenses devem maior respeito e admiração,
pela caminhada dedicada a todos na realização de grandes
e vultuosos atos de cidadania, e sobretudo de amor à terra,
aos irmãos aqui residentes. Benefícios extensivos
a toda região no atendimento a necessidades prioritárias
na saúde, na educação, onde tive o privilégio
de ser sua aluna, com muita alegria, satisfação, e
orgulho. Conheci-o na minha casa, quando por acasião das
suas pesquisas esteve por várias vezes com minha mãe,
que lhe passou fatos muitos dos quais presenciou. Ela o admirava
e com muita alegria o recebia, orgulhosa de ser por ele lembrada.
Repetindo, quem sai aos seus não degenera, como diz o ditado
popular.
Sua genética dos dois lados é rica em dotes de generosidade,
dignidade e arte na escrita, na pintura, arte cênica musical,
onde vários parentes se destacaram e se destacam, irmãos,
sobrinhos, parentes mais próximos. Homem voltado para ações
de alto valor material e pelas causas nobres era também um
místico. Na sua última hora se despediu dos familiares
anunciando ter sido chamado pelo “General” que o premiara
chamando antes da ida de algum dos filhos, coisa que pedia a Deus
e que se sentiu ouvido. Dr. Hermes, astro da constelação
do norte de Minas, nunca será esquecido. Sempre louvado,
admirado, e seguido nas pegadas da luta, do almejar e fazer realizar
coisas úteis voltadas para se viver um tempo melhor. Amemos
nossa terra e, imitando o centenário inesquecível,
a façamos cada vez melhor. Onde estiver, parabéns
pelos seus cem anos de chegada ao nosso planeta, onde passou deixando
marcas indeléveis, Deus o tenha em bom lugar para rezar e
olhar pela nossa cidade que tanto amou. A paz e a luz eterna.
MONTES
CLAROS NO CENÁRIO DAS ARTES
PLÁSTICAS BRASILEIRAS
Felicidade
Patrocínio
Cadeira N. 20
Patrono: Camilo Prates
Para aqueles que objetivam um conhecimento completo das artes plásticas
brasileiras, contextualizadas a partir do séc. XX até
a contemporaneidade, será necessário incluir no roteiro
uma passagem pelas expressões artísticas de Montes
Claros.
Podemos explicar. Montes Claros localiza-se no estado de Minas Gerais,
e este é reconhecido como o berço da identidade artística
brasileira, desde quando o mestre escultor e arquiteto Antonio Francisco
Lisboa, o Aleijadinho, o pintor Ataíde e outros,
marcaram, de maneira definitiva, as paisagens montanhosas das Minas,
com as suas obras estéticas. Foi através dessas primeiras
expressões artísticas genuinamente brasileiras, contornadas
pela plástica do Barroco, que alvoreceu o Brasil.
Da mistura de etnias divergentes fermentadas no “caldeirão”
dos tempos de colônia, com mais intensidade no solo aurífero
das Minas, foi surgindo o que poderíamos denominar de “brasilidade”,
uma nova identidade que recolhia nas marcas ancestrais
o que havia de mais forte e belo e atualizava na influência
do novo contexto. E a resposta brasileira a essa simbiose cabocla,
cafusa, mameluca e mulata, resultou num sincretismo cultural de
rara beleza.
A partir dessa estreita familiaridade com o Belo, no seu jeito introspectivo,
mas sensível, o mineiro permaneceu antenado, com pés
no chão, mas olhos no mundo, captando as mudanças
de rumo deste com os seus conseqüentes reflexos nas artes.
Assim transplantou as influências do modernismo que já
invadira São Paulo, a partir do movimento de modernização
das artes no ano de 1922, marcado pela Semana de Arte Moderna. Absorvendo
aquela manifestação que “transtornou”
e transformou a atmosfera pictórica do país, Minas
reinventou a sua modernidade, acrescentando nesse cenário,
através das mãos do então governador Juscelino
Kubitschek, a doce e forte figura do pintor e professor de arte
Alberto da Veiga Guingnard, cujos traços, cores e lirismo,
invadiram para sempre as Minas, levando reflexos e influências
aos Gerais mais distantes.
Por tudo isso e mais, ontem e hoje, a vasta região de Minas
é um canteiro de artes sem limites, mas, como as Minas e
os Gerais perfazem uma vasta região, necessário se
faz estreitar o foco para uma percepção introdutória.
Vemos aí, então, a possibilidade de priorizarmos a
nossa terra, Montes Claros, “Cidade da Arte e da Cultura”,
já que neste cenário fermenta e é fecunda a
semente da mais legítima intelectualidade.
Esta cidade, que se localiza num ponto distante nos gerais, bem
ao norte das minas, destaca-se no cenário nacional por vários
fatores como: a riqueza e diversidade de suas manifestações
artísticas; um folclore vivo e contagiante, é sede
do Conservatório Estadual de Música Lorenzo Fernandez,
que tem o maior número de matrícula entre os Conservatórios
da América Latina; é sede de uma grande universidade
pública e de inúmeras faculdades particulares, tornando-se,
desde a última década, emimportante
polo universitário brasileiro. É, também, o
segundo entroncamento rodoviário do país, o que sinaliza
o trâmite de influências culturais, mas, principalmente,
tem uma vocação ímpar para as artes em todas
as suas modalidades, sustentando desde o ano de 1984 o título
de “Cidade da Arte e da Cultura”. Por isso, dentre os
muitos nomes da terra, que bem poderiam representar este slogan,
escolhemos três para um primeiro registro pelo que conseguiram
no cenário das artes plásticas: Raymundo Colares,
Konstantin Christoff e Yara Tupynambá, nomes que são
referências do que há de mais legítimo e elevado
na pintura brasileira, com reconhecimento em todo o território
nacional e até no exterior.
Há muito, tínhamos a curiosidade de conhecer por inteiro
estes mitos. O propósito deste estudo ofereceu-nos a oportunidade.
Diante da extensão e beleza das suas obras, da complexidade
de suas histórias, exigimo-nos esforço e minucioso
cuidado na
tarefa de selecionar e restringir ao máximo, para atender
às particularidades deste específico espaço.
Apresentamos então uma síntese ainda mínima,
mas elucidativa de suas personalidades e obras. Mesmo assim, será
necessário dividir o conteúdo em três
capítulos, publicando-os separadamente nas revistas número
5, 6 e 7, devido ao perfil desta publicação, cuja
totalidade inclui artigos de autores diferentes. Escolhemos o artista
Raymundo Colares para iniciar este percurso.
RAYMUNDO
COLARES
Raymundo Colares é considerado por unanimidade como um dos
mais expressivos artistas da geração 60/70 do país.
Sua arte é considerada absolutamente única no cenário
brasileiro. Colares surge num momento de transição
e sua arte se apresenta como mescla e síntese de múltiplas
fontes: construtivismo, pop, futurismo, minimal arte, cubismo, geometrismo,
o que a classifica como contemporânea.
De
acordo com a especialista em arte, Lígia Canongia, “Colares
é intelecto, é emoção, clareza e caos,
consegue fazer conviver os domínios excludentes e confluir
os opostos”1. Sua vida inicia-se entre Grão Mogol/MG
onde nasce, e Montes Claros, para onde se transfere aos 6 anos de
idade, cidade que amou e adotou como sua, onde construiu a sua memória
e o seu imaginário criativo. Nascido aos 25 de Abril de 1944,
quinto entre os nove filhos de Felicíssimo Colares e Joana,
Raimundo Felicíssimo Colares passou a infância numa
casa no centro da cidade, numa esquina da rua Dr. Santos com Dom
Pedro II, cujo espaço retangular era o espaço sobrante
de uma grande construção em forma de L, o maior e
mais moderno cinema de Montes Claros; o Cine Fátima. Do seu
quintal podia-se ouvir a música e os diálogos dos
filmes que Raimundo acabava assistindo no grande salão auditório.
Colares amou a arte do cinema e com ela conviveu estreitamente.
Fazia álbuns de cinema e colecionava fotos de artistas. Adorava
ler histórias em quadrinhos, os gibis, colecionava-os. Era
um menino introspectivo, algumas vezes brincalhão. Lia exageradamente,
muito cedo se tornou culto.
Tinha uma boa relação com os irmãos e, pela
mãe, adoração. Admirava-a na sua força
e doçura. Separada do marido regia a prole sozinha.
Colares
fez o curso primário no Colégio Imaculada Conceição,
colégio de freiras católicas e continuou como seminarista
no Seminário Diocesano Nossa Senhora Medianeira de Todas
as Graças, a principal escola de formação de
padres da cidade. No Seminário ficou pouco tempo, apenas
2 anos, de lá seguiu para o Colégio Estadual Plínio
Ribeiro, a conhecida Escola Normal de Montes Claros, até
a segunda série do curso Científico, ao conquistar,
através de concurso, o prêmio Bolsa de Estudos da Sudene
, para terminar o curso em escola preparatória para o curso
superior, na Universidade da Bahia, em Salvador. Raimundo morou
em Salvador durante um ano, encantou-se com a cidade, descobriu
os seus alagados e os pintou na série do mesmo nome. Foi
lá que tomou conhecimento das artes de Piet Mondrian e Paul
Klee, figuras estas que irão revolucionar as suas idéias.
Ambos, pintores geométricos abstratos. Esses personagens,
com suas artes, fascinarão Colares que imediatamente começa
a pintar.
_________________________________________
1
CANONGIA, Ligia. Analise das referências in”Raimundo
Colares Trajetórias”.
Org. Centro Cultural Light. Rio de Janeiro.1997.Pag15.
_________________________________________
Há
relatos que comprovam a atração de Colares para o
mundo das artes desde a infância, alem do contato assíduo
com o cinema, gostava de desenhar e desenhava bem.
Após
os primeiros contatos com a arte moderna em Salvador, pesquisou
muito e estreitou os laços de afinidade com Mondrian. Vimos,
no acervo dos seus objetos, papéis com traços e escritos,
onde lemos, “Mondrian... ainda entenderei este cara”.
Raimundo descobre-se artista e decide mudar sua trajetória,
dispensa a bolsa de estudos. De Salvador escreve aos pais comunicando
a desistência do curso de Engenharia e a pretensão
de inserção no mundo das artes. Transfere-se para
o Rio de Janeiro.
RAYMUNDO
NO CENÁRIO DAS ARTES NO RIO DE JANEIRO
A grande metrópole, porta aberta do Brasil para o mundo,
o impressiona.
Era o ano de 1965 e Colares tinha entre 20 e 21 anos. O Brasil vivia
a ditadura militar, gerada no golpe de 1964. No contato com a grande
cidade, Raymundo se depara com o progresso, a velocidade, a nova
arquitetura construtivista. O contato com as grandes personalidades
artísticas emergentes e a geometria que já se acendera
no contato com Mondrian, vão causar a febre criativa de uma
arte única. Até então, autodidata, Colares
inicia contato com expoentes renomados da arte contemporânea
brasileira.
Para
sobreviver na grande metrópole e paralelo ao trabalho nas
telas, desenvolve um outro que depende também de criatividade;
desenha jóias para a H. Stern. Volta a Montes Claros por
um tempo, retornando ao Rio no ano seguinte, com a intenção
definitiva de desenvolver efetivamente a sua arte. Em 1966 faz vestibular
e se matricula na Escola Nacional de Belas Artes (ENBA), que abandona
no ano seguinte, devido às aulas não corresponderem
à sua expectativa. Continua com suas experiências primordiais
como autodidata, em busca de métodos de criação
mais livres. Foi nesse período (1966) que tentou pela primeira
vez uma seleção no Salão Nacional de Arte Moderna,
enviando 2 trabalhos, não sendo aceito.
Já no ano de 1967, em busca de referências essenciais,
aproxima-se de Ivan Serpa e frequenta por um tempo os seus cursos
livres no MAM, contudo, sem abandonar as suas pesquisas e experimentações
pessoais. Neste ano de 1967 já participava de coletivas importantes,
por exemplo, a mostra Nova Objetividade Brasileira no Museu de Arte
Moderna daquela cidade (MAM-RJ), da qual participou, a convite do
artista Antonio Dias. Participa também da V Exposição
de Arte Brasileira, no Museu Nacional de Belas Artes do Rio. Participará
ainda de mais um Salão de Arte, o Salão de Arte Contemporânea
de Campinas. Integra-se à vanguarda brasileira de artes plásticas,
ao lado de expoentes como Wanda Pimentel, Roberto Magalhães,
Carlos Vergara, Antônio
Manuel, Lígia Pape, Hélio Oiticica e outros, mas será
a partir de 1968 que começará a sua colheita de prêmios.
O
montes-clarense afirma-se como artista e passa a vender a sua arte
em galerias importantes como as Bonino e Klabin. Por alguns períodos
ministrará aulas de arte no Curso de Arte e Atelier Livre
do MAM e ensinará desenho num colégio de Niterói.
Em 1969 realizará a sua primeira exposição
individual no Copacabana Palace no Rio de Janeiro.
No período entre os anos de 1968 a 1980, conquista 11 prêmios,
os mais significativos no campo das artes plásticas brasileiras
daqueles tempos.
Aqui
registramos todos esses prêmios em ordem cronológica:
-1968: Isenção do Júri (Salão Nacional
de Arte Moderna (MEC-RJ), 2º Prêmio de Pintura do Salão
Esso do Artista Jovem (MAM-RJ); Medalha de Ouro do Salão
Paulista de Arte Moderna, Prêmio Aquisição no
Salão da Prefeitura de Belo Horizonte.
-1969: Seleção Prévia da Representação
Brasileira à Bienal de Paris (MAM-RJ) 1º Prêmio
Salão de Transportes (MAM-RJ), Prêmio de Aquisição
no Salão de Prefeitura de Belo Horizonte.
-1970: Prêmio Viagem ao Exterior do Salão Nacional
de Arte Moderna, Prêmio IBEU na Mostra O Rosto e a Obra, na
galeria desse Instituto, com acréscimo de passagem para EUA
e convite para expor na Art Gallery of the American Cultural Institute
de Whashington.
-1977: Prêmio Aquisição na Exposição
Arte Agora 1, promovida pelo Jornal do Brasil e Museu de Arte Moderna
do Rio de Janeiro.
-1980: Prêmio Aquisição no Arteboi, Salão
de Artes Plásticas de Montes Claros.
-Fala-se também de um primeiro prêmio conquistado aos
23 anos de idade, na V Mostra do Ciclo Retrospectivo de Arte Brasileira,
Na Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro.
A partir de 1970, Colares estará produzindo os seus famosos
gibis, livros objetos feitos com papel recortado e colados em composições
geométricas, que a princípio venderá muito
barato. Sua irmã Terezinha, em entrevista à autora,
dirá que Raimundo apreciava muito a música e interpretação
de Roberto Carlos. Então ficava muito feliz, quando, com
o dinheiro da venda de um gibi, comprava duas fitas cassetes de
Roberto Carlos. Esses gibis,
arte objeto, hoje requisitados, procurados e pesquisados, são
reconhecidos como valiosos no cenário da arte contemporânea.
Através do seu manuseio o artista conseguia a participação
e interação do espectador, aspecto que o preocupava.
Hoje, esses pequenos gibis são comercializados por mais de
R$ 50.000,00 cada.
Outra expressão que Colares experimentou com originalidade
foi a literatura. Compôs poemas neoconcretos com os quais
presenteava amigos, ou os abandonava nos próprios espaços
em que nasciam. Alguns eram recolhidos num caderno que sempre perdia.
No entanto, alguns dos que foram salvos estão presentes no
livro editado pelo Centro Cultural Light.
A
ARTE GEOMÉTRICA DE RAYMUNDO
Todos os críticos brasileiros de arte, de expressão
dessa época, sentem-se motivados a uma observação
mais apurada dessa genuína arte geométrica e tentam
classificá-la. Buscam nela alguma justificativa pop, já
que no momento a pop art explodia nos Estados Unidos. No entanto,
a estudiosa da arte de Colares, Ligia Canongia, refutará
essa possibilidade, ao conferir nos diferentes espaços culturais
e políticos, momentos antagônicos, enquanto a pop arte
norte americana brotava da dinâmica do mundo moderno, onde
é imensa a neutralização do homem como sujeito,
transformado em massa, sem identidade, apenas número e coisa,
paralelamente, aqui no Brasil em meio a plena ditadura, a luta pela
vida começava literalmente no corpo a corpo, homem versus
homem, uma luta em primeiro lugar pela sobrevivência física
num contexto repressor de muita vigilância e controle.
Em
relação à pop art reconhecerá “apenas
a mediação de alguns elementos formais semelhantes”.
Justifica Ligia Canongiaque, ”Se a obra de Raimundo Colares
é uma mescla, uma síntese de múltiplas fontes,
que vão da arte construtiva ao pop, do futurismo à
arte minimal, do cubismo ao cinema ou aos comics, é porque
ela é, antes de tudo, uma obra contemporânea, através
e malgrado suas influências modernas”2.
Para maior entendimento lembramos que a arte contemporânea,
muitas vezes, traz elementos da arte moderna, só que mais
voltados ao conceito, o que aconteceu a partir dos anos 60, obrigando-nos
a busca desse conceito até mesmo nas pinturas figurativas
e construtivas. No caso de Raimundo, devido ao tema dos ônibus
somos remetidos ao conceito velocidade e, por extensão, à
“fragmentação do espaço e do tempo do
próprio homem urbano das grandes cidades”3.
Mas
será o próprio Raimundo que se verá influenciado
pelo futurismo italiano e o cinema, tentando sínteses a partir
da influência dos fotogramas da sétima arte e as histórias
em quadrinhos com as quais conviveu estreitamente desde criança,
paralelo às sensações de impacto vividas diante
da velocidade urbana nos grandes centros e o desconcerto do homem
no tempo, a partir da vida moderna.
Colares tinha uma preocupação interessante, “queria
ampliar a escala da sua pintura através de processos mecânicos
como o silk screen, processo de reprodutibilidade técnica,
aspecto que indiretamente remete à linguagem pop”.
De acordo com relato
de sua irmã Terezinha Colares, ele queria democratizar a
sua arte, propiciar a todo o tipo de público o acesso à
sua pintura. Por isso através de sua técnica e fala,
não só sugeria, mas propunha espaço e condições
para que qualquer pessoa, através de manuseio pessoal, pudesse
fazer uma cópia do seu trabalho, em vários tamanhos
e ou materiais, fato inédito no meio dos artistas.
_________________________________________
2 Idem.Pág. 14
3 CANONGIA, Ligia. Sobre o Artista e a Exposição in
“Raimundo Colares Trajetórias”.
Org. Centro Cultural Light. Rio de Janeiro. 1997. Pag 09.
_________________________________________
Ele
disse: “Com isso eu pretendo tirar a minha arte exclusivamente
das mãos do burguês colecionador. Uma pessoa que tenha
quadro meu vai ter porque gosta e sabendo ainda que qualquer outra
pessoa pode, se quiser, ter o mesmo quadro. Pois qualquer quadro
meu pode ser reproduzido, sem perder sua autenticidade. Nos meus
quadros não há pincelada solta nem o chamado toque
artístico. Por isso qualquer pessoa que os copie obedecendo
a sua estrutura, não estará alterando em nada o trabalho,
que continuará a ser tão meu quanto antes. A minha
principal preocupação
é que o quadro não fique preso apenas a um colecionador
ou a um só trabalho. A única coisa que se gasta é
o material. Esse negócio de direito autoral não existe
para mim. Existe, isso sim, o prazer que alguém se interesse
pelo meu trabalho, o reproduza
ele mesmo, e o coloque lá na sua parede, pendure no seu teto,
ou simplesmente pose-o no seu chão. Agora, eu cobro por essa
reprodução, afinal eu vivo disso”4.
De acordo com o dito, vê-se que o artista pode perder a autoria
artesanal da obra, sem prejudicar a sua autoria intelectual, aspecto
bastante discutido na área artística ao longo do século
XX. E como descrito acima sua arte apresenta original figuração
de ônibus com cortes e fragmentações denotando
velocidade, e tem colorido vibrante e atraente, com predomínio
do vermelho e amarelo.
Desde o início de sua estadia no Rio de Janeiro, Raimundo
conquistara a companhia de artistas ligados à linguagem construtivista,
com os quais descobrirá afinidades, no entanto, sua figuração
exclusiva denunciará lances futuristas na forma de captação
“dos ritmos de uma urbanidade atual onde a interpenetração
dos ritmos visuais essencializam os movimentos de veículos
automóveis no trânsito de uma cidade grande”5.
A sua forma de representação denota “um sufocamento
e reflete o assombro de alguém que viera de sua pequena cidade
de origem para enfrentar a rea-
Sem título, 1968 - Esmalte sobre madeira -
enamel on wood –
160 x 160 cm - coleção João Leão Sattamini
- MAC/Niterói
Ultrapassagem - pista livre II, 1969 - Esmalte sobre madeira –
enamel on
wood - 160 x 160 cm - coleção João Leão
Sattamini - MAC/Niterói
lidade
espasmódica de um centro urbano de pleno ritmo, o Rio de
Janeiro”6. Na introdução de uma dimensão
orgânica ou humanista em estruturas originalmente tão
rígidas, Colares, em oposição à ortodoxia
concretista, agrega elementos expressionistas. Há quem defenda
que “a emoção é sempre o ponto de partida
de suas trajetórias”7. E não poderia ser diferente
a conclusão para todos aqueles que conheceram Colares pessoalmente,
a pessoa Raimundo transparecia uma sensibilidade quase que comovente,
“um misto de paixão e candura”8, que parecia
buscar “um pouco de ternura ou de compreensão”9.
Confrontamos alguns textos técnicos e científicos
desses críticos de arte com relatos de alunas dos Cursos
de Decoração e Artes Plásticas do Conservatório
de Música Lorenzo Fernandez de Montes Claros. Em um artigo
de Marluce Ramos, (recebemos uma cópia da própria
autora) publicado em jornal da cidade após a sua morte, lemos:
“Seus problemas existenciais pareciam maiores que ele próprio.
Recusava-se a aceitar os padrões de vida que a sociedade
impusera para todos. Era-lhe difícil submeter-se a conceitos
tradicionais, e aceitar um mundo cheio de preconceitos e repressões”
e então concordamos com aqueles que o chamaram de “James
Dean desglamourizado e de herói-suicida.” Vê-se
que não só visual-plástico, mas também
psicologicamente, “ele sempre esteve em trânsito, a
caminho, está sempre saindo, sempre chegando. Um bólido
no espaço”10. Daí, concluímos, os flashes/fragmentos
dos ônibus em movimento.
_________________________________________
6
Idem.
7 MORAIS. Frederico de. O Sonho não Acabou, de Volta à
Estrada, Colares
Busca Novos Caminhos in”Raimundo Colares Trajetórias”.Org.
Centro Cultural
Light. Rio de Janeiro. 1997. Pág 62.
8 Idem.
9 Idem. Pág. 63
10 MORAIS, Frederico de. O globo, 1983.
_________________________________________
RAYMUNDO
PROFESSOR DE ARTE
Após gozar o prêmio Salão Nacional MEC-RJ de
Viagem ao Exterior, que o levou a residir nos EUA por seis meses
e depois na Itália
por 18 meses, Colares retorna ao Brasil, especificamente à
sua “aldeia” Montes Claros. Sentia saudades e desejo
de rever os amigos e a paisagem da infância e adolescência.No
ano de 1972, colaborou para a criação do curso de
Decoração no Conservatório de Música
Lorenzo Fernandez, então dirigido por D. Marina Helena Fernandez
Silva. Montes Claros vivia naquela época um momento especial
no que se refere às artes. O movimento artístico do
Conservatório que viria a ser por muitos anos o primeiro
em número de alunos no Brasil devido ao dinamismo da sua
diretora e à resposta positiva da população,
contaminava a todos e a cidade respirava os novos ares da arte.
A força e o prestígio de D. Marina, filha do compositor
Oscar Lorenzo Fernandez, que viera do Rio de Janeiro, trazia para
a cidade artistas importantes no cenário nacional para apresentações
e cursos, ocasionando um bom intercâmbio artístico
com outras metrópoles. Montes Claros era mesmo um “point”
da cultura. Convidado a emprestar o seu talento e conhecimento artísticos,
Raimundo se infiltrou no meio de tudo isso disponibilizando a sua
genialidade e inteligência, contribuindo para o excelente
nível do curso de Decoração, nos seus primeiros
anos, apesar de já ser usuário de drogas, em avançado
grau de dependência. De acordo com depoimento de algumas alunas
das primeiras turmas do referido curso, Raimundo lecionava várias
disciplinas em um mesmo período; Desenho, Pintura, História
da arte e Composição Artística. As suas viagens
e permanências nos Estados Unidos e na Europa, paralelo à
sua experiência gloriosa no cenário das artes brasileiras,
alargaram a sua dimensão intelectual, que desde jovem se
mostrara plena de profundidade e erudição. Tornara-se
poliglota, traduzindo em aula simultaneamente ao ler, vários
textos de livros europeus e americanos. Conseguia transmitir com
lealdade tudo que aprendera (depoimento das alunas Marluce Ramos
e Lúcia Becatini).
Apesar
da simplicidade, tinha personalidade forte e marcante e os alunos
que o adoravam, nos momentos difíceis de crise, o protegiam.
Durante os anos de magistério, Colares precisou interromper
esse exercício várias vezes para atividades e participações
no Rio de Janeiro e as vezes, para proceder a tratamentos contra
a dependência das drogas. Internou-se algumas vezes, em São
Paulo e mesmo em Montes Claros, apesar da cidade não possuir,
ainda, espaço de saúde especializado na área
em que o seu problema requeria. De acordo com depoimentos de alunos
a sua contribuição como professor foi imensurável
para as suas formações de estetas.
TRAJETÓRIA INTERROMPIDA
A dependência das drogas intensificou-se, levando Raymundo
à ruína.
Após várias tentativas de desintoxicação
e cura, em março de 1986, Raymundo por vontade própria
se internou no Prontomente de Montes Claros, instituição
ainda precária, mas paliativa, para tratamento de doenças
mentais. Buscava alívio para a sua dependência das
drogas.
Após alguns dias, amarrado à cama que se incendiou,
não se sabe como (fala-se em cigarros) queimou-se vivo quase
que na completude física. Seu corpo apresentou o que na medicina
se classifica como “grande queimado”. Transladado para
o CTI do Hospital São Lucas, onde resistiu por 3 dias, faleceu
no dia 28 de março, uma sexta-feira da paixão, deixando
em estado de choque a cidade de Montes Claros e, transtornado, o
mundo artístico do Brasil.
O nome de Raymundo se fez sinônimo de grande arte e é
reverenciado como presença marcante na história da
arte brasileira. O colecionador de arte, dono de um dos maiores
acervos privados do Brasil, João Sattamini, que adquirira
grande parte da obra de Colares, hoje a disponibiliza eventualmente
para mostras de peso. Elas são expostas, eventualmente, no
MAC /Niterói, onde eu tive o orgulho e a satisfação
de contemplá-las reunidas, o que propiciou a mim uma visão
do conjunto da obra. Fiquei impressionada,
pude então perceber a dimensão, a força e originalidade
desta criação.
O Centro Cultural Light no Rio de Janeiro, no ano de 1997 o homenageou
com a edição de um livro de arte com textos de Ligia
Canongia, Paulo Venâncio Filho, com transcrições
de textos dos críticos Roberto Pontual, Frederico Morais,
Wilson Coutinho,
Reynaldo Roels, Jayme Maurício, além da carta-poesia-diálogo
de Hélio Oiticica, paralelo a uma monumental exposição
retrospectiva no período de 9 de julho a 24 de agosto, ambos
os eventos denominados de “Raymundo Colares Trajetórias.”
Foram filmados bons roteiros sobre o seu percurso. Um deles, ao
qual assistimos e nos emocionamos, se intitula: “Colares”,
sob a direção do cineasta Sérgio Bernardes,
foi patrocinado pela Prefeitura de Montes Claros, gestão
Mário Ribeiro e a Secretaria da Cultura do Estado de Minas
Gerais.
Como se vê, pode-se fazer um paralelismo da figura do ônibus,
tão presente em sua imagética, a induzir e explorar
a idéia de velocidade e ultrapassagens rápidas da
vida moderna, com a trajetória da sua vida. Colares, após
20 anos de atividade artística ininterrupta, morreu jovem
e de maneira trágica, deixando para o mundo o legado de uma
imagética única e levando o nome de Montes Claros
ao podium mundial das artes.
Como vimos, grandeza é a medida destes mitos que homenageamos
com o nosso trabalho. Necessário se faz lembrálos,
reverenciá-los, registrá-los para o conhecimento das
gerações futuras, pois o passado daqueles que transcendem
não se apaga, torna-se história, e esta é parte
do presente e do futuro.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
-
“Raimundo Colares Trajetórias”. Org. Centro Cultural
Light. Rio de Janeiro. 1997.
RAMOS,
Marluce. Relembrando Ray-Saudades de Ray. Diário de Montes
Claros, maio de 1986.
MORAIS,
Frederico. Panorama das artes plásticas. Séculos XIX
e XX. Inst. Cultural Itaú. São Paulo. 1989.
ARRUDA,
Wanderlino. Artes em Montes Claros in Tempos de Montes Claros. Belo
Horizonte. 1978.
www.macniteroi.com.br
www.art-bonobo.com
Entrevista
gravada com sua irmã Terezinha Colares.
SOBRE
GERALDA MAGELA
Felicidade
Patrocínio
Cadeira N. 20
Patrono: Camilo Prates
Texto
biográfico lido durante o lançamento do livro “LABOR
CLUBE
INTERNACIONAL DE MONTES CLAROS,” da escritora
Geralda Magela de Sena Almeida e Sousa, ex - laboriana.
Aconteceu
no auditório da ACI de M.Claros, onde compareceu grande público,
formado por autoridades, ex-laborianas, ex-orbianos, integrantes
do Instituto Histórico e Geográfico de M.Claros, da
Academia Feminina de Letras de M.Claros, da Academia Montesclarense
de Letras, da Pró-Reitoria de Extensão da Unimontes,
do Rotary Clube Norte, amigos e convidados em geral.
Foi abrilhantado com o hino de Montes Claros e do Labor Clube pelo
coral da AABB/FUNADE, sob a regência da maestrina Clarice
Sarmento. A Sra. Carmen Lúcia Antunes Rosa, uma das suas
ex-presidentes, falou conceituando o Labor Clube Internacional.
Em seguida, a Sra. Yvone de Oliveira Silveira, presidente da Academia
Montesclarense de Letras, fez a apresentação do
livro.
Após se ouvir a declamação de um poema e uma
canção da autora, dedicados a Montes Claros, e as
suas palavras de agradecimento, o Sr. Wanderlino Arruda, presidente
do Instituto Histórico
e Geográfico de Montes Claros, falou e, encerrando a sessão,
convidou para um coquetel que foi servido a seguir.
No transcurso da cerimônia um telão à frente,
lançava fotos com imagens de locais importantes de Montes
Claros da época e registrava ações sociais,
reuniões festivas e de companheirismo do Labor Clube Internacional
de Montes Claros, no período do seu funcionamento: 1963 a
1980.
Geralda Magela de Sena Almeida e Sousa
A
apresentação da autora foi feita pela ex-laboriana
e amiga, a artista plástica Felicidade Patrocínio
cujo texto, na íntegra, segue abaixo.
SOBRE GERALDA MAGELA
Difícil transformar em palavras uma realidade tão
ampla e complexa, como o é uma pessoa.
No entanto, confesso, fascina-me essa possibilidade. Acostumada
ao contato da argila que me oferece a plasticidade apropriada ao
domínio da materialização da forma idealizada,
transcendendo a pura coisidade em idéia, vejo-me, agora,
diante de um novo desafio que motiva a minha inspiração.
E este consiste em transpor, num desenho abstrato, uma figuração
que em si já é imaterial, já que me disponho
a esculpir, no conceito, o perfil da pessoalidade de Geralda Magela
de Sena Almeida e Sousa.
Tarefa que me honra de maneira especial.
E tratando-se de conceito, o que possuo para auxiliar-me nesta sublime
tarefa?
Por um lado, a palavra, e por outro, a beleza, em forma de pessoa:
Magela.
O receio de incompletudes leva o meu senso crítico, inquieto,
a questionar: poderá esse processo sofisticado de abstração,
traduzido em simples sinais escritos e sons significantes, totalmente
arbitrários, mas combinados e aceitos pelo grupo, trazer
a compreensão de realidades tão complexas, como uma
subjetividade pessoal, um modo de sentir e ver o mundo?
A história das letras sinaliza de forma positiva. Sendo assim,
solicito a atenção de todos, para que sejam levados
a ver a beleza de
alguns quadros da vida de uma mulher exuberante que desde sempre
fez um pacto com a vida, vivê-la de maneira virtuosa e produtiva.
Nossos primeiros contatos se deram, quando, ainda crianças,
brincávamos nas portas das casas, dela, da minha, onde entrávamos
e saíamos alegres e cantantes.
Nos vôos imaginários nos galhos das goiabeiras imitando
passarinhos. Nos folguedos de roda, de circo, e nos barulhentos
recreios da primeira escola, o Grupo Escolar Francisco Sá.
Como filha, única mulher, Magela reinava em sua casa com
direitos de princesa, rodeada por seus pais amorosos, Cypriano Almeida,
famoso agrimensor, D. Ambrosina, a gentileza em pessoa, e pelos
seus 4 irmãos.
Cabelos longos da cor do mel, sorriso meigo que ao longo do tempo
foi adquirindo um charme encantador.
Era linda de dar gosto. E continua como podem ver.
Magela se destacava dentre outras crianças e, mais à
frente, dentre as jovens, devido a sua precoce personalidade.
Aos meus olhos de menina curiosa, acostumada à multidão
de 12 irmãos e quartos cheios de camas, o quarto de Magela
era um deslumbramento: bonecas de louça de face rosada, guardaroupa
farto e criativo, tapetes no chão e almofadas sobre uma
cama só.
Sempre vestida de forma primorosa, laços, babados e bordados
e coisas mais para o encantamento das amigas. Tudo naquela casa
nos encantava, mas a marca maior, gravada para sempre na minha mente,
vem de um sorriso, este sim, indescritível, sem linguagem
capaz de apreendê-lo e transmiti-lo na sua totalidade.
Era
o sorriso da mãe Ambrosina, quando punha os olhos sobre Magela.
Era a expressão do AMOR, na sua perfeição.
Magela descreve esse sorriso no seu texto; “No colo da mãe,
a vida se aprende”, publicado na revista do Instituto Histórico
e Geográfico de Montes Claros, n.4/2009.
Foi lá que li também:...”eu canto, porque ouvia
minha mãe cantar. E me arremedo poeta, porque com ela aprendi
os primeiros poemas.Ainda muito pequena, me lembro, ficávamos
estendidas sobre sua cama, fundidas nas dimensões da beleza
e dos sentimentos. Ela declamava para mim”...... “nossos
saraus aconteciam ali, no aconchego do ninho. Ela declamava e eu
percebia a minha mãe transformar-se: um rubor de emoção,
um brilho de estrelas nos olhos verdes, ondas de arrepios enquanto
repetia a história dos poetas e transmitia lições
de sensibilidade, emoção e vida.” “Lembranças
inesquecíveis! Riquezas acumuladas na alma!”
Essa influência materna direcionada à literatura levou
Magela, desde tenra idade, a compor versos e, com freqüência,
vestida de papel crepom, subir aos palcos dos auditórios
escolares, onde dançava, cantava e declamava lindos poemas.
O tempo foi passando e nós crescemos.
Tornamo-nos
parte da geração anos dourados, década de 60.
Aquela década prometia. Chegara a vez dos jovens.
Na explosão dessa juventude via-se latente a determinação
da conquista da liberdade. Essa febre atingiu todo o planeta e o
nosso contato com o mundo tornou-se consciente e participativo.
Amávamos a humanidade e queríamos transformá-la.
Agenciamos atitudes e, até onde foi possível, traduzimos
esse desejo.
Na
música, nas roupas, nos discursos, nas ações
sociais, no comportamento como um todo, cantamos com os Beatlles,
com os Tropicalistas, vibramos com os festivais da MPB, dançamos
o Twist.
Surgiu o Movimento Hippie, os avanços da Ciência levaram
à conquista do espaço, a medicina trocou num peito
ainda pulsante um coração doente, a TV iniciou a transmissão
ao vivo, via satélite.
Ainda aí, nos anos 60, começa a sair da fôrma
o computador com promessas de internet. Surge a pílula anticoncepcional
e a mulher domina e controla o seu corpo de fêmea, o que propicia
a sua infiltração no mercado competitivo do trabalho,
paralelo ao homem. Aturdidas, víamos tudo isso acontecer
e nós próprias protagonizávamos o acontecer
e, confesso, se não fossem os resíduos de uma formação
vigorosa, os nossos pés teriam saltado do chão, sem
retorno à normalidade.
Os reflexos dessas mudanças impactantes e irreversíveis
fizeram-se sentir nos quarteirões sul (hoje centro) da cidade
de M. Claros onde morávamos.
Magela, assim como e eu e as nossas amigas e amigos, assumimos um
novo modo de estar no mundo.
Magela, que desde criança se encantara com as cores da primeira
caixa de lápis coloridos, já nos cursos ginasial e
Magistério, no Colégio Imaculada Conceição
apresenta forte tendência para as atividades artísticas.
Naturalmente motivada à vida ativa e participativa, durante
o curso Normal, ingressou na JEC, movimento da juventude católica,
onde experienciou (de acordo com suas próprias palavras)
o ”agir no mundo através da religiosidade e da relação
com Deus”
Ingressou no Tabatoriba “grupo de dança folclórica
que possibilitava sua relação c/ a música,”
fazendo abrir em sua consciência
mais um canal para a expressão do belo que já pressentia.
Participou de Concursos de Poesia, buscando, na declamação,
uma comunicação literária, através da
combinação da entonação de voz, silêncios
e gestos.
Aqui quero abrir um parêntese para um registro que considero
importante: trata-se dos cadernos de poemas de sua autoria que se
multiplicavam em pouco tempo. Era uma alegria, para nós,
as amigas, ouvi-la na leitura desses poemas tão lindos, com
expressões bem articuladas, onde se percebia, subjacente,
sentimentos nobres e mais forte do que todos, aquela emoção
que denunciava a descoberta do amor.
Era já o prenúncio de uma escritora bem sucedida que
viria honrar a Academia Feminina de Letras desta cidade. Ingressou
também no “Labor Clube de Montes Claros, franquia do
Labor Internacional, clube feminino, de serviço onde, diz
ela, “vivenciava
a relação com a sociedade e com o outro através
da consciência de Mundo, de Ser Humano, de fraternidade e
serviço”. Tive a alegria de ser sua colega também
no Labor e, dentro daquele espaço de fraternidade, agenciamos
transformações valiosas de vidas através do
trabalho social e de palestras dirigidas aos jovens, sobre formas
saudáveis de estar e participar do mundo.
Magela relata de forma primorosa, neste livro que lança agora,
a história desse clube em Montes Claros.
Após a formatura e já consciente da importância
da sua presença no mundo, ela se viu preparada para o que
se propusera: colaborar efetivamente na evolução da
sociedade, através do mister mais sublime, a educação,
o que se efetivou a princípio no Pré-primário
e Primário.
Na busca de aperfeiçoamento, estreitou os laços com
a arte através do curso de Pedagogia Musical feito no Conservatório
Lorenzo Fernandez.
Em
pouco tempo, estende o seu labor ao magistério de 2º
grau e a partir de 1972 amplia seus horizontes produtivos com um
trabalho muito especial com adultos da zona rural (agricultores,
fazendeiros e cooperados).
Aí que ela pode lembrar-se do companheirismo que já
conhecera no Labor Clube, e mais uma vez admirou-se da força
que emana da união e da cooperação.
É que, desta vez, Magela se tornara, por acréscimo,
Técnica em Educação Cooperativista através
da Ercoop/Sudene.
Em 74 faz novo curso, Pós-graduação em Orientação
Educacional- FAE/UFMG F e através das Escolas Polivalentes/PREMEM
dá um novo salto.
Desenvolve no Triângulo Mineiro, precisamente na cidade de
Ituiutaba, durante 3 anos, aquilo que define como a experiência
mais organizada e satisfatória que conhecera na educação
formal: as Escolas Polivalentes.
No final de 76, de volta a Montes Claros, participa do Centro Integrado
de Atendimento ao Menor - o CIAME cuja estrutura e processo educativo
era ligado à FUNABEM/FEBEM.
Magela relata em seu texto “Arte Vida, Vida Arte” que
foram “sete anos de maravilhosa experiência na ação
social em campo aberto e educação informal”.
Em 82, já casada com Hugo César de Sousa e com 2 filhos,
William César e Túlio César, muda-se p/ BH
acompanhando o marido.
Lá trabalhou na 1ª Delegacia Estadual de Ensino, Colégio
Estadual “ Olegario Maciel”, nas E.E. “Dep. Antonio
Martins Canedo” e “Diogo de Vasconcelos”, e no
Colégio Pitágoras-Cidade Jardim.
Em
91, já em Montes Claros passa a coordenar as Atividades Especiais
no Instituto Educacional da Criança e a partir de 93 enfrenta
os desafios da educação à distância,
através da Escola Técnica, somando aos seus atributos
mais esse avanço da tecnologia.
Capacitou-se adequadamente nesta área, através de
outra Pós-Graduação com especialização
em Educação Continuada e a Distancia, na Universidade
Nacional de Brasília, passando a trabalhar nessa demanda
no norte de Minas através da Pró-Reitoria de Ensino,
da Unimontes, onde permanece.
Durante essa escalada, a arte às vezes se escondia, mas na
realidade nunca a abandonou.
Nas práticas da sua docência, ela foi se tornando consistente
e direcionando sua vertente para o campo da linguagem, por isso,
nos trabalhos dos últimos tempos, produziu vídeos,
com roteiros de sua autoria, e, mesmo que o foco fosse pedagógico,
percebia-se nuances literárias.
No momento atual, dedica boa parte do seu tempo às letras.
Definiu e decidiu que este será o seu campo artístico
e será através dos meandros da palavra que continuará
contribuindo para o entendimento entre as pessoas, para a melhoria
da vida e o engrandecimento das manifestações do mundo,
no tempo.
Conhecendo a sua capacidade e determinação, aposto
no seu sucesso e esta festa o comprova.
Parabéns Magela.
O
QUE SERÁ TABATORIBA?
Geralda
Magela de Sena Almeida e Sousa
Cadeira N. 34
Patrono: Eva Bárbara Teixeira de Carvalho
Tudo
começou nas cabecinhas inquietas e alegres de um grupo de
estudantes de magistério do Colégio Imaculada Conceição,
em Montes Claros.
Fazíamos
o 2º ano normal e devíamos preparar a tradicional Festa
de Despedida para a turma do 3º normal que iria se formar.
Era o ano de 1962, setembro, por aí. Na turma de cinqüenta
alunas - 2º Normal B - um grupo, especialmente barulhento,
irrequieto, alegre e amigo formava a “turma do Lairô”.
Comandávamos as brincadeiras em sala e fora dela. As novidades,
o agito, as festas sempre tinham o dedo de algumas das meninas do
Lairô.
Essa turma possuía alguns subgrupos formados por maior afinidade,
vizinhança, conhecimento anterior, etc. Éramos: Conceição
Tolentino, Yole Nunes, Lúcia Idalina Narciso, Glória
Fagundes,
Terezinha Massière, Mercês Madureira, Ismar Aquino,
Miriam Milo, Magna Jeanine Félix e eu.
Entusiasmadas, urdíamos planos para a festa. Costumeiramente,
após as aulas de Educação Física, à
tarde ou após algum horário vago no final da manhã,
nos reuníamos para conversar sobre os Lairôs, os flexs,
comentar sobre os fatos interessantes ocorridos nas aulas da semana,
cantar e rir, rir com vontade.
A alegria era a tônica do grupo. A alegria e o canto ao som
do violão, que sempre estava por perto e ao som do qual sempre
eram finalizadas as nossas reuniões. A verdade é que
sempre estávamos juntas ou nos encontrávamos por aí.
A sede do Lairôs Clube ficava situada exatamente no amplo
quarto de Magna Félix, num sobrado localizado na esquina
da Rua Carlos Gomes com a Rua Lafetá.
A janela do quarto que se abria para a Rua Carlos Gomes era nossa
janela para o mundo e o nosso ponto de observação
das lambretas, carros e os flexs que passavam por ali por “
pura coincidência”.
Além de nós também apareciam pelo clube, ainda
que com menor freqüência, a Mirtes Lopes, Isabel Nunes,Maria
de Jesus Rabelo, Maria da Consolação Rabelo, Zenilda
Araújo Gomes, Ismar Aquino, Marta Brasil, Josefina Pereira
de Carvalho, Mércia Beatriz Pereira e outras, cujos nomes
não me ocorrem agora.
Com certeza, foi numa destas manhãs ou tardes que a idéia
para a festa surgiu e imediatamente tomou corpo. Faríamos
uma festa diferente, “estrordeler”, inesquecível!
Formaríamos um conjunto para cantar e dançar.
Imediatamente a data do primeiro ensaio foi marcada. E na hora certa
estávamos lá com mil idéias na cabeça
e querendo dançar.
Mas não foi fácil colocar e entender as idéias
apresentadas diante da algazarra e brincadeiras de cada uma. Não
se chegava
a nenhum acordo. Cada uma queria falar, rir e gritar mais do que
a outra.
Segundo Josefina, ela não se esquece de como eu, séria,
“brigava” e me empenhava para botar ordem na confusão
generalizada. No final tudo dava certo e acabava em riso.
A festa aconteceu no Pentáurea Clube e foi um sucesso!
Apresentamos a Bandinha do 2º Normal B que ficou assim na sua
formação original:
Violão - Zenilda Gomes e Ismar Aquino
Atabaque - Elizabeth Lücher Castro e Carmem Lúcia
Tupinambá
Cocos - Mercês Madureira e Neusa Gonçalves Dias
Maraca e triângulo - Teresinha Massière e Iole Nunes,
Josefina Pereira e Lúcia Idalina Narciso,
Pandeiros - Conceição Tolentino, Glória Fagundes,
Odete
Queiroz, Joelita Noronha Nassau, Miriam Veloso Milo e Geralda
Magela de Sena Almeida.
O melhor é que o grupo fez tanto sucesso que no ano seguinte,
diante da necessidade de levantar recursos para as festas da nossa
formatura, não pensamos duas vezes: - a Bandinha do 2°B
vai ser o show!
Mas seria necessário um repertório diferente, melhorar
nossa apresentação. Precisávamos buscar ajuda.
Mas onde buscar? Quem poderia ser?
Não se podia falar em música naquela época
sem imediatamente ver surgir em destaque o nome de Dona Marina Lorenzo
Fernandes Silva.
Dona
Marina??!! Será que ela atenderia o convite de um ”grupinho
de alunas” sem relevância?
Fomos lá verificar. Uma colocando a outra na frente, sem
saber bem como dizer do nosso desejo, rindo do nosso próprio
acanhamento e pretensão, tocamos a campainha da casa dela.
Nessa época D.Marina morava à Rua Dr. Veloso, ao lado
da casa de D. Natália Peixoto, quase esquina com a rua Dom.
Pedro II.
Parecia que a porta não ia se abrir. A gente tinha vontade
de sair correndo com a desculpa de que ninguém atendeu. Assim
não teríamos que passar pela vergonha de “fazer
feio” diante dela.
Mas a porta se abriu. E a luz de um sorriso amigo, cordial iluminou
o ambiente e correu com todo medo. Quando vimos, já estávamos
na sala da casa de D. Marina à vontade, conversando com ela,
contando sobre nossas idéias e admiradas de vê-la já
parte do grupo dando sugestões e marcando nosso primeiro
ensaio.
A festa teria o nome de “Chá... Chá... Chá...
na Bahia” e a divulgação que a precedeu merece
uma crônica à parte. Criou um suspense geral.
– O que será Tabatoriba? Na cidade só se falava
disso. As Colunas Sociais especulavam. Todos queriam saber o que
seria a tal TABATORIBA proclamada em cartazes espalhados pelos principais
pontos do centro da cidade.
E chegou o dia. Vestidas de baiana estilizada em vermelho, branco
e com muitas bolas, argolas grandes no turbante em laço,
mal conseguíamos esperar para entrar no salão de festa
do Clube Montes Claros.
Ficou
decidido que cantaríamos músicas de folclore brasileiro.
Entraríamos cantando “Na Bahia tem...“ e o “pour
porri” com músicas folclóricas da nossa região.
A seguir passaríamos para a música “Vento”
de Dorival Caymi.
Nesta música estava o clímax da apresentação.
Embalados pelo som da canção: “...vento que
esparrama as palhas do coqueiro, vento que encrespa as ondas do
mar...” viam-me levantar e caminhar pelo salão declamando
os versos da música, enquanto todo o grupo sentado fazia
fundo sussurrando a melodia. Os aplausos eram espontâneos
e efusivos. E antes que o público se desse conta a música
lânguida e romântica explodia num chá... chá...
chá... vibrante que contagiava a todos numa grande animação.
O grupo se levantava e, dançando o novo ritmo da moda, tirava
as pessoas mais próximas para dançar. Quando a pista
começava a se encher ele saia de mansinho deixando o ar de
sua alegria envolvendo a todos. E eram palmas. Muitas palmas.
O
Grupo TABATORIBA ficou consagrado desde a sua primeira apresentação.
Foi convidado muitas vezes a se apresentar, inclusive, nas cidades
vizinhas. E enquanto foi possível nos reunirmos, Tabatoriba
partilhou o ar de sua graça.
Eu
não disse por que o grupo se chamou TABATORIBA! É
que segundo Isabel Rebello, hoje Isabel Rebello de Paula, na época
nossa querida professora no Colégio Imaculada Conceição,
o nome caia bem para o nosso grupo, pois, segundo ela, TABATORIBA
queria dizer em tupi-guarani: grupo alegre, exatamente como éramos.
Assim,
ficou: TABATORIBA. Nome de um grupo alegre de jovens normalistas,
que dançando marcou a lembrança de todos
que puderam vê-lo.
E
que ficou tatuado no coração de cada uma de nós,
para sempre marcando esse tempo feliz de alegre convivência
no Curso Normal do Colégio Imaculada Conceição
e no grupo alegre
–
TABATORIBA.
Foto
1: Apresentação da bandinha TABATORIBA - Festa ”Chá,chá,chá
na
Bahia”. Clube de Montes Claros – Ano 1963
Foto
1 - Da esq. para a direita: De joelhos, Terezinha Massière,
Iole Nunes, Lúcia Idalina Narciso.Josefina Pereira de Carvalho.
A assentadas no tablado, Zenilda Araújo, Elisabeth Lücher
Castro, Marta Brasil, Carmem Lúcia Tupinambá, Ismar
Aquino. Assentadas no chão, de frente, Mercês Madureira
e Neusa Gonçalves. Assentadas de lado, com pandeiro, Joelita
Noronha, Odete Queiroz, Glória Fagundes e Conceição
Tolentino.
Foto
2
Foto
2 - As duas integrantes do grupo que estão na foto ao lado,
com pandeiros, e não aparecem na foto maior são: (da
esquerda para direita) Geralda Magela de Sena Almeida e Miriam
CASOS
PITORESCOS DOS ALBORES
DE UMA CIDADE
Itamaury Teles de Oliveira
Cadeira N. 84
Patrono: Newton Prates
Sempre
fui muito curioso para saber das pessoas mais velhas o que faziam
para ocupar o tempo, nas pequenas cidades, onde as opções
de lazer eram mínimas. Invariavelmente, o assunto se concentra
nas prosas intermináveis à porta das casas, onde elas
se refestelavam a bordo de bancos e cadeiras, deslindando casos
pitorescos que ocorreram no nosso sertão norte-mineiro.
Como velho repórter, ando sempre munido de gravador, para
colher relatos autênticos e não perder detalhes importantes,
capazes de ensejar novas pesquisas.
Pois foi com esse propósito que, em janeiro de 1985, em companhia
do meu tio José Gomes de Oliveira, fomos visitar, em Montes
Claros, o Sr. Pedro Ladeia. Eu o queria conhecer havia muito tempo.
Ele fora citado pelo meu avô Filogônio Teles de Menezes,
em entrevista a mim concedida, em 25.12.1975, como sendo o homem
que construíra uma casa em Porteirinha, “a muque”,
na década de 30, contra a vontade da política de Grão
Mogol, que deliberou proibir a construção no distrito,
por cinco anos, para que não crescesse mais que a sede do
município.
Emancipada de Grão Mogol, em dezembro de 1938,
esta é a primeira imagem
da florescente cidade de Porteirinha (Foto: Acervo do Cônego
Julião
Arroyo Gallo)
O
Sr. Pedro Ladeia disse-me ter nascido em Jacaraci – BA. Mudou-se
para Porteirinha em 1917 e ali permaneceu até 1932, quando
transferiu residência para Montes Claros. Era tropeiro, como
meu avô Filogônio. Recordou, inclusive, de um episódio
acontecido com ele, quando viajava com tropa: “Filogônio
até começou bem e estava mais ou menos regulado. Ele
me contou que comprou uma tropa e começou a negociar e tal.
Com pouco pegou: quando ele apanhava um couro, o couro ia lá
pra cima. Pegava um arrocho [que era um petrecho utilizado para
se apertar a carga] e tomavam da mão dele e botava lá.
Tinha um saco – que eles davam o nome de piranga – que
era para botar em cima para poder apertar o animal. Tudo que ele
pegasse, tomavam da mão dele.”
Nesse
ponto, interrompi para indagar se já era uma manifestação
do famoso Romãozinho que, em 1927, atazanou a residência
do meu avô. E o Sr. Pedro Ladeia não titubeou: “Era.
Estava ajudando ele. Mas a tropa sumia. Isso eu vi. Eu saí
junto com ele e cheguei 15 dias adiantado. E ele chegava atrasado
porque burro sumia, outra hora a carga perdia.” Indagado pelo
meu tio se foi nessa época que Filogônio Telles ficara
cego, Pedro Ladeia disse que não, pois a vista dele só
começou a piorar depois da aparição do Romãozinho.
O tropeiro Filogônio Teles de Menezes passou
por maus momentos, supostamente
causados pelo ente Romãozinho (Foto Itamaury Teles)
Mudando
de assunto, quis saber do Sr. Pedro Ladeia como era Porteirinha
naquela época em que lá morou. Para ele, Porteirinha,
embora distrito de Grão Mogol, era bastante movimentada,
mas havia poucas casas. “Era um arraialzinho. Tinha aquela
casa ali do Major Fidêncio, até uma algodoeira velha,
que era onde tinha a casa de Domingos Lima. Zé Gomes foi
para lá logo depois.”
O montes-clarense José Gomes de Oliveira participou
intensamente dos
acontecimentos sociais e cívicos de Porteirinha. Ao centro,
ele aparece tocando
surdo no desfile de sete de setembro de 1942, tendo sua irmã
Palmyra
Santos Oliveira como porta-bandeira. (Foto: Acervo do Cônego
Julião Arroyo
Gallo)
“Quando
fui prá lá – conta José Gomes –
Porteirinha já era cidade fazia quase dois anos. Eu inaugurei
o telégrafo lá no dia 20 de outubro de 1940. Inaugurei
o aparelho Morse. O telefone já havia sido inaugurado no
dia 7 de setembro do mesmo ano, por João de Deus, um guarda-fio
de Diamantina, que foi lá fazer esse serviço de construção
da linha. Quando fui pra lá, o Correio funcionava onde era
há pouco tempo a casa de Milton Teles, esquina com o velho
Torozó, que era pai de Tarcino. Fiquei em
Porteirinha até 1943, quando me mudei para Montes Claros.
Propércio, meu filho mais velho, tinha seis meses.”
Pedro Ladeia disse que saiu de Porteirinha em 1932, quando
Natinho - comerciante casado com a sobrinha da minha avó,
Guiomar Rosa de Brito (Dona Guigui) - construiu a primeira casa
no Cabaçal e lá montou uma venda.
Quando
o Sr. Pedro Ladeia saiu de Porteirinha, em 1932, o ainda distrito
grãmogolino
tinha este bucólico aspecto.
Ao
falar de Natinho, iniciou-se um pequeno desencontro de opiniões
entre Pedro Ladeia e José Gomes. Este falava que a casa onde
Major Santos morou fora construída por Natinho e Pedro Ladeia
dizia ter sido por Nino, irmão de Dona Guigui, ao lado da
casa do Major Fidêncio Cangussu. José Gomes disse que
Natinho construía e vendia casas em Porteirinha. A última
notícia que ele teve de Natinho foi que havia se mudado para
Jequitinhonha.
Antiga Praça da Bandeira, em Porteirinha,
projetada pelo Dr. Jansen, vendose
ao fundo, à direita, as casas que pertenceram a Major Fidêncio
Cangussu
e Major (Alcebino) Santos.
Como
não chegaram a um acordo, aproveitei a oportunidade para
fazê-los lembrar de casos pitorescos ocorridos em Porteirinha,
nos anos 1917 a 1943.
José Gomes lembrou-se de alguns casos ocorridos no Correio.
“Eu me lembro de um Fulano de Tal Cardoso de Moura e a mulher
dele era Cardosa de Moura.” Além disso, lembrou-se
que, aos sábados, fazia chamadas no Correio, às 9,
13 e 15 horas, quando “corria” as cartas. Quando lia
um nome ouvia-se sempre alguém dizer “supara”,
para separar. A maioria das cartas era dirigida ao Jatobá
(hoje, Serranópolis de Minas), aos cuidados de Oscar Antunes
ou de Ananias José Alves, “que eram os donos de lá,
na época.”
José Gomes disse ter sido muito bom o período em que
viveu em Porteirinha. “Fiz boas amizades. Lá para mim
era o mesmo que minha casa. Naquele tempo não tinha política
ainda e era todo mundo amigo. Depois é que veio a política
e atrapalhou tudo.”
Nesse ponto, indaguei quando havia iniciado essa divisão
entre Liobas e Gabirobas. “Isso foi mais tarde. Eu já
havia mudado para Montes Claros. Começou com Anfrísio
Coelho e Dr. Almerindo Brito. Alcides herdou de Dr. Almerindo.”
Segundo José Gomes, “Porteirinha teve um prefeito,
Dr. Altivo Fonseca, que era tenente da Polícia e advogado.
Ele proibiu as pessoas de amarrar cavalos nas portas das casas.
O sujeito chegava a cavalo e o amarrava ali na porta. Tinha até
uma argola
própria pra isso. Era um costume. Depois da proibição,
o pessoal da zona rural tinha que amarrar os cavalos fora da cidade.”
Nessa época, recorda-se José Gomes, morava em Porteirinha
um alemão, Dr. Jansen, que era chefe de obras da Prefeitura.
Enxergava pouco. Dr. Altivo recomendou a ele para não deixar
ninguém atravessar o jardim. “O jardim era um gramado
que tinha lá e eles botaram uma cerquinha de arame liso,
mas as pessoas saltavamaquilo. Um dia – continua José
Gomes – eu estava na casa que era de Natinho e vi o Dr. Altivo
atravessando o jardim, saltando a cerquinha. Aí o Dr. Jansen
gritou: - Ô, moço! É com você mesmo que
eu estou falando! Dr. Altivo olhou pra trás. E Dr. Jansen
gritou: - Num pode andar aí, não! Aí Dr. Altivo
continuou andando. E Dr. Jansen continuou gritando: - É com
você mesmo que olhou pra trás, seu cavalo! Você
não sabe que é proibido andar aí dentro? Depois,
Dr. Altivo veio, sorriu e disse: - Você está certo.
Fui eu quem deu a ordem.”
O primeiro prefeito de Porteirinha, Dr. Altivo Fonseca,
proibiu o “estacionamento”
de animais nas ruas da cidade.
José Gomes lembrou-se de que Dr. Jansen só tinha um
dente na frente. Como eram muito amigos, um dia perguntou-lhe por
que não arrancava aquele dente solitário. E ele, sem
pestanejar, respondeu: - Arranco, não! Serve pra chupar umbu...
“Outra vez vi que ele mantinha um apito na cabeceira da cama:
- Dr. Jansen, para quê este apito? E ele respondeu: - Eu moro
sozinho. Se eu sentir mal de noite eu apito e a vizinhança
sabe que estou querendo alguma coisa e vem me ver.”
Quis saber o que se fazia em Porteirnha naquela época. Pedro
Ladeia recordou que, por não ter nada para se fazer, ficava
sentado na porta. “Botava as cadeiras na porta da casa para
uma prosa... A gente também jogava marimbo, uma espécie
de jogo de baralho. Jogava muito com o Major Fidêncio.
José Gomes manifestou-se sobre o Major Fidêncio, da
Guarda Nacional. “Era uma pessoa muito austera. Fácil
de lidar com ele, muito educado, reto demais da conta. Muito direito.
Ele e Dona Naninha.”
Sobre
o que fazia naquela época, recordou: “Naquele tempo
a gente jogava muito bilhar, tinha muita melancia [risos], muita
fartura... Quando andei por lá, Porteirinha era conhecida
como o maior produtor de mamona do País. Anteriormente, era
um grande exportador de suínos também. Tinha muito
carro por lá. Mas em Mato Verde tinha mais carro que Porteirinha.
Em Monte Azul tinha o carro do Sr. Telles. Aos sábados, tinha
aquele monte de carro vindo para Montes Claros. A gente tinha que
combinar a boléia com antecedência. Se tivesse com
a mulher, não tinha vez pra gente. Por uma questão
de delicadeza, a gente tinha de ceder a boléia para a mulher.
A gente ia em cima da carroceria...”
Para mim, os casos pitorescos são rara especiaria que tempera
e dá sabor a normalmente insípida e muitas vezes desinteressante
história oficial. Por isso, minha curiosidade continua...
COISAS
DO PASSADO
Juvenal Caldeira Durães
Cadeira N. 81
Patrono: Nathércio França
Na década de 30, Montes Claros era uma cidadezinha modesta,
plantada no sertão mineiro e longe de tudo. Era servida pela
“Estrada de Ferro Central do Brasil” (EFCB), meio de
transporte que ligava a nossa comunidade aos grandes centros e às
localidades por onde passavam os seus trilhos. As outras partes
da região, ligadas com estradas precárias, eram servidas
pelas tropas de burros e carros - de - bois.
O
povo da cidade era simples, solidário e vivia como se fosse
uma grande família e os camponeses da redondeza não
eram diferentes. Todos juntos formavam uma sociedade tranqüila,
com raros casos de violência e de desavenças.
Naquela época, eu era criança e morava na fazenda
“Cantinho”, com meus pais, irmãos e agregados
prestativos. Ali, era um paraíso com paisagens verdejantes
e floridas, aves exóticas banhando nas águas tranqüilas
das lagoas ou pousando nos galhos das árvores frondosas que
cobriam a região.
Chovia
muito e as colheitas na redondeza de produtos agrícolas e
de frutas eram abundantes e suficientes para o sustento da população,
apesar da falta de conhecimentos tecnológicos e de recursos
da nossa modernidade. O povo vivia satisfeito e alegre, sem nada
reclamar.
A alimentação era sadia e saborosa. Os produtos químicos
não eram conhecidos na região e tudo era natural.
No lugar dos agrotóxicos, usavam-se o “toá”
moído no pilão (rocha amarela e macia) para imunizar
o feijão contra o caruncho. O arroz era conservado em casca,
para evitar as pequeninas lagartas e socado no pilão à
medida que fosse usado na semana. O toucinho e a carne de porco
eram fritos e transformados em conservas enlatadas para o uso diário.
As abóboras e morangas eram conservadas no meio das espigas
de milho do paiol, para o uso do ano. A lenha destinada aos fogões
era armazenada no galpão para evitar o aguaceiro das chuvas
torrenciais. As rapaduras eram empilhadas e a farinha ensacada,
depositadas na dispensa. E assim, sem geladeiras e recursos modernos
de hoje, procediam na conservação dos alimentos para
passar os períodos chuvosos do fim de ano, chamados impropriamente
de “inverno”, que se dava sempre em novembro e dezembro,
deixando a região alagada com rios cheios e estradas intransitáveis.
Com o passar do tempo, tudo mudou radicalmente. Surge a tecnologia
avançada e cheia de novidades modificando as coisas e os
costumes para melhor ou para pior, de acordo com as circunstâncias
do momento e das tendências das pessoas modernas. Ao lado
das inovações benéficas apareceram os males
da época, como o mau uso da internet, da televisão
e o abuso das drogas e da liberdade exagerada, o que aniquila cruelmente
o potencial da juventude e faz gerar a violência. Todavia,
esses vírus contagiosos não conseguem atingir pessoas
de boa índole, previdentes e que sabem evitar esses flagelos
e aproveitarem das vantagens oferecidas pelo progresso para prosperarem
a bem de si mesmas e da sociedade.
Na
década de trinta, a vizinhança vivia como em colônia,
uns ajudando aos outros, harmoniosamente. Ali, havia pouca ambição
e as pessoas não se preocupavam com estudos e nem pensavam
em concursos públicos ou coisas semelhantes. Não tinham
pressa e viviam com tranqüilidade e despreocupadas. Se aparecessem
algumas desavenças entre elas, eram resolvidas a contento
por familiares e amigos. Nada de Polícia ou Justiça.
A primeira era violenta, portanto evitada. A segunda era cara e
fora
do alcance das pessoas comuns. Além disso, aquelas instituições
não eram simpáticas e nem inspiravam confiança
entre aqueles habitantes. Eles acreditavam mais nas intermediações
de familiares e de vizinhos amigos.
O povo era simples, sem formalidade e vaidade. Era arredio e desconfiado
quando se tratava de desconhecidos. Era confiante quando lidava
com conhecidos. Eles cultivavam a prática de visitas para
manterem a amizade. Nos encontros, falavam da
política e do regime rigoroso da ditadura de Getúlio
Vargas. Criticavam as “temidas” Leis Trabalhistas instituídas
pelo ditador. Os fazendeiros achavam que aquelas inovações
sociais vinham inviabilizar a produção do campo. Tinham-nas
como entrave à produção e a falência
das fazendas. Queixavam-se das atitudes dos governantes da época,
preocupava-se com o rigor do tempo e de outros assuntos limitados
aos seus parcos conhecimentos e pequeno universo.
Apesar de chover muito, o veranico de janeiro era constante. Minha
mãe reunia as famílias mais próximas e organizava
o movimento das penitências para chover. Saíamos ao
meio-dia com o sol a pino, durante nove dias, com pedra na cabeça,
litro d’água em uma mão e ramos verdes na outra.
No trajeto da sede da fazenda ao cruzeiro da igreja de Santo Antônio,
nós, em duas colunas, íamos cantando hinos religiosos
em intenção ao santo padroeiro, pedindo chuvas. Quase
sempre, o santo nos “atendia”, até mesmo antes
de terminar a novena.
Além
dessas penitências entre vizinhos, faziam-se mutirões
nas épocas de plantas e de capinas das roças, numa
espécie de consócios adotados na vizinhança.
A solidariedade e confiança entre uns e outros eram uma constante.
A criação de filhos era rígida e o diálogo
entre pais e filhos era raro ou não existia. A nossa família
era liberal, amiga dos filhos, dos empregados e dos vizinhos. Gostava
de fazer e receber visitas. Eu, apesar de minha pouca idade, participava
sempre daquelas visitas.
Uma vez, eu acompanhei o meu pai numa visita ao Seu Vitório.
Ele era baixinho, falante, já beirando os setenta anos de
idade e com bons hábitos, determinado e firme nas suas decisões.
A janela da “sala de fora” (sala de visitas) da casa
era baixa e a soleira era seu lugar preferido para assentar-se quando
recebia visitas. Ele sentava sempre de lado, escorava as costas
num dos portais e colocava os pés no chão já
corroído e fundo com a freqüência de seus movimentos
constantes. Ali postado e acomodado naquela posição,
ele tinha a visão do terreiro e do interior da sala, sem
dificuldade. Então, ele começava a contar suas interessantes
histórias do passado.
Naquele dia de nossa visita, ele falou sobre o seu curioso casamento.
Contou-nos, com ar jocoso, que certo dia seu pai lhe ordenou para
acompanhá-lo numa visita ao seu vizinho mais distante para
combinar o dia de seu casamento. Ele, surpreso e até assustado
com a revelação do seu genitor, não tinha como
desobedecer ou protestar. Tomou um banho apressado, procurou sua
melhor roupa para vestir, calçou suas botinas que encontrava
no baú e arreou os dois melhores cavalos e partiram em direção
à fazenda de seu futuro sogro. Ele sempre atrás do
pai, sem comentários. Na sua família não usava
o diálogo entre pai e filhos, a não ser no caso de
uma ordem a cumprir ou de um assunto simples intermediado pela mãe.
Depois de algum tempo de viagem e de suspense, eles chegaram à
casa da noiva desconhecida. Foram bem recebidose convidados a entrarem
na “sala de fora”. Tomaram assentos e os velhos, já
conhecidos e até amigos, travaram na conversa.
Falaram das chuvas, das roças, dos animais, da crise, das
“repudiadas” Leis Trabalhistas a serem colocadas em
práticas e suas conseqüências danosas na produtividade
do campo. Ele só ouvia sem dizer nada e sem ser notado, pelos
velhos entretidos nas conversas. Então, entra a suposta futura
sogra com um bule de café
e uma bandeja de xícaras de porcelanas e atrás dela
uma linda moça com belas tranças jogadas nas costas
e portando uma travessa de bolos finos e outra de biscoitos apetitosos.
Vitório com seus vinte e poucos anos de idade, sem nunca
ter namorado e visto uma moça tão bela na sua frente,
fitou os olhos na donzela e por pouco não desmaiou de tanta
emoção. Elas colocaram as coisas na mesa e cumprimentaram
cerimoniosamente os visitantes. Ficaram poucos minutos escoradas
nos portais da porta que dava para o corredor de entrada à
cozinha, depois entraram sem dizer nada e não apareceram
mais. Eles tomaram o café com os deliciosos quitutes e os
velhos fizeram seus costumeiros cigarros de palha e fumaram com
satisfação, soltando baforadas. Conversaram um pouco
mais e então, eles, sem a participação das
mães e dos futuros noivos, abordaram o assunto e acertaram
a data e os pormenores da cerimônia do casamento. Despediram
e regressaram a sua casa sem comentários. Vitório
não esquecia a fisionomia da suposta noiva e estava deslumbrado
com aquela beleza nunca vista pelos seus olhos.
Em casa, ele não parava de comentar com seus irmãos
e amigos, sobre a formosura da jovem que em breve deveria ser sua
esposa amada. O tempo corre e chega o dia do sonhado casamento.
Ele entra com seus genitores na igreja cheia de parentes e amigos
de um lado e de outro. Não demorou entram os pais e a noiva.
Para a sua surpresa, a moça não era a que ele havia
visto. A primeira era alta, de cabelos negros e longos, bela e nova.
A moça apresentada no momento da cerimônia era baixa,
de cabelos castanhos e curtos, não tinha a mesma beleza e
bem mais velha. Ele como não podia manifestar e muito menos
contestar, casou-se, sem reclamar.
Tempo
depois, ele voltou a ver Maria, a donzela que lhe fizera sonhar
por algum tempo. Ela casou-se com o vizinho chamado Joca Contendas
e tiveram muitos filhos e viviam juntos naquela época, como
também, Seu Vitório vivia com a D. Joana e seus doze
filhos e netos.
Seu Vitório não queixava da sorte. Estava contando
como eram feitos os casamentos de sua época, com graça,
contente e orgulhoso com sua família e nada a reclamar. Pois,
nenhuma moça foi-lhe apresentada como sua noiva no dia do
noivado. A Maria estava ajudando sua mãe a servir o café
e não sendo apresentada como noiva, o que descarta qualquer
ato de má fé, que poderia comprometer a seriedade
do velho sogro.
Anos depois, Nenzinho casou-se com Maria, viúva de Mirão
e Antônio, com a jovem Carmelita. Os dois rapazes eram filhos
do casal Joca e Maria e as duas moças, filhas de Vitório
e D. Joana, todos vivendo na vizinhança e amigos solidários.
Ouvi esta história numa tarde chuvosa de novembro do ano
de 1935, nas vésperas de meu aniversário de oito anos.
Depois disto, o mundo transformou-se com o tempo, as pessoas mudaram
seus costumes e as coisas foram sofisticadamente substituídas
dentro da tecnologia moderna e engenhosa. Há quem chore os
tempos passados. Eu também tenho saudades indeléveis
daquelas épocas douradas, mas jamais me habituaria àquelas
condições, se comparando com as atuais.
Nossa fazenda e toda a vizinhança, anos depois e já
nas mãos de outras pessoas, foram desapropriadas para a construção
do quartel do 55º Batalhão de Infantaria do Exército.
Aquelas pessoas e seus movimentos de outrora só existem na
lembrança. E as construções naquele rincão
de tantas recordações foram abandonadas e acabaram
com o passar do tempo. Ainda hoje, avisto ao longe os morros que
ainda estão lá inertes e no mesmo lugar circundando
aqueles lugares saudosos, hoje retomados e transformados pela ação
da natureza. Quem diria!
Os
nomes dos personagens foram substituídos por outros, para
evitar possíveis constrangimentos de seus descendentes, se
por ventura ainda existam alguns, mas a história é
verdadeira.
ASSOCIAÇÃO
DESPORTIVA TIRADENTES
Lázaro Francisco Sena
Cadeira nº 55
Patrono: João Luiz de Almeida
Em 1956, quando o 10º Batalhão da Polícia Militar
se instalou em Montes Claros, o futebol amador era, sem dúvida
alguma, o esporte de maior apelo popular na cidade, capaz de mobilizar
toda a sociedade, através dos clubes representativos dos
diversos segmentos comunitários. Para contrapor a uma Associação
Desportiva Ateneu, que apresentava um viés elitista, cujo
estádio dispunha de arquibancadas divididas por grades metálicas
para se evitar o contato físico de torcedores adversários,
criou-se uma Associação Atlética Cassimiro
de Abreu, que galvanizava as camadas populares daquela época,
ao ponto de ter sido apelidado de “o mais querido”.
Entidades representativas de categorias profissionais se projetavam
através de suas equipes de futebol, como foram o Ferroviário
Esporte Clube, da Estrada de Ferro Central do Brasil, e a Associação
Desportiva Bancária, que congregava os profissionais daquele
setor, dentre algumas outras vertentes comunitárias. E a
Polícia Militar, ficaria de fora dessa “festa”?
Nem pensar, pois os seus comandantes sempre entenderam que a Corporação
deveria estar onde estivesse o povo. Era preciso, portanto, organizar
a sua própriaequipe
de futebol, para não se passar por um intruso, ou um convidado
trapalhão.
O primeiro registro de atividades esportivas no 10º Batalhão
foi publicado no boletim interno da Unidade em 25-02-1958, com a
criação da Caixa de Esportes, “com a finalidade
de proporcionar aos Oficiais e Praças da Corporação
facilidade para a prática dos diferentes esportes”.
A diretoria era constituída de um Presidente, um Diretor,
um Secretário e um Tesoureiro, sendo que o Presidente seria
sempre o Comandante do Batalhão e os demais cargos seriam
ocupados por Oficiais designados por ele próprio. Todos os
Oficiais e Praças do Batalhão poderiam ser sócios
da Caixa de Esportes, para o que contribuíam com uma mensalidade
no valor de Cr$10,00 (dez cruzeiros), para qualquer posto ou graduação.
O Comandante do Batalhão, Maj José Geraldo de Oliveira,
como Presidente natural, em 07-03-1958 designou os demais membros
da Diretoria, que ficou assim constituída:
- Diretor..................... 1º Ten Altivo Gomes da Silva;
- Secretário................. 1º Ten Raymundo Wanderley
Dias;
- Tesoureiro................ 2º Ten Adm João Lopes de
Oliveira.
Em 11-06-1958, foram designados, como “membros do Departamento
de Esportes da Unidade”, os seguintes policiaismilitares:
- Diretor de Esportes.......... 2º Ten Smith Alves Valentino;
- Técnico de Futebol.......... 2º Sgt Manoel Pacheco;
- Representante
na Liga de Futebol. 1º Sgt Eletácio Francisco
de Souza;
-
Encarregado de Material.. 1º Sgt Clárissom da Rocha;
- Massagista....................... 3º Sgt Jarbas Gonçalves;
- Roupeiro......................... Sd José Guilherme.
Com
a designação desse pessoal naquela data, entendemos
que foi criada oficialmente a equipe de futebol que passaria a representar
o Batalhão nas competições da cidade, nascendo
assim, ainda sem nome, o que seria a Associação Desportiva
Tiradentes.
Já no dia 28-07-1958, por ocasião do segundo aniversário
de instalação da Unidade em Montes Claros, consta
uma partida de futebol entre as equipes do Tiradentes (do 10º
BI) e do Almirante Barroso (do Serviço de Saúde da
PM). Vale ressaltar que, nessa
mesma data, foi inaugurado o Gabinete Dentário do Batalhão,
um fato de grande relevância para a época, daí
a presença do pessoal do Serviço de Saúde da
Polícia Militar. Essa partida de futebol certamente foi a
primeira disputada oficialmente pela Associação Desportiva
Tiradentes. A propósito da denominação da equipe,
vamos encontrar, no programa comemorativo ao Dia do Soldado, em
25-08-1959, uma partida de futebol entre a Associação
“Atlética” Tiradentes (10º BI) e o Tiro
de Guerra 87. Todavia, em 19-09-1959, foi designado o Conselho Fiscal
da Associação “Desportiva” Tiradentes,
que ficou assim constituído:
- Cap Mário Simões Soares de Souza;
- 2º Ten Tomás dos Santos Rodrigues;
- Sub Ten Aristides da Silva.
De acordo com informações prestadas pelo Cel Smith
Alves Valentino, do quadro de Oficiais da Reserva e hoje residente
na cidade de Itaúna-MG, durante entrevista com o autor destas
notas, desde a instalação da Unidade em Montes Claros,
era pensamento do Comandante Geraldo Batista criar um time de futebol
vinculado ao Batalhão, como forma de integração
comunitária. Para isso, inclusive, designou o então
Aspirante José Hirton Melo para providenciar os estatutos
da agremiação e manter os contatos iniciais com a
Liga Montes-clarense de Desportos-LMD, tendo havido, de início,
alguma resistência dessa entidade para aceitação
da equipe, sob a alegação de dispositivos regulamentares
que proibiam a participação de militares nesse tipo
de atividades. Mas a resistência foi diplomaticamente vencida
e a equipe foi aceita, com
a condição de disputar o campeonato de acesso. Superada
essa etapa, o Tiradentes juntou-se à elite futebolística
de Montes Claros, integrada por Ateneu, Cassimiro de Abreu, Ferroviário,
A. D. Bancária e Vera Cruz. É preciso lembrar que
Montes Claros, àquela época, não tinha televisão
e, por isso mesmo, tinha no esporte o seu principal entretenimento,
de modo especial o futebol. As tardes esportivas dominicais despertavam
a atenção das massas e, após o término
da rodada, outro assunto não havia, nos bares e nas esquinas,
que não fossem os resultados das partidas.
O Cel Smith, em seu tempo de Tenente, prestou relevantes serviços
ao esporte do Batalhão, sendo um dos fundadores da Associação
Desportiva Tiradentes, tendo integrado a equipe inclusive como atleta.
Sua dedicação ao futebol era reconhecida por todos
os desportistas de Montes Claros, mesmo antes do Tiradentes, quando
ele exerceu cargo de destaque na direção do Ferroviário
e até chefiou excursão do Ateneu à cidade de
Januária, conforme aparece na fotografia seguinte:
Tenente Smith, à direita, com o Ateneu,
em excursão a Januária.
Como
prova do bom relacionamento do Batalhão na cidade, transcrevemos
a “parte esportiva” das festividades comemorativas do
dia 21-04-1958:
- 14:30 h, no Estádio João Rebelo, Bola Militar entre
as equipes do 10º BI e Tiro de Guerra 87;
- 16:00 h, ainda no Estádio João Rebelo, demonstração
de “ordem unida” pelos Recrutas recém-incorporados,
seguida de uma partida de futebol pela equipe do Ateneu, em homenagem
aos mesmos Recrutas, não sendo citada a equipe adversária;
- 19:00 h, na Praça de Esportes, volibol feminino entre as
equipes da Escola Normal e o Colégio Imaculada;
- 20:00 h, ainda na Praça de Esportes, futebol de salão
entre as equipes do 10º BI e do Tiro de Guerra 87.
A fotografia seguinte mostra uma das primeiras equipes básicas
do Tiradentes, em 1959:
Da esquerda para a direita, de pé: Manoel
Pacheco (Técnico), Walter, Piloto,
Smith, Moacir e Zé Guilherme; agachados: Mamão, Camilo,
João Francisco,
Eli Costa e Plácido. Não conseguimos identificar o
goleiro da equipe.
No
início do ano de 1960, foi publicada, em boletim interno,
uma determinação do Comandante da Unidade, Ten Cel
Armindo Pereira Fernandes, sob o título ASSOCIAÇÃO
DESPORTIVA TIRADENTES, nos seguintes termos: “Estando a nossa
Entidade Esportiva necessitando de recursos financeiros para as
obras de sua praça de esportes, não tendo outra fonte
de renda que não as mensalidades de seu quadro social, determino,
por não haver outra solução, que se inscrevam
todos os elementos desta Unidade como sócios da Associação
Desportiva Tiradentes (Caixa de Esportes), a partir do corrente
mês, continuando a vigorar a contribuição mensal
CR$ 10,00 (dez cruzeiros). Este Comando espera que todos compreendam
o alcance desta medida, que visa unicamente o engrandecimento de
nossa Associação, dotando-a de um estádio à
altura de seu progresso sempre crescente. O nosso Quadro está
intimamente ligado às atividades do Batalhão e, assim,
prestigiá-lo será uma demonstração de
espírito de corpo e de real interesse para os assuntos relacionados
com o 10º BI.”
Percebe-se, na determinação acima, o entusiasmo do
Comando com as atividades do Tiradentes, fazendo crer na importância
da equipe de futebol para o bom relacionamento do Batalhão
na sociedade montes-clarense. Outro fato notável é
a referência à necessidade de um estádio próprio
para a Associação, o que já se iniciava com
a construção de um campo de terra batida, no terreno
que fora há pouco tempo adquirido para a atual sede da Unidade.
O Tiradentes, assim, começava a adquirir visibilidade dentro
do próprio Batalhão, despertando o interesse de Oficiais
e Praças pela sua direção. Um fato, todavia,
que de início parecia irrelevante, começou a adquirir
proporções preocupantes: a necessidade de filiação
à Liga Montes-clarense de Desportos, perante a qual a Associação
tinha caráter civil, inclusive com uma diretoria
em formato próprio, onde alguns cargos não se adequavam
necessariamente ao modelo funcional do esporte no Batalhão.
Era preciso, portanto, eleger uma diretoria, mesmo que, de acordo
com as normas em vigor, o Comandante já fosse o seu presidente
efetivo. O que poderia ter sido resolvido na base do entendimento
terminou por criar uma situação constrangedora para
o regime disciplinar da época, com o Comandante, Ten Cel
Armindo Pereira Fernandes, na iminência de disputar uma eleição
e perdê-la para um seu subordinado. Diante do impasse surgido
e não solucionado, prevaleceu o regulamento disciplinar,
terminando com a intervenção do Comandante Geral,
que determinou a suspensão das atividades da Associação
Desportiva Tiradentes e a sua desfiliaçao da Liga Montes-clarense
de Desportos, até que novos dispositivos fossem introduzidos
em seus Estatutos, de forma que a equipe pudesse participar das
competições daquela entidade, sem ferir os princípios
elementares da disciplina.
UMA
NOVA FASE
Quando, ao final de 1964, chegamos ao 10º Batalhão,
aí encontramos um Tiradentes já reintegrado à
Liga e disputando o campeonato amador da cidade com mais quatro
equipes: Ateneu, Cassimiro, Ferroviário e Ipê. Naquele
tempo não existia qualquer equipe profissional por aqui.
Quando se falava “amador” era mais para confirmar a
elite futebolística, em destaque perante o futebol da várzea,
que já ensaiava os primeiros passos na periferia de Montes
Claros. Era ainda o tempo da grande rivalidade entre Ateneu e Cassimiro,
restando às demais equipes o papel de coadjuvantes. Até
mesmo os principais jogadores da primeira fase do Tiradentes estavam
atuando pelo Ateneu. É que o Comando do Batalhão,
àquela época, ainda não tinha reassumido o
entusiasmo
anterior com a sua equipe de futebol; apenas permitia o desenvolvimento
de suas atividades.
A partir de 1966, todavia, uma nova fase se iniciou, com a reintegração
dos antigos atletas ao Tiradentes, que passou a competir de forma
equilibrada com os outros grandes times da cidade, embora não
tenha conseguido sagrar-se campeão até ao final daquela
década. Mesmo assim, vale a pena relembrar a equipe básica
de então, com os seguintes jogadores: Joaquim (Aílton),
Santo Antônio (Tone Câmara), Godofredo, Cachaça
e Miguel Butina; Bahiano e Careca; Carinhanha, Zuza, Plácido
e Davidson (Expedito Edson). A isso juntou-se também o entusiasmo
do Tenente Lázaro Francisco Sena, eleito para a presidência
da Associação, que empreendia grande esforço
para aumentar a visibilidade da equipe no cenário desportivo
local. Dentre outras iniciativas, tais como o início de colocação
de grama no campo de futebol, criou-se o departamento de volibol,
com times masculino e feminino, cujas apresentações,
concorrendo principalmente com o Ateneu, lotavam as arquibancadas
do Ginásio Darcy Ribeiro, na Praça de Esportes.
Nesta foto aparecem, de pé, da esquerda para
a direita, a partir do segundo:
Ten Lázaro, Sgt Piloto, Sgt Vicente (Macarrão) e Cb
Acácio. Dentre os civis,
destaque para o “levantador” Terezino, último
à direita.
Nesta foto, além da rainha do Tiradentes (3ª, de pé,
a partir da direita), identificamos outras atletas,
tais como Diná, Antonina, Tonhão, Gilda e Íris.
A
rivalidade esportiva, assim, ultrapassava os limites do campo e
das quadras, para ganhar, inclusive, os salões do Automóvel
Clube, onde se elegeu a rainha do futebol, em memorável promoção
da Liga Montes-clarense de Desportos, com o Tiradentes apresentando
a sua candidata, a Srta. Maria das Graças Queiroz, que não
foi a escolhida, mas, curiosamente, pouco tempo depois foi eleita
“Mis” Montes Claros, em concurso oficial promovido pelo
cronista social Lazinho Pimenta.
Maria das Graças Queiroz, rainha do Tiradentes,
exibindo a flâmula da Associação, junto aos
troféus até então conquistados.
UMA
ÉPOCA DE RESULTADOS
A partir de 1969, sob o Comando do Ten Cel Cícero Magalhães,
elegeu-se presidente da ADTiradentes o Maj Geraldo Ferreira Diniz,
então Sub Comandante do Batalhão, com o objetivo expresso
de fazer o time campeão. Com o apoio decidido do Comando,
não foi difícil atingir tal objetivo. O Tiradentes
conquistou o tricampeonato amador da cidade, nos anos de 1970/1971/1972,
além de, paralelamente, conquistar a Taça Montes Claros,
versão simplificada do campeonato, nos mesmos três
anos seguidos. Em 1972, conquistou ainda o campeonato juvenil de
futebol, modalidade obrigatória para todas as equipes que
participavam do campeonato amador. Não temos uma fotografia
do time tricampeão, mas podemos citar a sua formação
básica, com os seguintes atletas: Betinho (Geraldo), Milton
Sonso, Godofredo, Alberto (Arílson) e Bahiano Doido (Nélson);
Dico e Dante (Gildásio); Dirceu, Ely, Vivaldo e Balduíno
(Pastoré e Elísio).
Em
l973, um pequeno equívoco de tabela impediu que o Tiradentes
fosse campeão, mesmo não tendo perdido qualquer partida.
No ano seguinte, por determinação do Comando Geral
da Polícia Militar, a equipe foi afastada da competição,
retornando em 1975, quando se sagrou campeão amador de Montes
Claros pela quarta vez. Foi nesse ano também que o Tiradentes
conquistou o Torneio Inconfidência, disputado em Pirapora-MG,
além de formar a base da equipe que conquistou o Campeonato
Olímpico
da Polícia Militar. Dessa última fase apenas uma “mágoa”
restou: não ter ganhado da seleção de Guanambi-Ba,
nessa minha terra natal, embora tenhamos empatado lá, por
duas vezes, e ganhado deles pelo placar de 3 x 1, em sua única
visita a Montes Claros.A fotografia seguinte mostra a equipe básica
dessas últimas conquistas.
De pé, da esquerda para a direita: João
Dias (Técnico), Periquito, Nego Ro, Gildásio, Betinho
e Bahiano; agachados: Dirceu, Elísio, Eli, Dico, Vivaldo
e Fredimar (Massagista).
Muitos
foram os integrantes do 10º Batalhão, além de
alguns abnegados civis, que prestaram inestimáveis serviços
à Associação Desportiva Tiradentes, desde a
sua criação em 1958, até a
sua maioridade, aos vinte e um anos, em 1979. Pena que, nesse último
ano, encerrou precocemente as suas atividades. Como representante
de tantas pessoas que contribuíram de alguma forma para o
Tiradentes, como atletas, dirigentes ou torcedores, citaremos um
nome que, temos certeza, traz o consenso de simbolizar essa valente
equipe de futebol: Tenente João Dias da Silva Júnior.
Esse cidadão, mesmo nunca tendo calçado uma chuteira
em sua vida, participou de todas as diretorias da Associação,
inclusive como diretor-técnico, em seus últimos onze
anos de funcionamento, período em que mais vitórias
foram conquistadas.
Aí,
vem aquela pergunta que incomoda: Por que o Tiradentes se acabou?
O Cel Smith, um dos poucos sobreviventes da sua criação,
respondeu com perplexidade e nostalgia: “Sinceramente, não
sei a razão do fim do Tiradentes”. Nós, todavia,
ainda chocados com o desaparecimento precoce da nossa ADT, ousamos
formular algumas razões para esse fim: o surgimento do futebol
profissional em Montes Claros, a partir da década de 70 do
século passado, o que esvaziou a prática do futebol
amador em nossa cidade; o fato de o Tiradentes ter passado a conquistar
títulos, deixando de ser um mero participante, gerando insatisfação
das equipes e torcidas adversárias, perdendo pois a finalidade
essencial de constituir-se em elemento de integração
social; a operacionalização da Polícia Militar,
que deixou de ser uma tropa aquartelada, para sair às ruas
em missão de policiamento ostensivo, dificultando assim a
disponibilização de pessoal para a prática
de futebol, sem prejuízo para o serviço; finalmente,
a diversificação das opções de lazer
e entretenimentos públicos, com destaque para a massificação
da televisão, o que desmotivou significativa parcela da população
para comparecer aos estádios e torcer pelas suas equipes
preferidas. Não foi somente a equipe do Tiradentes que desapareceu,
dentre as suas contemporâneas. Por onde andam a Bancária,
o Vera Cruz, o Ferroviário, o Ipê, o Industrial, o
Bahia e o Independente, para não citar outras mais recentes?
Ateneu e Cassimiro, depois de fracassadas experiências profissionalizantes,
insistem em permanecer vivos, mercê de seu invejável
patrimônio nesta cidade. De qualquer forma, fica este pequeno
registro para as gerações futuras.
SONHANDO
ALTO
Luiz de Paula Ferreira
Cadeira N. 19
Patrono: Caio Mário Lafetá
Um mundo estável está cedendo lugar a uma era de profundas
mudanças. Cabe-nos considerar que só temos uma vida
e para merecê-la devemos procurar vivê-la pelo menos
com um mínimo de compreensão pelo que nos envolve,
pelo que nos rodeia.
De
outra parte, a vida é dura. Ela nos impõe um sentido
aritmético de deve/haver, de pode-não-pode, um compasso
binário limitando as opções a uma dicotomia
de vence-ou-perde, de vive-ou-morre.
Mas tendo embora os pés firmes na terra – é
necessário tê-los e ai de quem não os tenha
– urge que para se fazer jus ao prêmio de ter nascido
se abram portas e se criem asas em cada um de nós. E se alcem
vôos em busca de melhor compreensão da vida.
Nesse sentido, cabe papel importante a instituições
como as universidades abertas a pesquisas.
Mas
em qualquer instituição, como em tudo, o principal
elemento, o componente mais importante é o homem. Que no
DEVE-HAVER da vida encontra oportunidades para refletir sobre sua
origem e destino. E erguendo os olhos, mais ao alto, possa vislumbrar
luminosidades onde entreveja, quem sabe, a própria morada
do impossível.
História
de atividades sociais e
filantrópicas em Montes Claros
Entidades a serviço da vida
Maria Aparecida Costa
Cadeira N. 7
Patrono: Antônio Gonçalves Figueira
A
criação do Instituto Histórico e Geográfico
de Montes Claros possibilitou-me a participação como
sócia efetiva, tendo despertado em mim o interesse em pesquisar
o trabalho de entidades sociais e filantrópicas. Sou voluntária,
há mais de dez anos, de entidades beneficentes. Fiz o propósito
de produzir um texto que relatasse a existência de duas dessas
entidades fundada na década de 50. A Legião de Assistência
Recuperadora–LAR (1955), conhecida como O Nosso Lar, e o Círculo
dos Trabalhadores Cristãos de Montes Claros (1950).muitas
vezes conhecida como União Operária de Montes Claros,
assunto que vem comprovar a elaboração de Eliot em
“ A Tradição e o Talento Individual (1950)”,
quando discorre sobre o senso histórico “O senso histórico:
implica na percepção não apenas do caráter
passado do passado como também de seu caráter presente,
o que leva o homem a escrever não apenas de acordo com a
geração a que pertence.”
Para melhor conhecermos Montes Claros, torna-se necessário
destacar pontos de sua história no que se refere às
características
políticas, econômicas e sociais, notadamente da década
de 1950, sem, contudo, deixar de citar fatos de décadas anteriores.
Historicamente,
sabe-se que Montes Claros é retratada na década de
50 como cidade à margem da Política Desenvolvimentista,
onde o desemprego a deficiência de serviços básicos,
a carestia e o favor dominavam. Políticos da época,
médicos e fazendeiros, comerciantes e advogados fizeram com
que permanecessem as relações sociais de dominação,
vide A Cidade do Favor, de Laurindo Mékie Pereira-2002.
Em 1950, a população urbana de Montes Claros era de
43.097 habitantes, crescera mais de cem por cento na década,
conforme Enciclopédia dos Municípios Brasileiros.
É interessante destacar que em 2005, segundo o IBGE, a população
de Montes Caros era de 342 mil habitantes demonstrando um acelerado
crescimento populacional em decorrência do progresso que se
instalou partir da década de 70.Montes Claros passou a ser
pólo regional de desenvolvimento, fazendo parte do “Polígono
das Secas” dentro das ações da SUDENE, instalando
projetos de implantação de novas indústrias,
favorecendo a expansão econômica, educacional, cultural
e ao mesmo tempo, acelerando a migração populacional
e a concentração de famílias de baixa renda,
nas periferias da cidade.
Início da década de 50 é inaugurada, a Catedral
de Nossa Senhora Aparecida, sendo bispo Dom Antônio de Almeida
Morais Júnior. Melhorias e o progresso para a cidade foram
reivindicados durante toda a década, porém, explica-se
o não atendimento, prioritariamente pelo domínio do
setor agropecuário numa área de transição
do clima Tropical Semi-árido e Semi-úmido, com escassez
de chuvas e longo período seco, e com uma vegetação
também de transição: cerrados, mata-seca. O
final da década de
50 foi marcado por vigorosos protestos da população
sem trabalho e mal remunerada contra a constante elevação
dos preços de alimentos, originando Campanha e Associação
das Donas de
Casa
contra a carestia, quando participaram os Sindicatos do Comércio,
Indústria, Associações e Círculo dos
trabalhadores. Consta que em 1957 o Círculo Operário
através do seu Presidente Oliveiro Barbosa, organizou o movimento
Pró-Semana Inglesa. Nesse contexto é que promove-se
um movimento de articulação política para inserir
Montes Claros e o Norte de Minas nos investimentos públicos,
legados pelo plano de metas do presidente Juscelino Kubitschek de
Oliveira, que se esperava rompesse com a exploração
e a dependência.
Elites montesclarenses arquitetaram a estratégia do centenário
de Montes Claros(1957), com o objetivo de que se voltasse para a
cidade a vontade política, na esperança de uma Montes
Claros “rejuvenescida”, com a união de todas
as forças políticas locais. Diversos festejos foram
realizados para se comemorar o centenário da elevação
de Montes claros à categoria de cidade.
No processo de desenvolvimento de Montes Claros, o professor Marcos
Fábio de Oliveira em sua tese de mestrado - 1996, relata
que a mendicância, o desemprego e a violência urbana
incomodavam, o que deu origem a entidades filantrópicas que
atuavam na assistência às crianças, famílias
e idosos, que eram dirigidas por esposas das principais lideranças.
A tensão social era visível e cita-se a instalação
do Orfanato Nossa Senhora do Perpétuo do Socorro, “Lançada
a pedra fundamental em 19 de abril de 1941, com a doação
de terreno e recursos financeiros para a construção,
pelas senhoras Laudelina Ribeiro Maia, Luiza Magalhães e
outros” (Maria Celestina de Almeida, 97 anos). Tem o objetivo
de receber meninas pobres e ou abandonadas, sendo um fato revelador
das dificuldades de muitas famílias para garantir a sobrevivência
de seus filhos. Por força do Estatuto da Criança e
do Adolescente, a entidade passou a se denominar Lar e Escola Nossa
Senhora do Perpétuo do Socorro. Hoje essa entidade possui
uma diretoria e está sob aos cuidados das Irmãs da
Sagrada Família. Situa-se no bairro Todos os Santos,à
rua São Carlos, 40, Montes Claros. Em outra época,
aqui mesmo em Montes Claros, a caridade misericordiosa também
deu origem à Associação das Damas de Caridade
“Lar das Velhinhas”, fundada em 31 de dezembro de 1923,
em terreno doado pelo Padre Marcos Van In e entregue à Igreja
Católica que repassou a obra para um grupo de senhoras que
passou a administrá-la com a denominação de
“Casa das Pobres”, hoje Associação das
Damas de Caridade. Na época a Casa teve aprovação
do bispo Dom Antônio de Morais que instituiu a primeira diretoria.
Foi nomeada como provedora a senhora Flora Pires Ramos. O Lar das
Velhinhas é uma entidade Filantrópica sem fins lucrativos
que atende atualmente 50 idosas. Sua finalidade é a proteção
da saúde das idosas, dando-lhes assistência alimentar,
religiosa, educacional, médico-hospitalar, recreação
e abrigo. As mais idosas moradoras são Maria Beatriz Moreira
102 anos, e Angélica com 106 anos. A atual diretoria é
composta pelo Presidente Celso Ciríaco Santos, Vice Maria
Lúcia V. Maia, compõem também a diretoria as
senhoras Zélia Maia de Abreu que foi entrevistada, Dores
Lopes Mendes, Jacqueline C. Camelo. O apoio religioso é realizado
pelo senhor João Simões e outros. A entidade situa-se
a rua Dom João Pimenta, 65, no centro de Montes Claros.
Contextualizar na história de Montes Claros é de fundamental
importância para que os leitores possam entender a instalação
em nossa cidade de entidades “De Caridade”, hoje entidades
de assistência a crianças, adolescentes e família.
“A lei básica do universo não é a competição
que divide e exclui, mas a cooperação que soma e inclui.”
Leonardo Boff.
LEGIÃO
DE ASSISTÊNCIA RECUPERADORA-LAR
Frente
à realidade social que vitimizava as famílias, surgia
a indignação e atitude de idealistas e sonhadores,
entre eles, intelectuais, políticos e de pessoas de bom coração
- Entidades a Serviço da Vida. A comemoração
dos 50 anos da LAR em 2005 e dos Círculo dos Trabalhadores
em 2000 foi a celebração do comprometimento. Essas
“ongs” continuam hoje seu trabalho, crescendo e apontando
caminhos para crianças, adolescentes e famílias empobrecidas.
A dedicação, o compromisso, a alegria dos educadores,
instrutores e voluntários sustentam a ação
e contam com parceiros públicos e privados.
Nos idos de 1950, surgiu a Legião de Assistência Recuperadora
– O Nosso Lar, que nasceu do idealizador Doutor Plínio
Ribeiro
dos Santos, em 16 de outubro de 1955, quando se realizou a primeira
reunião da Associação, com a denominação
de “Núcleo de Assistência e Orientação”,
que tinha o objetivo de atender às crianças, adolescentes
e famílias carentes visando sua valorização
pessoal e integral, no meio social. A primeira presidente e co-fundadora
foi a Sra. Maria de Lourdes Antunes Pimenta, que teve como assessores
da diretoria, Dr. Mário Ribeiro da Silveira, Francisco de
Paula Prates, Leônidas Miranda, Mércia Beatriz P. Gomes,
Valdivia de Carvalho e Dra. Olívia Esteves Peres.
A LAR foi registrada como Associação em 1956, tendo
seus estatutos transcritos em cartório em 4 de dezembro de
1956, sob o nº 38 folhas 63-V, com sede em Montes Claros, Minas
Gerais. Somente em 1964 instalou-se na Vila Santa Rita, Bairro Morrinhos,
hoje Bairro Santa Rita, em funcionamento com o Ensino Infantil,
Deputado Antônio Pimenta, atualmente, CEMEI (Centro Municipal
Ensino de Infantil), em terreno doado. O patrimônio da sociedade
é composto de terrenos doados e adquiridos, dotações
federais, estaduais e municipais e de prédios construídos.
Consta que, no ano de 1965, foi iniciada a construção
de nova sede no Bairro São Judas Tadeu, em terreno de sete
mil e duzentos metros quadrados, parte do terreno doado pela Sra.
Maria de Lourdes Antunes Pimenta e outra parte adquirida de dona
Laudelina Maia. Neste espaço aconteciam atividades com crianças
de 4 à 6 anos e de 7à 16 anos, jovens e adultos, à
rua Marcos Plínio Ribeiro, nº 202. Dona Lourdes ,como
é mais conhecida, sonhou com a Escola de Artes e Ofícios.
Para realizar esta ideia, em 1986 foi construído um galpão
de cento e sessenta metros quadrados para funcionamento de multiatividades.
Na inauguração foi celebrada a missa e realizada pintura
pelas crianças no muro recém construído. A
LAR passou a ser conhecida como “O Nosso Lar”, denominação
carinhosa, devido a sua importância para os moradores da região.
No ano de 1987,quase no termino da construção de novo
galpão, aconteceu um temporal que destruiu parte das instalações,
porém foi reconstruído. “A entidade, nos seus
primeiros
anos de existência, limitou-se, exclusivamente, à orientação
e ao amparo aos lares menos favorecidos, promovendo empregos, facilitando
pequenas indústrias dando assistência médica
e material às famílias, providenciando internatos
em outros estabelecimentos do Estado, para os menores abandonados.
Na sua segunda fase, foi construído um prédio destinado
ao ensino de artesanatos para maiores, após a conclusão
do curso primário. Em virtude das dificuldades financeiras,
a instalação do curso de artes foi adiado e o prédio
foi adaptado para funcionamento de um Jardim de Infância e
Lactário, para atender às necessidades daquele meio
social desprovido, até então, de outros recursos.
Ultimando a construção, junho de 1988.
O
Jardim, hoje CEMEI “O Nosso Lar”, vem funcionando desde
maio de 1964, abrigando 325 crianças, também de bairros
distantes, alcançando ao final do primeiro ano letivo um
índice de aproveitamento social e psicológico formidável,
o mesmo acontecendo com a parte de assistência maternal para
aqueles que ainda não alcançaram a idade estipulada
para freqüência ao Jardim de Infância.
Funciona também, anexo ao Jardim o Clube de Mães,
inicialmente pela L.B.A que tem conseguido atingir os nossos objetivos
que são melhorar a parte social e cultural das Mães,
”conforme relatório elaborado por dona Lourdes, tendo
como inspiração o lema “PARA QUE TODOS SEJAM
UM E O MUNDO CREIA (jo,17-21)”.
No ano de 1995, Dona Lourdes se afasta da entidade, entregando-a
a diocese de Montes Claros - Bispo Dom Geraldo Majela de Castro.
Novo estatuto é elaborado e homens passam e integrar a Diretoria
Executiva da LAR, além de destacar como missão o trabalho
com crianças e adolescentes (7 à 14 anos) e suas famílias.
Foram ainda presidentes da entidade as Sras. Geraldina Maria da
Conceição Sarmento Mourão e Josefina Tupinambá.
Atuou como secretária executiva Elizabeth Aguiar e orientação
religiosa das Irmãs da Divina Providência.
A LAR tem cadastro na Secretaria Especial de Ação
Comunitária da Presidência da República com
o código MG 112542 (28 de novembro de 1987), reconhecida
como de Utilidade Pública Municipal, 17 de Março de
1987, resolução 552 e, Utilidade Pública Estadual
em 15 de outubro de 1986, e o titulo de Expressão do Ano
de 2005, em 29 de outubro, numa homenagem da sociedade montesclarense,
através do repórter social Magnus Medeiros do Jornal
de Notícias de Montes Claros.
O espaço com duzentos e oitenta e oito metros quadrados teve
construção iniciada em 1989, com entrada pela rua
Glaucilândia, nº 175. Foi inaugurado em 23 de Abril de
2003, sob a denominação de Centro de Formação
Maria de Lourdes Antunes Pimenta, em homenagem à grande benemérita
e co-fundadora, na administração da diretoria os Srs.
João Luiz de Vasconcelos, Vicente de Paulo Fernandes Leal,
Maria Aparecida Costa e do Arcebispo Dom Geraldo Majela de Castro.
Este espaço destina-se à realização
de atividades de apoio a adolescentes, jovens e suas famílias,
inspirado no objetivo foi escrito na placa. “CONTRUIRMOS JUNTOS
COM OUSADIA UM SONHO DE UM NOVO AMANHÔ, anexada no
prédio.
Senhora
Lourdes Pimenta na inauguração do Novo prédio
em Abril de 2003
Na
administração dos Srs. Vicente de Paulo Fernandes
Leal, João Luiz de Vasconcelos, Hélcio Horta de Oliveira,
Maria Aparecida Costa e de Marly Teresinha Guimarães Costa,
construiu-se o novo ambiente para funcionamento de diversos cursos,
a instalação
da Escola de Informática e Cidadania em 2003, com 70 alunos,
destes 76% na faixa etária de 12 a 18 anos. Esta escola é
uma parceria da LAR com o Comitê de Democratização
de Informática e a Pastoral do Menor. Funcionaram os cursos
de Corte e Costura, Peças Intimas, o trabalho da horta realizado
pelo senhor João Batista de Souza e reforço Escolar.
A Diretoria 2005/2006 foi composta pelos seguintes membros: Diretora
Presidente Maria Aparecida Costa, Vice-presidente João Luiz
de Vasconcelos, Primeiro secretário Evanildo Teixeira da
Silva, Primeiro Tesoureiro Celso Ciríaco dos Santos, Diretor
de Patrimônio João Gilberto Durães, Diretor
de Promoções Antônio Carlos dos Santos e de
Marketing Vicente de Paulo F. Leal. Foi Secretário Executivo
Wagner Adriano de Souza. Nesse mandato a Assembléia Geral
adequou o Estatuto às novas regras da Assistência Social,
foi comemorado o cinquentenário da entidade com diversas
atividades, entre elas a construção de cerca viva,
de jardim e oratório consagrado à Sagrada Família
em16/10/2005, da execução do projeto Horta e a farmacinha
medicinal “Farmaviva”, em parceria da LAR com a UFMG
e a Pastoral do Menor. A continuidade da Escola de Informática
e Cidadania - “EIC”, que une modernidade com solidariedade,
promovendo educação, inclusão digital e desenvolvimento
social, que a cada ano atende a 140 alunos de curso básico
e 30 alunos do curso avançado. Em 17 de agosto de 2006 foi
reinaugurado o prédio, com reformas do telhado, pisos banheiros
e pintura, onde funciona o CEMEI “O Nosso Lar” em parceria
com a Prefeitura Municipal de Montes Claros/Secretaria de Educação.
Atende 245 alunos na faixa etária de 3 à 5 anos nos
turnos matutino e vespertino para crianças que residem nos
bairros São Judas I e 2, Antônio Pimenta, Morrinhos,
Santa Rita 2, Canelas 2, Vila Luiza e outros. Diversos cursos e
oficinas funcionaram nesse período, como: Corte e costura,
Peças íntimas, Biscut, Pintura em tecido, Bijuterias,
Serigrafia, Violão, atividades de lazer e esportes, o Karatê
e a Capoeira.
O mandato 2007/2008 teve como Diretor Presidente Evanildo Teixeira
da Silva, Vice-Presidente Maria Aparecida Costa, Primeiro Secretário
Valmir Ferreira Neves,Primeira Tesoureira Ilza Teixeira Duarte,
Diretor de Patrimônio João Gilberto Durães,
sendo Secretária Executiva Suely Borges Araújo. Foram
ações dessa administração: a implantação
no curso Produzindo Artes com recursos do FIA, os cursos da Escola
de Informática e Cidadania com aquisição de
novos computadores, Corte Costura, Peças Intimas, Violão,
Biscut, Pintura em Tecido e Reforço Escolar. Continuou o
projeto da horta e da Farmaviva, Karatê, Capoeira e introduziu
Inglês Básico.
Horta
na LAR-2006
O
espaço da LAR ainda foi e é utilizado pela comunidade,
Pastoral da Criança, Grupo de Alcoólicos Anônimos,
Vicentinos, Catequese Infantil, Alfabetização de Jovens
e Adultos, Curso Pré-Vestibular Comunitário “Bem
Viver” e Pastoral do Menor com o projeto “Dignidade
e Paz”. No período 2004 à 2006 a LAR cedeu o
espaço para o funcionamento do Programa Liberdade Assistida,
parceria com Ministério da Justiça e CNBB/Pastoral
do Menor que o executou.
Entrega de certificados do curso de Informática
2004
Em
abril de 2009 foram eleitos a nova Diretoria Executiva e os Conselhos
Diretor e Fiscal, sendo Arcebispo Dom José Alberto Moura.
Cinquentenário da LAR, evento na Câmara
Municipal, LAR-2008 em 14-10-
2005. Diretores e Voluntária: da esquerda para direita, Gilberto
Durães, Ilza
Duarte, João Luiz, Fátima Cruz e Maria Aparecida Costa.
O
trabalho voluntário e semi-voluntário, com ações
individuais ou coletivas, tem dado excelente resultado para os atendidos
e a quem os pratica, pois a gente vê no sorriso das crianças,
adolescentes e famílias que aprendem, acima de tudo, a acreditar
no seu próprio crescimento, encontrando oportunidades e realizando
sonhos.
Projeto Produzindo Arte
CÍRCULO
DOS TRABALHADORES CRISTÃOS
DE MONTES CLAROS
O
Círculo dos Trabalhadores Cristãos de Montes Claros
é uma das mais antigas entidades não governamentais
da cidade e da região, fundada pelo Padre Leopoldo Bretano,
em maio de 1950, mentor e fundador do Movimento Circulista no Brasil,
antecipando o futuro, há cinco décadas atrás,
com a necessidade da criação dos Sindicatos dos Trabalhadores,
instalado anos depois, onde se reuniam e discutiam suas reivindicações,
sendo Bispo Dom Luiz Vitor Sartori. O Círculo situa-se à
avenida Padre Bretano, 102, Bairro Roxo Verde.
A
dimensão social da Evangelização devido às
condições de exploração dos operários,
aos desafios sociais, provocaram a reflexão pontifícia,
dando origem à Doutrina Social da Igreja- exigências
éticas e problemas que surgem da vida e das relações
socais. “Foi elaborada a Encíclica Rerun Novarun -
Das Coisas Novas(1891,Papa Leão XIII), oriunda das péssimas
condições dos operários, sendo um protesto
contra a exploração dos mesmos. Em 1931 a “Quadragésimo
Ano” adverte acerca da falta de respeito à liberdade
de associação, reafirma os princípios de solidariedade
e de colaboração para superar a desigualdade social
- Papa Pio XI. A Encíclica Mater et Magistra - Mãe
e Mestra, elaborada pelo Papa Pio XII (1961), enfoca a vida comunitária,
a socialização, a justiça e a participação,
em decorrência do desenvolvimento econômico separado
do desenvolvimento social. O Papa João XXIII em “Pacem
in Terris” - Paz entre as Nações, dá
destaque ao tema da Paz, em consequência da proliferação
nuclear.” - Trabalho de Manografia de Cristina Freitas, 2008.
Posteriormente, Padre Colatino Sitário Mesquita foi Presidente
do Círculo dos Trabalhadores Cristãos, antes de 1953.
Dom José Alves Trindade, Bispo diocesano, deu assistência
ao movimento circulista, criado para defesa do operariado. A Diretoria
em 1953, com estatuto em discussão era composta por: Presidente
Raimundo Dias de Araújo, Vice-presidente Efraim Gonçalves,
Tesoureiro Hermelindo José de Carvalho e o Primeiro Secretário,
Benjamim Silva Junior. Na presença do então Padre
Paulo Emílio Pimenta de Carvalho, em reunião de 16
de agosto de 1953, o Presidente Raimundo Dias de Araújo informa
sobre o funcionamento do armazém da Cooperativa, para prestar
benefícios aos seus associados.
Em 1954, sendo Presidente Padre Paulo Emílio P. de Carvalho,
a entidade possuía 45 circulistas, Ambulatório Médico
e Serviço Dentário. Em agosto desse mesmo ano, toma
posse o Presidente Oliveiro Barbosa, ferroviário e criador
de programa na rádio ZYD7. Nessa época o Senhor Avair
Miranda fazia apresentação
na rádio, articulando o movimento circulista. Da Confederação
dos Círculos Operários foram doados livros sobre Iniciação
Social, Manual do Círculo Operário, O Clero e Ação
Social e outros. Esse manual apresentava: Porque Pertencer ao Círculo
de Trabalhadores Cristãos, Os Princípios Básicos
,Os Objetivos e Finalidades, O Programa Circulista “Operário,
ATENÇÃO! vêde, lêde, refleti e agi! 1-
Então para viver bem precisa de uma habilitação,
alimentação e divertimentos. O Círculo faz
campanhas para aquisição destas necessidades pelo
salário justo. 2 - Então o homem trabalhador encontrará
no Círculo: - Cooperativas - Consultas médicas e Dentárias.
3 - Mas o operário é também um ser humano composto
de corpo e espírito. Então no Círculo encontrará
ele: Escola-alfabetização, primária noturna,
livros editados, jornais-boletins, cinema e outros. 4 - O operário
deve ganhar honestamente o pão. Então encontrará
no Círculo: Serviços domésticos, Escolas profissionais,
Escola de corte e costura e Escola de Formação de
Lideres. A GRANDEZA DA PÁTRIA ESTÁ, EM PARTE, NO VALOR
DOS TRABALHADORES. O trabalhador brasileiro no Círculo procura:
Cristianizar-se, Orientar-se e Dignificar-se.” Essa formação
de lideres era realizada em Belo Horizonte e dentre os enviados
para o curso citamos: Ezequiel Felipe Pereira, Eduardo Figueiredo
e outros.
Os senhores Francisco Corsino e Afonso Avelar se tornaram circulistas;
o Padre Agostinho Bekhauser, em setembro do mesmo ano, torna-se
assistente eclesiástico.
Em 1956 foi adquirido o terreno para a sede, no valor de CR$86,000,00
mil cruzeiros, onde funciona, hoje o Círculo dos Trabalhadores
Cristãos de Montes Claros. Foram paraninfos da pedra fundamental
os Drs. Geraldo Correa Machado, Moacir Lopes, Mário Viana
e Capitão Enéas. Nessa época foi criado um
jornalzinho “O Circulista” com atuação
dos jovens Carlos Monção, Benedito e Ricardino Soares.
A entidade recebeu subvenção dos Drs. Plínio
Ribeiro e José Esteves Rodrigues. Atuaram como presidentes
em diversas épocas: Malaquias Pimenta, Zeferino Guedes, João
Amaral, Geraldo Alcides Teixeira, José Acácio da Silva,
Paulo Roberto Amorim Neto, e Janete do Perpétuo do Socorro.
Há
mais de 40 anos a entidade está sob a orientação
Católica do Padre Henrique Munaiz que, com sua simplicidade
e exemplo de dedicação cristã, vem conquistando
a todos. Em 14/07/2007, o Jornal Norte de Minas publicou: Círculo
Operário: 57 anos fazendo história e formando vencedores.
Falou da história da entidade, da sua finalidade, dos recursos
para o funcionamento e entrevistou o senhor José Acácio
da Silva, 77 anos, participante há 50 anos das atividades
do Círculo Operário, como é conhecido o Círculo
dos Trabalhadores Cristãos, onde já foi presidente.
“Feliz de ver a satisfação com que os voluntários
estão dando novo impulso às atividades profissionalizantes,
educativas e sociais da entidade.” À frente do Círculo,
como presidente, o Sr. Ezequiel Felipe Pereira e a secretária
Deonilia do Rosário Oliveira, continuam e inovam os trabalhos
do Círculo.
Cartilha utilizada pelo Circulo dos Trabalhadores
Cristãos. No inicio das
Atividades.
O
Círculo está desenvolvendo esforços, no sentido
de aglutinar novas perspectivas, com projetos novos para proporcionar
à comunidade o desenvolvimento humano, independente da orientação
religiosa, mas cristão. A entidade desenvolve ainda o Ensino
Infantil, do Maternal ou Pré-Escolar, tendo 84 alunos, em
convênio com a Secretaria Municipal de Educação.
Os diversos cursos oferecidos são: Cabeleireiro, Manicura,
Depilação, Massagem e Informática Básica
e outros. Funcionam também Escolinha de Futsal ,Grupo de
Oração, AA - Alcoólicos Anônimos, Jogo
de Truco, Missa Dominical que é celebrada pelo Padre Henrique,
na capela própria, uma turma de Pró-Jovem e Velório.
A voluntária Rita de Cássia Rodrigues Santos conclama
a todos com aptidões a virem somar, compartilhando conhecimentos
em toda e qualquer área.
Estar
com a consciência voltada para o outro, e não somente
para nós, é levar nossa solidariedade às pessoas
e dar significado a nossas vidas; é reconhecer o privilégio
que nos é dado, pelo milagre do existir. Celebrar a vida
e tudo de bom que ela pode nos trazer, apenas como passageiros desta
vida terrena. Seja solidário e voluntário ,basta aprender
a ver. “Mire e veja” como no relato da obra de Guimarães
Rosa.
Quero deixar um convite a todos que lerem este artigo. O de fazerem
fermentar suas ações, de seguir adiante com a consciência
de que juntos podemos gerar mudanças. Veja o poema Sal da
Terra ,do montesclarense Beto Guedes.
“Vamos precisar de todo mundo para banir a opressão.
Para construir a vida nova, vamos precisar de muito amor. A felicidade
mora ao lado e quem não é tolo pode ver.”...
Montes Claros, abril de 2009.
FONTES
E BIBLIOGRAFIA
Enciclopédia dos Municípios Brasileiros - RJ: IBGE,1959.
Censo Demográfico / Minas Gerais-IBGE,2000.
Jornal de Notícias-Montes Claros, outubro de 2007.
Atas e Relatórios da LAR e do Círculo dos Trabalhadores
Cristãos-Montes Claros,1950 - 2008.
VIANNA, Nelson. Efeméderes Montesclarenses - 1707-1912 RJ:
Pongetti,1964.
BIBLIOGRAFIA
FREITAS, Cristina. A criança e o adolescente. Trabalho de
Monografia do Curso Serviço Social - 2008.
T. S. Eliot - Essais Choisis - In a Tradição e o Talento
Individual -Du Seuil - Paris - 1950.
PEREIRA, Laurindo Mékie. A cidade do Favor - Montes Claros
em meados do século XX - Montes Claros: Unimontes - 2002.
OLIVEIRA, Marcos Fábio Martins. O Processo de Desenvolvimento
de Montes Claros (MG) sob a Orientação da SUDENE.
São Paulo: USP, 1996. Dissertação de Mestrado.
DONA
BENZINHA
Maria Clara Lage Vieira
Cadeira n. 100
Patrono: Wan-Dyck Dumont
O grande valor da História são as lições
de vida que ela nos oferece. Adquirimos cultura, costumes, experiências
através do conhecimento da vida de nossos antepassados, de
seu modo de ser, dos seus feitos, do mundo que construíram
para nós. Muitas vezes aprendemos a cultivar valores essenciais
a nossa vida, sem saber quem, no passado, despertou a sociedade
para esses valores. Daí ser importante, necessário
- imprescindível até - registrar a lembrança
de personagens que viveram entre nós e que deixaram marcas
em nossas vidas e na vida de nossa cidade. As gerações
futuras carecem conhecer as suas raizes, as suas verdadeiras, autênticas
tradições.
As raizes de um povo, como as de uma árvore, é que
fazem o povo vicejar, florescer e dar frutos.
É por isto que vamos registrando a memória de pessoas
que já se foram e que contribuíram na construção
da História de Bocaiúva.
Waldemar e Benzinha no lançamento da pedra
fundamental do Hospital dos
Tuberculosos, hoje creche Nova Esperança (ao lado do Estádio
Municipal) -
1974.
Valdemar, Dona Benzinha e membros do Asilo São Vicente de
Paula - 1970.
Dona Benzinha com filhos, netos, noras e genro em sua residência
na rua
José B. Filho - 1976.
Washington
Drummond foi filho de família tradicional da sociedade bocaiuvense,
tendo se casado com Rita Martins, constituiu com ela uma família
sempre presente nos eventos da cidade.
Geralda Drummond foi uma das filhas do casal. Nasceu em Bocaiúva,
no dia 5 de agosto de 1912. Além dela, são também
filhos do casal: Luíza, Lizaura, Joaquim, Sérvulo
e Manoel.
Geralda, desde cedo, mostrou pendores artísticos e uma grande
disponibilidade para ajudar as pessoas, principalmente aquelas mais
carentes. Era tão prestativa que sua irmã Lizaura
a chamava de “Benzinha”. E o apelido pegou.
Ainda muito jovem, casou-se com Waldemar Valle de Menezes, passando
a assinar Geralda Drummond Menezes.
Teve nove filhos: Idalmo, Francisco Washington, Maria Carmem, Reinaldo,
Paulo Ricardo, Marcos Túlio, Regina Helena, Waldemar e Eduardo.
Mulher de formação cristã, sempre teve sua
vida dedicada à família e à comunidade. Mãe
zelosa, procurou educar seus filhos dentro de princípios
éticos, ensinando-os a se colocarem a serviço das
pessoas.
O marido, mais conhecido pelo apelido de “Dema”, admirava
e apoiava todos os seus planos no sentido de proporcionar melhoria
de vida à população.
De espírito decidido, Benzinha sonhava alguma coisa e logo
se punha a arquitetar uma maneira de realizá-la.
Foi assim que pensou em fundar o Asilo São Vicente de Paula.
Algumas pessoas tentaram dissuadí-la do intento, achando
muito difícil, mas ela procurou ajuda de pessoas influentes
e políticos
da região e conseguiu que se construísse um prédio
e se
fundasse o asilo.
Da mesma forma, conseguiu criar um hospital para doentes do pulmão,
que chegou a funcionar por muito tempo, recebendo pacientes até
de outras comunidades. Quando a procura diminuiu, o hospital se
fechou e o local foi e é aproveitado hoje para funcionamento
da Creche Esperança, que abriga crianças carentes
cujos pais trabalham durante todo o dia.
Na Igreja Católica, Benzinha foi, de tudo um muito. Foi zeladora
do Apostolado do Sagrado Coração de Jesus e colaborou
na construção da atual igreja matriz do Senhor do
Bonfim, pedindo ajuda ao povo em geral a a políticos. Assim,
conseguiu a doação de portas, janelas, bancos, piso,
parte elétrica, etc. Ela foi a primeira ministra extraordinária
da Sagrada Comunhão e uma das primeiras pessoas na paróquia
a participar do Cursilho de Cristandade, um movimento cristão
de avivamento da fé e de
reflexão, de origem espanhola e que se desenvolveu com muito
sucesso no Brasil, na década de 70.
Sempre incansável e empreendedora, incentivou os jovens a
participar de movimentos filantrópicos. Criou o primeiro
grupo de jovens católicos e organizou com eles, durante a
festa do padroeiro, os quadros vivos que ornamentavam a procissão
e que visavam relembrar passagens da vida de Cristo, transmitindo
a sua mensagem de serviço, de paz, de amor.
No Natal, com ajuda de outras senhoras da sociedade, reunia as crianças
que se vestiam de anjinhos durante o mês de maio e organizou
com elas o grupo de pastorinhas. Elas se vestiam a caráter
e, anunciando o nascimento de Jesus, iam cantando, de casa em casa,
enfeitando e alegrando as noites , no período natalino. Também
angariavam fundos para ajudar o serviço da Igreja, adquirindo
velas e outros materiais que se fizessem necessários.
Além
do cunho religioso, as pastorinhas também eram uma manifestação
folclórica interessante e atraente. Trata-se de uma tradição
herdada de nossos colonizadores e que D. Benzinha soube adaptar
com maestria ao jeito bocaiuvense.
Como já dissemos, desde a infância, ela mostrou gosto
pela arte. Gostava de decoração, não só
nos ambientes, como também em pratos culinários. Por
isto, era procurada sempre. Ornamentava, com carinho e bom gosto,
a igreja para qualquer cerimônia, principalmente casamentos,
missas de quinze anos, etc.
Decorava também, com beleza e requinte, salões de
festas para bailes, jantares, banquetes, recepções
a autoridades e inaugurações de obras do prefeito
da época.
Como tinha muito amor por tudo o que fazia, era exímia na
confecção de doces, salgados, bolos, tortas confeitadas,
licores finos e bandejas ornadas com flores artificiais que ela
mesma fazia..
E ela não se importava de passar seus conhecimentos e sua
arte para quem quisesse. Ensinava as receitas e ensinava também
noções de etiqueta. Quando alguém precisava
saber como receber autoridades ou como arrumar uma mesa de jantar,
recorria a ela, que atendia a todos com boa vontade e presteza.
Em suma, D. Benzinha pensou em cada tipo de pessoa: prestigiou e
ajudou cada fase da vida. Criou, ao mesmo tempo, trabalho e lazer
para crianças, oportunidade de serviço comunitário
para jovens, ajudou, como voluntária, a Casa da Amizade,
associação filantrópica formada pelas esposas
dos rotarianos, deu um bom impulso na criação, implantação
e desenvolvimento do Asilo São Vicente de Paula. Pensou sempre
nos pobres, nos doentes, procurando agir de maneira que pudessem
enfrentar e resolver seus problemas, seus anseios, minorando-lhes
o sofrimento.
Até
conselheira, ela foi. Pessoas de qualquer idade ou condição
procuravam-na para uma palavra amiga, para um conselho, uma orientação
e mesmo uma admoestação.
Faleceu aos trinta de julho de 1979, como morrem os justos, aqueles
que têm a consciência do dever cumprido.
Ela havia organizado uma celebração comemorando o
aniversário de um seu companheiro de ministério da
comunhão, o senhor Joaquim Neri, que era também um
grande homem, por sua disponibilidade e espírito de serviço.
A celebração, que foi presidida por Monsenhor Ozanan,
significou muito para o aniversariante e para a assembleia que participou.
Terminada a cerimônia, ela saiu da igreja sentindo uma ligeira
tontura. Chegando em casa, sentiu-se mal. Chegou ao hospital já
inconsciente. Um aneurisma repentino tolheu-lhe a vida.
Mas o seu trabalho, o seu carisma, a sua presteza em realizar o
bem, isto ficou para sempre na memória de quem a conheceu
e é isto que queremos registrar porque gostaríamos
de que a juventude de hoje tomasse conhecimento e reverenciasse
,pois a figura de D. Benzinha deve ficar gravada na mente e no coração
dos bocaiuvenses de todos os tempos. Ela é um exemplo de
grandeza, determinação, coragem e amor para com todas
as pessoas, seja qual for a idade. Podemos afirmar que ela se tornou
uma das personagens marcantes que construíram a História
de Bocaiúva.
HENRIQUE
SAPORI NETO
um construtor do progresso
Maria
da Glória Caxito Mameluque
Cadeira N. 40
Patrono: Georgino Jorge de Souza
Ano
de 1887: a nação brasileira estava passando por um
período de ebulição com as idéias abolicionistas.
Membros do Partido Liberal e do Conservador defendiam a libertação
dos escravos, também defendida por intelectuais e jornalistas
da época. Em 1850, a Lei Eusébio de Queiroz já
proibia o tráfico de negros e começava a surgir a
falta de mão de obra nas zonas cafeeiras. Ao mesmo tempo
surge um grupo de fazendeiros que defende o uso de mão de
obra livre nas plantações de café. A Lei do
Ventre Livre em 1871 e a Lei dos Sexagenários em 1885 anunciavam
que não demoraria o fim da escravidão.
Na mesma época, a Itália passava pelas guerras da
Unificação Italiana e, após o fim dessas, a
economia italiana se encontrava debilitada, associada a problemas
de alta taxa demográfica e desempregos. Os Estados Unidos
passaram a criar barreiras para a
entrada de estrangeiros. Tais fatores levaram ao início de
maciça imigração de italianos para o Brasil,
já iniciada a partir de 1870.
Henrique
Sapori Neto
Os
primeiros imigrantes vindos da Itália instalaram-se no sul
do Brasil, onde agruparam-se em colônias agrícolas,
muitas vezes compostas exclusivamente por italianos. Dessa maneira,
o doloroso fato de abandonar sua terra natal se tornava mais ameno,
a partir do momento em que o imigrante tentava recriar em terras
brasileiras características de seu país de origem.
Embora tenha sido a região sul a pioneira na imigração
italiana, foi a região Sudeste que recebeu o maior número
de imigrantes, por causa da expansão das lavouras de café
em São Paulo. Com o fim do tráfico de negros e o sucesso
da colonização italiana no Sul, o Governo Paulista
passa a incentivar a imigração italiana para trabalho
nos cafezais. A imigração subsidiada de italianos
começou na década de 1880. Os próprios donos
das fazendas de café tratavam de atrair imigrantes italianos
para as suas propriedades. Os proprietários de terras pagavam
a viagem e o imigrante tinha que se propor a trabalhar nas fazendas
para devolver o valor da passagem paga.
Dessa forma, atraídos por benefícios anunciados pelo
governo brasileiro, grande número de italianos aportaram
no Brasil, para substituírem os negros na lavoura cafeeira,
notadamente após a abolição da escravidão.
São Paulo concentrava a maior
parte das lavouras, mas Minas Gerais tornou-se um dos maiores redutos
da colônia italiana do Brasil, sendo que colonos agricultores
foram atraídos para os arredores de Belo Horizonte e trabalhadores
para o café, atraídos para o sul de Minas.
Os imigrantes italianos, na sua maioria, imigravam para o Brasil
em famílias e eram chamados de colonos. Os fazendeiros, acostumados
a trabalhar com escravos africanos, passaram a lidar com trabalhadores
europeus livres e assalariados. No entanto, muitos italianos nas
fazendas de café foram submetidos a jornadas de trabalho
maçantes como as enfrentadas pelos escravos e muitos eram
tratados como se o fossem. Essa situação gerou muitos
conflitos entre os imigrantes italianos e os fazendeiros brasileiros,
causando rebeliões e revoltas. As notícias do trabalho
semiescravo chegaram à Itália, e o governo italiano
passou a dificultar a imigração para o Brasil.
São Paulo recebeu 70% dos imigrantes italianos e muitos conseguiram
escapar das abusivas fazendas de café e se instalaram nos
centros urbanos. O imigrante italiano participou ativamente do desenvolvimento
do comércio e de atividades urbanas. Em 1900, 81% dos operários
fabris de São Paulo eram italianos. Assim, membros da comunidade
italiana passaram a compor a elite paulista.
O imigrante italiano normalmente vinha para Minas Gerais acompanhado
de sua família (com uma média de 3 a 7 pessoas), oriundos
do norte da Itália. Houve um ligeiro predomínio de
homens e de pessoas solteiras seguidas por casadas. Ao contrário
do que sucedeu no resto do país, onde predominou o imigrante
miserável e analfabeto, o italiano em Minas Gerais era melhor
instruído e mais rico, de forma que permanecia uma média
de dez anos no campo e depois migrava para os centros urbanos, como
Belo Horizonte e Juiz de Fora, em busca de melhores condições.
Os imigrantes e seus descendentes contribuíram ativamente
para o desenvolvimento da agricultura, urbanização,
da indústria, do comércio e da identidade cultural
do Estado, inclusive sendo fundadores do Cruzeiro Esporte Clube,
antigo Palestra Itália.
E foi nesse cenário que apinhados em navios que saiam da
Itália em direção ao Brasil, muitas famílias
italianas chegavam, na esperança de conseguirem trabalho,
atraídas por promessas de melhores dias e alimentando o sonho
de encontrar no Brasil a terra onde poderiam reconstruir suas vidas.
O COLOMBO era um dos navios que fez por muitas vezes a rota Gênova/Santos.
Construído na Inglaterra em 1873, servia como cargueiro sob
o nome BRAZIL, até ser adquirido pelo italiano
Giácomo Cresta em 1888. Após sofrer uma reforma que
o transformou em navio misto, foi rebatizado como COLOMBO e em setembro
de 1888, comandado pelo capitão Antônio Mangini, fez
sua primeira viagem transportando imigrantes para o Brasil.
O COLOMBO tinha capacidade para transportar cerca de 700 passageiros
em acomodações comuns e 80 a 100 em classe cabina
(alojamento individual) e não obstante dispusesse de instalações
frigoríficas para armazenar víveres frescos –
no que foi pioneiro – o transporte dos imigrantes era feito
em precaríssimas condições.
Em uma dessas viagens, no ano de 1897, encontravam-se entre centenas
de famílias, relacionados nas listas de passageiros as seguintes:
Evangelista Sapori , sua esposa Rosa Sapori e os filhos; Domenico
Demaria, sua esposa Teresa e filhos; Eugênio Gibellini, sua
esposa Luigia e filhos e em outro navio Lorenzo Faluba, sua esposa
Modesta e filhos. As quatro famílias foram acolhidas na Hospedaria
de Imigrantes em Juiz de Fora de 1897, procedentes de Gênova,
na Itália, constando no registro, de profissão: agricultores,
de religião católica. Contratante: José de
Figueiredo Neves e destino: Fazenda das Pedras, município
de Sete Lagoas, em Minas Gerais. Natureza da lavoura: café.
De Sete Lagoas, depois foram para a Fazenda Monjolos, nas proximidades
de Ribeirão das Neves, de propriedade de João Gonçalves,
onde começaram a trabalhar.
Entre os filhos do casal Evangelista e Rosa Sapori, encontrava-se
o menino Enrico de dez anos de idade. Cresceu trabalhando com o
dono da Fazenda que gostava muito dele. Toda a família trabalhava
na lavoura do café.
O menino Enrico, anos mais tarde casa-se com Ida Gibellini, cuja
família veio no mesmo navio. Dessa união vieram seus
filhos
e entre eles, Luiz, que casou-se com Maria, também de família
italiana .
08 de abril de 1939 : era sábado de Aleluia. Havia uma movimentação
diferente na casa do casal Luiz e Maria, na Fazenda Monjolos. Luiz,
que pertencia à Sociedade São Vicente de Paulo andava
sempre às voltas com pessoas carentes que ele cuidava, aplicando
injeção e providenciando o que elas precisassem. Era
um homem educado e muito fino, mas um pouco fechado. Talvez por
isso os netos tivessem mais liberdade com o Avô Enrico, mais
conversador, alegre, festeiro. Todos tinham adoração
por ele.
O casal já tinha três filhos: Maria, José Luiz
e Antônio. E naquele dia a casa estava em festa pela chegada
do quarto filho, outro homem. É fácil imaginar aquele
bebê rechonchudo, carinha vermelha, tentando abrir os olhos
na penumbra do quarto da Fazenda, onde uma lamparina de azeite iluminava
o ambiente. Envolto em muitos panos, ornados com rendas e o rostinho
protegido pela touca de cambraia, era alvo da curiosidade dos irmãos
e dos parentes que vinham visitar a nova mamãe no quarto
cheirando a alfazema. Na pia batismal recebe o nome do avô:
Henrique.
Assim como o avô Enrico , que vindo com 10 anos da Itália,
corria pelos campos da Fazenda Monjolos, é fácil imaginar
o neto Henrique , subindo em árvores, correndo pelos campos,
nadando no córrego ou acompanhando o seu pai e seu avô
nas lides da
Fazenda.
Anos mais tarde, trabalhando na Empresa de ônibus Viação
Nossa Senhora das Neves, em Ribeirão das Neves, Henrique
casa-se com Maria da Conceição (Nenzinha)
Tempos depois, já em 1971, a família veio para Montes
Claros,onde adquiriu a Empresa Tolentino e montou a Transnorte.
Passados cinco anos, o transporte urbano era feito em Kombis velhas.
Henrique Sapori comprou a empresa “Faixa Branca”que
fazia o transporte urbano, transformando-a na Transmoc. Na opinião
de muitos que o conheceram, Henrique Sapori tinha uma visão
futurista, não pensava no hoje, pensava sempre na frente.
E assim, em 1977 começou a negociação para
adquirir a concessionária Fiat – Polígono, inaugurada
em 1978.
Henrique Sapori Neto nasceu em 08 de abril de 1939 e faleceu em
17 de agosto de 1985 com apenas 46 anos, deixando três empresas
bem estruturadas: a Transnorte, que iniciou suas atividades em 25
de março de 1971, contando com apenas dezessete
carros e atualmente conta com cento e oitenta veículos; a
Transmoc, adquirida em 1972, com oito ônibus e hoje conta
com uma frota de setenta lotações que atendem a cidade
de Montes Claros e a Polígono- Fiat Automóveis, inaugurada
em 1978.
Henrique Sapori Neto recebeu o título de Cidadão Honorário
de Montes Claros, em março de 1981, por seus serviços
prestados à comunidade, como empresário do serviço
de transporte coletivo urbano e interurbano, sendo reconhecido como
um dos
construtores do progresso norte-mineiro e ainda pelo seu brilho
pessoal, enquanto pessoa humana. Recebeu ainda a Medalha Urbis do
Sesquicentenário de Montes Claros (in memoriam), em 03 de
julho de 2007, por relevantes serviços prestados à
cidade de Montes Claros.
A respeito dele, várias pessoas assim se referiram: “Era
um homem à frente do tempo, com um inconformismo social muito
grande, lutava pelas transformações sociais, tendo
como principal objetivo garantir direitos e deveres aos mais humildes.
Odiava a injustiça.” (Artur Leite)
_________________________________________
(Extraido do livro Henrique Sapori Neto- um homem à frente
do seu tempo)
“ETERNO
INSTANTE”
Maria Luiza Silveira Telles
Cadeira N. 42
Patrono: Coronel Geraldo Tito da Silveira
Gosto
de gente assim, que mergulha de cabeça no amor, sem medo
da dor; que abraça a Vida com paixão, vive com intensidade,
caindo e levantando; mora no Parnaso, sem tirar os pés do
chão; usa sempre a palavra para edificar, expressar sentimentos
nobres, fazer jorrar a emoção e jamais para ferir
ou aviltar.
Amo pessoas que transcendem o corriqueiro, o medíocre, o
rasteiro. Pessoas que ainda acreditam na bondade, na criatividade
e no poder de superação do ser humano; que fazem parte
de um movimento que se alastra pelo planeta, movimento este composto
por aqueles que crêem no Bem, no Amor, na Justiça,
preocupadas com o seu crescimento pessoal e da humanidade.
Amo pessoas que compreendem a dor, porque já passaram por
esse processo e procuram minimizá-lo no próximo, transformando-o
em Beleza, Arte e Compaixão. Pessoas que buscam a Verdade,
mas nunca se arvoram em donos dela, porque sabem
que a Verdade é o próprio Deus e estamos todos, por
caminhos
Miriam Carvalho
retos
ou tortos, indo em direção a Ele. Pessoas cheias de
Amor, cujas lágrimas são sempre de deslumbramento
e gratidão diante da misericórdia do Pai. Nelas a
Vida pulsa sempre vibrante e suas vozes de esperança e fé
se elevam e se ajuntam a tantas outras que acreditam no eterno recomeçar.
Amo pessoas como a minha amiga, Miriam Carvalho, que, no “eterno
instante”, sabem tecer e bordar a Vida, bebendo a taça
da Alegria e da Dor, brindando sempre a Graça e o Dom.
Miriam é o amor, a poesia, a filosofia, a solidariedade encarnados
em uma só criatura, que espalha com a palavra escrita ou
falada apenas a beleza e o mistério da vida. Talvez muitos
não a compreendam, nem tampouco sua poesia, pois estão
longe de sua nobreza e de seu brilho. Mas a verdadeira estrela não
se sente incomodada com o brilho de outras, pois, tem seu brilho
próprio. Só quer cumprir a sua função
de estrela: brilhar juntamente com suas irmãs, enfeitando
o céu.
O humano e o divino se misturam e se desnudam de uma forma incrível
na poesia desta criatura. O carnal e o místico se abraçam
amorosamente no “eterno instante”.
Ah, quão pobres seriam nossas vidas se não existissem
pessoas como Miriam! Sua poesia sabe transformar a dor em beleza,
o cotidiano em beleza, o corriqueiro em sublimação.
Seus olhos sabem enxergar com amor e compaixão os nossos
montes que já não são tão claros e seu
coração guarda como relíquias as belas lembranças
de um tempo, em que vivemos juntas, e os ventos “nos elevavam,
sem receio de perigo, (...) aos cimos dos claros montes”.
Seus olhos contemplaram mágoas, misérias, desterros
“de um amor sem cordeiros, de um amor sem bezerros”
e soube transmutar tudo em “beleza, sabedoria e esperança”.
Miriam
é muito mais que poeta, é um ser humano de uma riqueza
incomensurável, que sabe, mesmo com os pés sangrando,
caminhar sobre pedras, com o olhar sempre posto na glória
eterna dos Céus. Para ela o importante é viver plenamente,
sempre aberta, convidando o próximo a se levantar, a caminhar
a seu lado, a beber de sua taça, a comer de seu pão,
a participar com ela da Festa da Vida, pois para Miriam não
apenas “escrever poemas traz um sabor de festa”, mas
tudo tem o doce sabor de uma festa eterna.
Miriam consegue de uma forma magistral descrever toda a beleza e
o mistério do “tempo, da morte, da esperança,
da perda, do encontro e desencontro, da ventura e desventura, da
dor e da visão universal da existência com seus antagonismos”.
Ela nos arrasta aos abismos de possibilidades que a vida nos oferece
e busca na sua escritura, como ela mesma confessa, “a integração
intersubjetiva do trabalho poético, que descreve um percurso
do racional ao afetivo”.
Sua poesia não é apenas a emoção que
jorra, mas um delicado trabalho de artesã caprichosa. Ela
se diz camoniana, mas seus versos não nos remetem apenas
a Camões, nas suas analogias, mas nos fazem lembrar todos
os grandes poetas que souberam deixar talhados na Pedra da Existência
o mundo insondável e abissal dos belos e contraditórios
sentimentos que tomaram suas almas.
Miriam mostra a sua intimidade não só com a própria
vida, com seus movimentos que lembram o vai-e-vem das ondas, nem
apenas com os sentimentos que impulsionam os humanos e com o inconsciente
coletivo, mas, também, a sua intimidade com a escritura e
a alma daqueles que souberam “poetar”.
Vejamos:
“Com
certeza
um amanhã benigno
para além dos nossos afetos
aferidos em cada ser
vai certeiro, vai levando
o movimento da vida...”.
Eu me curvo, humilde, diante da grande poetisa, da grande literata,
que sabe traçar com delicadeza e maestria cada palavra de
seus poemas.
Seu nome, no futuro, certamente, estará ao lado de Göethe,
Elizabeth Browning, Florbela Espanca, Drummond, Quintana, Neruda
e tantos outros, porque ninguém foge à peneira do
Tempo, que sabe eliminar os cascalhos inúteis e separar as
pedras preciosas.
Sintamos a beleza e o sentido da voz da poetisa:
“Nossas vidas já sorriem para outra vida,
para aquelas portas celestes de porcelana
que se abrem ao convite de domingo
num tempo de alva luz e manhãs livres
num bloco de estrelas sem noite,
no espelho translúcido do dia sem dia
num espaço sideral sem fronteiras,
onde o tempo infinito grava eternamente
com adaga de ouro e luz
o aberto amor do Pai”.
O homem comum diria: “Morremos e vamos para o céu”.
Mas para Miriam estas são palavras mui pobres que não
expressam a maravilha de nunca morrer e ser acolhida nos braços
do
Pai...
Meu Deus, quanta beleza em expressões como “tempo de
alva luz e manhãs livres”, “estrelas sem noites”,
“dia sem dia”!...
Só
mesmo uma alma superior, uma mente rica e uma formação
acadêmica ampla e profunda para dar condições
a alguém para dizer algo tão simples de modo tão
belo e singular.
A poesia de Miriam nos desperta, nos sacode, nos sacia. A gente
voa na beleza de seus versos e, ao mesmo tempo, mergulhamos em abismos
profundos e andamos por desertos sem fim... Mas a esperança
nos enche a alma:
“Luzeiros pensamentos
como lindas peças raras
hão de luzir um dia
na mais leve e pura essência
cheirando a malva do céu
nos vazios espaciais,
nas superfícies alvas
hão de luzir um dia”.
Miriam nos empolga e nos leva às lágrimas. A riqueza
de suas figuras de linguagem nos povoam a mente e a alma com sentimentos
que nem conseguimos expressar...
“Eterno Instante” talvez seja um dos mais belos presentes
que uma alma nobre e um talento incrível deixam como herança
para Montes Claros, para Minas e para o mundo.
E eu fico por aqui
“num coração que não cabe
um olhar de esquecimento
e uma alma sem intento”.
Sobre
o poeta Olintho da Silveira
Miriam
Carvalho
Cadeira N. 88
Patrono: Plínio Ribeiro dos Santo
Falar do poeta Olintho da Silveira não é apenas falar
de sua poesia, inserida no contexto do século xx, mas, é,
também, falar de uma personalidade que amava profundamente
a leitura e se entregava à poesia de um Drumond, de um Bandeira,
de um Musset, de um Edgar Alan Poe, e tantos outros, num diálogo
não isento de vaidade, segundo o seu depoimento que precede
os poemas publicados, Cantos e Desencantos, em 1963, pela gráfica
Santa Maria, Belo Horizonte. São quarenta poemas regidos
pela lógica do poeta contemplador, mergulhado em diversas
facetas da vida: do amor à morte, da Serra do Catuni ao Paraíso
Perdido, do universo infinito à terra sertaneja, da lua ao
sol, no seu contato com a natureza, procurando com ela uma relação
direta, com base na linguagem dos sentidos, expressando tudo o que
vê, ouve e sente. É sobre esta obra poética
que o pensamento bucólico, telúrico, sertanejo, contemplativo,
do homem Olintho, se agrega como valor adicional à sua vida,
extasiado com a criação do Universo. O ritmo da poesia,
nesta obra, observa o compasso da natureza e suas transformações:
as manhãs, pela luz do sol-nascente, a chuva no sertão,
vestida de um
verde encantador, ou a estiagem no Norte esquecido, com a presença
da lua, vista como “um lago do seu sonho, com toda beleza
nua” e por isso é “lua bendita”, segundo
o poeta. Vale a pena determo-nos nesta estrofe: “Direi apenas
que és bonita/ lua bendita/ Noiva imaculada e inatingível/
dos poetas sem noivados”. Até que ponto esta poesia
quer resgatar a natureza? Ora, aqui, a palavra de Cantos e Desencantos
põe em destaque o ideal da poesia, como força, harmonia
e representação do mundo que parece reduzir o particular
ao universal, o vivo ao conceito, em momentos de contemplação.
Consideremos estas idéias numa estrofe típica do poema
Sempre Viva que revela uma identidade entre poesia e natureza: “a
poesia há de viver/ em toda natureza/ da qual só ela
canta/ Toda imensa beleza!” Como se cantaria/ Os céus,
a luz, os sons,/ As cascatas, os rios, as sombras, o silêncio/
e os pássaros em hamonia?” A idéia da poesia
permanecer Sempre Viva, “nos remete às palavras e as
palavras dão o significado e o sentido da vida. Viver é
estar nas palavras, nos símbolos, nas significações...
(conceito de Ramon Xirau em seus Ensaios Críticos e Filosóficos).
Em Cantos e Desencantos, o poeta não está longe de
uma visão do mundo manifestada a partir de uma reflexão
crítica, e também de um estado de meditação.
Desta forma, o mistério do universo é o mistério
de Deus, conforme a expressão destes versos: “Contemplador
impotente/ do mistério universal;/ sinto a angústia
metafísica/ do pensar que eles tem gente/ Que nos olha e
verifica,/ Praticando bem a física.” Por entendermos
que a escrita poética se faz em rede, fundamentada em vários
textos que se entrecruzam, ao longo dos tempos, é que nos
parece oportuno avaliar a verdade, o saber e a crença da
poesia de Olintho Silveira, ligada à natureza e bem enquadrada
numa concepção de vida simples, de acordo com o poema
Transfiguração: “Quero banharme na tua luz/
Fecunda e pura, Ó sol ardente do sertão/ Sem ti, ó
sol do meu sertão/ sem teu calor,/ Nenhum valor/ ”Outras
vezes,
o poeta busca fixar a amada, nas páginas do livro, de forma
sensorial, gravando a canção dos sentidos desejados,
através de Linguagens, nome do poema: “Vem!/ Olha-me
bem nos olhos tristes./ Faze deles o teu espelho. Viste-te? Sim.
Como não hás de ver-te,/
Se vivo sempre dentro deles? Os meus olhos só vêem
a ti / a minha boca só fala em ti. / Meu coração
só pulsa por ti./ A notação visual é
um procedimento artístico que sempre foi utilizado pela poesia,
sobretudo, quando se une olho no olho: amador e amada. Em Olhos
Negros, um dado memorialista capta a nossa atenção:
o jovem casal Silveira está em lua de mel. O amado cria,
em forma fixa o seu poema, um soneto, metaforicamente desenhando
os olhos de sua alma gêmea como “negros, veludosos,”
“qual um lago em tardes de frescura,” “ternos
como os cantos maviosos”
“belos como as estrelas prateadas,” “profundos
como o mar em doce calma.”Belo soneto, que contempla a contemplação
de si mesmo uma vez que o amado presencia a sua imagem nos olhos
da mulher amada: “Olha-me bem nos olhos tristes”/ Faze
deles o teu espelho”/Vem’/ Deixa que me veja nos teus
olhos”/ Já em Ausência, a dor da separação
se faz presente. Novamente, há uma referência à
natureza: assim como retorna a Aurora, a amada também pode
voltar.“Será que você volta um belo dia,/”
Como retorna a aurora?”/ Mas é preciso ter Alma de
Vento, é preciso conhecer em Francisco Sá a Serra
do Catuni “para lhe transpor o dorso ondulado” e no
Paraíso Perdido encontrar Regiões onde não
há sofrimento nenhum, pois os sonhos de um tempo franciscano
se prendem “na raia loira da madrugada”, palavras de
Canto e Desencanto. Em Metamorfose, a chuva no sertão adquire
uma dimensão expressiva das populares canções,
cantadas pelo homem do campo quando a natureza começa a sua
transformação Eis o que diz esta estrofe: “Está
chovendo no sertão/ E esta chuva
que cai/ E pelo chão/ Espalhando se vai,/ Respinga saudade/
No meu coração/” Se alguns poemas traduzem a
alegria diante da existência, outros, em retrospecção,
ganham um tom melancólico, segundo estes versos: “As
horas passam lentas neste dia”/E as coisas todas se enchem
de tristeza”/ Antes de ser um poeta (que dirige o seu clamor
para o mundo e para Deus,) ele se apresenta também como um
trovador. O trovador, na verdade, é um vassalo, vassalo de
amor e vassalo de seu senhor, cultivando o gênero da canção
amorosa. No poema, Epístola, as quadras dão o tom
a esse estilo, tipicamente trovadoresco: “Muitas vezes disse-lheeu/
Que o amor fere sem dó.” Mas você só compreendeu/
”Agora que ficou só. “Naquele dia tristonho”,
“Você se foi eu fiquei”. Seu semblante era risonho”.
Eu penso até que chorei.” Eis uma obra capaz de transformar
a realidade em graus de beleza com dados da sensibilidade e imaginação.
Diria, portanto, que Olintho é um poeta contemplador e visual.
O mundo penetra os seus olhos e esses fazem o caminho de regresso
à natureza. Por isso, ele
pergunta: Quem está isento de vaidade? O poeta não!
Descobre o mundo e o invade, e assombra-se, e goza no primeiro instante
de contemplação, porém o mundo descoberto,
por sua vez, situa o poeta, invade-o e outorga-lhe presença
e vida. Duas epifanias necessárias e complementares: olho
e luz. O olho, o do poeta, a luz, a da poesia. Ato de verdadeira
graça, entregue à gratidão generosa do amor
à vida.
Gênese
do São Francisco
Petrônio Braz
Cadeira N. 18
Patrono: Brasiliano Braz
Na Eupana1 por erro foi formado,
na legendária terra de riqueza
onde bugres bramiam com destreza
grande disco de ouro fabricado.
Ao dourado metal nobilitado,
que nos Andes havia, com certeza,
a busca encetaram com firmeza,
com fervor, com arrojo denodado.
Com a ambição tomada como guia
bandeirantes prodigiosamente
pejaram em ondas o continente
à cata da miragem fugidia.
Sem rumo a seguir em tal porfia
foram ter em terra de brutal gente,
que Deus forjou com sua mão clemente,
em hora de lazer e fantasia.
_________________________________________
1 – EUPANA – A Eupana ou El Dorado seria
uma grande lagoa, supostamente localizada nas proximidades dos Andes,
onde pensavam inicialmente os portugueses nascia o rio São
Francisco. Nas margens da Eupana ficava a cidade de Manoa, cujos
habitantes portavam ornamentos de ouro e diamantes (N. do A).
_________________________________________
As
terras que a todos extasiam,
aos bravos Guaíbas, Natus, Crixás,
Xacriabás, Caiapós e Goianás,
do país do São Francisco2
pertenciam.
Seus límpidos destinos definiam
os Caetés, Tuschás, Amoipirás,
Tamoios, Catolés, Abatirás,
na liberdade natural que conheciam.
No linguajar impuro que usava,
o rio pelo índio era chamado
Pará ou Opará. Foi batizado
co’o nome do santo que celebrava
na grande fé cristã que professava
o descobridor recém-aportado.
O nome, do santo originado,
a um novo país se destinava.
Que eu possa contar em verso impuro
em tosca rima, mas contar honesto,
as glórias do gentio e do modesto
caboclo; do branco buscando ouro
ou nas margens do rio curtindo couro;3
na conquista, no pelejar funesto
ali ficando p’ra fazer de resto
do vastíssimo vale o seu tesouro.
_________________________________________
2 – PAÍS DO SÃO FRANCISCO –
O Vale do rio São Francisco (N. do A).
3 – CICLO DO COURO – Uma das fases da evolução
do Vale do rio São Francisco (N. do A).
_________________________________________
Como
o Spinoza4 bandeirantes intrépidos,
que os índios indômitos combateram,
sua história desde cedo escreveram
em lutas, glórias e crimes cometidos.
Sem amor, impios e desalmados,
a cruz pelo Navarro5 transportaram
e a ela impunemente atrelaram
os bandos de escravos dominados.
O Fernão,6 que viagem empreendeu
em busca da Serra Resplandecente,
em missão heroica, quase imprudente,
no Guaicuí em delírios feneceu.
Morreu sem forças, andando ao léu,
na terra de Tupã, que dominante
mostrou por ilusão pedra brilhante,
que o levou do inferno ao céu.
Cardoso,7 do São Francisco regente,
com o poder d’El Rei assaz cingido
de herói, em máscara revestido,
fez bramir sua espada ingente.
Impõe, pela força de sua gente,
o poder pela espada urdido,
para que seu nome fosse temido
no sertão todo como inclemente.
_________________________________________
5 – NAVARRO – Pe. Aspilcueta Navarro.
Foi o capelão da bandeira Spinoza (N do A).
6 - FERNÃO – Fernão Dias Paes, o Caçador
das Esmeraldas (N do A).
7 – CARDOSO – Januário Cardoso de Almeida, Regente
do São Francisco (N. do A).
_________________________________________
Pela
força a região conquistou,
E a límpida areia da praia,
Que ao longo do rio se espraia,
com o sangue dos bravos se manchou.8
O índio na mata se ocultou,
recuando com mostras de agonia,
em busca da vingança, quase pia,
que o emboaba inepto provocou.
A vingança os índios proclamaram
no ritual que a todos desafia,
em fastidiosa coreografia
a dança da guerra eles dançaram.
Aos duendes celestes invocaram
ao som no maracá, em polirritmia,
com o pagé servindo-lhes de guia,
as forças p’ra vingança que clamaram.9
Como turba valente, exortada,
do fundo do sertão eles desceram
e com todas as forças combateram
aos brancos em última emboscada.
Vencidos os caiapós n’ssa contenda,
Com perdas que as partes detiveram,
a sede de vingança contiveram
e a paz finalmente foi firmada.
_________________________________________
8
– Por ordem de Januário Cardoso, Manoel Pires Maciel
guiou as tropas comandadas
pelo Cap. Manoel Francisco Toledo para a conquista da ilha de São
Romão, em
Minas Gerais. Foi uma matança impiedosa. A Igreja celebrava,
no dia, a festa de São
Romão, 23 de outubro. Daí veio o nome da ilha e da
futura cidade, segundo Diogo
de Vasconcelos. Morto o cacique, após um dia e uma noite
de luta, muitos indígenas
fugiram e foram concitar vingança aos parentes e demais tribos
da raça. Organizaram
a Confederação dos Caiapós, de que muito esporadicamente
falam os livros de história
(N do A).
9 – CONFEDERAÇÃO DOS CAIAPÓS –
Os índios derrotados em lutas isoladas conclamaram
para a vingança todas as tribos da nação Caiapó.
Diogo de Vasconcelos afirma
que foi geral a sublevação dos selvagens. “Do
vão do Paraná ao alto Tocantins, e do
Carinhanha ao Paracatu ecoou o grito de guerra” (N do A).
_________________________________________
Por
Helena os gregos mais ousados
contra Troia em guerra pelejaram,
e os feitos das vitórias que tiveram
foram pelo Homero celebrados.
Na guerra aos guaíbas10
celerados
Catarina11 os bugres
seqüestraram
E p’ra mata das origens a levaram
Em desonra dos brancos revoltados.
Na glória de seus bélicos tambores
os gregos os seus feitos memoráveis,
em escritos e versos tão notáveis,
aos pósteros legaram seus valores.
Pela mão de seus clássicos autores,
em obras ‘inda hoje inesgotáveis,
em essências de vida formidáveis,
cultuaram seus imortais amores.
Ao alvedrio de dúplices temores,
De estranhos guelfos e gibelinos,12
Sofreando os brancos libertinos
e suportando bárbaros horrores,
nutrindo de amor as suas dores,
Catarina sem versos cristalinos,
sem poetas p’ra cantar esses destinos,
ingressou na história sem louvores.
_________________________________________
10 –
Os GUAÍBAS eram uma tribo da nação Caiapó.
Habitavam a ilha de São Romão,
no rio São Francisco, em Minas Gerais (N do A).
11 – CATARINA – Índia, mulher de Manoel Pires
Maciel, o conquistador da ilha de
São Romão. Era filha do cacique caiapó do Brejo
do Amparo (Januária-MG). Foi seqüestrada,
juntamente com o filho, pelos caiapós, após a luta
pela conquista da ilha
de São Romão, mas fugiu e, com sua volta, negociou
a paz na região entre índios e
brancos. Foi a grande pacificadora (N do A).
12 – GUELFOS E GIBELINOS – Os guelfos eram os partidários
dos imperadores suábios
durante a questão entre esses e o Papa, e os gibelinos eram
os partidários do Papa.
História italiana dos Séculos XII a XV (N do A).
_________________________________________
Da
Paraguaçu13
a mesma ventura
não teve, nem a sorte da Moema,
que o mar revolto rugindo toma
como ornamento em sepultura.
Sua alma foi nobre e sempre pura;
sendo índia houve-se como dama
e a todos o seu amor derrama,
como se santa fosse a criatura.14
Como Iracema não teve a fama
que o Alencar em páginas brilhantes
deu ao conhecimento às doutas gentes.
Não foi gentil, bela, nem culta dama,
que na vil alcova o amante chama.
Não recebeu adornos, nem presentes,
mas evitou que o sangue de inocentes
se perdesse no chão formando lama.
Foi sincera, heroica e prudente.
Ao branco ousado impôs respeito,
como o filho a sugar-lhe o peito,
mostrando a todos que o inocente,
mestiça cria, modesto infante,
era o futuro, de pronto efeito,
que do amálgama quase perfeito,
formaria outra raça dominante.15
_________________________________________
13
– PARAGUAÇU - Mulher de Diogo Álvares Correia,
o Caramuru, batizada com o nome de Catarina, em homenagem à
rainha Catarina de Médici, sua madrinha. Não confundi-la
com a mulher de Manoel Pires Maciel (N do A).
14 – CORRENTE FILOSÓFICA – Montaigne e Rousseau
pertenciam à corrente filosófica que considera o selvagem
sempre bom (N do A).
15 – CRUZAMENTO DAS RAÇAS – O cruzamento das
raças deu origem ao povo brasileiro (N do A).
_________________________________________
No
sertão restrita a seu terreiro
uma raça de homens foi forjada
e u’a nova riqueza foi criada
no aboio dolente do vaqueiro.16
Amante do rio, o barranqueiro
trabalha de sol a sol co’a enxada
a espera da chuva que sempre tarda,
mas enche de esperanças o seu celeiro.
Desprovido do ouro procurado
o ciclo do couro, com firmeza,
implantaram em forma de riqueza
e houveram de pronto resultado.
Na solidão total lhes foi deixado
escolher, com alegria ou com tristeza,
o próprio caminho que a natureza
mãe lhes apontava como seu fado.
Prelibando futuro invejável
seus filhos, em projeto cerebrino,
no Vale um Estado paladino
aventaram em plano memorável.17
Hoje, como reserva formidável,
suas águas – glorioso destino –
nas represas marulham belo hino,
procriando força inesgotável.
Com a força que um Estado planejou
nos barranqueiros ‘inda estão patentes
a mesma força e sangue ardentes
_________________________________________
16 – Ver Nota nº 3.
17 – ESTADO DO SÃO FRANCISCO – Vários
projetos já foram apresentados com vistas à formação
do Estrado do São Francisco (N do A).
_________________________________________
que
a viril conjuração deflagrou.18
Os seus feitos a história registrou
E miríades de feitos são presentes,
Com glórias ainda hoje onipotentes
Na história que Licínio nos contou.
OPINIÕES
“Gênese
do São Francisco” é uma página brilhante,
antologia que marcará tempo na vida do Velho Chico. O poema
é um retrato falado do São Francisco. É sua
vida, suas lutas, seu vigor, seu passado e seu eterno futuro. Li,
mais de uma vez, o poema que me empolgou. Com “Gênese
do São Francisco”, o Velho Chico se liberta, tornando-se
um rio com vida e história. É verdade que inúmeros
barranqueiros falaram dele, quais sejam: Saul Martins, Anfrísio
Lima, José Gonçalves (este um apaixonado pelo rio:
conversava com ele e beijava suas águas), o talentoso Fernando
Rubinger (meu dileto amigo), o velho e culto escritor Manoel Ambrósio,
autor das magníficas obras, de fundo regional, “Brasil
Interior”, “Os Laras”, etc., e Manoel Ambrósio
Júnior, autor do belo romance “Iaiá Quitéria”.
Mas, na verdade, não disseram tudo do Velho Chico, como,
em versos, disse Petrônio Braz”.
Cândido Canela
O Rio da Integração Nacional vem, num abraço
amoroso, unir o “irmão do Norte” e o “irmão
do Sul”. Petrônio Braz, o poeta barranqueiro, sente
a beleza e conta a história do rio. “Gênese do
São Francisco”, poema do El Dorado, dos Caiapós
valentes, de Catarina, a medianeira da paz. Como Luiz Vaz de Camões
cantou as glórias lusitanas, Petrônio Braz, em versos
cheios de força e lirismo, canta a epopeia do sertão
banhado por um rio belo e generoso.
Maria
de Lourdes Reis
Presidente da Casa do Poeta do Brasil - DF
_________________________________________
18
– CONJURAÇÃO - Conjuração do São
Francisco de 1736 (N do A).
O
TREM DO SERTÃO
Roberto
Pinto da Fonseca
Cadeira N. 92
Patrono: Sebastião Tupinambá
Antigamente, / Na chegada e na partida, /
Largo no peito, / Coração batia assim: /
Café com pão... / Café com pão ... /
Café com pão ...
Montes Claros, / Monte Azul, / Café com pão .../
Estação de Canacy, / Café com pão.../
Burarama, / Uratinga, / Uratinga, / Burarama./
Hoje sem café com pão, / Coração bate
estreito,
Sem ritmo, / Fora dos trilhos, / Coração bate sem
jeito.
KARLA
CELENE CAMPOS
No
norte de Minas, era comum ouvir as expressões “Trem
do Sertão” , “Trem Baiano”. Hoje essas
palavras são sinônimos de saudades para os mais velhos
e praticamente desconhecidas para as novas gerações.
O tempo das locomotivas, quando o apito estridente das máquinas
fumegantes
reunia as pessoas em torno da estação, já passou.
Foram tempos de glória, conquistas, desbravamentos de terras
e distâncias. O trem não apita mais, mas ficou a história.
O primeiro protótipo de uma máquina a vapor colocada
a operar sobre trilhos, ainda que de madeira, pouco parecida ainda
a uma locomotiva, rodou no país de Gales, Inglaterra, em
1804, percorrendo em 4 horas aproximadamente 14 kms e deslocando
uma carga de 25 toneladas. Esse modelo original, desenvolvido por
Richard Trevithick e rejeitado na época, é o marco
inicial para um dos maiores fenômenos dos meios de transporte
da humanidade.
Em 1814, o também inglês George Stephenson apresenta
a primeira locomotiva a vapor, a Blucher, que foi utilizada para
transportar carvão entre Killinsworth e Hetton. Percorreu
13 kms a uma velocidade de 6,5 kms/h, transportando 30 toneladas
de carga.
A fábrica Robert Stephenson & Co., fundada em 1822 na
Inglaterra, produz, em 27 de setembro de 1825, a máquina
a vapor denominada “Locomotion”. Percorreu um trecho
de 15 kms, entre Stockton e Darlington, transportando aproximadamente
500 passageiros, 80 toneladas de carvão e puxando 21 vagões.
Iniciase definitivamente a era das ferrovias - no Brasil, por analogia,
todas as máquinas seriam denominadas locomotivas.
Em setembro de 1830 é inaugurado o primeiro trecho de linha
férrea entre Liverpool e Manchester, com 50 kms de extensão.
Nesse mesmo ano é inaugurada nos Estados Unidos da América
a linha entre as cidades de Charleston e Hamburg, na Carolina do
Sul.
No Brasil, graças ao espírito empreendedor de Irineu
Evangelista de Souza (1813-1889), o Barão de Mauá,
um ex-caixeiro, foi inaugurada a primeira ferrovia, no dia 30 de
abril de 1854, a Companhia
de Navegação a Vapor e Estrada de Ferro Petrópolis,
ou Estrada de Ferro Mauá. Com a presença do imperador
D. Pedro II, percorre-se um trecho de 14,5 kms, em apenas 23 minutos,
entre as localidades de Porto de Estrela e Parada Fragoso, no Rio
de Janeiro. A locomotiva foi fabricada na cidade de Manchester,
Inglaterra, pela firma William Fairbain & Sons e, no ato da
inauguração, recebeu o nome de Baronesa, em homenagem
a Maria Joaquina, esposa de Irineu Evangelista, que nesse dia foi
também agraciado pelo imperador com o título de barão.
A segunda a ser inaugurada, no dia nove de fevereiro de 1858, foi
a Estrada de Ferro Recife ao São Francisco, percorrendo inicialmente
31,7 kms de linhas. Em 29 de março de l858 entra em operação
a Companhia de Ferro Dom Pedro II, que percorre uma distância
de 48 kms entre Campo de Santana e Nova Iguaçu.
O desenvolvimento e o expansionismo do sistema ferroviário
ocorreram sobretudo em função da cultura do café
no Vale do Paraíba. Era política do governo imperial
interligar, via trilhos, o Rio de janeiro a Barra do Piraí
e, a partir desse ponto, estabelecer bifurcações para
o Estado de São Paulo e de Minas Gerais.
Em 1867, a ferrovia Dom Pedro II chega à região de
Paraíba do Sul e Três Rios, na divisa dos Estados do
Rio de Janeiro e de Minas Gerais, e em 1875 os trilhos chegam a
Juiz de Fora. Adentrando mais no território mineiro, alcança
a cidade de Santos Dumont em 1877, Barbacena em 1880 e Conselheiro
Lafaiete em 1883. A partir desta cidade, muda-se a bitola dos trilhos
até então construídos com uma distância
de 1.60 m, e passa a ser utilizada a bitola de 1 metro. Essa mudança
de parâmetros técnicos em relação ao
tipo de bitola a ser utilizada gerou muitas polêmicas, mas
a bitola de 1 metro proporcionava uma maior economia de custos e
prazos e, nesse contexto, os trilhos seguiam firmes em direção
ao Vale do Rio das Velhas e às margens do Rio São
Francisco, pois o objetivo era chegar a Belém do Pará.
Ouro
Preto, então capital da província mineira, foi atendida
em 1888. Esse trecho ferroviário, denominado Linha do Centro,
chegou em 1887 a Itabirito e as obras seguiram em direção
a Sabará, quando ocorreu a Proclamação da República.
Com o advento da República, a 15 de novembro de 1889, a estrada
de Ferro Pedro II passa a denominar-se Estrada de Ferro Central
do Brasil. Por prestar grandes serviços à nação,
integrando vastos territórios, em 2008 foram merecidamente
comemorados seus 150 anos de fundação.
Em 1893 é inaugurado o ramal de Belo Horizonte a partir do
terminal de General Carneiro, próximo a Sabará, visando
a possibilitar as obras da construção da nova capital
mineira, conforme estabelecido pela Constituição de
1891.
Dando continuidade ao expansionismo da Linha do Centro em direção
ao norte de Minas, via Rio das Velhas e São Francisco, os
trilhos chegam a Sete Lagoas em 1896, Cordisburgo (l903), Curvelo
(l904), Corinto (l906) e Pirapora (l910).
Construção da Ponte Marechal Hermes,
sobre o Rio São Francisco em
Pirapora, década de 1920.(RFFSA)
Malha ferroviária da Estrada de Ferro Central do Brasil (1969),
que a partir
do litoral possibilitou a integração do norte de Minas.
Como
se pretendia alcançar a cidade de Belém, a EFCB concluiu
na década de 1920 a Ponte Marechal Hermes, sobre o Rio São
Francisco, mas como o plano de integração do território
nacional através dos trilhos foi perdendo estímulos
políticos e econômicos, a ferrovia para na cidade de
Buritizeiro em 1922.
Nesse período, a localidade de Curralinho, atual cidade de
Corinto, torna-se o mais importante entroncamento ferroviário
da região, favorecendo rapidamente a interligação
da região. Os trilhos chegaram a Diamantina em 1914 e em
1924 são iniciados, a partir de Bocaiuva, os serviços
de construção da linha, que chega finalmente a Montes
Claros no dia 1º. de setembro de 1926, tendo a frente das festividades
de inauguração da Estação da EFCB o
Ministro da Viação, o Sr. Francisco Sá. Em
1947, a cidade de Monte Azul foi interligada à rede ferroviária,
totalizando 1354 kms até a Estação do Rio de
Janeiro, o marco zero dessa obra pioneira.
Estação de Curralinho, atual cidade
de Corinto. (RFFSA)
Com
a crescente importância do norte de Minas e da malha viária
da EFCB, em l950 a Viação Férrea Federal Leste-Brasileiro,
a ferrovia do Nordeste, interligou Monte Azul às regiões
Nordeste e Sudeste.
Milhares
de pessoas passaram a utilizar esses trilhos em busca de melhores
condições de vida em outras regiões do país,
até a desativação desse ramal em 1996, fato
até hoje lamentado pela população. Carinhosamente
chamados de “Trem Baiano” e “Trem do Sertão”,
ainda vivem no imaginário das pessoas.
As regiões por onde passavam os trilhos tiveram o seu crescimento
econômico favorecido. Muitas comunidades e manufaturas se
desenvolveram ao redor das estações. Viajava-se de
primeira, segunda ou terceira classe e, no tempo do império,
para facilitar a locomoção da população
carente, bastava apresentarse descalço na estação
que o acesso ao embarque era gratuito. Essa medida pitoresca, no
entanto, foi revogada em pouco tempo, porque pessoas de classes
sociais mais elevadas, mesmo bem vestidas, chegavam às estações
descalças, para desfrutarem do privilégio.
Outras importantes ferrovias também contribuíram para
o desenvolvimento do país, como a Estrada de Ferro Leopoldina,
surgida em 1872, a Viação Férrea Federal Leste
Brasileiro, formada a partir da junção de diversas
pequenas companhias nordestinas, que em 1938 foi a primeira empresa
nacional a utilizar locomotivas diesel-elétricas; a Viação
Férrea Centro-Oeste, que a partir de Angra dos Reis integrou
o sul e o Triângulo Mineiro, chegando a Brasília; a
Vitória-Minas, que possibilitou o desenvolvimento do Vale
do Rio Doce e de regiões adjacentes.
No dia 30 de setembro de 1957, sob o governo de Juscelino Kubitschek,
é fundada a Rede Ferroviária Federal S.A. RFFSA, englobando
a Estrada de Ferro Central do Brasil e 22 outras empresas, tornando-se
a maior empresa ferroviária do país.
Entretanto, a partir de 1960 o sistema ferroviário nacional
começa a perder fôlego, fato que viria a agravar-se
nos anos vindouros. Mudanças radicais passaram a contribuir
para o enfraquecimento da rede ferroviária, como o incremento
da indústria automobilística,
o crescimento da população e o consequente aumento
demográfico nas principais capitais nacionais, a ênfase
aos investimentos nas rodovias, siderurgia e mineração.
A partir dos anos 80, com as novas tendências econômicas,
a globalização e, sobretudo com novas políticas
com o intuito de reduzir a participação do estado
na economia, o setor ferroviário perde cada vez mais importância.
Com o crescente aumento do transporte de mercadorias e de passageiros,
buscam-se preferencialmente as rodovias, que encurtam distâncias
e tempo. As ferrovias, então, passam a atender aos interesses
das grande empresas, sobretudo nas áreas de mineração
e siderurgia. Muitos ramais passam a não mais transportarem
passageiros. O tempo romântico do apito do trem, a chamar
para o embarque, passou.
Em Minas Gerais, principalmente , a rede ferroviária terá
como prioridade o transporte de minério.
Travessia do Rio Curimatai – Trecho Corinto
– Montes Claros (RFFSA)
É
inegável a rapidez dos transportes rodoviários. O
custo, porém, é elevado, o que afeta sensivelmente
populações economicamente carentes. Assim, a população
de baixa renda viu-se prejudicada com a paralisação
do transporte ferroviário.
Hoje
restam poucas linhas disponíveis para transportes de passageiros.
A prioridade se dá para o transporte de cargas. Restam, também,
curtos ramais utilizados apenas com fins turísticos.
Obras de construção de um viaduto em
Montes Claros (l948) (RFFSA)
Em
1969, a Rede Ferroviária Federal sofre uma grande reestruturação
com a criação de quatro sistemas regionais. Assim,
a área atendida pela Central do Brasil fica pertencendo ao
Sistema Regional Centro. As ferrovias são classificadas como
Divisões
Operacionais, perdendo as antigas denominações de
Estradas de Ferro.
Em março de l996, a Rede Ferroviária Federal é
privatizada e dividida em quatro empresas: Companhia Paulista de
Trens Metropolitanos (CPTM), para atender o transporte suburbano
de São Paulo; a MRS Logística, que opera com bitola
de 1,60 m; a Super-Via, no sistema suburbano do Rio de Janeiro,
e a FCA – Ferrovia Centro Atlântida, para o sistema
com bitola de l,00 m.
Atualmente
as ferrovias brasileiras atendem essencialmente as atividades da
iniciativa privada.
Construção
do trecho Montes Claros a Monte Azul (l948) (RFFSA)
Estação Ferroviária de Montes Claros em 1926
(Facella)
Monumento a Francisco Sá – Praça Raul Soares
– Montes Claros
A
inesquecível
Felicidade Perpétua Tupynambá
Ruth Tupinambá Graça
Cadeira N. 96
Patrono: Tobias Leal Tupinambá
A
data 20 de Junho de 1909 é sagrada para mim. Nesse dia, no
sobrado numero 18, (que ainda existe) na Praça Dr. Chaves,
ao lado do Centro Cultural Dr. Hermes de Paula, nasceu numa hora
feliz, Felicidade Perpétua Tupynambá, filha do casal
Josefina Mendonça Tupynambá e Tobias Leal Tupynambá.
Começou
sua vida escolar no Grupo Escolar Gonçalves Chaves, onde
fez o primário e mais tarde diplomou-se normalista na Escola
Normal Oficial Melo Viana, de Montes Claros. Era estudiosa, perspicaz,
e apesar de dificuldades de transporte e comunicação
da nossa cidade, com grande força de vontade, ela conseguiu
fazer vários cursos em Belo Horizonte e São Paulo:
Arte na Educação, Psicologia da Arte em função
de Recreação, vários cursos de psicologia infantil
que lhes proporcionaram cultura, talento, experiências das
quais ela soube aproveitar transmitindo às nossas escolas
no esforço de bem servir.
Com o diploma em mãos, lecionou na Escola Estadual Professor
Plínio Ribeiro, Colégio Imaculada Conceição,
Instituto
Norte Mineiro, Colégio Diocesano, aulas de Educação
Física, Artes, Sociologia e Psicologia, aposentando-se depois
de 30 anos de magistério.
Sua caminhada foi um rastro de luz deixando, por onde passava, seus
raios incandescentes de amor. Naquele coração só
existia espaço para a ternura, tinha sempre uma palavra amiga
para acalentar o coração dos que sofriam.
Fely (como carinhosamente a chamávamos) deixou uma maravilhosa
obra literária. Da sua mente prodigiosa passaram para a posteridade
muitos livros de contos e poesias e durante muitos anos seus poemas
e crônicas abrilhantaram as paginas de diversos jornais de
nossa terra, com tanta sensibilidade que levou o escritor Nelson
Viana chamá-la de “A Pérola de Montes Claros”.
Foi ela quem, com sua experiência e vontade de servir implantou,
juntamente com Marina Fernandez Silva, o Conservatório Estadual
Lorenzo Fernandez, que tantos benefícios vem prestando a
juventude montesclarense e de toda nossa região.
Felicidade Perpétua recebendo titulo de Personalidade
do Ano no Automóvel
Clube de Montes Claros no dia 25 de maio de 1985.
Implantou
o Curso de Pedagogia (Normal) no Colégio Imaculada Conceição.
Também o Centro Cultural de Moc deve a Fely a sua fundação.
Como artista plástica de reconhecida capacidade criativa,
na década de 40, juntamente com Godofredo Guedes, organizou
a primeira exposição” Salão de Artes
Plásticas em Montes Claros.
Pertencia à Academia Montesclarense de Letras como sócia
efetiva e secretária, ao lado da Presidente Professora Yvonne
Silveira que até hoje se lastima pela sua ausência
e a falta da sua eficiente colaboração.
Fely era uma mulher extremamente bonita, educadíssima, elegante,
uma perfeita “Lady”. Era alegre gostava de cantar, dançar,
declamava muito bem, tanto que era solicitada em todas as reuniões
e festas em que ela estivesse presente e o fazia com tamanha sensibilidade
e perfeição que muitos assistentes não conseguiam
conter as lágrimas...
A característica principal da sua personalidade era ajudar
a quem precisasse.
Para ela não havia diferença entre ricos e pobres,
pretos ou brancos. Era afável com qualquer um e amiga de
todos.
Nunca se casou embora tenha sido muito cortejada. Teve muitos namorados
e até noivo, mas ela queria mesmo era ser livre.
Mas os seus feitos não se restringiram só à
área cultural. Era decidida, enérgica e firme nos
seus objetivos, valores que impulsionavam suas atitudes. Por isto
ela foi a primeira mulher que, enfrentando os preconceitos da nossa
sociedade (e os “tabus” daquela época) aceitou
o cargo numa repartição pública. Admitida na
Prefeitura Municipal de Montes Claros (gestão do
Dr.
Santos) permanecendo no cargo de Chefe de Gabinete por 30 anos.
Passou por onze Prefeitos, ocupando, por duas vezes, o cargo de
Vice-Prefeito (por afastamento dos titulares) governando a nossa
cidade.
Podemos afirmar que entre os filhos de Montes Claros, nos últimos
60 anos ninguém tenha exercido ou ocupado maior espaço
político e cultural na vida da cidade do que esta abnegada
professora.
Sua cultura emoldurada pelas pesquisas se eternizou como autora
da preciosa obra “O Mundo Interior da Criança”.
Numa linguagem clara, precisa e objetiva, a autora torna possível,
através da arte e do desenho, penetrar na alma infantil de
uma maneira mais delicada e mais agradável.
Com sua experiência adquirida na Escolinha de Artes (fundada
por ela) e como professora de Artes Plásticas e Psicologia,
a autora oferece aos pais, educadores e alunos do Curso de Especialização,
Pós graduação, Pré-primário uma
oportunidade para
grandes descobertas e válidas experiências.
Nesta comemoração do centenário de vida de
Felicidade Perpétua Tupynambá, ela marcará
com esse livro sua passagem por esta Montes Claros que ela tanto
amou e tanto beneficiou. Que ele seja bem aproveitado, fazendo jus
ao que sua autora tanto almejou.
Que o exemplo de Felicidade Perpétua Tupynambá seja
uma bandeira para seguirmos. Que todos os montesclarenses perpetuem
a memória desta inesquecível professora que dedicou
sua vida inteiramente, a Montes Claros, durante os 90 anos de sua
existência.
UM
SONHO NA MADRUGADA
Wanderlino Arruda
Cadeira N. 33
Patrono: Enéas Mineira de Souza
Normalmente,
chegávamos à casa do professor José Oliveira
Fonseca, na Rua Carlos Pereira, às cinco da manhã.
Todos os dias, de segunda a sábado, lá estávamos
para a aula de análise sintática e de outras questões
mais objetivas da língua portuguesa. Não éramos
muitos, mas, éramos bastante curiosos e interessados, principalmente
o Mauro Lafetá, o Corbiniano Aquino, o Afrânio Nogueira,
o Adil Oliveira e eu. Eles, candidatos ao vestibular de Direito
em Pouso Alegre ou Niterói; eu, estudante do curso de Letras,
aproveitando a maestria do professor Fonseca, o melhor que passou
pela matéria em Montes Claros.
Era um tempo excelente, alegre, pleno de maduro entusiasmo, sonhos
de pessoas que, a certa altura da vida, sabem o que fazer e com
que se ocupar. O Afrânio acabava de deixar as aulas de primeiro
estágio do madureza e já cursava, à noite,
as últimas unidades para enfrentar o segundo grau, num esforço
tremendo de ano e meio entre a escola primária e a universidade.
O Mauro, com toda aquela pose que Deus lhe deu, sério, compenetrado,
sonhador,
quase já exigia que o tratássemos de Doutor. Era tudo
uma beleza, embora o professor nunca nos tenha dado um cafezinho
para espantar o sono do levantar tão cedo...
Foi por aí, madrugadas em transformação de
aurora, manhãs de gostoso friozinho para pouco agasalho,
que o professor e nós fizemos as primeiras propostas para
a fundação da Faculdade de Direito. Entre uma análise
e outra, entre um verbo e um substantivo, uma nova observação
sobre o futuro da segunda faculdade de Montes Claros. Quem estaria
disposto a colaborar? Com quais advogados poderíamos contar
para a formação do corpo docente? Quem poderia ser
o primeiro diretor? Onde funcionar? Onde buscar apoio financeiro?
Eram perguntas e mais perguntas, tão constantes e tão
assíduas como os próprios formuladores. Não
durou muito tempo a temporada de sonhos e cogitações
e, em menos de um mês, já estávamos, na rua,
buscando apoio, tendo-o
encontrado no deputado Euler Lafetá, tio do Mauro e homem
próximo ao governo, e no Inspetor Zezinho Fonseca, que ficou
mais entusiasmado do que nós próprios. A luta tomara
corpo, criava-se do espírito de séria decisão.
O Mauro cada vez mais encantado e, antecipadamente, vitorioso.
Iniciamos as primeiras consultas aos principais advogados, através
de uma comissão - Mauro, Afrânio e eu - num desdobramento
de trabalho feito antes por Francolino Santos e Corby. Ninguém
pode imaginar nem prever as reações humanas e profissionais
diante de um desafio. Quem poderia calcular onde estaria o interesse
pessoal, o desprendimento, o entusiasmo ou, ao contrário,
o medo de futura concorrência? Quem poderia acreditar naqueles
sonhadores, querendo fazer as coisas de baixo para cima, invertendo
toda a lógica aceitável?
Realmente, diante da proposta, futuros mestres mostraramse ora alegres,
ora tristes, na maioria das vezes terrivelmente irônicos.
“Quem” era mesmo que queria fundar uma faculdade de
Direito em Montes Claros? Que saberiam aqueles três sobre
espírito
universitário? Loucos, era o que pensavam que éramos...
Por que não iam estudar por correspondência como fizeram
tantos outros, passeando de vez em quando? Seria mais fácil
do que criar uma escola...
Dois fatores tornaram-se importantíssimos em nossa luta:
O Jornal de Montes Claros ficou contra, afirmando a não necessidade
de formação de novos bacharéis, o mundo já
estava muito cheio de advogados; apareceram interessados em nosso
trabalho o professor João Luiz de Almeida e os deputados
Francelino Pereira e Cícero Dumont. Doutor João cedeu-nos
as instalações do Instituto para funcionamento da
escola e se dispôs a ser o primeiro diretor; Francelino levou
as idéias e os planos ao governador Magalhães Pinto;
Cícero organizou os estatutos da Fundação.
Ninguém poderia segurar mais. O contra e o a favor estimularam
ainda mais nossa frente de batalha. A reação da imprensa
provocou um desafio, a ajuda dos amigos poderosos deu o tempero
que faltava.
Quase cinqüenta anos depois, o curso de Direito continua mais
do que vitorioso, um dos mais importantes da Universidade Estadual
de Montes Claros! Tenho bem guardadas as gravações
do dia definitivo da fundação, reunião realizada
na Rua S. Francisco, na Delegacia de Ensino, sala de trabalho de
José Monteiro Fonseca!
A
GRANDE NOITE DA CÂMARA
Wanderlino Arruda
Cadeira N. 33
Patrono: Enéas Mineira de Souza
Podia
ter sido uma reunião como qualquer outra, mas não
foi. Era a noite de uma sexta-feira dezessete, com apenas um assunto
na pauta, sem presença obrigatória. A ordem do dia
era a entrega de um diploma de cidadania como já fora feito
às centenas nos últimos anos, a todo tipo de gente
de muito ou de algum mérito, mas nunca de nenhum. Presentes
uma maioria pequena de vereadores, toda administração
e bom número de funcionários do Banco do Brasil, o
secretário da administração municipal, o presidente
do Sindicato dos Bancários, o padre Aderbal Murta, uma boa
vizinhança da
Rua Cairo, filhos e genros do cidadão empossado Roque Ferreira
Barreto. Um auditório, para bem da verdade, lotado, todas
as cadeiras ocupadas, muita assistência de pé. De jornalista
só um, mas muito ilustre: Haroldo Lívio de Oliveira.
Um bom cenário para um grande acontecimento.
E entrega de diploma de cidadão honorário de Montes
Claros dá sessão importante? A resposta lógica
é que não, tantas vezes a cerimônia foi repetida,
tantos foram os discursos de agradecimento,
sempre a mesma retórica, tantas as saudações
de autores dos projetos, constantes os mesmos argumentos biográficos.
A imprensa nem mais dá atenção, não
vai lá, não noticia, parece até num pacto de
esquecimento deliberado. Será que ser cidadão de Montes
Claros já nada mais acrescenta? Será que o “honorário”
não mais é uma questão de muita honra? É
uma incógnita para os matemáticos das pesquisas de
opinião, pois quando um assunto não mais dá
ibope é preciso pesquisá-lo mesmo que seja por curiosidade.
Ou há uma campanha surda e silenciosa contra as homenagens
da Câmara?
Veja o leitor que tenho razão de estar escrevendo, aqui,
sobre o assunto. É que a reunião do diploma do Roque
Barreto não foi uma sessão comum, foi uma apoteose,
a que esteve presente até o meu amigo Jair Caldeira, por
sinal um dos mais entusiasmados. Tudo preparado em matéria
de promoção - louve-se mais uma vez o Roque como o
relações-públicas do ano - não faltou
um só detalhe da parte do público, já que a
Câmara nem poderia suspeitar do banquete cívico que
convocara. É que os amigos e colegas do novo cidadão
não foram lá de brincadeira, levaram o assunto a sério,
começando pela pontualidade. Na hora marcada, a casa já
estava cheia, com Roque sem saber se ficava sentado ou de pé,
tanto convidado havia para receber, para dar tapinhas nas costas.
Do lado pessoal, é bom explicar que o discurso do Roque já
estava pronto há dois meses, datilografado em espaço
três, fita nova na máquina para ficar mais visível,
letra grande, vocabulário escolhido, frases curtas, pontuação
equilibrada, lugares marcados para gesticulação, tempo
cronometrado, tudo planejado como se fosse a fala do trono da Inglaterra.
Um capricho na minha vida de redator. A indumentária do dono
da festa foi o nosso assunto mais importante do último mês:
a cor do terno, um azul entre o cinza e o chumbo, a camisa, a gravata
de crochê com matizes de ultramar, as meias com baguetes em
relevo, os sapatos de pelica negra novinhos e bem polidos, tudo
novo até o lenço e a cueca...
O
nó da gravata e o colarinho foram objeto de muito cuidado
até à última hora, segundos antes de ser recebido
pela comissão introdutória composta dos vereadores
Cláudio e Pimentel.
As presenças do padre Murta, representante do poder espiritual;
de Luiz Modesto e José Lúcio, do poder econômico;
de José Maria, do poder executivo; de Juarez Antunes, do
poder sindical; dos vizinhos e familiares, do poder do amor; da
própria Câmara, como poder legislativo; e nossa - falo
em nome de quase uma centena de funcionários do Banco do
Brasil - o maior poder de apoio e de aplausos que um baiano de Amargosa
pode receber na vida. Nada faltou, ou quase nada, notada apenas
a ausência de Ildeu Gonzaga, que poderia ter dado um show
à parte. Foi uma noite de glória, de emoção
nunca vista, nunca ouvida ou apalpada. Foi como se cada um estivesse
ligado a uma antena de sensibilidade.
Só para terminar, sem exagero: da tribuna, até o lugar
que lhe foi destinado, Roque Barreto levou dez minutos para chegar,
pois Câmara e Mesa se derramaram em cima dele de abraços
que nunca acabavam. O Haroldo quase chorou, ele é o descobridor
do Roque como carnavalesco dos anos sessenta (Carnaval em Moc só
na base do Roque). Do plenário até a porta da rua,
vinte minutos. Já ia me esquecendo: o Roque foi levado à
Câmara pelo Jadir Colares Duarte, melhor motorista e dono
do mais lindo e rico automóvel da classe bancária:
um Del-Rey metálico prateado, novinho, zero e pouco! A Globo
não sabe o que perdeu: já pensou se ela tivesse televisionado
tudo, assim com quatro ou cinco câmaras, buscando cada detalhe?
Parabéns ao Vereador Milton Cruz por ter inventado o projeto.
COMPANHEIRO
Yvonne de Oliveira Silveira
Cadeira N.5
Patrono: Antônio Ferreira de Oliveira
Tu
foste o companheiro, o escolhido,
Para comigo andar pelo viver.
E, por longos anos, nosso amor vivido
Amparou-me com a força do teu ser.
Sem o amor a união teria ido
Para o abismo letal, sem se deter,
E eu não poderia ter sentido
A felicidade de te pertencer.
Companheiro, de ti me orgulhei,
Do teu caráter, da dignidade
A dirigir-te no labor constante.
Partiste, porém, e nesta soledade,
A dor me consumindo, já bem sei
Que irei encontrar-te a qualquer instante.
Dezembro de 2009.
Yvonne de Oliveira Silveira e Olyntho Silveira
SÍTIO
AZEDO
Yvonne de Oliveira Silveira
Cadeira N.5
Patrono: Antônio Ferreira de Oliveira
Quando
o prof. Juvenal Caldeira Durães, meu colega de magistério
na E. E. Prof. Plínio Ribeiro e na Faculdade de Filosofia,
publicou o livro Experiências de uma Vida, surpreendeu a todos
nós.
Professor de matemática, ciência que não admite
especulações sem base teórica, muito menos
fantasias, dedicado e competente, depois de aposentado, surge escrevendo
livros. As memórias, bem escrito, sem saudosismos cansativos,
texto interagindo com o autor, homem equilibrado e correto. E aí
estão as Experiências de uma Vida na prateleira dos
memorialistas da Literatura Montes-clarence, guardando as recordações
do prof. Juvenal Durães, em espaço e tempo da historia
de Montes Claros.
Causando nova surpresa, eis outro livro, o Sitio Azedo, que apresentamos
nesta noite, vindo revelar-nos que, ao lado do estudo das ciências
exatas, também, se dedicou à literatura dos poetas,
romancistas, filósofos e sociólogos, pelas citações
que faz, narrando a historia de Fátima, personagem que provoca
o libelo do prof. Juvenal Durães.
O
Sítio Azedo não é romance nem memória
ou nenhuma das espécies do gênero literário
narrativo, embora uma narrativa.
Isto, porém, não importa e, sim, o seu valor, o interesse
que desperta no leitor, interligando-o ao libelo do autor contra
a situação de contrastes do nosso País, riqueza
e miséria, belezas naturais e construídas nas capitais,
e secas e abandono, no sertão.
O confrade Petrônio Braz, no Prefacio, é menos categórico
e, em vez de libelo, considera o Sítio Azedo um retrato fiel
das desigualdades sociais, um alerta, uma crítica.
Já o outro confrade, Dário Cotrim, também prefaciando,
classifica-o de “análise dos absurdos da política
brasileira”.
Concluímos, por estas ponderações, que o autor,
aproveitase da história de Fátima para mostrar os
abusos do poder, e protestar.
Fátima, real ou fictícia, é natural do Sítio
Azedo, um dos muitos espaços de aglomerados humanos do Brasil,
diz o autor: “Um lugar desprovido dos mais elementares recursos
e de meios propícios para a sobrevivência digna do
ser humano”.
É o espaço onde vive a família de José
e Antônia, escolhida, assim esclarece-se “... para que
eu pudesse relatar, com fidelidade a realidade vigente..”.
Com esta afirmativa está clara sua intencionalidade.
Se o Sítio Azedo, José, Antônia e Maria de Fátima
existem ou não, o leitor fica entre o estado intermediário
de realidade e ficção, angustiado com o sofrimento
de muitos brasileiros, ou admirando a produção inteligente
do autor.
Assim, a técnica narrativa do Sítio Azedo, para nos
mostrar a “realidade vigente”, é um ir e vir
entre as duas realidades: a história
de Fátima, de miséria e sofrimento e as descrições
da beleza e riqueza das capitais dos Estados do Norte e Nordeste.
A miséria vem do abandono dos que governam com a corrupção
e abusos do poder.
Neste ir e vir, as citações de poetas, filósofos
e autores reforçam as reflexões do autor e revelam
as fontes em que vem bebendo conhecimentos e inspiração.
A narrativa do Sítio Azedo é construída através
das realidades, predominando a vida da personagem central, pois
é desta vida, no espaço sem moral, de promiscuidade,
fome, doenças, vidas sem Deus, mas alimentadas pelo fanatismo
do milagroso padre Cícero, que o autor faz um interessante
tecido, deixando o leitor revoltado com a existência do Sítio
Azedo, e atraído pela leitura até o final, quando
Fátima, depois de abandonar pais, marido brutamontes e filhos,
alcança a libertação, o bem estar, a felicidade.
É possível? Sim, pois a miséria não
é espaço para o amor de mãe, para nenhum amor.
Inteligentemente, o autor Juvenal Durães usou a técnica
narrativa de lançar o seu libelo contra uma realidade dolorosa
de injustiças sociais centralizando a vida de uma personagem
daquele ambiente, em vez de uma simples explanação,
em texto discursivo.
Cria um universo dietético fascinante, para colocar o leitor
revoltado e, ao mesmo tempo preocupado com a impossibilidade de
nada poder fazer para melhorar a situação.
A reconstituição da história de Fátima
sem diálogos, apenas com algum monólogo interior -
ou inventada - é cristalizada a partir do encontro do autor
com ela – personagem do universo
Petrônio
Braz, Wanderlino Arruda, Yvonne Silveira, Dario Cotrim, Juvenal
Caldeira e dona Rosa
dietético
de chagas impiedosas e incuráveis, nos deserdados, é
a essência do libelo de Juvenal Durães no Sítio
Azedo.
A força da tensão da narrativa está subentendida
no sofrimento de um brasileiro – o meu colega Juvenal - com
realidade vigente – cito-o novamente.
Ao apresentar o seu livro, atendendo, prazerosamente, o seu convite,
afirmo que você deixa a frieza do cálculo para o calor
da fantasia literária, usando a palavra – precioso
dom de Deus - em vez dos números, a fim de produzir textos
de valor e encantamento para os que os lerem.
Apresento-lhe, com minha admiração e felicitações,
os aplausos da Academia Montesclarense de Letras, desejando-lhe
sucesso na nossa caminhada, a que nos dá o prazer de produzir
e encantar: a caminhada do lutador com a palavra, bem mais fácil
e encantatória do que com os números.
Parabéns, Juvenal.
_________________________________________
Apresentação do livro “Sítio
Azedo”, no Centro Cultural Hermes de Paula, lançamento
do referido livro, pela Profa. Yvonne de Oliveira Silveira. Presidente
da Academia Montesclarense de Letras; Membro do Instituto Histórico
e Geográfico de Montes Claros / IHGMC. Em 05/02/2010.
_________________________________________
RETALHOS
HISTÓRICOS
Zoraide
Guerra David
Cadeira N. 86
Patrono: Patrício Guerra
Tentando
organizar meu acervo literário, dentre pilhas de papel, deparo-me
com um soneto, datado na década de 80, autoria do poeta Mariano
Félix Goes:
Educadora
À emérita Profª Zoraide Guerra David
Alcandorada e excelsa educadora
Da Escola Normal de Montes Claros,
Levas à juventude sonhadora,
No idioma português, teus dons aos avaros...
Educas com visão supervisora
Pelos teus dotes culturais e raros,
Que te fazem feliz, na redentora
Trajetória dos teus ideais preclaros.
Prossigas
teu caminho enflorescido,
Rumo ao solar da glória além erguido
A espargir o tesouro da cultura...
Legar à juventude o ideal saber,
È ser Pátria, é ser Mãe, é Tudo
ser
- É ser divinizada criatura!
A
emoção impulsionou-me a localizar um acróstico
que teci homenageando a Escola Normal. Datado de 21 de setembro
de 1971, em cópia mimeografada, publicado num jornal daquele
educandário, eis sua mensagem:
MENSAGEM
DE CONFRATERNIZAÇÃO
Zoraide Guerra David
Aos caros colegas e alunos do Colégio Estadual Prof. Plínio
Ribeiro, pela comemoração do seu 92º aniversário.
Companheiros, marchemos corajosos,
Olhar sereno e puro o coração,
Limiando a estrada esperançosa
E enobrecendo tão árdua missão.
Galgar os cimos e sentir a glória
Infinita de dar-se ajuda ao irmão
O que mais poderia premiar-nos?
E dar certeza de uma boa ação?
Se a nós compete cultivar com esmero,
Ter que lutar e ser heróico e forte,
Aangústia, o cansaço, o desespero,
De nós que se afastem a qualquer sorte.
União faz a força. Eis a verdade,
A pontada na vida a cada instante.
Levando-nos a ser: REALIDADE
Pelo
elo entre o mestre e o estudante
Ressurgir confiante a cada tombo
Ou esmagar o egoísmo vil.
Fluidificar a dor, erguer do escombro
E lutar honestamente com armas mil,
Sentir que a energia recobrou-se,
Sorrir quando o desejo é só chorar,
Olhar e perceber que realizou-se
Rico trabalho: ensinou-se a amar.
Pelos festejos do nosso Colégio,
Leais, felizes, com ardor e fé,
Ivestidos do nobre privilégio,
Não neguemos ação. Prontos! De pé!
Incentivemos nosso aluno a ser,
O homem ou a mulher do amanhã,
Reafirmando que estudar é ter
Infinda recompensa; nunca vã.
Buscai caros alunos compreender:
Estudar é preparar Brasil seguro.
Investir contra o mal é proceder
Renhida luta em busca do futuro.
O tempo é ouro e belo é o saber !
Gratificante
usar da memória para reviver e aquilatar o valor da missão
de educadora naquele conceituado educandário.
Dentre tantos colegas dignos, destaco o responsável, educado
e competente professor Simeão Ribeiro Pires. Ele que já
galgara o cimo do destaque social, político, econômico
e literário, deixava extravasar em seus bate-papos na Sala
dos Professores uma simplicidade cativante.
A 27 de dezembro de 2007, surge um momento marcante para Montes
Claros.
Foi
criado o Instituto Histórico e Geográfico de Montes
Claros, com a “missão de pesquisar, interpretar e
divulgar fatos históricos, geográficos, etnográficos,
arqueológicos, genealógicos, assim como fomentar
a cultura, a defesa e a conservação do patrimônio
histórico, artístico e cultural de Montes Claros
e do Norte de Minas”.
Ao transcrever esse excerto da apresentação da Revista
do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros
– Volume I, página 09, referendo seus objetivos,
enfocando esses dois patrimônios históricos: a Escola
Estadual Professor Plínio Ribeiro – Escola Normal
de Montes Claros e o historiador Simeão Ribeiro Pires -
patrono da cadeira 93, da referida agremiação cultural,
ocupada pelo atual presidente e reconhecido historiador Dário
Teixeira Cotrim.
A corrida do tempo não apagou a lembrança dos momentos
vividos naquele educandário. Porque: aqueles estudantes
que ajudamos a formar na Escola Normal são profissionais
hoje prestando serviço a comunidade norte-mineira e o Instituto
Histórico e Geográfico de Montes Claros - Casa de
Simeão Ribeiro Pires -, ao prestar-lhe essa homenagem de
resgate histórico, está a afirmar-nos seu senso
de justiça norteando sua dinâmica de trabalho, enquanto
estimula-nos a darmos nossa contribuição tão
necessária.
VIDA
DE SACRIFÍCIOS E DE VITÓRIAS
Avay Miranda
Sócio Correspondente
Brasília/DF
Normalmente
uma pessoa que teve vida pública, somente depois da morte
que os fatos de sua existência são destacados. Aí
os jornais e outros meios de comunicação dão
a sua biografia, narrando as passagens principais de sua família
e os feitos de sua vida.
Nesta matéria, a pedido de parentes e amigos, quero deixar
registradas algumas passagens de minha vida, que, como está
no título, é cheia de sacrifícios, porém,
com muitas vitórias, até não esperadas, além
de registrar passagens especiais na minha vida profissional.
Nasci na Fazenda Coqueiro, em Taiobeiras, em 21 de junho de 1937.
Sou o terceiro filho de Isalino Miranda Costa e de Elvira Mendes,
cujo casal gerou uma grande prole, de 13 filhos, dos quais, 11
estão vivos. Quando criança, eu era muito raquítico,
sentia indisposição até para brincar e minha
família achava que não tinha condições
de sobreviver. Porém, fui crescendo e adquiri uma boa saúde,
que até hoje não faço uso contínuo
de qualquer medicamento.
Aprendi
as primeiras letras em escola particular, com a Professora Joana
Rodrigues de Souza, na Fazenda Coqueiro. Executei todo serviço
de roça, que está a altura de uma criança.
Meu pai fazia moagem de cana, fabricava rapadura e tinha tenda
de farinha, além de criar gado leiteiro, porcos e galinha.
Eu guiava os bois carreiros, era o encarregado de cuidar dos animais,
conduzia as vacas para as mangas e para o curral, apartava os
bezerros, alimentava os animais pequenos.
Posteriormente, meu pai instalou uma fábrica de cachaça
e eu era o alambiqueiro.
O meu pai possuía um grande pomar, próximo da casa.
Na sexta-feira eu colhia e no sábado ia vender frutas na
feira de Taiobeiras, conduzidas num carro de boi, como laranja,
tangerina, manga, carambola, figo, banana, mamão, abacate,
pêssego e outras.
Fico admirado quando os Congressistas criam leis proibindo o trabalho
de menores, limitando a idade de 16 anos para começar trabalhar.
Não sou a favor do trabalho análogo ao escravo,
mas, trabalho não é negativo para ninguém.
Quando o jovem passou dos 16 anos, ele já está com
sua personalidade formada, querendo namorar, não tem condições
de aprender a trabalhar.
Comecei
a trabalhar muito cedo e acho que isto apenas me fez bem. Gosto
do trabalho. Tanto que me aposentei e continuo trabalhando, por
prazer.
Em fevereiro de 1952, como eu e meus irmãos estávamos
em idade escolar, meus pais transferiram residência para
Taiobeiras, onde frequentei a escola da Professora Elizabeth Rodrigues
de Souza e a partir de agosto de 1952 e em 1953, fiz o 2º
e o 3º anos primários com o Professor Péricles
de Araújo Passos.
Este professor notou que eu era dedicado aos estudos e com facilidade
de aprender os ensinamentos, passou a me incentivar a sair de
Taiobeiras para continuar os estudos em outras cidades. Nos domingos,
ele me convidava para almoçar com ele, quando me narrava
as vantagens de continuar os estudos e de minhas possibilidades
futuras. Posteriormente, ele procurou o meu pai e disse que ele
deveria aproveitar o potencial que existia em mim e me enviar
para outra cidade para continuar a estudar.
Meu pai disse que me daria todo o apoio moral, mas, financeiro,
por causa da quantidade de filhos, ele não tinha condições
de me dar. Então decidi que eu teria que trabalhar durante
o dia e frequentar à noite. Resolvi ir para Montes Claros,
a cidade mais próxima que oferecia condições.
No dia 20 de janeiro de 1954 saí de Taiobeiras, com destino
a Montes Claros. O transporte foi um caminhão e eu, juntamente
com outros passageiros, viajamos sobre a carga daquele veículo.
Demoramos dois dias, por estradas de terra, para percorrer pouco
menos de 300 quilômetros. Em períodos de chuva já
viajei três dias de caminhão para fazer o percurso
de Montes Claros a Taiobeiras. Hoje, com a estrada asfaltada,
se gasta três horas para fazer o percurso de 260 km.
Chegando em Montes Claros, fui hospedar-me numa pensão
de uma conterrânea, que ficava na Rua Dom João Pimenta.
Montes Claros, em 1954, tinha uma população em torno
de 100 mil habitantes. A cidade era composta pelo centro e os
bairros principais eram: Roxo Verde, Cintra, Santo Expedido, Alto
São João, Santos Reis, Morrinhos e Vila Brasília.
Como Montes Claros atraía muita gente de fora, estavam
em implantação, os Bairros São José,
Todos os Santos, Cândida Câmara, Santa Rita, Ipê,
hoje denominado Edgar Pereira, e o Bairro de Lourdes.
A luz era gerada em uma usina tocada a motores a diesel, instalados
num lote de terreno da esquina das ruas Grão Mogol e Padre
Augusto, onde é a sede da CEMIG, atualmente.
Comecei
a trabalhar na Indústria de Laticínio São
José, depois transformada na Cooperativa Agro Pecuária
de Montes Claros. Em cinco meses, trabalhei em todos os setores
do Laticínio, exceto o Laboratório e o Escritório.
Submeti-me ao concurso de Admissão, fui classificado e
comecei a fazer o curso ginasial. Não fiz o 4° ano
primário. Tinha o 3° ano e passei no curso de admissão.
Como o salário que recebia não dava para as minhas
despesas, tive que mudar para um pensionato, na rua São
Francisco, acima da linha férrea, pagando um valor menor
para alimentação e dormida. Depois residi numa pensão
na Rua Carlos Pereira, outra na Rua Rui Barbosa e, finalmente,
fui residir no Hotel Glória, na Rua São Francisco.
Fiz o curso Ginasial, entre 1954 e 1957 e, em seguida, o Curso
Técnico em Contabilidade, entre 1958 e 1960, no Instituto
Norte Mineiro de Educação, todos no turno noturno.
Turma do Curso Técnico em Contabilidade
no INME
A
partir de agosto de 1954 fui trabalhar na loja de tecidos, denominada
Casa Mato Verde, instalada na Rua Coronel Antônio dos Anjos.
Por orientação de meu pai, em fevereiro de 1955
fui para Belo Horizonte para continuar os estudos naquela capital.
Matriculei-me num curso noturno e comecei a frequentar as aulas.
Entretanto, a exemplo do que aconteceu em Montes Claros, precisava
trabalhar para sustentar-me e manter os estudos.
Não consegui um emprego fixo. Fui ser vendedor de uma casa
atacadista. Foi muito bom, porque conheci vários bairros
de Belo Horizonte, daquela época. Como a renda não
estava dando para a minha manutenção, tive que regressar
para Montes Claros.
Em de março de 1955, fui trabalhar no Bazar Queiroz, situado
na Rua Rui Barbosa, nas lojas da Prefeitura Municipal, que foram
demolidas, onde hoje existe o Shopping Popular. Em janeiro de
1959, casei-me com uma montes-clarense, Maria de Lourdes Mendes,
tendo com ela seis filhos, montes-clarenses: Ireny, Avay Júnior,
Denir, Ely Renê, Cláudio Amaury e Hernani Leonardo.
Trabalhei no Bazar Queiroz de 1955 até o final de 1959.
Em 1960 coloquei uma loja de tecidos, confecções
e calçados, em sociedade com meu sogro, na Rua Coronel
Antônio dos Anjos, também, numa das lojas da Prefeitura
Municipal, que foi demolida, posteriormente.
Anos depois vendi a loja da Rua Coronel Antônio dos Anjos
e coloquei uma loja de brinquedos e confecções para
crianças, na Rua Simeão Ribeiro.
Fiz o vestibular e iniciei o curso de Direito em 1965, fazendo
parte da primeira turma da Faculdade de Direito do Norte de Minas
- FADIR, de Montes Claros, colei grau no dia 8 de dezembro de
1969. Fui o primeiro aluno daquela Faculdade a conseguir a inscrição
na OAB-MG, sob o nº 19.201, porque já trabalhava no
Setor Jurídico do Banco do Nordeste do Brasil S/A.
Colação de Grau em Direito, em 08/12/1969
Em
1966 fui candidato a Vereador, em Montes Claros, pela ARENA-2,
recebi 401 votos. Não fui eleito, porque faltaram 15 votos
na minha legenda, então fiquei na primeira suplência.
Por causa da legenda, tomou posse, como o 15° vereador, um
candidato do MDB, menos votado.
A minha vida em Montes Claros foi muito sofrida. No início
senti muito a minha separação da família,
uma vez que nunca havia saído da companhia de meus pais
e irmãos. Lutei com dificuldade para criar os filhos. Não
tinha condições nem de comprar um veículo
velho. Meu meio de transporte era a bicicleta. Somente no final
de 1968 que comprei o primeiro veículo, um Jeep Willys.
A minha vida começou a melhorar, depois que fui para o
Banco do Nordeste do Brasil S/A.
Fiz concurso para Escriturário no Banco do Nordeste do
Brasil S/A, sendo classificado, vendi a loja da Rua Simeão
Ribeiro e fiquei aguardando a chamada do Banco. Fui nomeado para
a agência de Guanambi-BA, onde tomei posse, ficando naquela
agência de outubro de 1967 a agosto do ano seguinte.
Em Guanambi entrosei-me bem com a sociedade local, criei a Associação
Comercial e Industrial de Guanambi e fundei um jornal com o nome
de “O Jornal de Guanambi”. Nesta cidade fui admitido
como sócio do Lions Club de Guanambi. Quando voltei para
Montes Claros, transferi minha filiação para o Lions
Club de Montes Claros.
Voltando para Montes Claros, apesar do tempo em que fiquei em
Guanambi, no início de 1968, fui a Montes Claros e fiz
as provas finais do ano anterior, na Faculdade de Direito. Com
o meu regresso a Montes Claros, continuei no 4° ano da FADIR,
cursando mais duas matérias do 3° ano, porque não
havia frequência suficiente para ser aprovado no ano anterior
e terminei o curso de Direito, junto com a primeira turma, em
dezembro de 1969.
O Banco do Nordeste do Brasil S/A necessitava de um Advogado para
assumir o serviço na Agência de Montes Claros. Por
indicação do gerente Cecílio de Souza Barbosa
Júnior, em 1970 fui chamado para fazer um estágio
no Departamento Jurídico do Banco, em Fortaleza –
Ce, onde passei quatro meses.
Depois daquele estágio, voltei para Montes Claros e fui
trabalhar como advogado do Banco em todo o Norte de Minas e em
Belo Horizonte. Como Solicitador, não podia assinar as
petições iniciais, então eu elaborava as
peças, enviava para o Departamento Jurídico do Banco,
em Fortaleza, lá eram assinadas por um advogado e devolvidas
para eu encaminhar ao Juiz e acompanhar até o final.
A direção da Faculdade e os formandos lutaram muito
para conseguir o seu reconhecimento pelo Ministério da
Educação.
Fui
um dos que empenharam nisto, indo até o Rio de Janeiro
entrar em contato com membros do Conselho Nacional de Educação,
pedindo prioridade.
Como a FADIR foi reconhecida pelo Ministério da Educação,
peguei uma declaração do Banco de que eu necessitava
do registro na Ordem para ocupar o cargo, a OAB-MG me concedeu
prioridade no registro, que foi o primeiro dos formados da FADIR,
como registrado acima.
Como advogado do BNB, participei de diversos seminários
promovidos pelo referido Banco, em Salvador, Recife e Fortaleza-Ce.
Exerci o cargo de Advogado do Banco do Nordeste no Norte de Minas,
atendia a todas as agências então existentes em Minas,
como Montes Claros, Brasília de Minas, Januária,
Porteirinha e Salinas, atuando em todas as Comarcas da Região.
Em 1976 fiz concurso para Juiz de Direito do Estado de Minas Gerais.
Fui classificado, mas, não quis ser nomeado inicialmente,
porque, como advogado do BNB, ganhava mais do que um Juiz. Morei
em Montes Claros 23 anos e cinco meses, com uma pequena interrupção
de 10 meses que residi em Guanambi-Ba.
Presidente do Tribunal do Júri, em Janaúba, em 02/04/1979.
Em 1977, aceitei a nomeação, depois da reforma do
Judiciário e que os vencimentos do Juiz em Minas ficaram
mais compatíveis com a responsabilidade do cargo. No dia
31 de julho de 1977, tomei posse como Juiz de Direito da Comarca
de São Francisco. Ali permanecendo até março
de 1978, quando fui removido, a pedido, para a Comarca de Janaúba.
Permaneci
em Janaúba até março de 1980, quando fui
promovido, por merecimento, para a Comarca de Francisco Sá,
então de segunda entrância.
No mês de junho de 1980 submeti-me ao concurso para Juiz
de Direito Substituto da Justiça do Distrito Federal, tendo
êxito, fui nomeado e tomei posse em 15 de setembro de 1980.
Como Juiz Substituto, atuei em quase todas as Varas de Brasília,
inclusive o Tribunal do Júri e fui promovido para Juiz
de Direito, sendo o primeiro titular da 3ª Vara Cível
de Taguatinga.
Prestando compromisso na posso no Cargo de Juiz
de Direito Substituto, no
dia 15/09/1980, no Tribunal de Justiça do Distrito Federal.
Como
Juiz titular, fui convocado para atuar no Tribunal de Justiça
como Desembargador Substituto. Participei de vários Congressos
de Magistrados, de âmbito nacional, especialmente em Belo
Horizonte, Campo Grande, Goiânia e Recife. Completando meu
tempo, aposentei-me em abril de 1988.
Em setembro de 1984 contraí segundas núpcias com
Lúcia Miranda Brito, com quem não tenho filhos.
O filho Avay Miranda Júnior casou-se com Anágela
Silveira de Sá, também montes-clarense e teve os
filhos: Pedro Henrique, casado com Mariana Melo Machado; Maria
Clara, Giovani e Luíza Mariana; Denir Mendes Miranda casou-se
com Maria Cristina Gouveia Paranhos Miranda e tem os filhos: Rafael
e Luiz Filipe; Ely Renê Mendes Miranda, casou-se com a peruana
Êmiko Karina Arrunategui Miranda e tem as filhas Natália
e Cecília; Cláudio Amaury Mendes Miranda, casou-se
com montes-clarense Symone Rodrigues Jardim e tem os filhos Tiago
e Lucas; e o caçula, Hernani Leonardo Mendes Miranda, em
23.01.2010, casou-se com Patrícia Teixeira Casela.
UM
POUCO DA VIDA PÚBLICA
Ao longo da minha vida, fui agricultor, industriário, comerciário,
comerciante, bancário, advogado e Juiz de Direito em três
Comarcas do Estado de Minas Gerais e no Distrito Federal.
Em 1956, fui servir ao Tiro de Guerra. Frequentava as instruções
a partir da 6 horas da manhã, trabalhava durante o dia
na loja Bazar Queiroz, estudava à noite e ainda sobrava
tempo para namorar. Mesmo com todas estas incumbências,
dava conta de tudo. Terminei a prestação de serviço
ao Tiro de Guerra com zero ponto perdido. Não cometi nenhuma
falta naquele ano e somente assim consegui esta condição.
Nunca fui reprovado nos estudos.
A Família de Isalino Miranda Costa e D.
Elvira Mendes.
Quando prestava Serviço Militar, em 1956.
Em
Montes Claros participei de vários movimentos sociais e
fiz parte de diversas entidades. Como estudante, participei do
Diretório Central dos Estudantes Secundaristas de Montes
Claros.
O Rotariano Idelbrando Mendes arregimentou uma plêiade de
jovens, entre eles, eu fazia parte e fundamos o Orbis Clube de
Montes Claros, em 01.05.1960. Orbis Clube é um clube de
serviço, composto por jovens de 18 a 26 anos de idade.
Fui Tesoureiro, Diretor de Protocolo e Presidente deste clube
e, Governador, para os Estados de Minas Gerais e Goiás.
Em
1962, passei a ser sócio do Circulo de Trabalhadores Cristãos
de Montes Claros, do qual ocupei o cargo de Secretário
Geral, por vários anos, porque, mesmo na alternância
do poder, o novo presidente me mantinha no cargo.
Com o apoio da diretoria, criei um programa radiofônico
e fui seu apresentador durante 10 anos, na Rádio Sociedade
Norte de Minas, de prefixo ZYD-7. Participei de vários
seminários regionais e congressos nacionais dessa organização,
especialmente em Salvador, Belo Horizonte e São Paulo.
Além de apresentar o programa na ZYD-7, eu passei a transmitir
notícias rápidas das ruas. Fui o locutor da solenidade
de instalação do Escritório da SUDENE em
Montes Claros e transmiti alguns comícios da política
local e de candidatos ao governo do Estado.
Concomitantemente, eu era comerciante e ocupei o cargo de Secretário-Geral
da Associação Comercial e Industrial de Montes Claros
– ACI. Numa de suas reuniões semanais, sugeri a criação
de uma associação para congregar todos os Municípios
Mineiros da área de atuação da SUDENE, que
foi a ideia geradora da AMAMS. A sugestão foi criando corpo,
o Prefeito da época, Dr. Pedro Santos apoiou e, posteriormente
virou esta potência que é hoje, de suma importância
para todos os Municípios do Norte de Minas que fazem parte
da área da SUDENE.
Quando era Secretário-Geral da ACI, no mandato do Presidente
Alberto Celestino Ferreira, aconteceram coisas engraçadas.
Como exemplo, era Prefeito de Montes Claros o Dr. Pedro Santos.
Como ele não tinha apoio político suficiente, todas
as iniciativas para melhoramentos de Montes Claros eram encabeçadas
pela ACI, chegou ao ponto de numa reunião ordinária,
quando a Diretoria estava discutindo uma ideia para reivindicar
melhoramentos dos governos Estadual e Federal, o Presidente Alberto
Celestino Ferreira desabafou: “parece que a ACI virou o
Legislativo e o Executivo de Montes Claros.”
Foi
graças à atuação da ACI, nas décadas
de sessenta e setenta, que Montes Claros conseguiu o início
do asfaltamento da estrada para Belo Horizonte, o aeroporto asfaltado,
a transmissão da energia elétrica de Três-Marias,
a ligação do interurbano, a transmissão da
televisão de Belo Horizonte, a instalação
do Distrito Industrial, a instalação do Escritório
da SUDENE, a ligação asfáltica com a BR-116,
a Rio-Bahia e muitos outros melhoramentos.
Como Secretário-Geral da ACI, juntamente com a Secretaria
Executiva da entidade, elaborei uma monografia sobre Montes Claros,
denominada “A SUDENE COMEÇA EM MINAS”, na qual
demonstrava seus aspectos físicos, climáticos, turísticos,
econômicos e mostrava a infraestrutura existente para o
progresso. Este documento foi de grande importância para
Montes Claros, porque nele demonstrei o potencial que a cidade
possuía para implantar o Distrito Industrial.
Com alguns colegas de Escola, criamos um Jornalizinho para dar
notícia sobre as atividades de nossa turma e do Instituto
Note Mineiro de Educação. Waldyr Senna Batista era
o redator de “O Jornal de Montes Claros” e estudava
na mesma escola. Ele tomou conhecimento de nosso Jornalzinho,
então me convidou para ser colaborador daquele Jornal.
Passei a escrever crônicas, fazer pequenas reportagens e
depois o Waldyr Senna Batista me passava incumbências maiores,
como cobrir um encontro de Prefeitos que se realizou em Januária,
o encontro de investidores, realizado em Pirapora, visita de autoridades
a Montes Claros e muitos outros.
Naquela época a Delegacia de Polícia de Montes Claros
era ocupada, geralmente, por Policiais Militares reformados. Waldir
Senna Batista e eu sustentamos uma campanha, pelo Jornal, com
notícias e entrevistas com as autoridades locais, sobre
a necessidade de designação de Delegado, Bacharel
em Direito, para ocupar o cargo, ou seja, que a Delegacia de Polícia
fosse ocupado por um membro da Polícia Civil. Logo em seguida,
a campanha obteve êxito, com a designação
pelo Governador do Estado de um Delegado, Bacharel em Direito.
Nesta época passei a ser o correspondente em Montes Claros,
do “Diário de Minas”, de Belo Horizonte, onde
consegui várias manchetes de notícias interessantes,
sendo uma delas, uma grande notícia que enviei sobre o
fenômeno da água quente natural, existente no Distrito
de Água Quente, do Município de Rio Pardo de Minas,
que não era conhecida fora da região. Na época
havia poucas casas residenciais no local.
Em 1972, era Prefeito de Taiobeiras o meu pai, Isalino Miranda
Costa. Em determinado dia, chegou em Taiobeiras um Diretor do
DER com o jornal que publicou a notícia e perguntou onde
ficava aquela localidade. O meu pai disse que a reportagem fora
feita pelo filho dele e cedeu o transporte para o Diretor do DER
ir à localidade no Município de Rio Pardo de Minas.
O DER interessou pelo assunto, construiu uma casa no local, melhorou
o estado das estradas, incentivou o pessoal de Belo Horizonte
e de outras cidades a visitar a localidade para desfrutar do fenômeno
da água quente natural. Outras casas foram construídas,
a população aumentou, dando condições
para o Distrito se emancipar politicamente de Rio Pardo de Minas,
em 1° de janeiro de 1993 e tornou-se no Município de
Montezuma.
A minha passagem pelo jornalismo foi uma boa escola. O sistema
de redação que aprendi para escrever as notícias
e os artigos me serviu para todos os concursos que fiz, depois
disto.
Waldir Senna Batista teve a ideia de se criar as associações
dos moradores dos bairros. Convidou-me para participar do movimento
e, juntamente com ele, elaboramos o estatuto, fundamos as primeiras
associações dos moradores de Bairros em Montes Claros
e criamos a UNAB – União das Associações
de Moradores de Bairros de Montes Claros.
Naquela
época, como Montes Claros passava por uma fase de prefeitos
inoperantes e ruins, o Orbis Clube, do qual eu fazia parte, resolveu
lançar uma campanha de esclarecimento politico. Em parceria
com a direção de “O Jornal de Montes Claros”
criamos uma coluna semanal, denominada “Coluna de Debates”
e eu fui encarregado de escrever as matérias. Durante vários
meses o Orbis Clube abordou os temas relacionados com a Administração
Municipal, criticando os erros e indicando os caminhos que achava
corretos.
Pode ter sido coincidência, mas, as facções
políticas de Montes Claros, compostas pela ARENA-1, ARENA-2
e o MDB, resolveram lançar candidato único e com
o apoio de toda a sociedade, foi eleito o Sr. Antônio Lafetá
Rebelo, que fez uma ótima administração.
Por ser ele Rotariano, assimilou todas as ideias dos jovens componentes
do Orbis Clube e transformou Montes
Claros. Portanto, temos a história da Administração
de Montes Claros dividida em duas partes: antes e depois da gestão
Antônio Lafetá Rebelo.
Eu já havia vendido a loja da Rua Simeão Ribeiro
e estava esperando ser chamado pelo BNB para tomar posse do cargo
de Escriturário, quando o Prefeito Antônio Lafetá
Rebelo me convidou para ocupar o cargo de Auxiliar de Gabinete,
cujo cargo exerci até o mês de outubro de 1967, quando
fui tomar posse no BNB em Guanambi - BA.
Quando Antônio Lafetá Rebelo foi candidato a Prefeito,
em 1966, fui candidato a vereador, ficando na primeira suplência
da ARENA-2. O titular, Vereador Jonas Alves de Almeida entrou
de licença por 4 meses, em 1969, como primeiro suplente,
exerci o cargo por igual tempo.
Não
sou daqueles que medem a atividade do vereador pela quantidade
de projetos de leis apresentados. Acho que o país já
possui muitas leis, falta é o cumprimento delas, por isto,
não apresentei nenhum projeto de lei, mas, ofereci várias
sugestões por meio de requerimentos, proposições
e pedidos de envio de ofícios a autoridades e de fiscalização
das atividades da Administração Municipal.
Exerci o meu tempo de vereador em Montes Claros, tendo como companheiros
pessoas dignas e conceituadas, como Dr. Simeão Ribeiro
Pires, Dr. Sidney Chaves, Dr. Francisco José Pereira, Wanderlino
Arruda, Pedro Narciso, Dr. José da Conceição
Santos, Neco Santa Maria e muitos outros.
Quando saiu a estatística anual da Câmara de Vereadores,
no fim de 1969, fui surpreendido com a informação
de que eu fui o Vereador que mais apresentou requerimentos e proposições
naquele ano, tendo exercício a vereança apenas três
meses, porque um mês foi de recesso.
Em 1962 ingressei na Conferência Bom Jesus da Lapa, da Sociedade
de São Vicente de Paulo. Fui secretário, Tesoureiro,
Vice-Presidente e Presidente da referida Conferência. Fui
Presidente do Conselho Particular de Montes Claros, fui o primeiro
Presidente do Conselho Regional de Montes Claros e depois primeiro
Presidente do Conselho Central de Montes Claros, ocupando, ainda,
a Vice-Presidência do Conselho Metropolitano de Diamantina,
da SSVP.
Juntamente com outros confrades, fundei o Curso de Formação
Vicentina, o que possibilitou a preparação de vicentinos
para a expansão do movimento em todo o Norte de Minas (a
respeito da minha atuação na SSVP, a Revista n°
IV, do IHGMC publicou uma matéria mais ampla).
Indicado pelo Padre Geraldo Majela de Castro, antes de ser Bispo
da Diocese de Montes Claros, fui um dos três primeiros leigos
(com Geraldo Avelar e Mauro de Carvalho Lafetá), a fazer
o Cursilho de Cristandade, em Belo Horizonte, em maio de 1970.
Depois o Cursilho foi criado na Diocese de Montes Claros e proferi
palestras em vários cursos.
Sou sócio-fundador da Academia Montes-clarense de Letras,
sócio correspondente da Academia Anapolina de Letras, Ciências
e Arte, de Anápolis-Go e da Academia Taguatinguense de
Letras, do Distrito Federal. Sou cidadão honorário
de Buenópolis e Janaúba, em Minas Gerais e de Taguatinga,
no Distrito Federal e sócio correspondente do Instituto
Histórico e Geográfico de Montes Claros. Por indicação
do Deputado Cleuber Carneio, fui agraciado com a Comenda do Mérito
Legislativo, pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais, tendo
recebido a Comenda em sessão solene, realizada no dia 15
de setembro de 1998, em Belo Horizonte.
Em 1968 fui admitido como sócio do Lions Club de Guanambi-BA.
Quando voltei para Montes Claros, fui transferido para o Lions
Club de Montes Claros. Algum tempo depois pedi demissão
do Lions e desde 1988, com a retirada do limite de idade para
ser orbiano, que faço parte do quadro social do Orbis Clube
de Brasília, tendo ocupado o cargo de Diretor de Protocolo
e, por vários anos, o cargo de Diretor Regional para o
Centro Oeste, de Orbis do Brasil. Participei de várias
Plenárias do Orbis Clube. Fui escolhido como “Orbiano
Padrão” na 30ª Plenária de Caratinga-MG,
em 1988, na 46ª Plenária de Guaíra-SP, em 2004
e na 51ª Plenária, de Brasília-DF, em 2009.
Em 1986 lancei um livro de crônicas em Montes Claros, Taiobeiras
e em Taguatinga-DF, denominado “CRÔNICAS: Desenvolvimento,
Política e Folclore”, tendo no apenso uma Monografia
sobre a história de Taiobeiras. Estas crônicas foram
publicadas em “O Jornal de Montes Claros” ao longo
de diversos anos.
Depois de aposentado, como Juiz de Direito, voltei para minha
terra natal, Taiobeiras, filiei-me ao Partido Democrata Cristão
– PDC e fui candidato a Prefeito, em 1988, apoiado pelo
Prefeito Geraldo Sarmento de Sena. Não fui eleito, mas,
entre quatros candidatos, fiquei no segundo lugar.
Restabeleci
a inscrição da OAB-MG e instalei um escritório
de Advocacia em Taiobeiras, tendo advogado durante o ano de 1989.
Transferi meu Escritório de advocacia, em 1990 para Brasília-DF.
Em 1991 fui convidado pelo hoje Ministro do Supremo Tribunal Federal,
Gilmar Ferreira Mendes, para ocupar o cargo de Assessor Jurídico
da Presidência da República, servindo aos Presidentes
Fernando Collor de Melo e Itamar Franco.
No Governo de Itamar Franco, eu fui nomeado substituto do Chefe
da Assessoria Jurídica da Presidência da República.
Quando o Chefe assumiu o cargo de Ministro da Casa Civil, eu exerci
a Chefia daquela Assessoria Jurídica, por vários
meses.
Em 31 de dezembro de 1993, pedi exoneração do cargo,
para ser candidato a Deputado Estadual em Minas Gerais, em 1994,
pelo PFL, mas, não consegui me eleger, embora tivesse expressiva
votação, recebendo votos em 132 Municípios
de Minas Gerais.
Anteriormente, só se referia aos Municípios do Norte
de Minas, individualmente. Atendendo a sugestões de amigos
de Taiobeiras, adotei a ideia de se cunhar a expressão
“Vale do Alto Rio Pardo”, como meio para os Municípios
daquela região criar uma consciência coletiva de
reivindicação. Depois de muita luta, na minha campanha,
com entrevistas e pedidos aos Órgãos Públicos,
o nome pegou, que hoje é conhecido em todo o país.
Reativei o meu Escritório de Advocacia em Brasília,
onde exerço a profissão até hoje, em sociedade
com o advogado Léo Sebastião David.
Estando filiado ao PFL, ocupei o cargo de Delegado junto ao Diretório
Regional de Minas Gerais. Em 1996, sai candidato a Prefeito de
Taiobeiras, numa coligação de meu Partido com o
PPB e o PSB, com a denominação de “Frente
Viva Taiobeiras”. Não fui eleito, mas, fiquei em
segundo lugar, entre os candidatos. Logo depois desfiliei-me do
PFL e filiei-me ao Partido Social
Cristão
– PSC, exercendo o cargo de Delegado junto ao Diretório
Regional de Minas Gerais. Em 1988 elaborei um programa de governo
para sustentar minha campanha. Em 1996, atualizei o programa.
Várias de minhas ideias, sobre a administração,
foram adotadas pelo Sr. Denerval Germano da Cruz na sua primeira
campanha e sendo eleito na segunda campanha, associadas às
ideias próprias dele, colocou aquelas ideias em prática
o que contribuiu para Taiobeiras despontar como o Município
de maior desenvolvimento no Vale do Alto Rio Pardo.
Em 1997 editei um livro da história de Taiobeiras, com
a denominado de “Taiobeiras, seus Fatos Históricos”,
tendo sido lançado em Taiobeiras, Berizal, Montes Claros
e Belo Horizonte, com grande repercussão na cidade, na
região e em Minas Gerais, uma vez que Taiobeiras se tornou
a quarta cidade do Norte de Minas a ter sua história contada
em livro. No apenso ao livro, foi publicada a história
de Berizal, então Distrito do Município, escrita
por Maria Antônia Gomes dos Santos, professora naquela localidade.
Tenho
muita preocupação em preservar a cultura, especialmente
as tradições e o folclore, proporcionar meio para
o desenvolvimento do artesanato e da manutenção
dos marcos históricos de Taiobeiras, tendo reunido alguns
artistas e artesãos e fundado a Sociedade dos Amigos das
Tradições de Taiobeiras (SOATA), infelizmente, ela
está inativa e com os comerciantes e industriais, fundei
a Associação Comercial e Industrial de Taiobeiras
(ACIT), muito atuante.
FATOS
MARCANTES
Passo
a narrar alguns fatos que aconteceram na minha vida profissional,
especialmente de advogado e de Juiz de Direito. Deixo de mencionar
os nomes de alguns participantes dos fatos referidos, por motivos
óbvios.
EM
MONTES CLAROS. Registro dois fatos marcantes, em Montes Claros.
O primeiro. Um fato que aconteceu comigo na Câmara de Vereadores.
Naquele tempo vereador não tinha vencimento e nem qualquer
outro benefício. Houve uma proposição de
um vereador para que a Câmara de Vereadores de Montes Claros
enviasse uma moção ao Presidente da República
e ao Ministro da Justiça, pedindo que se instituísse
uma remuneração para os Vereadores.
Na hora da votação, cada Vereador manifestava o
voto, de acordo com seu pensamento e alguns encaminhavam o voto,
justificando sua posição. No encaminhamento do meu
voto, aleguei que eu achava que o Vereador não devia ganhar
nada para exercer esta função pública e que
eu já vinha trabalhando pela comunidade como voluntário
e nada recebia. Além disto, aleguei que em 1966 nós,
candidatos a vereador, informamos aos eleitores que queríamos
trabalhar pelo povo sem nenhuma pretensão pessoal, portanto,
o meu voto foi contra aquela proposição.
Foi o único voto contrário à proposição.
Portanto eu fui minoria absoluta e foi o voto que muito me honrou.
Tive orgulho daquele único voto, porque até hoje
penso que a vereança deve ser exercita gratuitamente, por
pessoas de espírito público, como eram todos os
candidatos de 1966.
O segundo fato. Em 1976, eu era advogado do Banco do Nordeste
do Brasil S/A e concursado para Juiz de Direito de Minas Gerias.
Naquela época o concursado somente era nomeado quando manifestasse
interesse ao Presidente do Tribunal. Fui classificado no concurso,
mas não aceitei a nomeação inicialmente.
Fazia parte do corpo de jurados da Comarca de Montes Claros. Num
julgamento de um crime considerado bárbaro, eu fui sorteado
e aceita a minha atuação, o Juiz que presidia o
Júri instalou o julgamento. Atuei com bastante atenção,
tomando nota de todas as fases do Júri. Depois elaborei
um roteiro que me serviu de orientação como Juiz.
Por isto não tive nenhuma dificuldade em presidir os Júris,
na minha vida de Juiz. Quando vim para Brasília, atuei
no Tribunal do Júri, passei este roteiro para os colegas,
que foi oficializado no Júri do Distrito Federal.
O Juiz que presidia o Júri em Montes Claros mandou o Escrivão
ler várias peças do processo e uma delas era o depoimento
de uma criança que disse que seu pai estava viajando e
chegou um homem, dirigindo um trator, para abrir uma rua num Bairro
de Montes Claros. Quando chegou próximo à sua casa,
o tratorista informou à sua mãe que tinha que derrubar
aquela casa.
Sua mãe argumentou para o tratorista que não tinha
para onde ir e que seu marido estava viajando, que esperasse quando
ele chegar para resolver esta questão. Mas, o tratorista
não aceitou e então começou uma discussão
entre a mãe da criança e o tratorista.
Num determinado momento da discussão, o tratorista muito
nervoso disse para a mãe da criança: “sai
da frente sua égua, senão eu vou passar o trator
entre as suas pernas”.
Nisto, juntou muita gente e convenceu o tratorista a não
derrubar a casa. Quando o marido chegou de viagem, ficou sabendo
do acontecido, pegou uma espingarda procurou o tratorista e o
matou. Era este homem que estava sendo julgado.
O Promotor de Justiça era muito bom de serviço e
fez uma acusação arrasadora. O Advogado que defendeu
o réu foi meu professor na Faculdade, fez uma defesa muito
fraca, que deixou muito a desejar, eu mesmo não estava
convencido do meu voto. No final da instrução, o
Juiz perguntou se algum jurado queria que lesse alguma peça
do processo. Então eu pedi para repetir a leitura do depoimento
da criança.
Naquele tempo as pessoas gostavam muito de assistir os julgamentos
e o auditório do Fórum Gonçalves Chaves estava
lotado. Durante a leitura da peça eu ouvi um zum zum zum
no auditório, por causa do impacto da leitura. O Réu
foi absolvido e eu fui para casa.
No dia seguinte, estava eu na minha sala de trabalho, no BNB,
quando a secretária veio me avisar que duas pessoas queriam
falar comigo. Pedi para entrar e para minha surpresa, era o Advogado
com o seu cliente e ao entrarem na minha sala, o Advogado me disse:
“eis aqui o homem que você livrou ontem da cadeia,
estamos aqui para lhe agradecer.”
EM SÃO FRANCISCO. Tomei posse como Juiz de Direito da Comarca
de São Francisco, no dia 31 de julho de 1977. No mês
de novembro do mesmo ano, aquela cidade comemorou o seu centenário
de emancipação política. Houve uma grande
festa e eu fui o Juiz do Centenário, com direito a discursar
na solenidade e ter uma foto na contra capa do livro do Sr. Brasiliano
Braz.
Certo dia veio à minha mesa de trabalho, uma Ação
de Reintegração de Posse, com pedido de liminar.
Examinei o processo e verifiquei que o Sr. João Teixeira
Lima, por meio de um procurador, vendeu uma fazenda no Município
de São Francisco para uma pessoa física e esta pessoa
vendeu o imóvel para uma empresa reflorestadora.
Algum tempo depois, João Teixeira Lima chegou no local
e ocupou a casa sede da fazenda. O gerente da Fazenda procurou
o invasor e disse que aquela fazenda pertencia à reflorestadora,
mas, o vendedor afirmava que ele tinha autorizado a vender apenas
uma parte da fazenda.
Eu não tive dúvida, concedi a liminar e determinei
a expedição do Mandado de Reintegração
de Posse. No prazo concedido, o Oficial de Justiça devolveu
o Mandado cumprido. Aquela foi mais uma ação que
passou pelas minhas mãos.
No fim de 2009, José Geraldo Aguiar, de São Francisco
lançou um livro, com o título: LAMPIÃO, o
invencível, duas vidas e duas mortes. Esta minha decisão
está registrada no referido livro, sabem por que? João
Teixeira Lima, segundo José Geraldo Aguiar, é o
próprio Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião,
o Cangaceiro, que não foi morto na emboscada de 1938, mas,
ele havia renunciado ao cangaço fugiu do Nordeste, depois
de vários anos chegou ao Norte de Minas Gerais, tendo residido
em vários Municípios e, em cada um deles, ele adotou
um nome diferente. Residiu no Município de São Francisco
por vários anos e faleceu em Buritis, em 1993.
EM JANAÚBA. Em Janaúba houve dois episódios
relacionados com a Barragem do Bico da Pedra. Em 1978, a meu pedido,
eu fui removido da Comarca de São Francisco para a Comarca
de Janaúba. O governo Federal estava construindo a Barragem
do Bico da Pedra, cuja Barragem fica acima da cidade de Janaúba.
Terminada a construção, aguardou-se o período
chuvoso, que
começou no início de 1979. Os Engenheiros calculavam
que somente depois de dois anos de chuva que a Barragem encheria.
Mas, o início de 1979 foi bastante chuvoso, tendo a Barragem
enchido e sangrado em apenas 20 dias de chuvas constantes, o que
levou muita apreensão aos moradores da cidade, que temiam
a quebra da Barragem e a inundação da cidade.
Quando a Barragem estava enchendo, a mídia passou a dar
notícias espalhafatosas e muitos amigos meus de Montes
Claros telefonavam, sugerindo que eu retirasse a minha família
daquela cidade, por causa da possibilidade da quebra da Barragem.
Além disto, fiquei sabendo que muitas pessoas perguntavam
nas ruas se o Juiz permanecia na cidade e frequentando o Fórum.
Com a resposta positiva, estas pessoas falavam que se o Juiz continuava
em Janaúba é porque não havia perigo.
Com isto, vi minha responsabilidade aumentar. Então pedi
um encontro com o Engenheiro responsável pela construção
da Barragem e perguntei se ela era segura. O Engenheiro me levou
até a Barragem e demonstrou que não havia perigo
da Barragem quebrar, porque o maior volume de água era
retido por uma serra. Fiquei tranquilo e nada houve.
O segundo episódio. Tão logo anunciou o término
da construção da Barragem, os pequenos proprietários,
que tiveram suas terras desapropriadas passaram a me procurar
para informar que não receberam o valor da indenização
de suas terras, querendo uma solução. Eu explicava
para eles que eu era Juiz da Justiça do Estado e o problema
deles seria resolvido na Justiça Federal, em Belo Horizonte.
Como eles não entendiam deste assunto e achavam que procurar
o Juiz da Comarca era o suficiente, determinei a um funcionário
da Justiça que tomasse nota do nome e endereço de
todos aqueles que iam ao Fórum reclamar que não
receberam a sua indenização.
Antes da inauguração, um Engenheiro do Órgão
Federal que construía a Barragem, o DNOCS ou a CODEVASF
pediu ao Prefeito Vildemar Maximino da Cruz para convocar uma
reunião com as autoridades de Janaúba e o povo em
geral, que ia explicar as vantagens da Barragem.
Eu fui convidado e levei comigo uma relação de mais
de 100 pequenos proprietários que não receberam
a indenização.
Na reunião, realizada no Automóvel Clube, o Engenheiro
falou das vantagens da Barragem, da irrigação que
seria implantado às margens do Rio Gurutuba, da geração
do emprego e renda, do tempo que gastou para a construção
da Barragem e outros detalhes, se colocou à disposição
dos presentes para tirar as dúvidas.
Depois de muitas perguntas dos presentes e resposta do Engenheiro,
eu pedi a palavra e perguntei sobre a indenização
dos desapropriados. O Engenheiro informou que tudo estava certo
e que o Governo não devia a ninguém mais. Eu ainda
perguntei
se
ele tinha certeza disto e recebi a resposta positiva. Então
eu disse que a informação dele não correspondia
com a realidade local, porque os prejudicados estavam procurando
o Fórum para reclamar que não receberam as indenizações
e entreguei a ele a relação de mais de 100 pessoas.
O Engenheiro ficou sem ambiente e disse que era outro setor que
tratava deste assunto, mas, ele ia levar a relação
dos prejudicados para tomar providências. Este fato causou
grande repercussão na comunidade janaubense e foi relembrado
em várias oportunidades.
EM BRASÍLIA. No início de 1980, fui promovido para
a Comarca de Francisco Sá. Fiz o concurso para Juiz de
Direito Substituto do Distrito Federal, fui classificado e tomei
posse no dia 15 de setembro daquele ano.
Atuei em várias Varas de Brasília. Meses depois
fui designado para a 3ª Vara Cível e Família
de Taguatinga. Eu sempre fui um Juiz muito aberto e democrático.
As pessoas falavam comigo, quando queriam.
Estava em meu Gabinete, quando a Secretária veio me avisar
que havia uma comissão de pessoas querendo falar comigo.
Pedi para que eles entrassem na minha sala.
Tratava-se de uma comissão de pessoas da SSVP – Sociedade
de São Vicente de Paulo e me disseram que sabiam que eu
era um Juiz muito humano e não tolerava injustiça.
Informaram que uma senhora idosa, moradora na Ceilândia
que, de parente, tinha apenas uma neta. Então a idosa resolveu
doar a sua casa residencial para a neta com o compromisso da neta
deixá-la residir na casa durante vida tiver. É o
que chamamos na linguagem jurídica de “usufruto vitalício”,
mas, que esta condição não constou da escritura
de doação.
Informaram que a neta entrou na Justiça, com uma ação
de despejo e o Mandado já estava com o Oficial de Justiça
para ser cumprido e o processo tramitava naquela Vara que eu estava
respondendo. Pedi para vir o processo à minha mesa e verifiquei
que a informação tinha procedência. Perguntei
se a idosa tinha testemunha de que a combinação
foi como eles disseram. Com a resposta positiva, pedi para que
eles voltassem no dia seguinte, que eu teria uma solução.
Peguei o processo e levei para casa e não achava uma solução,
porque se tratava de uma sentença judicial, já transitada
em julgado, isto é, não podia ser modificada.
A única solução que encontrei foi suspender
o cumprimento do Mandado de Despejo, por motivos humanitários
e determinei que as partes negociassem um acordo. No dia seguinte
informei à comissão de vicentinos e dias depois
eles me avisaram que a neta resolveu cumprir o combinado e deixou
a avó residindo na casa, durante vida tivesse.
CONCLUSÃO
Assim, minha vida é cheia de sacrifícios e vitórias.
Hoje estou satisfeito com o que sou. Ocupei cargos que nunca pensei
que aquele filho de agricultor pudesse alcançar. Tive a
graça de dar uma boa formação moral e cultural
aos meus filhos. A Ireny é enfermeira e trabalha na Secretaria
de Saúde do Distrito Federal; Avay Miranda Júnior
é Agrônomo e trabalha na Apex-Brasil, uma Agência
do Governo Federal, destinada a promover as exportações
de produtos brasileiros; Denir Mendes Miranda, cursou Línguas
e trabalha na Direção Geral do Banco Central; Ely
Renê Mendes Miranda é Arquiteto, tem suas atividades
inerentes ao curso, em Petrolina-Pe.; Cláudio Amaury Mendes
Miranda fez o curso de Desenho Industrial e trabalha na Direção
Geral do Banco do Brasil S/A, em Brasília; e Hernani Leonardo
Mendes Miranda, cursou Relações Púbicas e
trabalha no setor compatível, na Petrobras, no Rio de Janeiro.
Continuo na luta, animado como antes, dando valor à vida,
ajudando a quem precisa, na medida de minhas possibilidades.
_________________________________________
*Avay Miranda é taiobeirense, Juiz aposentado
e sócio correspondente do IHGMC
LUTA
CONTRA OS ÍNDIOS DUROU
100 ANOS
Jeremias Macário
Sócio Correspondente
Vitória da Conquista/BA
Milhares
de nativos foram dizimados pelos portugueses, mas a luta durou
mais de um século até que os colonizadores conquistassem
definitivamente o território do Sertão da Ressaca.
As emboscadas, as traições e as armas de fogo marcaram
uma era sangrenta contra as tribos. Antes, os Camacans, os Mongoiós,
Imborés e os Pataxós já guerreavam entre
si com arcos e flechas pela disputa das terras.
Naquela vastidão de território viviam os índios
em suas aldeias, armando suas tendas de lugar em lugar, se sustentando
da caça e da pesca. Depois da ocupação do
litoral, o homem branco voltou-se para o interior do sertão
na busca do ouro e de pedras preciosas. O governo custeava os
bandeirantes e ordenava a ocupação das terras dos
nativos com o uso da força, provocando
matanças.
João Gonçalves da Costa tinha a incumbência
de ocupar todo território e criar condições
de povoamento. Alguns estudiosos do assunto citam que os índios
que habitavam nas terras atuais de Conquista só foram vencidos
pelos colonizadores depois de muitas armadilhas enganosas, inclusive
com a disseminação de doenças.
AS TRIBOS
A tribo Camacan se caracterizava pela permanência num local,
enquanto os outros eram nômades e se deslocavam. A etnia
Camacan habitava o sul da Bahia e entre os rios Pardo e das Contas,
no sudoeste. Calcula-se que essa tribo de cerca de cinco mil índios,
que confeccionava bolsas e sacolas e andava nu, morava no Sertão
da Ressaca. A paz, muitas vezes era interrompida com as lutas
contra os Pataxós e Imborés quando se tratava de
delimitação territorial.
Já os Imborés e Pataxós não se fixavam
num único local, mas todos eles pertenciam ao tronco Macro-Gês.
Os Imborés eram morenos, cabelos e peles mais grossos,
e usavam botoque de madeira nas orelhas e lábios. Por isso,
eram também chamados de Botocudos e pintavam o corpo com
urucum e jenipapo.
Os Pataxós, ainda encontrados na região de Porto
Seguro, não pintavam seus corpos. Eles chegaram a se movimentar
até a região do Planalto de Conquista, guerreando
com os Mongoiós.
Os Mongoiós gostavam de dançar ao som dos chocalhos
e maracás, feitos com cabaças, cascos de veado ou
anta. Tinham respeito aos mortos e os funerais se prolongavam
por dias. Para curar as doenças usavam fumaça de
tabaco soprada sobre as doenças. Como se fixavam num território,
os Mongoiós terminaram ocupando extensas áreas onde
hoje é Vitória da Conquista.
“VALENTES FILHOS DESTE PAÍS”
Na Bahia, os primeiros colonizadores tiveram que se confrontar
com os nativos Tupis, Tupinambás, os Gês, integrados
pelos Camacãs ou Camacans, os Pataxós, Mongoiós,
os Imborés (Botocudos) e os Cariris.
Os Mongoiós, Pataxós e os Imborés habitavam
o centrosul da Bahia, especialmente na área compreendida
entre os rios Pardo e das Contas. Essas tribos foram vítimas
de ataques e destruição sob o comando do capitão-mor
João Gonçalves da Costa. Nas suas memórias
chegou a revelar que quando avistava as aldeias “me pulava
o coração com o desejo de os conquistar”.
Dentre as tribos, os Aimorés, Amburés ou Ymborés
(Botocudos) ofereceram maiores resistências e reagiam com
bravura e coragem. Eles cruzavam o Espírito Santo com Ilhéus.
Do litoral foram expulsos pelos colonizadores. Com os conflitos,
se embrenharam nas matas, mas sempre retornavampara se vingar
e atacar os engenhos e roças dos brancos.
Em visita a Belmonte e Ilhéus, por volta de 1815, o príncipe
alemão Maximiliano ficou impressionado com o vigor físico
desses índios e chegou a levar um Botocudo para a Alemanha.
Esse grupo era hostil e muito temido pelos colonos e jesuítas.
Para se ter uma idéia, o engenheiro José Antônio
Caldas, em visita à região, destacou que eles destruíam
tudo por vingança e ódio. Braz do Amaral foi mais
incisivo ao declarar que do São Francisco ao rio Doce eram
os principais inimigos dos invasores, os mais fortes defensores
da terra e os mais valentes filhos deste país.
Já os Mongoiós, Mongoioz, Mongoyós ou Monxocós,
subgrupo dos Camacãs, apesar de também defensores
de suas terras, desconfiados e discretos, eram mais dóceis
e fáceis de serem manipulados. Sobre eles, os colonizadores
disseminaram germes de doenças e praticaram atos de traição.
Esses índios eram inimigos ferozes dos Pataxós e
dos Imborés e ainda por vezes, eram encurralados pelos
brancos. Os Mongoiós eram agricultores e se juntavam em
aldeias e rancharias entre os rios Pardo e o das Contas. Em suas
conquistas, o capitão-mor chegou a cruzar com cinco aldeias
de duas mil almas. Segundo o príncipe Maximiliano, eles
possuíam organização socioeconômica
mais desenvolvida que os Pataxós e não se fixavam
num mesmo lugar.
O certo é que todos pereceram diante dos métodos
truculentos dos desbravadores sertanistas como João Gonçalves.
Os Mongoiós, por exemplo, foram escravizados, se embrenharam
nas matas e até se aliaram ao invasor para combater outras
tribos inimigas. De acordo com os historiadores, essa gente foi
obrigada a lutar contra os Pataxós e os Botocudos e não
se beneficiaram dessa aliança. O príncipe Maximiliano,
em seus escritos, testemunhou a tirania praticada pelo invasor
contra os Mongoiós.
Em sua Memória sobre a Conquista do Rio Pardo, o próprio
capitão, em 1807, confirmou a utilização
do índio como escravo. Por serem mais fácil de extermínio,
João Gonçalves chegou a demonstrar que não
queria confronto e até deixava que a etnia permanecesse
na terra. Mesmo assim, os conflitos sempre existiam. Ele mesmo
lembra a hospitalidade recebida pela tropa de 70 soldados comandada
pelos filhos Antônio Dias Miranda e Raymundo Gonçalves
da Costa no reconhecimento de uma aldeia de Mongoiós.
O Capitão aproveitou muito das disputas que esses índios
tinham
com os Pataxós e, juntamente com os filhos, chegou a presenciar
lutas de muitas mortes entre eles. Paz e animosidade marcavam
a convivência entre os colonos e essa tribo mongoió.
Mas,
os conflitos se acirraram no início do século XIX,
entre 1803/06,
quando aconteceu o que chamaram de “Banquete da Morte”.
Depois de fazerem um acordo, os índios começaram
a atrair os homens do capitão para as matas e iam eliminando-os
aos poucos. João Gonçalves, então, resolveu
fazer uma festa e convidou os índios. Quando todos estavam
no local, comendo e bebendo, os Mongoiós foram cercados
por todos os lados e dizimados.
SÍTIO
DO SÃO ROMÃO
Cônego Newton Caetano d’Ângelis
Patrono da Cadeira N. 83 do IHGMC
No
desempenho do múnus paroquial em Rio Pardo de Minas, durante
mais de três décadas, transitando pela atual rodagem
térrea, que é o novo caminho da margem esquerda
do rio Pardo, via-se, ao longe, a casa sede da fazenda do São
Romão. Hoje, tiveram (Dr. Paulo Costa, Dr. Dário
Teixeira Cotrim e eu) a oportunidade de visitá-la, já
abandonada pelos atuais herdeiros; ainda desafiam o perpassar
do tempo a frente e os respectivos cômodos, mas em ruínas
estão varias dependências internas; da senzala, depois
de transformada em Casa de Engenho e desativada, resta apenas
uma parede. O primitivismo da construção, de quase
nenhum conforto doméstico, deficiente até da própria
luz natural e ventilação, leva-nos a crer que tenha
sido o Capitão Mor Salvador Cardoso de Sá, falecido
em maio de 1755, e nosso mais antigo ancestral, que a tenha edificado.
Ignorando-se a procedência da fazenda residiu este primeiro
vigia no Destacamento de número sete do Distrito Diamantino,
nas margens do rio Pardo, deixando doze filhos legítimos
e numerosíssima descendência. Já no final
do século XVIII, ali residia o senhor Silvério Soares
Bandeira, com vários escravos, dos quais ainda conheci
quatro; Verônica, Valéria, Daniel e Ana, irmã
deste. Seguramente incompletos, recordome proprietários
da mesma fazenda: Armindo Moraes, Tibério Ferreira Neves,
José Néri de Souza e finalmente Maximino Pedro dos
Santos. (Este texto foi escrito pelo Cônego Newton Caetano
d’Ângelis no dia seis de setembro de 1997).
LIVROS
RECEBIDOS
- Constituição da República Federativa do
Brasil – Produção do Senado Federal.
- Poesia Sempre (Angola – Moçambique) nº 23.
Ano 13 - 2006
- Poesia Sempre (Portugal) nº 26. Ano 14 – 2007
- Poesia Sempre (China) nº 27. Ano 14 – 2007
- Poesia Sempre (Sérvia) nº 29. Ano 15 – 2008
- Poesia Sempre (Polônia) nº 30. Ano 15 – 2008
- Guia Curt-Lange – Acervo
- Códice Costa Matoso – Coleção das
notícias dos primeiros descobrimentos das Minas na Américas
que fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo ouvidor-geral das
do Ouro Preto, de que tomou posse em fevereiro de 1749 –
Volume 1
- Códice Costa Matoso – Coleção das
notícias dos primeiros descobrimentos das Minas na Américas
que fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo ouvidor-geral das
do Ouro Preto, de que tomou posse em fevereiro de 1749 –
Volume 2
- Barroco Mineiro: Glossário da Arquitetura e Ornamentação
– Affonso Ávila, João Marcos Machado Gontijo
e Reinaldo Guedes Machado.
- Resgate Bibliográfico de Minas Gerais – Volume
1 – Hélio Gravatá
- Resgate Bibliográfico de Minas Gerais – Volume
2 – Hélio Gravatá
- Viagens na América do Sul – Alexandre Caldcleugh
- Inventário dos Manuscritos Avulsos Relativos a Minas
Gerais
Existentes no Arquivo Histórico Ultramarino (Lisboa) –
Caio C. Boschi - Volume 1
- Inventário dos Manuscritos Avulsos Relativos a Minas
Gerais Existentes no Arquivo Histórico Ultramarino (Lisboa)
– Caio C. Boschi - Volume 2
- Inventário dos Manuscritos Avulsos Relativos a Minas
Gerais Existentes no Arquivo Histórico Ultramarino (Lisboa)
– Caio C. Boschi – Índices organizado por Júnia
Ferreira Furtado – Volume 3
-
Efemérides Mineiras (1664 – 1897) José Pedro
Xavier da Veiga
– Volumes 1 e 2.
- Efemérides Mineiras (1664 – 1897) José Pedro
Xavier da Veiga
– Volumes 3 e 4
- Efemérides Mineiras (1664 – 1897) José Pedro
Xavier da Veiga – Índice
- O Piano e a Estrada – Arthur Moreira Lima
- 1ª Conferencia Nacional de Cultura 2005/2006 – Brasília
– DF
- Quilombolas: Tradições e Culturas da Resistência.
- Manual Prático da Administração Pública
– Petrônio Braz
- Processo de Licitação: Contrato Administrativo
e Sanções Penais
– Petrônio Braz
- Direito Municipal na Constituição – Petrônio
Braz
- Eleições Municipais 2008 – Petrônio
Braz
- Manual do Assessor Jurídico de Município –
Petrônio Braz
- O Vereador – atribuições, direitos e deveres
– Petrônio Braz
- Tratado de Direito Municipal – Volumes 1, 2, 3, 4 e 5
– Petrônio
Braz.
REVISTAS
Revista da História da Biblioteca Nacional / Ano 1 –
nº 11 – Agosto
de 2006 / Ano 2 – nº 14 – Novembro de 2006 /
Ano 2 – nº 15
– Dezembro de 2006 / Ano 2 – nº 17 – Fevereiro
de 2007 / Ano
2 – nº 19 – Abril de 2007 / Ano 2 – nº
20 – Maio de 2007 / Ano
2 – nº 21 – Junho de 2007 / Ano 2 – nº
22 – Julho de 2007 / Ano
2 – nº 23 – Agosto de 2007 / Ano 2 – nº
24 – Setembro de 2007
/ Ano 3 – nº 25 – Outubro de 2007 / Ano 3 –
nº 26 – Novembro
de 2007 / Ano 3 – nº 27 – Dezembro de 2007 /
Ano 3 – nº 28 –
Janeiro de 2008 / Ano 3 – nº 29 – Fevereiro de
2008 / Ano 3 – nº
30 – Março de 2008 / Ano 3 – nº 35 –
Agosto de 2008 / Ano 3
– nº 36 – Setembro de 2008 / Ano 3 – nº
37 – Outubro de 2008
/ Ano 4 – nº 41 – Fevereiro de 2009 / Ano 4 –
nº 42 – Março de
2009 / Ano 4 – nº 43 – Abril de 2009 / Ano 4
– nº 44 – Maio de
2009 / Ano 4 – nº 47 – Agosto de 2009 / Ano 4
– nº 48 – Setembro
de 2009. / Revista Integração (vários números)
– Guanambi
– Bahia / Revista Imagem (vários números)
– Caetité - Bahia.
ÍNDICE
Diretoria do Instituto Histórico e Geográfico de
Montes Claros - 3
Lista de Sócios Efetivos do IHGMC - 5
Homenagens - 8
Apresentação - 9
Amelina Chaves
Uma Viagem no Dorso de Eros - 13
Amelina Chaves
100 anos do inesquecível Hermes Augusto de Paula - 16
Felicidade Patrocínio
Montes Claros no Cenário das Artes Plásticas Brasileiras
- 20
Felicidade Patrocínio
Sobre Geralda Magela - 37
Geralda Magela de Sena Almeida e Sousa
O que será Tabatoriba? - 46
Itamaury Telles de Oliveira
Casos Pitorescos dos Albores de uma Cidade - 53
Juvenal Caldeira Durães
Coisas do Passado - 61
Lázaro Francisco Sena
Associação Desportiva Tiradentes - 68
Luiz de Paula Ferreira
Sonhado Alto - 79
Maria Aparecida Costa
História de Atividades Sociais e Filantrópicas em
Montes Claros
Entidade a Serviço da Vida - 81
Maria Clara Lage Vieira
Dona Benzinha - 99
Maria
da Glória Caxito Mameluque
Henrique Sapori Neto - Um Construtor do Progresso - 106
Maria Luiza Silveira Telles
“Eterno Instante” - 113
Miriam Carvalho
Sobre o Poeta Olintho da Silveira - 119
Petrônio Braz
Gênese do São Francisco - 123
Roberto Pinto da Fonseca
O Trem do Sertão - 131
Ruth Tupinambá Graça
A Inesquecível Felicidade Perpétua Tupynambá
- 142
Wanderlino Arruda
Um Sonho na Madrugada - 146
Wanderlino Arruda
A Grande Noite da Câmara - 149
Yvonne de Oliveira Silveira
Companheiro - 152
Yvonne de Oliveira Silveira
Sítio Azedo - 154
Zoraide Guerra David
Retalhos Históricos - 158
Avay Miranda
Vida de Sacrifícios e de Vitórias - 162
Jeremias Macário
Luta Contra Índios Durou 100 Anos - 189
Cônego Newton Caetano d’Ângelis
Sítio do São Romão - 193
Impresso
na oficina da
GRÁFICA EDITORA MILLENNIUM LTDA.
Rua Pires e Albuquerque, 173 - Centro
39.400-057 - Montes Claros - MG
E-mail: mileniograf@viamoc.com.br
Telefax: (38) 3221-6790
_______________________________________________
Não encontrando este livro nas livrarias, solicitar por
Reembolso Postal ao Instituto Histórico
e Geográfico de Montes Claros,
Praça Dr. Chaves, 32
E-mail: ihgmc@gmail.com - Site: www.ihgmc.art.br
39400-005 – Montes Claros – Minas Gerais
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