Page 98 - VIVENDO E APRENDENDO
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VIVENDO E APRENDENDO
Fomos morar na rua principal, próximo da pensão de Hermes
Mota Matos e D. Olindina e bem perto da casa de Tide, irmão de
Arabel, de Vital e da venda de João Neves, onde passei a trabalhar
pouco depois. Na venda de João Neves havia uma parte do balcão
coberta com um veludo verde, onde o tempo todo alguns fregueses
jogavam baralho, um jogo que não ouço mais falar dele, chamado
cunclamplê, que aprendi logo e passei a ser requisitado professor,
ensinando a quem queria jogar, mas não sabia; em três dias, eu for-
mava um campeão. Só deixei este meu primeiro magistério, como
qualquer outro mal remunerado, porque um tenente que chegou para
a delegacia, achou aquilo um absurdo e chamou meu pai e o dono
da venda para repreendê-los pelo delito contra um adolescente. Cha-
mou-me também e disse que, como eu precisava trabalhar e ganhar
o meu dinheiro, ia me deixar como balconista, mas nunca mais po-
deria me aproximar da jogatina. Foi a última vez que peguei em uma
carta de baralho ou me aproximei de qualquer jogo. Anos mais tarde,
quis encontrar o oficial da Polícia Militar de Minas Gerais, que passei
a considerar um meu grande benfeitor, mas soube que ele já havia
morrido. Foi uma pena não o ter encontrado, porque me lembro dele,
com agradecimentos, até hoje.
Lembro-me também da madrugada de 1949, início da viagem
de Mato Verde para Taiobeiras, caminhão cheio de coisas de mudan-
ça, família ainda pequena, Jurandi e Vilmar os mais novos. Meu pai
e minha mãe apressavam-me para terminar de escrever as marcas
de saudades que eu gravava com giz na calçada, parte pelos amigos
e por D. Zema, a querida professora, maior parte por deixar Pinha, a
namorada loura, de olhos azuis da cor de um céu em dia de brilho. Eu
não queria largar nada do que vivi em cinco lindos anos de existência.
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