Page 106 - VIVENDO E APRENDENDO
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VIVENDO E APRENDENDO
trabalho, que aí a cidade é de todo mundo e a beleza das pessoas
causa menos impacto, sem os perfumes, sem a performance dos
momentos de ócio, sem o burburinho das horas de passeio grã-fino.
A Rua Quinze que eu vi, pela manhã, era uma rua bem diferente, bem
mais vazia, embora ainda tivesse muita gente despreocupada a dis-
cutir política e futebol, a seguir, com olhos cobiçosos, uniformizadas
donzelas de longas saias azuis e cabelos de tranças.
Foi depois de contar estórias da vida na Rua Quinze, que tive
a grata alegria de receber uma carta do meu colega e amigo Ni-
comedes Almeida Teixeira, ministro-chefe da Secretaria da Fadec,
companheiro de muitas lutas na Fafil, em quatro longos anos do Cur-
so de Letras, quando frequentou minhas aulas de português e de
linguística. Se a lembrança dos meus dias de Rua Quinze era um
gostoso desfiar de saudades, a carta do Nicó me veio trazer uma
suave afirmação de compromisso com o passado, uma certeza de
que nenhum ato de nossa vida, simples ou sem importância, passa
esquecido ou desfigurado de valor, sem o mérito do ter acontecido.
Não vou interpretar a correspondência do meu intérprete. Passo-a
ao leitor assim como chegou às minhas mãos. Tem o gosto de um
grande amor a Montes Claros e ao tempo de nossa mocidade.
“Amigo Wanderlino, ao ler o seu artigo publicado, no domingo
último, intitulado “Rua Quinze”, não pude deixar de me envolver em
uma onda nostálgica, pois ali passei boa parte de minha infância.
Em fins de 1951, meu pai comprou, em sociedade com mais
dois irmãos, o Big-Bar, ponto de encontro obrigatório para os bo-
êmios da época. Ali passei momentos marcantes em minha vida,
discutindo futebol, convivendo com os artistas de rádio trazidos à
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