Page 62 - VIVENDO E APRENDENDO
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VIVENDO E APRENDENDO
Nunca vi minha mãe parada, a não ser nas de horas de rezar
com o terço azul esmeralda, as contas passando devagarinho pelos
dedos acredito até calejados. Cada dia de vida começava com a fu-
maça do cuscuz e o crepitar da lenha no fogão do café e no forno
com os biscoitos. Chegado o leite do curral, era parte para a leiteira,
parte para a despensa, destinado aos queijos, aos requeijões, aos
doces caramelados com a maior gostosura do mundo, que só minei-
ro sabe fazer e guardar. Dona Anália sabia cozinhar, assar, costurar,
bordar, fazer rendas para qualquer tipo de enfeites, mestra de belezas
em enxovais ou coisas do dia a dia. Lindas as suas toalhas, bonito-
nas as colchas, importantes as blusas e os chales. Para as horas
da missa de domingo, até as fitas que ela ajeitava eram chamativas,
maravilhosas de causar inveja.
Dona Anália sabia ser amiga em todas as horas, cuidando de
visitar e receber visitas, de amar e ser amada, admirar e ser admi-
rada. Muita a sua simplicidade, sorrisos contidos, fala moderada, o
olhar sempre direto nos olhos das pessoas, nunca muito alto por não
ser arrogante, nunca tão baixo, porque jamais tímida. A forma que ela
tinha mais no ser gentil era dar alguma coisa de comer e apreciar às
pessoas, principalmente aos filhos e netos. Era chegar a sua casa e
só esperar um pouquinho, lá vinha um biscoito cozido e assado, um
beiju, um pedaço de bolo, uma canjica, um manuê, um pão sovado,
tudo feito por suas habilidosas mãos. Parece até que ela achava que
a gente mastigando e engolindo, realizava a alegria da vida e do amor.
Tudo parecia que era feito só para nós, presente especial guardado
para marcar presença.
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