Page 95 - VIVENDO E APRENDENDO
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WANDERLINO ARRUDA
No lado de baixo da praça tinha chegado uma família de pro-
testantes que o marido e a mulher já haviam lido a escritura sagrada
de cabo a rabo cinco vezes. Liam até de trás prá frente. Será que
Salinas seria mesmo melhor?
Descarregado o caminhão de mudança, a casa mesmo grande
ficou cheia com as coisas da família de três filhos, naquela época:
eu, o mais velho, e as duas meninas, Nair e Dercy, uma com três
anos, a outra ainda bebê. A casa era na mesma praça da igreja e do
grupo escolar, mas em um ângulo que não dava para ver o mercado,
nem as lojas do outro lado. Feita a matrícula por meu pai, o diretor
levou-me para a professora, a mulher mais alta da cidade, com fama
de bonita e de inteligência sem igual, D. Heloísa Veloso Sarmento
Cordeiro. Eu nunca tinha visto gente assim com quatro nomes. O
Cordeiro era por causa do casamento com Rodrigo, ele ainda mais
alto do que ela. D. Heloísa era a fera da escola, dona da disciplina,
aluno tinha que piar mansinho. Fez um teste para avaliar o que eu
sabia, pois vindo de escola particular e pouco tempo de escola de
governo, nem tinha um número de série. Achou que eu podia ficar
no terceiro ano, e foi lá que me colocou no meio de uns trinta e tan-
tos colegas, sentado na frente para ser visto melhor. Tudo tinha que
ser decorado, do descobrimento do Brasil até a Guerra do Paraguai.
Nomes de todos os estados brasileiros, de todos os países das Amé-
ricas e da Europa, com as respectivas capitais. Nem pensar trocar
dois esses por cê cedilha. Como não admitia não ser o primeiro da
classe, tive de estudar dia e noite até superar o nível da turma. Quase
que uma luta de vida e de morte.
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